recomeça o futuro sem esquecer o passado

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30 de março de 2015

quem sabe

Amarro as letras num fio de guita bem apertado e, para segurança, as fecho numa gaveta duma paragem solitária. Não quero perder nem uma, porque me pode fazer falta num qualquer dia de passado, presente ou futuro. 
Quem sabe um dia, assim como que esquecido das rosas porque uma roseira me picou, eu resolva estragar os sonhos porque não se realizaram e desatar a escrevê-los com essas letras atadas num atilho.
Quem sabe um dia, perdidas todas as amizades eu escreva todos os nomes num livro de pardo papel e utilize essas letras guardadas na gaveta.
Quem sabe um dia, lembrando todas as lembranças, eu vá à garagem buscar esse molho de letras e desatilhadas eu as encarreire num palavreado simples para dizer quanto gosto de ti.


Sanzalando

23 de março de 2015

palavras sem vento

Procuro palavras para descrever sensações,  feitos e feitios. Procuro perder-me em alfabetos simples, letras vivas em sorrisos de trocadilhos e não sei onde me encontro. Atravesso parágrafos, tropeço em pontos e vírgulas e dou de caras com retratos pintados em letras soltas.
Afinal de contas gastei letras trocadas em silêncios preguiçosos só para perder um segundo e por esta via dizer um  gosto-te.




Sanzalando

21 de março de 2015

poema cansado

Tenho medo de me cansar. Canso-me do silêncio,  da mentira,  da irá, do ócio. Tenho medo de me cansar de que um dia te cales. Cansado te peço: não te cales.



Sanzalando

19 de março de 2015

eu e o Meu pai

Acordei e me disseram de consciência que era dia do meu pai. De imediato chorei. Eu o amava quando ainda não sabia o que era amor porque ele partiu para parte incerta era eu ainda um cadengue que não se recorda do som das gargalhadas diziam ele dava. Chorei num cansaço profundo, não por melancolia, apenasmente porque não me lembro do perfume natural do Meu pai. Chorei exausto porque envelheço na rotina de recomeços sem me recordar da palma da sua mão a me acariciar os cabelos que eu tinha antes dele partir para parte incerta. Chorei por uma infinidade de razões até conseguir abrir a arca do tesouro de ser pai e me recordar que ausentemente não deixei de o ser assim como não deixei de o ter, o Meu pai.


Sanzalando

17 de março de 2015

63 - Estórias no Sofá - Uma garrafa pela pensão de viuvez

É tão bom ganhar assim um presente inesperado, ouvir uma coisa que nunca nos pensou na cabeça ouvir, receber um abraço assim como sem motivo, trocar um sorriso a dar ao desconcertante. Viver assim uma coisa simples numa complexa vida que mesmo depois de morto deve continuar a dar prazer. 
Assim num repente alguém desmaiou ao pensar que eu louquei de loucura irreversível.
Explico. 
Eu, Cipriano Acácio de nome registado no registo, já não me lembro nem de onde, assim fez o tempo que passou, casado com mulher mais jovem, de boas parecenças e saúde de ferro novo, faleci de natural morte, com vidas gastas em boa vida vivida, gargalhadas e outros prazeres sentidos na alma, sem dívidas à vida e sem lágrimas de missão incompleta. Em resumo, morri de bem feito, deixando viúva de bom gosto e gosto da vida.
Alegre meia idade, três amigas se juntam na praia, discutem decotes de outras eras, gargalham estórias escondidas que nunca haviam ousado falar em voz alta e algumas escondidas nos pensamentos noturnos, bebem uma garrafa de vinho marcado em boas cepas e pedigree. 
Uma a uma contam tostões, discutem preços, sobra para mais uma. Esta é paga pela pensão de viuvez por mim, Cipriano Acácio, deixada a mulher mais nova de boas parecenças e saúde de ferro  para que elas possam rir e de mim continuar a dizer as coisas bonitas que vou ouvindo desde o miradouro que um dia ganhei no céu.


Sanzalando

15 de março de 2015

poliban e eu

De repente dou comigo frente a um poliban. Sim, desses mesmo mínimos em que quando entra um o outro tem de sair. Tem porta que fecha não vai cair a água no resto da casa. Assim a modos que mal comparado tem amores que são tipo poliban. Tão apertado que só cabe um nesse amor. Ele se interessa por tudo o que a ela diz respeito. Ou vice versa que o género não é para aqui importante. São os estudos, os amigos, a família, o trabalho, a respiração, o sorriso e a transpiração. Um recebe tudo e o outro nem retribui. Nem nas angustias. A situação vai andando, levada tanta vezes pela inércia, que um dia porque a paciência se cansou ou simplesmente acabou e tudo acabou, sem brilho, sem chama, sem o rufar dos tambores, apenas pelo cansaço dos amores e as lágrimas das dores. O outro então dá conta que até parece passe de mágica ou drible da vida ela mesmo. Vai ser duro. Insiste. Nada. Vazio onde antes estava cheio. Tudo muda de contornos. São mails, sms e outras tantas modernices. Uma vida desabou e a outra vida se constrói no contraponto. Gato escaldado de água fria tem medo.
De repente dou comigo frente ao poliban, desses mesmo muito pequeno onde afinal ainda há espaço para dois, mesmo que seja por amor.


Sanzalando

10 de março de 2015

perfeita vida

Caiu nevoeiro parecia queria cegar o horizonte. Mas eu podia ficar contigo ali, nos silêncios do pensamento, no cruzamento de ideias, no abraço forte dum sorriso face a face e nos desejos da noite sonhada como que embrulhados num manto de nevoeiro.
A dois metros céu azul, horizonte como que longe nuns passos infindáveis de alcançar.
Como seria perfeita a vida.


Sanzalando

6 de março de 2015

62 - Estórias no Sofá - Notícias de Jornal

Joaquim Sentado, apelido de parte de pai que já vinha dum avô, filho de mãe desconhecida, pelo menos dele, literalmente jazia dia a dia debaixo duma acácia lendo jornais velhos, com um olhar de quem nem sabia o que era uma letra. Fazia vento, chuva ou sol e lá estava o pré-cota na sombra, mesmo nocturna da acácia, agarrado ao jornal que não sabia a idade, que as notícias não passavam disso mesmo e as fotos não amareleciam, e Joaquim Sentado lá estava cultivando o olhar pelo jornal.
Tantas vezes ali passei que cheguei a pôr hipótese de ser uma estátua de gente importante sentada como existem nas cidades importantes que alguma vez albergaram gente ilustre. Mas Joaquim Sentado não era de bronze e de vez em quando se mexia. Som é que nunca tinha lhe ouvido.
Um dia, estava eu com vagar e ali fiquei uns instantes a estudar o ar posto de Joaquim Sentado sobre o então já velho jornal, de fotos já sem nitidez e enxovalhado de tantas vezes dobrado. Levantou a cara, olhou-me nos olhos e num sotaque que não sei como escrever me disse:
- Não fica aí. Vai passear. É horrivel te ver me olhar e eu sem aguentar a força desse teu ver que até parece eu vou explodir as letras que bebi deste velho jornal que um dia foi novo e tinha notícias que eu ainda não sei porque lhes olho e elas não falam.
Se mudo estava, mudo continuei porém pensei que as notícias eram novas porque não tinham sido lidas, embora escritas faz tempo.


Sanzalando

5 de março de 2015

do sol à sombra

Retiro-me do sol e me sento na sombra como que alinhavando ideias, calcetando sonhos ou simplesmente a olhar para lado algum enquanto imagino a arranjar-me desde que torto nasci.
Retiro choros que chorei por estar cansado e porque às vezes tudo me cansa. Retiro lágrimas soltas que deixei cair por melancolia. Seco os olhos dos choros envelhecidos nas saudades. Limpo a cara das que rolam por rotina.
Retiro-me do sol e me sento na sombra, feliz porque estou num constante começar-te.


Sanzalando

2 de março de 2015

simplicidade

Aproveito o sol que aquece neste inverno se sorrisos e felicidades como faz tempo eu não me lembrava e debito palavras soltas sem medo que elas sejam levadas pelo vento para lugares distantes ou fiquem por aí represas num qualquer galho da vida. Não me importa que diga uma ou miles de palavras, não importa o quanto eu demore a dizê-las. Porque se valer a pena, a espera é apenas um detalhe, um pormenor ou um grão de areia numa praia deserta.
Aproveito o sol e pouco me importa que dê certo ou não. A vida é assim, as coisas são assim e dum nada chega a felicidade e eu nem noto porque sou.
Aproveito as palavras para estender ao sol e dizer que quero tudo de novo. Simples.

Sanzalando