A Minha Sanzala

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31 de outubro de 2009

viagens

Parti em viagem, de sonho em sonho, engarrafado no trânsito, em busca de mim. Aportei em portos que nem eu sabia que os havia, corri sem respirar para não perder a minha memória de dúvidas. Tantas vezes caí que se as fosse contar não teria nunca feito outra coisa. Viagei alegre umas vezes, carregado de tristezas outras tantas, umas vezes com a alma feita em fanicos e outras sem ela mesmo, umas vezes em espirito outras de corpo apenas.

Nunca, mas nunca mesmo, viagei para fora do meu mundo de sonhos.

Percorri mundos sem fundo e fundos sem fim, tatuei pensamentos, bordei palavras em recantos da memória, caminhei ao sol ou à sombra, na estrada e por ar, no mar e no sofá, parei em sinais e sem sinal curvei-me, vi fantasmas, tive alucianções, morei em assombradas casas.

Nunca, mas nunca mesmo, sai dos meus sonhos porque procuro a ilha onde eu tenha o meu lugar de ermita sem tempo.


Sanzalando

30 de outubro de 2009

minha rua

Posso subir e descer a minha rua umas mil vezes que esta nunca será a minha rua. Jamais saberei de cor todas as pedras desta rua como imagino que sei as da minha rua. Aquelas pedras tinham brilho mesmo nunca tendo sido polidas senão com os calções cardados do meu tempo de criança, tinham um nome que só eu os sabia. Se calhar o Zé lhes tinha dado um nome também que não eram igual ao meu. Mas aquelas eram as pedras da minha rua mesmo que a rua fosse de mais outros alguéns.

Posso sair da mão dada, ouvir a música já gasta e riscada, que esta não é a minha rua. Posso dançar contigo na minha memória, fazer ridículas figuras de brilhantes olhos castanhos que ela continua a não ser a minha rua, aquela rua que me viu tantas vezes na esquina à espera de te ver passar, mesmo sabendo que não me ias ligar nenhum.

Eu sei que louquei por sonhar ver a minha rua onde passearia contigo de mão dada.

Será que alguma vez pensaste se eu teria mão para te dar? Eu pensei tantas vezes na sedosa mão que seria a tua…

Mais um sonho vão que se perde num qualquer vão de escada numa rua que não é nem nunca será mais a minha rua, nem nunca terá as minhas pedras que eu sabia de cor.

Assim, não sei quando sentirei o delírio de ser feliz, numa rua que um dia eu possa dizer que é a minha rua.



Sanzalando

29 de outubro de 2009

sonho-te

Sonho-te com algo novo e que me perdure, na memória e na alma. Eu sei que podia ter escolhido outra razão para os meus sonhos, mas tu foste-me imposta pelos subconscientes da vida. Podias ser mais linda, mais jovem, mais interessante, mais tanta coisa e eu se calhar nem te conheceria e jamais te sonharia como te sonho até que um dia ele se torne realidade dum novo sonho.

Na verdade tu não sabes o que gosto ou não, na realidade nada sabes dos meus sonhos nem das minhas forças e fraquezas. Nem sabes que o meu sonho é ver-te feliz. Nem sabes que eu existo, quanto mais estas tantas coisas que eu te digo nos meus silêncios.

Um dia, sem hora marcada, saberás da minha existência, conhecerás a minha estória, saberás de tudo o pouco que há de saber de mim e dar-me-ás o que eu nestas palavras caladas tanto te tenho pedido.

Guardo na minha intimidade o teu nome, o teu rosto, perfume de mulher tropicalizada na geografia da memória porque eu sei que um dia me darás o olhar e atrás deste virá o sorriso e depois o brilhozinho nos olhos.

Sonho-te sempre e um dia atrevirarei-me a ver-te ser feliz comigo num delírio de tontarias.


Sanzalando

27 de outubro de 2009

Não sei se sonhei

Não sei se sonhei, se ouvi ou inventei que atrás das coisas bonitas está algo terrível. Mas me deu para pensar que por trás de ti deve estar alguma coisa horrivel, tragédias ou tempestades, dores e hemorragias de lágrimas, assim numa de dar para vender e ainda sobrar. É que nos meus sonhos tu apareces sempre bela, mesmo quando me apareces enfaixada numa manhã de cacimbo, rodeada de areia fina que vem no sopro do vento que chega do deserto.
Bela de beleza que as palavras não conseguem nem pintar num esboço de aproximação, mesmo com as palavras doridas dum ou outra lágrima. Já sei que esta dor tem algo de belo uma vez que ela é sentida na alma, na espiritualidade do sonho tornado desejo. Talvez seja por isso que a gente sente dor num doer inexplicavel, numa sofisticação de ser humano.
Não sei se sonhei ou não, mas a verdade é que a tua beleza faz com que eu esqueça a minha não existência para além da contemplativa. Um dia qualquer eu faço uma festa à vida, sonhe ou não contigo.

Sanzalando

26 de outubro de 2009

tarde de outono

Não sei o que se passa comigo. Num repente tenho a estranha sensação de ter acordado a meio da noite, mesmo ainda sendo de tarde num entardecer de outono, e sinto no ar o perfume das acácias floridas duma avenida que já foi Barroso. Mas sinto dum real sentido perfeito que a noite calada que ainda não chegou aparece-me carregada de sombras como se fossem memórias vagueando em mim. Sinto ao mesmo tempo o ruido da terra que não tarda vai aguentar o peso da noite. Mas ainda é de tarde num entardecer de outono e não uma manhã de cacimbo que perfuma as acáciads deste meu sonho de sonhar acordado. Deve ser um acidente de percurso, uma explosão do céu que se abate por mim numa ferida de saudade.

Ao longe, muito longe parece-me ouvir o uivo dum cão. Perto, muito perto, ouço o choro duma criança. Eu sou o centro, ponto médio da incógnita, num entardecer de outono que sonho noite dentro.

Na verdade não me lembro como acaba, o sonho, o entardecer ou a noite. Por esta ou outra ordem qualquer.

Me lembro apenas os barcos que sem passageiros ou tripulantes ondulam ancorados na minha baía de memórias.

Afinal os sonhos são sonhos e pouco mais que isso podem desejar ser, mesmo num fim de tarde de outono cuja noite promete ser de silêncios, mas perfumada com o perfume das acácias floridas desta ou doutra qualquer avenida porque o sonho ainda é livre.


Sanzalando

24 de outubro de 2009

ainda olhar


Aprendo com os meus olhos a olhar para todos os lados, até para dentro de mim. Vejo-me desejando tornar realidade os sonhos que sonho, as imagens que invento numa realidade virtual, os desenhos que esboço nas muralhas do tempo. Vejo-me a sentir o teu perfume como que a fazer parte de mim. Enfim, sou um afortunado que na escuridão consegue ver-te, sentir-te, desejar-te. Pena mesmo é, que nesse escuro encontre os meus lamentos, porque vou perdendo a memória da tua textura verdadeira, o odor do teu perfume real, o calor dos teus abraços. É assim uma mistura de memórias e realidades, um surtido de coisas doces alternado com nuvens de sabor amargo.

Mas com os meus cansados olhos ainda tenho esperança de te ver em toda a minha volta como que a dançarmos à roda num banho de humildade, fraternidade dum mundo que foi feito não apenas para nós dois.
Os meus olhos não me enganam, mesmo quando estão fechados a olhar-te por dentro, num ver-me de sentido futuro arrastado por brisas, ventos ou tempestades.

Através dos meus olhos sonho-te, sinto-te mesmo quando não te vejo.
Prontos, dizia a criança que passava ao pé de mim enquanto eu distraidamente delirava com a tua beleza que faz tempo não saboreio, ao mesmo tempo que me olhava com ar de quem quer perdoar-me algo que não lembro de ter feito ou dito. Se calhar queria dizer-me que sou nada, um perdido neste lugar que através das palavras que soletra com os olhos de lágrimas se quer encontrar. Não sei e olhando para os seus olhos de inocência ternura não me apeteceu perguntar. Fiquei-me pelo prontos num pronto de olhar fixo.
Afinal de contas, as minhas recordações estão memorizadas na retina.

Sanzalando

23 de outubro de 2009

com os meus olhos

Abro os olhos e nem sei o que vejo. É o desassossego da curiosidade, o nervoso da calma numa mistura de desejo pesado sobre as costas, fardo compartido num boca a boca do diz que disse. É tudo uma salada. Eu quero, logo penso que posso e sonho. Mas a realidade abraça-me, abana-me e mostra que afinal não é assim. O querer já é um começo da viagem. Do mal o menos. Aos poucos vou diluindo os meus tormentos, vou descarregando as costas do fardo de palavras, a memória esvazia-se de recordações sonhadas que não passaram disso mesmo, o que acaba por dar lugar a novos sonhos e açucarando novos desejos ardentes. Um dia, eu sei, vou-te abraçar, sentir-te o perfume, ver-te ao pôr do sol, navegar nas tuas lágrimas de alegria. É um sonho fácil. É pena que os meus olhos já não vejam com o brilhozinho nítido de outros dias. Mas o sonho continua a ter o mesmo colorido, a mesma intensidade. O sonho não é volátil, pode mudar como muda a areia do deserto, mas muda a forma, apenasmente. O sonho não é inflamável, não queima amarguras, tristezas nem se torna mais leve por fazer cinza.

Abro os olhos e já não vejo com a nitidez doutras eras, quando tinha todo o tempo do mundo.

Mas os meus olhos ainda conseguem ver um oásis, o desfazer de muralhas, algumas mentais e outras reais. Afinal de contas ainda consigo ver o meu umbigo. Sou um afortunado, sortudo.


Sanzalando

22 de outubro de 2009

Silencio no intervalo

Às vezes se nos escapam palavras abruptas por entre doces sonhos, outras, palavras sem sentido, são ditas no calor da alma encadescente duma raiva escondida. Mas todas as palavras mostram apenas a alma, o estado de alma ou a alma dum estado. Às vezes as palavras são ruidos, insuportáveis, o mesmo se passa com a insuportabilidade da nossa alma. Enfim, às vezes as palavras são como a dor no peito, surda, assustadora, mesmo sabendo que estamos em plena saúde. As palavras fazem-nos sair das nossas prisões, transformam um infernal dia num resplandecente dia de sol, transformam calados silêncios em imagens reflectidas num qualquer espelho de expressão. As palavras traduzem os meus sonhos, contam-te na aparencia perfeita, na rima incompleta, na máscara ou na realidade dum qualquer photoshop aquilo que me sai desses sonhos que tu sabes que eu te sonho.

Às vezes me apetece modificar uma ou outra, transformar um sonho noutro, mas falta-me tempo, inteligência, paciência, capacidade ou mesmo um somho plausível.

As palavras, meio de comunicação, de confusão, aglutinação ou afastamento, são como os sonhos que sonho-te com as palavras como uma salada de frutas, um estado de alma.

Mas são os sonhos que te sonho e como posso eu modificar este sonho de te poder sonhar em cada segundo? Com outras palavras? Não as sei! E os silêncios são apenas pedaços de tempo que uso para respirar no intervalo dos sonhos.



Sanzalando

21 de outubro de 2009

não sei

Caminho por caminhos tantas vezes já caminhados, revejo passos que dei, identifico marcas nos meus velhos passos e vou revendo os galhos que se me vão aparecendo no caminho, sempre como se fossem a primeira vez que os vejo. Donde vem isto tudo? Em que é que me converti? Será que eu sou apenas fruto da ilusão, filho do sonho? Pergunto-me o porquê de tantos passos pelos mesmos caminhos se eu já perdi a confiança de ser boa pessoa, de receber o que mereço, ou acho que sim, dependendo da perspectiva. Questões menores para grandes sonhos que perdi numa qualquer praia deserta, num amanhecer de verão em que sorria com a vontade estampada na cara por ter esperança de que um dia, mais cedo ou mais tarde, eu te abraçaria como se abraça uma amante que se ama de verdade. Quem sabe me perdi no labirinto dum qualquer sonho mal sonhado, numa lágrima de sangue que não derramei. Os meus olhos me vêem e o meu cérebro não me reconhce. Me convenço cada vez mais que eu sou fruto dum sonho, dum encontro casual duma ideia com o desejo, dum riso aberto com uma lágrima de dor, da consciencia com o subconsciente, da ilusão com o sofrimento apagado dum caminho sem fim.

Não sei se ganho, se perco, se choro ou gargalho, sei que sou feliz assim neste sonho. E um dia, cedo ou tarde, deixará de ser sonho e será realidade.




Sanzalando

20 de outubro de 2009

Coincidências do caraças


Uma amiga, fã desta página (vaidade minha é claro) escreveu, inspirada no meu 'post' de ontem: "guiado pela mão" no google e aparece em primeiro, de presente especial para ti a interpretação fantástica do côro do teu Namibe natal ... (não sou natural do Namibe mesmo tendo lá vivido a maior parte da minha vida, minha terra é mesmo no Planalto)
abri o link e na apresentação encontro: Coro de Moçâmedes a cantar no casamento.....
Agora ela me imagina desde o pontão de Alvor, pé ante pé, de onda em onda a caminhar até mesmo quase lá. É que eu de comoção não sei se conseguiria chegar lá e respirar ainda.
Hoje saiu um 'post' diferente porque me apeteceu ser diferente hoje.

Sanzalando

19 de outubro de 2009

sonhos...

Acho não preciso fazer malabarismos, truques de magia que desconheço totalmente, nem preciso de ter uma concentração fora de normal. Afinal de contas o que eu faço é apenas sonhar. Coisa simples de sonhos simples. Não preciso ficar de ar pesado nem deixar crescer a barba e despentear o cabelo para manter os meus sonhos que sonho num dia a dia a cada hora.
Um dia, eu sei, vou olhar para trás e vou ver uma multidão assim a caminhar como que a me seguir. Eu sei que também pode ser apenas um sonho como os outros sonhos, só não sei se vai cair na estante dos realizados ou no porão dos não. Mas isso o tempo é quem vai me dizer e não estou para competir com ele. Essa multidão gritará o meu nome. Espero eu não estar à frente a correr com ar de quem foge, mas estar com ar sereno de algum profeta da esperança.
Sonhos frenéticos sonhados fora da cama, ilusões sorridentes dum futuro carregado no presente e alicerçado num poderoso passado.
Afinal de contas eu continuo com o SONHO!


Sanzalando

16 de outubro de 2009

palavras

Passo a palavra pelos meus lábios, que os sinto secos. Quase apetecia dizer que não servem para nada, nem para afogar mágoas, nem clarear trevas, nem para apagar dúvidas. São as mesmas palavras que descrevem as mesmas dores, angústias e que me atravessam o espaço como lanças directas a uma qualquer parte de mim. Há palavras que me vhegam ao coração, outras que dele partem, palavras soltas e acompanhadas, salgadas e doce, para todos os gostos e muitos desgostos. São estas as que uso para te mostrar o que me sonho para ti, as que me aquecem a alma e refrescam o coração. São palavras tantas vezes feitas lágrimas, outras tantas feitas gargalhadas de esperança num soluçar interior. Por vezes te digo as palavras que caminham descalças no meu interior deserto, escaldante, não só árido como também poeirento/nublado e sempre pouco claro. Te digo palavras sem sombra, vazias, inexistentes, carregadas de dor afogadas de riso. Apenas uso as palavras com que te quero acariciar, mostra-te o que de mim resta quando não me estás, o que amargamente choro e alegremente vivo. São palavras vulgares que se gastam no tempo até desaparecerem na memória do esquecimento.

São estas as palavras que a minha voz rouca te querem dizer, todas as coisas que te tenho para te dizer, todos os sentimentos que te tenho sentido.

Faz tempo que não tenho tempo para te dizer palavras de chuva, cheiro de terra molhada. Enfim, hoje não encontrei a palavras certa para te dizer.



Sanzalando

15 de outubro de 2009

me disseram ao ouvido e eu acreditei

Assobio alegre nuns olhos que riem sem mentir. Me disseram assim num pertinho do ouvido que as minhas palavras quando lhes digo saem assim como que bonitas que até metem raiva. Corei na altura ao mesmo tempo que dava pulos de contente sem mexer um único músculo. Faz conta não percebi, não entendi ou não ouvi. Mas lá dentro de mim tudo foi no céu e desceu num rapidamente para manter a compostura. Algumas palavras eu queria dizer mas até a garganta ardia. Foi inesperado. Caminhei para me recompor e entrar novamente nos meus mundos, no real e nestes sonhos que sonho com a vontade que seja real. Complicado.

Já sei, sigo o conselho, me meto aí no meu mato, lá em cima nesse planalto que o Arquitecto fez como o mais lindo do mundo e donde eu posso ver até o deserto se desaguar no mar como se fosse um rio de águas douradas. Aí, eu vou falar num não calar mais e contar todos os sonhos, todas as curvas da vida, todos os olhares que olhei e os que me olharam, as lágrimas que chorei e as que guardei para mais tarde chorar. Aí, nesse meu planalto, eu não vou sentir mais a tristeza da solidão, a impotência na tristeza e a solidão impotente, porque vou ter como companhia as minhas palavras, alegres gargalhadas de sonhos que um dia eu gostava de ter vivido e por isto e por aquilo ficaram para amanhã eu poder apenas contar. Aí, no meu planalto, os meus ouvidos vão ficar atentos para te ouvir mesmo quando choras para dentro para não me incomodar, os meus olhos vão fixar os teus e as minhas mãos vão acariciar as tuas até não poder mais olhar porque alguém te vai dizer ele morreu.

Porque me falaram assim pertinho do ouvido coisas doces que eu não devia ter ouvido?

Quando mesmo é que eu vou acordar? Assim nem que apeteça eu vou despertar.


Sanzalando

14 de outubro de 2009

faz de conta

Faz conta estou a sonhar que sou um anjo, assim de verde florescente, pairando como que estivesse a voar sobre os campos, sobre os rios e parando sobre o mar. Faz conta canto uma canção de amor, acompanhado por uma arpa, que um piano é mais difícil de transportar, mesmo para um anjo. Faz conta consigo fazer esboçar um brilho nos olhos, uma constelação de sorrisos uma troca de ternuras. Faz conta consigo fazer soprar uma brisa, de sabor a mar, que faz com que as árvores dancem suave e melodiosamente. Faz conta consigo criar paz, transformar o outono no calor tórrido dum trópico. Faz conta sou acompanhado por um coro de pássaros e em orquestra cantamos as nossas canções de amor.

Faz conta que esse anjo que sou, de verde florescente, cantando canções de amor não é mesmo de faz de conta, mas puramente de ficção.

Anjo complicado este, que para além de verde florescente e cantando coisas de amor é um fingido de faz de conta que te amou, te ama e te amará, mesmo quando tu nem olhas mais para ele como nunca olhaste na vida.



Sanzalando

13 de outubro de 2009

delírio ou recordação

Aproveito o sol e vou saltitando na areia da praia como fazia quando era criança. Faz conta estou a dançar com um pé no passeio e outro na estrada, assobiando uma música que acho e jazz que acabei de compor e nunca mais vou conseguir repetir. Foi do sol. Foi este o título que eu lhe dei. Não tem letra e é só mesmo composta para assobio de quem não sabe assobiar. Aí vou eu praia fora tentando carregar a bateria dos sonhos ou os sonhos em baterias para mais tarde descarregar. Sei que de repente sinto um nó na garganta. Acho que acabei de saborear a recordação dum beijo que me deste, ou que eu já não sei se é memória ou se é delírio. Mas de facto saborei-o e senti a tua mão a passar por entre os meus cabelos. Não, este sol não faz insolação, acho mesmo é recordação porque delírio não pode parecer assim tão é de verdade.

Agora sinto uma amargura que me parece que não entrou nos ouvidos porque não ouvi a tua voz a me dizer que me queres e outras coisas mimadas. Meus olhos entram em colapso lacrimal e não me deixam ver a linha do horizonte direitinha como me parece que ela é. Parei a dança dos pés e já não me lembro a música para um assobio.

Não, este sol não é o mesmo que eu me recordo, este mar não tem o mesmo marulhar e os biquinis não são mais como eram.

Acho vou para casa ver se é delírio ou recordação.


foto de C. Freire
Sanzalando

12 de outubro de 2009

eu e o sol

O sol regressou como que cansado de aquecer os trópicos ou então, para meu espanto, se lembrou de me vir aquecer o corpo que já gelava pelo estado de alma. Ele sabe que eu tenho dias que passo dum estado de alma a outro num breve espaço de tempo que nem dá para pronunciar a palavra clique.

Tem dias que desperto do sonho assim com cara de quem teve um bom sonho, sorriso estampado nos lábios e aquele brilho no olhar. Até o teu andar é de levar a boca dos outros que te olham a dizer que vais de cabeça erguida rasgando o vento e já nem te lembras que faz segundos estavas carrancudo, dobrado e olhos no chão como quem procura uma agulha dum outro palheiro, transportavas nas costas os pesadelos deste e doutro qualquer mundo.

Ele sabe como tu sabes essas coisas todas sobre mim. Até te digo que sabes mais de mim que nem eu sei, pois fico nas minhas dúvidas e na amalgama de sentimentos que nem uma varinha mágica conseguia fazer melhor.

Não, hoje não te falo na amargura em forma de palavras nem na solidão de tantas amarguras que se me dão um nó na garganta.

Hoje te falo só apenas deste sol que me veio dizer que estás bem, obrigada!


Sanzalando

11 de outubro de 2009

hoje não existo

Se eu pudesse gritar, chorar, rir e enlouquecer era feliz, mesmo carregando nas costas o peso dos sonhos e um ou outro pesadelo. Até era capaz de ver um pouco mais claro mesmo nos dias de muito cacimbo. Acho que está na hora de dar forma à minha louca loucura. Mas como é que vou formar um desenho que ainda não pensei, construir o seu esqueleto se eu não deixei ainda amadurecer a forma?

Acho mesmo deixar acentar o pó da loucura e ver se a vontade, como das outras vezes, passa.

Hoje vou sonhar em não fazer nada e deixar um ou outro neurónio desatar a voar por mim fora como quem não quer nada.


Sanzalando

As Horas de Domingo (3)


Sanzalando

10 de outubro de 2009

sonhei um sonho que não tive tempo


Me deixo embalar nas memórias do cacimbo, que quase já nem me lembro mais como é que é, me envolvo na corrente do rio que quer dizer que choveu bué nas terras do planalto e me acastanhou o zulmarinho não me deixando ver claro a transparência que eu queria ter na alma.
Pouco a pouco as gotas do tempo caiem como guilhotina nos meus sonhos. Pode ser que eu ainda tenha tempo de chorar os sonhos que não tive tempo de sonhar, que abafei nos gritos calados da zanga interior como que lhes varrer de dentro de mim como se fossem lixo que me entorpece as articulações mentais. Enfim, todos os dias a guerra cai na mesma lenga lenga de sobrevivência mental. Acho que está na hora de comer um chocolate, deixar aquecer a noite nas saudades escaldantes da memória, agarrar um caderno de capa vermelha e tirar apontamentos enquanto a liberdade de movimentos está mantida.
Ai, quem me dera que o meu sonho não termine assim num dia carregado de repentementes, surpresas salgadas das lágrimas daqueles que fingem estão a chorar por mim e a dizer bem baixinho que eu bem lhe avisei que sonhar não enche barriga.
Mas que me importa se eu consigo passear nas avenidas das acácias, das palmeiras, das bungavílias, da D. Josefa e senhor Serafim, sem me importar se está frio, chove ou o sol torra que até pode pensar eu sou café que seca ao sol.
Faz hora que é hora e vai ter uma hora que a gente ainda diz que chegou. Depois, logo se verá se ela vem envolta num cilindro de ternura.


Sanzalando

9 de outubro de 2009

Eu, o luar e os meus sonhos que um dia sonharei

Me sento no meu canto e desato a sonhar que é lua cheia, ela está redonda, absolutamente redonda e reflecte-se nas ondas do meu zulmaringo como uma bola que chega a meus pés. Sonho que ela passa atraves dum vidro que não existe e que me separa do mundo exterior, esse mundo verdadeiro que não me deixa ser assim como aquele que eu gostava de ser. Ela inunda-me da sua luminosidade cinzenta clara, transformando os meus brancos cabelos num prateado brilhante de quem se penteou com a velha brilhantina, dando-me um ar de quem sonha com um amanhã que espera ser ainda hoje. Me imaginas?

Lhe olho como quem não vê mas deseja ardentemente abraçá-la e só espero um momento de luz verde, um sinal, um acenar e desataria num voo razante, à velocidade da luz, num evaporar de segundos, para seus braços.



Sanzalando

8 de outubro de 2009

sonhos de vento

Desalinho o ouvido de modo que não ouço o silvar do vento azucrinar as orelhas. Não me interessa construir muros de pedra para que um dia fiquem ruínas e alguém conte estórias que nem se quer foram sonhadas quanto mais realizadas, para me proteger desse vento que resolve me soprar até parece quer me limpar num sopro. Eu assim nem consigo falar as coisas que gostava de saber falar e o vento me empurra as palavras para dentro como a querer que eu me cale num silêncio. Mas se eu sou teimoso porque é que agora eu ia ficar de braços cruzados a ver o vento me comandar?

Mas afinal até o vento me faz chorar também. Me sopra nos olhos que eu lhes fecho e mesmo assim escorre uma lágrima parece eu estou a chorar. Nem calma nem desassossego, curiosidade de amanhã quando não ventar esse sopro de arrepiar.

Dúvidas, amarguras e tristezas eu deixo que esse vento lhas leve para longe e me deixe aqui num canto vivendo os meus sonhos voláteis dum deserto escaldante que me trouxe a memória.


Sanzalando

7 de outubro de 2009

sonhos que não sei

Devia deixar o meu coração errante guiar os meus passos e perder o controlo da cabeça que quer fazer tudo direito que nem régua e esquadro. Devia de me ausentar da minha própria vida, ir até aos horizontes horizontais da imaginação sonhada nas noites de insónia. Acho mesmo que me devia de realojar num reencontro onde o meio não tivesse fim e onde eu não tivesse possibilidade de me perder. Também não quero perder de vista o mundo real que me rodeia, nem os meus problemas, nem as minhas alegrias. Me contradigo nos quereres, porque não me perco de vista as imagens imaginadas, os amores amados nem os sonhos que ainda não sonhei, muito menos as lágrimas que verti.

Quero visitar cidades feitas nada, ouvir músicas ainda não compostas, admirar fotos ainda não disparadas.

Quero… quero, só sei o que não quero. Duques e valetes, cartas fora do baralho, ventos que sopram pedras, montanhas desventradas.

Enfim, sonho com uma montanha de desejos e sorrisos na cara.


Sanzalando

6 de outubro de 2009

porque é hoje

Hoje acordei e disse-me que era a última garrafa que eu ia atirar ao mar com o último recado.

Quantos recados escrevi?

Quantas visitas recebi?

Qual o resultado prático?

Tudo porque hoje não sonhei e parece que não me apetece sonhar. Até dá ideia que o barco em que tenho viajado se afundou num mar de realidades, entrou numa tempestade de trovoadas mentais. Ou até pode não ter sido nada disto e apenas me faltar a garrafa onde pôr a mensagem escrita com as palavras que sonhei num dia menos bem.

Na verdade fui sonhando sonhos, criando listas de palavras que diariamente vou enviando mar fora. Uma chega, outra não. Não contabilizei em caracteres, lágrimas e silêncios. Sonhei, falei e escrevi sempre que me apeteceu.

Hoje faltam-me as palavras ou apenas onde as guardar.

Hoje… apenas porque é hoje e não sei o que é amanhã.

Não, não me esqueci de ti. Não tenho é palavras para te dizer, nem uma garrafa onde as possa guardar, nem um papel onde as possa escrever para não me esquecer um dia de te dizer que te amo.

Hoje não te dou nenhum recado nem te conto nenhum sonho.


Sanzalando

5 de outubro de 2009

o que é a minha realidade

Navego por imagens que imagino, que penso ou que sonho. Já não sei quais são as reais e as que são apenas minhas. Se não fosse por outras coisas eu diria que a minha alma me pea mais que chumbo.

Mas afinal de contas eu tenho de sorrir, tenho de alegrar-me e viver a vida com muito menos carga do que aquela que eu imagino que transporto. A alma não me pode estar a doer assim tanto, o sonho não pode ser sempre um pesadelo e as preocupações são apenas frutos do meu pensamento. Nada disto mais me pode oprimir o coração, enevoar os olhos nas lágrimas transparentes que imitam lentes de desfocar.

Sei, sei que não tenho super poderes para além do poder de sonhar sonhos que me regem a vida.

É verdade que estar triste não significa estar debil, morto ou acabado. Há coisas que merecem a tristeza assim como há outras coisas que valem a pena. Uma recompnsa recebida por algo que superou um qualquer sofrimento se poderá dizer depois que valeu a pena. Pode não apagar a tristeza. Esmola-a.

Mas de verdade mesmo é que eu não gosto de sofrer. Cansa-me.

Por isso sonho-te, por isso desejo-te em cada sonho, em cada imagem que sonho. Já não sei qual é a minha realidade.


Sanzalando

3 de outubro de 2009

Ou vice-versa

Sinto a pele seca. Sabor a sal. Salpicos desse mar que bate aqui nas rochas embalado das saudades que me chegam desde lá. Parecem até que são lágrimas carregadas de vida que lhe largam só para me tocar. Não tivesse a água quase congelada e eu me atirava nele só para me deixar enrolar nesse mar de saudade.

Respiro com dificuldade devido à emoção desses pensamentos que viraram sonho ou vice-versa. Um dia vou descubrir mas até lá não me vou preocupar. Vou-me deixando embalar nestes pensamentos e assim esqueço que o lado obscuro passa ao largo, para lá de não sei onde.

Sonhos, presentes e passados, escritos na memória que um dia os vai esquecer. Ciclicamente é a vida num grirar de carrocel em dia de feira.

Sonho porque estou vivo. Ou vice-versa.



Sanzalando

2 de outubro de 2009

nostálgicamente sonhando

Me sento na escadaria e espero em vão que o passeio dos tristes comece. Eu te pagaria rios de lágrimas se lhe olhasse uma vez apenas e ela do alto da sua altivez me desse num relance um esboço de sorriso.
Faz tempo sonho este sonho e penso se a tristeza quando chega a gente lhe vê. Sentir a gente sente até na alma. Mas tantas vezes eu penso que não lhe consigo ver. Os olhos brilham de entusiasmo, o coração palpita num acelerado batuque de festa que se adivinha e não acontece. Quem ia dizer que eu estava triste? Acho mesmo que a gente não lhe vê doutra forma se não apenas com olhos do sentir. Tristeza é marca de coração, embarga a voz num disfarçado fado de melancolia. A tristeza não se apaga quando a gente segue adiante. Cicatriza na sua marca registada, numa etapa a que mais dia menos ano vai ter outra e assim se faz uma vida.
O sonho não apaga, não afoga nem desconecta a tristeza. Lhe atenua assim como a tua ausência me trás recordações que eu não consigo recordar com o brilho das cores quentes da paixão que não acabou, mas apenas com as cores ténues das lágrimas que choro calado no sono.
Hoje me sento na escadaria do tempo a ver se tejo passar na passarela da vida.

Sanzalando

1 de outubro de 2009

pode e poderá

Posso gritar, chorar, rir e até enlouquecer. Posso beber uns copos, fumar até rir e morrer. Mas de nenhuma maneira poderei escapar à minha capacidade de sonhar nem de estar no outro lado escuro dos meus desejos.

Pode até sobrar loucura e a morte ser branda e gradual, pode haver mentira, guerra e sangue, pode haver tantas outras coisas como o som duma guitarra colada ao ouvido, um falso amor ou um abismo que eu não deixarei de te sonhar.

Afinal de contas tu estás no meu absurdo modo de viver, não tenho como neutralizar-te, afogar-te dentro de mim, usar-te em exclusividade como se eu fosse o único ser da terra. Serei eu assim um monstro que não tenha direito a um esboçar de sorriso? Foges cada vez que eu penso que me aproximo.

Um dia, de manhã de tarde ou de noite, assim numa hora qualquer, escrito em letras de sangue tatuar-te-ei o nome num qualquer canto de mim. Não juntarei as palavras banais, amor de mãe, amor de filho, ano. Será apenas o teu nome e por baixo, pingando lágrimas escreverei eternamente.



Sanzalando
recomeça o futuro sem esquecer o passado