8 de agosto de 2025

Quando o silêncio tem o tamanho do mundo

Há dores que não têm nome. Por mais que pensemos o silêncio permanece. Se fosse possível proibir acho era a única proibição que eu concordaria ser re-pensar.

Quando nasce um filho, a vida ganha uma nova geografia, todas as rotas, todos os caminhos passam a ir na direção dele. 

Quando ele parte, o mapa fica vazio. Não é apenas a ausência de uma pessoa. É a ausência de um futuro inteiro. É o silêncio da existência.

Dizem que o tempo cura. Mentira piedosa, que fazem o favor de nos consolar. O tempo, no máximo, ensina a respirar com um peso no peito. Ensina a sorrir sem culpa, mesmo que a saudade esteja sentada à mesa, todos os dias. Ensina a viver com a ferida aberta, mas coberta de um pano limpo, para não doer sempre à vista.

A morte de um filho é uma contradição. É contra a ordem natural das coisas. O mundo continua a girar, e isso parece quase uma ofensa. Há trânsito, há anúncios de perfumes na televisão, há vizinhos a falar de futebol. E tu, parado no meio de tudo, a tentar compreender como é que se continua sem teres a tua geografia completa, os teus caminhos apagados, as tuas rotas desviadas.

E, no entanto, continuamos. Não por força, mas por instinto. Continuamos porque há memórias que ainda brilham. Porque há risos gravados na pele, há cheiros guardados em roupas antigas, há frases que ficaram a ecoar no ouvido. Continuamos para manter vivo o que já não está aqui.

O amor que se sente por um filho não morre com ele. Transforma-se. Passa a ser feito de silêncio, de lembranças, de conversas que só acontecem dentro da cabeça. É um amor sem destinatário físico, mas que insiste em existir, porque não sabe fazer outra coisa.

Perder um filho é perder uma parte de si. Mas é também descobrir, no fundo da dor, que o amor é tão resistente que sobrevive à própria morte. E é nesse amor, ainda vivo, que se encontra a única forma possível de continuar.

Hoje fiquei triste ao ler uma notícia de morte com nome. Conhecia-o de criança. Revi adolescente e agora jovem adulto desaparece. A geografia dos pais está mudada. A minha está desfocada e despensada, porque custa pensar, custa imaginar. Quanto custa viver para acabar assim?



Sanzalando

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