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8 de setembro de 2025

nadei na Praia das Miragens

Me disseram que a Praia das Miragens engana os olhos. De longe, o deserto parece prolongar-se até ao mar, como se a areia e a água fossem um só de cores diferentes. O calor distorce o horizonte, e o azul ondula em reflexos que confundem até os mais atentos.

Numa manhã de Março, decidi mergulhar ali, tal qual tinha feito na adolescência. Tinha imaginado histórias de pescadores, de amores e de como o mar daquela praia guardava segredos antigos, e de que quem ousasse nadar sentia-se entre dois mundos: o da terra árida e o do oceano infinito, na realidade e no imaginário, no quente calor do dia e na fresca noite. Estórias, pensei.

Entrei devagar, sentindo a frescura da água a cortar o peso do sol e a chegar-me ao osso. Depois nadei na forma desconjuntada de um nadador afundador. Cada braçada parecia abrir caminho entre miragens líquidas e imateriais pensamentos. O silêncio era profundo, apenas quebrado pelo estalar distante das ondas contra as rochas que marginam a marginal. Era eu e o sonho real de nadar no meu mar de criança.

Enquanto nadava, tive a sensação de não estar só. Havia peixes a acompanhar-me, prateados como lâminas, e acima dele as gaivotas riscavam o céu, como se vigiassem o meu percurso. A certa altura, olhei para trás e não reconheci a linha da costa: a areia misturava-se com a névoa do calor, e por um instante acreditei que poderia nadar para sempre sem encontrar uma maneira de voltar para trás.

Mas o mar devolveu-me a noção de regresso. Uma onda suave empurrou-me novamente em direção à praia, e saí da água com a respiração pesada, mas com o coração leve. Sentei-me na areia quente e percebi que nadar na Praia das Miragens não era apenas atravessar um pedaço de mar, era atravessar-me a si mesmo. Era colher cada pedaço de mim passado e devolvido ao presente

E ali, diante da imensidão, aprendeu que o mar, como a vida, às vezes nos confunde com ilusões, mas sempre nos devolve à margem certa.


Sanzalando

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