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9 de novembro de 2025

Inteligência artificial versus a natural, que é a minha

Agarrei num texto de 2003, primeiro ano que tenho guardado em arquivo digital, e fiz um copy-past para um verificador de uso de IA. Surpresa minha, deu 87 % de uso. Se naquela altura eu usava inteligência artificial, isto é, há 22 anos eu a usava e era mais novo, quer dizer que agora, passado esses anos e com alguns neurónio queimados, nos múltiplos stresses da vida eu devo ter muito menos de inteligência natural e muito mais de artificial, pelo que o que eu escrevo deve dar uns 110 % artificial e 120  % de delírio. E logo agora que eu pensava que ia usar o que me resta da inteligência natural...

Eu tenho 69 e um telemóvel que parece mais inteligente do que muita gente. Todas as manhãs, antes mesmo de acordar, uma música  suave me diz “bom dia” que vem do pequeno aparelho. O aparelho lembra-me de tomar os remédios, medir a tensão se eu fosse racional e até de fazer coisas durante o dia. Mas eu olho para ele e dou comigo a gargalhar porque penso se eu o programar eu deixo de pensar e eu passo a ser um robot dessa coisa pequena que antes servia apenas para telefonar.

A inteligência artificial entrou devagarinho na vida, como quem não quer incomodar. Primeiro foi o tal de relógio que contava passos que eu dava por dia; depois, a app que avisa quando o coração bate mais rápido do que devia. Só falta mesmo ele desatar a conversar comigo como a querer fazer-me companhia quando eu quero estar sozinho....

Mas há dias em que eu sinto falta da conversa verdadeira. A máquina pode responder a tudo, mas de certeza que não me vai responder se eu fizer a pergunta mais importante:  Já amaste alguém?

Eu sei que a voz é apenas um conjunto de algoritmos, frios e precisos. Falta-lhe o calor das histórias que só a inteligência natural, a humana pode construir com as lembranças, cheiros e afectos, as dores e as perdas.

Enquanto preparo um chá de caxinde, capim ou príncipe, que é tudo o mesmo chá, penso no quanto aprendi com o tempo: a distinguir o riso, aquele que vem sincero do sincero e do que vem do educado, o silêncio de quem escuta ou do silêncio de quem se cala. Nenhum algoritmo conhece esses segredos, tem essa sabedoria porque a sabedoria da vida, essa, não se programa.

E, no entanto, há algo bonito nesta convivência entre o velho e o novo. A máquina ensina-me a não me perder nos horários e eu ensino a máquina, ainda que ela não entenda, o que é ser gente.

Afinal, a inteligência artificial pode até prever o tempo, mas é a natural que sabe quando é hora de abrir ou fechar a janela.

Na verdade, continuarei, tal como até hoje, a usar a minha percentagem natural de inteligência artificial.


Sanzalando

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