A Minha Sanzala

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23 de novembro de 2006

18 - Estórias no Sofá - Na senda de JB - 2 de 2

Com o passar dos dias, Antero começou a apurar o seu sentido de segurança. A sua causa, a que ele não sabia que tinha, lhe estava a sair do controlo do reduzido número dos fabricantes do pasquim stencilizado, que ele sabia era agora mesmo só ele. Mudou de carro. Deixou de ter o verde alface e arranjou um mais velho cor de amarelo inveja. Eu nem mesmo sei porque é que os fabricantes de carros põem essas cores nos carros.
Mas com menos ou mais sobressaltos os dias de Antero lá iam correndo, sempre no mesmo horário, sempre no mesmo padrão, mesmo que algumas manhãs ele apresentava uma olheiras que até um cego quase lhe via.
Mas um dia a coisa mudou. Há sempre um dia que a coisa muda. Ele olha no retrovisor do seu amarelinho e vê uma mota que não lhe descola. Além de não descolar ainda lhe abria o braço direito. Antero empanicou e assim num repentemente atirou o pé direito no travão que o amarelo quase seguia em frente deixando as rodas lá atrás. Claro que o motoqueiro nem teve tempo de pôr a mão direita no guiador antes da mota bater no amarelinho. Sem olhar mais para trás, Antero meteu a primeira e seguiu o seu caminho. Acho que nem teve tempo para respirar, entre o travar e voltar a arrancar. Mas Antero aprendeu uma novidade, que é conduzir com um olho na estrada e outro no retrovisor.
Num cruzamento mais à frente ele vê que está outra mota, parecida com a primeira, a lhe esticar o braço direito e pelo que lhe pareceu até nomes na avó dele lhe disseram. Com o treino de há cinco minutos, Antero idealizou uma nova investida do motoqueiro, que devia ser colega ainda do outro e se vinha vingar ou acabar o trabalho. Esse candongueiro está mesmo a jeito, pensou ele com os seus calores e tremores. Faz um zigue zague que a motou se enfaixou logo no zigue que nem teve tempo de fazer o zague. Desta vez nem fez uma amolgadela no amarelinho. Antero se sorriu de ter conseguido sair-se bem de um segundo ataque.
Outro candongueiro lhe chama. Gesticula parece vai ter um ataque. Antero, que ainda não tinha saído do pânico anterior se afunda mais nele e atira o carro para a contramão.
O candongueiro nem viu como é que bateu no carro que lhe ia na frente.
Para tranquilidade de Antero ele se resolve a meter por ruas que não conhecia. Atraveza um descampado onde os miúdos jogam à bola. Ele não lhes estragou o jogo, mas um cão foi à vida porque não teve velocidade nem reflexos para fugir do amarelinho.
As crianças começam a gritar.
- Olha a
Antero já estava longe que nem ouviu o final da frase gritada pelas crianças que tinham estado a jogar à bola. Acho mesmo que foi a vez que o amarelinho andou mais depressa na vida dele. Ainda por cima não era hoje que ele ia chegar atrasado no serviço, coisa que nunca lhe tinha acontecido. Nem nos dias quentes. Não era por aí que os chefes lhe haviam de pegar.
- Vou fazer mais como? dizia ele como que a ver se arranjava uma solução para resolver o problema do tempo.
Corre a cidade no desespero do pára arranca, de quem está habituado a chegar muito mais cedo. Mas com tanta aventura de filme policial, não admira que as ruas e avenidas já estejam esgotadas.
Chegado, estacionou o carro com ajuda de umas pancadas nos carros da frente e de trás.
Consegue chegar antes do chefe. Para Antero isso era sagrado.
Quando sai do carro, o chefe que estacionara um pouco mais à frente lhe chama.
- Ó Antero!
Lhe olhou nos olhos e começou logo a lhe justificar este meu atraso.
- Mas ó Antero, eu queria dizer-lhe…
Nem teve tempo porque Antero já lhe estava a puxar o braço como que a lhe querer chamar para um canto mais sem gente.
- Bolas, Antero, eu só lhe quero dizer que a porta do lado direito do seu carro está a arrastar no chão!

Sanzalando

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