recomeça o futuro sem esquecer o passado

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30 de março de 2011

às vezes tem vez

Caminho na minha linha de vida, umas vezes traçada por mim, outra ziguezagueada por destinos, não querendo ser juiz ou réu, apenas vivendo um dia de cada vez, aceitando as pessoas ou a mim mesmo tal e qual somos. Mas tem dias que a linha se apaga e o improviso impera, cresce a falta de espaço, a falta de tempo, falta a paciência e chego a ser o meu pior inimigo e reinvento o ódio amargo de boca, torresmo duro de indigestão.
Depois, no calar dum pôr de sol, retorno-me ao regresso do dia a dia e sorriso no rosto canto aleluias no silêncio duma voz que não sabe cantar, entro na linha, que às vezes é desenhada por mim e outras vezes ziguezagueada por destinos sem que eu seja vítima, sem que eu verta lágrimas fáceis, sem que eu tenha medos.
Caminho para lá dos Andes, Himalaias, Pirenéus, Alpes ou Kilimanjaro, mas quase sempre na linha que eu tracei sobre valores presentes assentes no passado.
Caminho à vez por carreiros de formigas ao som das cigarras num regresso a mim de sabores presentes como quem caminha certo, absoluto e com destino traçado num ziguezague de tempos perdidos e apagados da memória.
(Hoje vou na Kipola dizer adeus a Março)



Sanzalando

29 de março de 2011

hoje tintei-me

Me sentei na areia solta desta praia de vento e em sacrifício meditei. 
Hoje escolhi o dia para me autoflagelar mentalmente. Não cozinhei para ti, não te disse os bons dias, não decorei nenhum recado para ti e não atendi os teus telefonemas. Fiz-me de contas que não contavas e nem me lembrei de te comprar flores nem de inventar jogos para jogarmos na solidão dum fim de tarde.
Hoje não me existes, não sei a cor do teu sorriso, a cor do teu crepúsculo nem a cor da tua cara quando deres conta de tudo isto. Tintei-me em ti hoje e vou comer chocolate, lambuzar os dedos e saltar os muros das minhas prisões.
Hoje me sentei apenas comigo para me prometer ser ainda melhor, para mim.

Sanzalando

26 de março de 2011

hoje ensurdei-me em silêncios

Arrepios de frio, vento bate forte parece quer levar-me com ele, mas ele não sopra para sul mas sim de sul. Invernei-me num repente quando me mentalizei que ia receber o calor. Por isso amuei-me comigo e calei-me atrás dos vidros da janela que dá para lugar nenhum. Gritei-me até desaparecer a voz e mergulhei-me em silêncios mudos que me ensurdessem a alma.
Afinal é Sábado num pais do norte e não tive pachorra de acordar para gastar o dia com vida, gasto-o sornamente num silêncio surdo como o tempo.

Sanzalando

25 de março de 2011

eu e o meu rádio de pilhas

Ligo o meu rádio de pilhas numa estação à toa. Parei nesta porque está a dar uma canção que lhe gosto. Não sei o nome de quem lhe canta mas sei que se chama Because I Love You, porque ele diz isso muitas vezes e eu me delicio a ouvir. O meu rádio de pilhas não tem ecran para ler o nome das músicas, nem o ano nem nada. Tem mesmo só um botão que se chama volume e outro que diz tunning. Mas dá para me acompanhar nos meus silêncios. E eu ouço Because I Love You e voei de pensamento em pensamento e imaginei um confabulação cósmica que me criou até viver este momento em que ouço o meu rádio de pilhas. Olho para trás e vejo o caminho que percorri, algum do muito lá para trás está tão nublado que quase esqueci mesmo como é que foi esse caminho. Olho para a frente e não tem caminho. Quer dizer que eu vou ter de caminhar e inventar o caminho para andar? Só poder ser confabulação misteriosa dum texto escrito e não lido que me deram para viver.
O meu rádio de pilhas mudou de música e agora toca uma que não tem letra e eu não faço a mínima que é que está a tocar e continuo a deixar-me levar nas ondas do pensamento confabulado até ao sentido de responsabilidade que é eu ter de escolher a minha vida. Acho mesmo vou só ficar de olhos abertos e deixar o caminho se fazer à minha frente enquanto eu ando.



Sanzalando

24 de março de 2011

ar gingão

Me apresentei com o meu melhor ar gingão, fato de domingo, novo de acabado de passar a ferro, colei na cara um ar de quem sabe para onde quer ir e como o quer fazer e entrei no gabinete. Cumprimentos de circunstância e ar de quem quer distância. Me mandaram sentar. Falei as respostas das perguntas feitas parecia eram tiros de metralhadora. O ar de decisão estava colado na cara parecia era cola de sapateiro para nunca mais descolar. Opinei opiniões de ensaios feitos no espelho. Ouvi com os ouvidos mais atentos do mundo. Acenava sim e não com a cabeça, mostrava estar mesmo a par de todas as palavras ouvidas e ditas pela minha voz firme.
O meu ar gingão estava a ganhar peso na conversa, me soltava a língua e já dizia não com as palavras certeiras de quem não quer nem perder tempo.
E o tempo passou que nem relógio parece ter tido tempo de lho marcar.
Quando o meu ar triunfal se levantou para o aperto de mão de despedida quase caiu no chão, num estrondo ouvido lá para os lados dos morros o azuis. Me disseram num soletrar bem audível que sim mas não era nem preciso.
O ar gingão entrou no saco, a cola se descolou e a vida continuou num viver à espera que o tempo tenha tempo de ter um relógio a marcar a hora.

Sanzalando

22 de março de 2011

a nossa praia

Sonhei na praia um sonho em que tu paraste para pensar em mim. Estava sol como está sol nesta altura na nossa praia. O mar, um pouco castanho da chuva que teima em cair furiosamente lá nos altos morros, estava calmo como não costuma estar nestas alturas na nossa praia. Os mapundas que agora têm que dar a volta pela estrada velha, já não vêm à nossa praia porque arranjaram outras praias um pouco mais a norte e nos deixam esta só para a gente.
Ai, acordado num repente me pergunto onde estou. Sonho lindo docemente sonhado e tristemente acordado. Sonhei com a nossa praia onde não estava a nossa casa porque nunca tivemos uma casa, muito menos uma casa de praia.

Sanzalando

21 de março de 2011

Falta-me o tempo para perder tempo.

Tanto que fazer no pouco tempo que me restou num dia gasto de horas a passarem despercebidamente. Não senti fome, nem sono e a falta de tempo não me tirou a vontade de desligar do mundo por segundos. Antes pelo contrário, quase me apeteceu gritar que desisto e arrear os braços desmoralizado. Mas um qualquer click, que não faço a mínima ideia de onde apareceu, fez-me ver que há mais mundo para além do que os meus olhos vêem, para além do meu umbigo, para além das minhas silabas mortas em monólogos de surdos. Acreditei que posso ter ainda um lindo dia nas poucas horas que me separam de amanhã e por isso sorri, brilhei nos olhos o brilho duma juventude que faz tempo gastei e aproveitei as rugas para fazer uma cara feliz. 
Olhei à volta, estava um luar, já não é o mesmo luar porém ainda tem mosquitos a me picar e a me fazer palavrear silêncios em obscenidades mentais, quando dei comigo a dizer que não devo viver de recordações futuras porque isso futuramente me mata, que as pessoas partem num partir definitivo, que as memórias se apagam e se desligam num furtivo esquecimento e que eu não serei a semente que vai ficar para apagar a luz.
Enfim, é o que faz a falta de tempo para não ter tempo de perder tempo.


Sanzalando

20 de março de 2011

lua cheia

Aproveitei a luz da lua e cantei que nem lobo uivando noite inteira. Esqueci pudores, arranquei fragmentos de passado à memória e reinveitei um corpo a partir dos sonhos e com as minhas mãos inventei a tua cintura que agarrei com quanta força tinha e disse-me que jamais te largaria. Foi violência verbal esta luta que também foi desigual. A minha impaciência esbarrou na tua indiferença e os meus lábios sangraram silêncios enquanto eu suei angustias. 
Me disseram era lua cheia, de lobos e eu feito cordeiro mais uma vez.
Em silêncio cantei-te poemas que inventei, contei-te estórias que gostava de ter vivido, falei-te de personagens que gostava de ter sido. Mas a lua cheia carregada de luar pôs-me nu frente à tua realidade e eu mais uma vez chorei silêncios e recriei novos horizontes em que atravessei fronteiras e nasci numa nova vida em que os meus olhos deixaram de chorar.

Sanzalando

19 de março de 2011

Dia do meu Pai

Tinha 4 anos e sem dizeres adeus, por falta de tempo, só pode, desapareceste da minha vida. Não me consigo lembrar se depois do carro preto do Dr. teu amigo, dono dessa foto em que lhe roubei o teu pedaço, que foi lá em casa dizer que tu tinhas viajado para sempre, e que eu me lembro como se fosse hoje dessa hora de almoço desse domingo, eu chorei muito, eu desesperei, birrei ou que é que fiz. Se apagou tudo da memória e ao longo dos tempos, quando eu comecei a juntar pensamentos e ideias na minha cabeça fui juntando fragmentos e fui fazendo a tua história. Me lembro de para aí ao 12 anos ter 'assaltado' aquela caixa de madeira que a mãe guardava zelosamente e quase que parecia secretamente na garagem e ter tirado de lá o Advogado do Diabo e lido como se estivesse a cometer um crime. Me lembro de me dizerem que te escondias em casa se o teu clube perdia lá terra que não conhecias e parece que até nem gostavas, para que os teus amigos não brincassem com essa tua 'doença'. Sorte que nesse tempo até parece que não te acontecia muito, pois se fosse hoje eles iam pensar que tinhas hibernado ou que a tua águia tinha deixado de voar. Me lembro que me disseram que tinhas tanta certeza que o teu primeiro filho ia ser um másculo e te saiu uma fêmea e por isso te escondeste uns tempo. Me disse a mãe que andavas sempre de gravata, só que amarrotada no bolso porque a lei não dizia onde é que ela tinha de estar.
Me contaram que nas terras do Lobito escreveste porque as mulheres começaram a andar de calças e tu não gostaste de ver, hoje estavas feito na azia porque onde quer que olhes não ias ver saias.
Me contaram que salvaste pessoas do primeiro balcão no dia do incêndio no cinema que até parecias eras herói.
Pai, tanta coisa mais me contaram e eu não te posso perguntar se é verdade, ou foi só coisas para me encher o ego. Eu sei que por aí se ouve tudo e por isso estás a ouvir o que eu estou aqui a te falar e assim me vais dizer que a tua falta de tempo nestes tempos todos foi só porque estavas ocupado a ser como sempre foste: boa gente e um dia vais me contar tudo e voltar a ser o meu Pai.
Sanzalando

18 de março de 2011

no meu caso de malha

Passeio ao longo da praia, ainda transportando um casaco de malha, que não sei se foi a minha mãe que fez ou apenas mandou fazer à vizinha que vai vivendo de fazer estas coisas. Se eu lhe colasse um jacaré ele passava a ter marca, mas este é mesmo um casaco de malha feito na minha rua. Acho me fica bem e estas riscas lhe dão um ar de que estou mais magro, mesmo que a balança diga que não é verdade. Tenho mesmo é que aprender a andar de costas direitas. 
Mas dizia eu que estava a passear ao longo da praia e sinto que a minha cara transpira um sonho adiado e nunca esquecido, que me leva por caminhos ilimitados que não consigo descrever com as mil palavras que um dia aprendi a escrever. Mas me olhando na sombra eu vejo que não encontrei ainda esse caminho, mesmo que eu olhe para todos os lados até para o meu lado infantil. Eu passeio e passam os dias e o sonho continua marcado na minha cara como se fosse um carimbo dum dia que não devia ter esquecido.
Passeio na praia com o meu casaco de malha feito pela vizinha que vive destes trabalhos encomendados, sei lá se com lãs de outros casacos que já foram novos e continuo atrás deste sonho adiado.

Sanzalando

17 de março de 2011

os meus quedes novos

Hoje calcei os quedes último modelo duma marca que eu nem sei como é que se lê, porque ainda estou no tempo em que as marcas não assim um importante que mereça eu gastar minha capacidade de gastar conhecimento nessas coisas. Não são LaFinesse, nem Wrangler porque isso é marca de calças. Mas não interessa perder tempo neste conhecimento calçado porque importa é que com estes quedes eu vou conseguir correr mais rápido que o vento que hoje sopra do contra, me vou conseguir desviar das gotas grossas da chuva que teima em me manter abrigado e me vou cansar num aquecimento que não vai ter frio capaz de me gelar nem a alma.
Com estes quedes eu vou só correr direito ao sul, esperar te ver passar na rua, encostada ao banco de trás do lado direito num fim de tarde, e depois ainda vou chegar a casa a tempo de te ver chegar.
Com estes quedes eu vou saltar as ondas do mar e nem lhe tocar como se fosse um salto de altura comprida e chegar lá, onde um dia chegaste ainda na alcofa e te olhar e dizer que o tempo não nos passou rasteiras e vou encontrar aquele esboço de sorriso que mostras quando estás feliz.
Com estes quedes novos eu vou simplesmente escrever que te tenho saudades.

Sanzalando

15 de março de 2011

gaivota da Ilha

Ouço o Ritmo da Ilha, através dos África Show, enquanto vejo as gaivotas me voarem por cima como que a me gritarem que são livres. Será que elas sabem que lhes chamam de gaivota? De repente até me deu vontade de ser pássaro assim.
Se eu tivesse asas eu me ia curar num instante desta doença de te ver desde aqui num esforço até lá, sobrevoava amores perdidos na esperança de lhes encontrar e depois me estendia no sofá a ver os meus olhos brilharem um azul mar.
Já sei que vais pensar eu louquei-me em querer ser pássaro porque só um louco quer ser bicho. Mas eu apenas queria ser num instante uma gaivota mesmo que depois eu não soubesse que tinha voado num voo sem regresso.
Reouço o Ritmo da Ilha vezes sem parar apenas para deixar de sonhar em ser pássaro e voar. Me disseram que a vida é melhor sem fantasia... desacredito. Desligo-me do som, dou uns passos na areia, olho as gaivotas e dei por mim a voar num planar interminável de imagens e sons que me levam aos amigos.



Sanzalando

14 de março de 2011

Parabens a mim que tenho amigos

Aderi às novas tecnologias e de phones nos ouvidos vou ouvindo uma e outra canção dos meus tempos de adolescente. Ouço o Baby Blue, Because I Love, outras que já não me lembro o titulo nem quem lhes deu vida. Vantagens das novas tecnologias associadas a velhas nostalgias. 
Me embalo no teu sorriso de quem adivinha que acabei de receber uma prenda, mesmo que não consiga ver a tua cara e nem tu a minha. Mas sabes, sorri, como se diz, de orelha a orelha numa felicidade de poder dizer que nem as milhas nos separam e como dizia um outro, os amigos ficam quando todos foram embora só porque chuviscou.
Me embalo no teu sorriso de contentamento de saberes que hoje adicionas mais um ano na tua pessoal contabilidade e eu não tive tempo, desculpas, de te enviar pelo correio um livro que ainda não escrevi.
Me embalo ao som dos Deep Purple no Smoke on the wather e me lembro que tu estás em casa a estudar e eu estou para aqui a vaguear no meio das mapundeiras que vieram ver o azul do mar que hoje carregou de pica pica e se encheu de castanho vindo do Bero abarrotado de lama desde lá do Virei.
Me deixo cambalear a cabeça num quase adormecer só porque me lembrei que tenho amigos e traquilamente ouço uma Muxima velha e sempre nova a bater-me no coração.
Parabens a mim que tenho amigos


Sanzalando

13 de março de 2011

Regresso lentamente

Abrigado do chuvisco que teima em cair, dou por mim a olhar a linha recta que é curva e que teimam em chamar de horizonte, quando lhe deviam apenasmente chamar de barreira entre o lado de cá e o de lá e ficava por aqui.
Mas aqui começam a saltar-me à memória recordações vividas, sonhadas, fantasiadas, imaginadas ou somente inventadas com a esperança de vir a ser feliz. E me embalo e me dou a te falar todas as vezes que o meu silêncio me afoga numa tina de solidão. Tu, esse ser vagamente vago, criatura dos meus sonhos, autora dos meus pesadelos, ritmo das minhas gargalhadas, sal das minhas lágrimas, brilho dos meus olhos, nem sabes que existes e eu aqui a falar-te tantas vezes, que qualquer dia até tu vais acreditar na tua existência.
Aqui me tens regressado para silenciosamente te falar, te fotografar ou apenas te olhar de memória.

Sanzalando