O convite dizia apenas: “Jantar em minha casa. Traz apetite e curiosidade.” Não mencionava dress code, mas percebi que era noite de aventura quando cheguei e senti, ainda no corredor, um perfume indecifrável — algo entre gengibre, manteiga quente e qualquer coisa que lembrava férias.
A porta abriu-se com a alegria de sempre, e lá estavam os amigos, cada um com o sorriso de quem já viaja há horas, embora ninguém tivesse passado da sala. A mesa era um mapa: tomates italianos conversavam com nacos mexicanos, enquanto especiarias indianas faziam uma dança silenciosa ao lado de uma travessa que, juro, parecia ter sido preparada por alguém que confundiu receita com poesia.
Começámos a provar, como quem visita cidades sem mapa, ao acaso. A primeira paragem foi Itália, bruschettas simples, mas tão boas que alguém comentou que deviam ser ilegais fora de Roma. Depois, Japão, numa salada tão leve que parecia ter sido feita para flutuar. México chegou em festa, com tacos que exigiam duas mãos e pouca vergonha. E Índia apareceu como sempre aparece na cozinha: deixando um perfume que fica na roupa, na memória e talvez na alma.
A certa altura, ninguém falava do prato que estava a comer. Falava-se da vez em que quase se perdeu um voo, da mãe que fazia bolo-bom, do medo de mudar de vida, do amor que foi e do que ainda pode vir. Descobrimos que, quando há sabores do mundo na mesa, as conversas também atravessam fronteiras.
No fim, enquanto a sobremesa francesa esperava pela devida atenção, alguém disse:
- Devíamos fazer isto mais vezes.
E era verdade. Não porque os pratos estavam perfeitos — não estavam, e talvez por isso mesmo estavam tão bons — mas porque ali, naquela mesa que parecia abarcar o planeta, percebemos que viajar não requer mala nem passaporte. Basta companhia certa, fome sincera e um punhado de especiarias.
Saí tarde, com o casaco a cheirar a histórias e a promessa silenciosa de que o mundo cabe inteiro num jantar entre amigos.
E se calhar é por isso que hoje há jantar do meu antigo serviço
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