recomeça o futuro sem esquecer o passado

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31 de maio de 2010

aproveito o sol

Que felicidade poder aproveitar o sol.
Acordo num despertar suave de um calor que me envolve como se fosse uma carícia. Sinto-me caminhar pelas areias quentes do deserto ainda antes de me erguer da cama.
Dourada areia fica marcada pelos meus pés. Deixei uma marca no mundo, pensei, eu enquanto olho para trás a ver o rasto que deixava.
Afinal de contas eu não passei em vão nem sou sombra dum outro qualquer corpo. Existo, marquei e deixo-me levar.
Os minutos passam e ainda não consegui tirar os pés do molaflex.
Deixem-me caminhar na aventura de sonhar acordado tentando deter em mim a ânsia que me devora, a febre que me faz delirar e as alucinações que julgo não ter.
Não suporto ver-me sem ser a olhar-te, mesmo quando não consigo ver-te.
Aproveito o sol e deixo que tudo o que fiz já não é meu. Passado!


Sanzalando

29 de maio de 2010

começar de novo é apenas começar

Começar. Sempre começar. Já não sei o número de anos que começo. Afinal de contas é apenas começar de novo. Simples.
Um dia, talvez numa tarde do nunca, eu não te necessite, não te pense e nem te sinta. Ai não será necessário começar, talvez apenas seja só recordar, rever a vida vivida, sorrir das figuras e gargalhar das gravuras.
Um dia, sem pensar, começarei de novo e de novo viverei na necessidade de te ter. Ciclo vicioso num contraponto ocioso de obesidades mentais, faculdades vitais nuns etecetras e tais.
Um dia, pensarás tu em mim, e eu, longe, partido para as resmas da memória, empoeirado num qualquer pedestal, ancestral e feito de coral roubado no zulmarinho que me uniu na separação, serei pó e mais nada que um nome só.
Um dia, levantar-me-ei e acordado, sonambulamente, viver-me-ei como num sonho que nunca sonhei.
Afinal de contas, começar de novo é apenas começar.
Sanzalando

28 de maio de 2010

deixo

Deixo os olhos navegarem por caminhos que passei, reinventam passeios que não dei e desapertam botões de rosa que não cheirei. Sinto as minhas mãos percorrerem-te a cintura ao mesmo tempo que sinto interiormente uma violência carnal enquanto aparento uma calma visceral. Deixo que as minhas palavras caladas tropecem no teu espírito feito calma e prolonguem os meus silêncios para além da tua alma. Deixo que o meu passado comprometido tropece num futuro já vivido.
Afinal de contas, deixo que os nossos corpos, até agora dessincronizados, um dia se encontrem por um eterno momento.


Sanzalando

26 de maio de 2010

em fim de tarde

Me deito na areia que não está a escaldar porque hoje o sol se esqueceu de vir brilhar para estes lados. Mas durante a noite deve ter estado vento porque lhe alisaram as dunas que hoje parece não tem. Deitado, barriga disforme apontada para as nuvens, que lá em cima me servem de tecto, entre cobrindo o sol de modo que eu posso ter os olhos abertos, vou desfilando pensamentos, alinhavando ideias e esboçando sonhos.
Um dia, qualquer dia ainda não vivido, eu vou receber a surpresa de ter a surpresa de viver um sonho sonhado, de ver tomado de vida uma ideia ou de sentir criar corpo um qualquer pensamento pensado num momento assim como este.
Deitado assim, me deixo levar num adormecer acordado de fim de tarde em direcção ao sul, que fica para um destes lados.


Sanzalando

23 de maio de 2010

neblina

Aproveito a névoa, sentado na praia, com os meus olhos eu construo um barco que um dia me vai levar para além dos meus sonhos e que me levará ao teu coração.
Aproveito a névoa para tentar apagar a ideia que só tu existes no meu pensamento e que toda a vida é apenas um cenário para compor este filme.
Deixo que a névoa me surpreenda com ideias e que me traga o brilho do teu olhar num qualquer pensamento transviado deste incêndio que tento apagar.
Aproveito a névoa para sonhar outros sonhos em que tu não sejas a princesa, rainha, personagem principal e única deste filme.
Aproveito a névoa para dar retoques no cenário... que um dia pode ser que eu tenha que fazer parte dessa realidade.


Sanzalando

Relato duma carta telefonada


Sanzalando

20 de maio de 2010

me olho

me olhei no interior para escutar alguma voz que me viesse da alma. Silêncio absoluto, quase igual àquele que congela tudo. Eu emudeci-me num desesperado silêncio de afonia mental. Me reinterno e vasculho célula a célula na procura da barragem de palavras. Para lá dela vai ter que ter uma albufeira de palavras que represadas estão sem som. Nada. Vais ver que de tanto ter-te contado todas as minhas vidas, fiquei sem corda vocal que vibre sem emoção, que trabalhe sem sentido definido das consoantes constantes dum cacimbo da vida.
me olho e desencontro-me. Não sei mesmo onde me vou procurar mais. Do lado de lá desencontrei-me num até hoje. Do lado de cá nunca me vi nem ouvi.
me olho e tenho a certeza que um dia eu vou conseguir ver-me de sorriso estampado na cara como se fosse um anuncio luminoso a dar cor na noite de trovoada.

Sanzalando

19 de maio de 2010

quantas vezes????

quantas vezes eu disse que ia continuar atrás daquele sonho? do especial!
e quantas vezes me encharquei nas lágrimas que me aprisionam a um presente que eu não quero ter? o real!
e as vezes que tentei sair da comodidade para me afundar na mediocridade de ser humano, racional e de memória selectiva? comodismo!
e quantas vezes eu precisei dum abraço amigo, protector do frio que sente quem caminha pelo lado errado da escolha e recebi um perto de mão? segurando-me apenas!
quantas vezes compus a canção que te tentei cantar e sem voz mais não disse que ais de dor? medos!
quantas vezes... naveguei-me em sonhos para os teus braços que se encontram fechados? realidade!

Sanzalando

13 de maio de 2010

tonteira

Levanto-me. Dou uns dois ou três passos e já não consigo mais. Tudo escurece à minha volta. Procuro com a mão a parede mais próxima e com aparente paciência espero que volte ao normal. Dizem-me que foi um tontura. Eu diria que foi uma tonteira, uma vez que foi uma tontura que aconteceu na cabeça inteira. Afinal de contas foram apenas uns 10 segundos. Eu tremi por 10 segundos da minha vida?! Os anos que gastei numa farra constante foram assim abalados em 10 segundos? Nã! é melhor nem pensar nisso. Esqueço os 10 segundos e recordo o futuro que tenho pela frente. Qual hipotensão ortostática, qual carapuça. Agora eu ia ter uma coisa dessas. Hipotensão ortostática... isso é para gente fina. Agora, em vez de levantar-me tenho que fazer um compasso de espera, sentar-me e depois então levantar-me. E se houver uma emergência? Calma lá fogo que eu agora não posso fugir... Vais ver tudo isto foi porque eu nasci cansado.
Espero sentado pela paixão ou sentado espero que a paixão passe.
Afinal de contas foram apenas 10 segundos que eu inventei para ver se tinha memória do tempo que se me escureceu a visão.


Sanzalando

12 de maio de 2010

por ali

Por detrás da porta da minha imaginação, guardado no silêncio da alma, esperando despido um sinal teu, existo numa vida que não é a minha.
Por vezes, quase morto de frio, gelado de esperas absurdas, me apatece vestir e rumar a outros rumos que numca planeei. Mas sempre volto ao santuário da tua imagem no meu coração, ao perfume que emanas e que eu decorei um dia para mais tarde esquecer e até hoje não o consegui, ao calor aquecido do teu corpo que não vi mais vezes porque os meus olhos teimam em serem assim.
Afinal de contas, há momentos que me fazem hesitar, se sigo a alma ou sigo o sangue. Um dia vou saber e voltar a ser feliz.

Sanzalando

8 de maio de 2010

Em jeito de balanço

Em Novembro de 2003 nasceu 'A MINHA SANZALA' no endereço http://sanzalando.blogspot.com. Por questões de semântica lhe chamei o meu blog e muitas vezes assim o vou tratando. Pensei várias vezes mudar-lhe o nome, mudei-lhe a estética por algumas vezes, mas a base literária se manteve, se é que se pode chamar literatura ao que aqui vou desenhando em palavras com a minha falta de jeito para o desenho.
Alturas há que parece estou farto dele, outras sinto a nostalgia dos primeiros tempos e raramente me arrependo de o ter começado.
Muitos elogios aqui fui recebendo, estímulos que dariam para escrever até ao fim dos meus dias se para isso tivesse vocação. Poucas, raríssimas mesmo, respondi aos comentários, mas podem ter a certeza que os li todos e em 99% quase me 'babei' como um adolescente que escreve cartas à namorada, se ainda houvesse cartas de amor.
Sei de gente que me segue deste o primeiro dia, outras gentes vão aparecendo ao longo do ano, outros desaparecendo porque outros caminhos se abriram, outros tempos gastos em outros lados, redes sociais que absorvem tempo sem que se dê por ele.
Já não me lembro se quando criei o meu blog eu pensava em algum objectivo se não o de dar largas à minha imaginação. Esse continua a ser a pedra fundamental deste espaço.
Não é um diário porque faz tempo que não lhe desenho palavras todos os dias, não é uma sucessão de relatos porque não conto nada com pés e cabeça, não é crónica política que disso eu sou alérgico, não é uma biografia porque me farto de inventar estórias, enredos, sequências, maldicências e outras essências que não vêm da Índia nem passam pela minha vida vivida, para além de que teria que haver da minha parte uma grande dose de honestidade para poder contar o que me parece é incontável.
Na verdade o que eu sei é que encontro aqui grandes doses de sentimentos verdadeiros disfarçadas em frases desconstruidas de emoção e descontraídas de erudição, destilações de amores e vapores de ódios e frustrações, resmas de paixões em datilografadas cartas de amor.
Perdi a caligrafia, ganhei a oralidade e contei uma estória, que pode ser minha, tua ou de quem a apanhar.
Enfim, se aqui tivesse sido contada uma estória, havia vários personagens principais e muito poucos secundários. Acho que deste último seria apenas eu.
Enfim, este meu blog é apenas o fruto dum gosto e sem mais categorias em catálogos.



Sanzalando

7 de maio de 2010

sem palavras

- Desculpa, não pensei que...
- Se não pensaste não fales...
Eu me perdi em qualquer esquina onde estavam os meus amigos e divaguei em conversas que nunca tivera tido. Eu me camuflei de neve, eu me disfarcei de floresta, eu imitei inundações, eu me perdi no tempo que não imaginei que tinha passado.
Eu tentei de tudo e ainda não encontrei as palavras.


Sanzalando

4 de maio de 2010

procurando-me

Dei voltas e mais voltas nas rotundas da vida que já vivi. Reli palavras que disse, frases que soletrei, parágrafos que calei.
Saltei fases, tentei alinhar épocas e juntei fragmentos soltos.
Na verdade não encontrei a ponta da meada. Nem a meada. Nem um molho de fios soltos emaranhados numa anárquica alquimia de vivências.
Concluí que eu não existo. Nem uma pegada minha encontrei.
Já sei. Deve ter sido o vento que apagou o rasto da minha existência, a chuva que lavou o meu odor, a noite que escureceu a minha passagem.
Não páro de me procurar porque eu sei que existo e por isso, mais cedo ou mais tarde, eu vou-me encontrar.

Sanzalando

2 de maio de 2010

Dia da mãe

Pedalava eu pelos caminhos dum despensar para esquecer que o mundo é mundo e outras coisas mais, quando me entrou no ouvido um sussurro a dizer que hoje é Dia da Mãe.
Eu sei, que antes de lhe levarem para um canto inesquecível da minha memória, eu lhe fiz doer a cabeça, lhe acinzentei muito cabelos que ela teimosamente pintava para não me assustar com o tempo que passa, lhe suguei lágrimas de dor de alma, lhe tirei sonos que mais que ela merecia. Todos os dias eram dia da Mãe. Porque quando não lhe fazia nada disto, eu lhe fazia rir de coisas sérias que eu não brincava, lhe alegrava o ego de ir mais além do que ela mesmo tinha imaginado, lhe provocava um babar de satisfação quando por portas e travessas alguém lhe era simpático e lhe me elogiava. Todos os dias eram Dia da Mãe.
Depois, cansada de coração fraco, torturada de não ser feliz nos últimos anos porque o chão que lhe segurava os pés não lhe pertencia, lhe levaram num dormir que não deu em acordar e lhe repousaram num canto inesquecivel da minha memória, onde lhe trago em cada instante.
Um dia, Mãe, eu te vou levar onde tu foste feliz! promessa do teu filho, que por agora vai pedalando pelos caminhos sem rumo, sem tempo, sem fim.

Sanzalando