Dou por mim a olhar as pessoas como se soubesse alguma coisa delas que nem elas mesmo sabiam. Assim como que lhes trespassava até à alma com o olhar de ver coisas que os olhos comuns nem conseguem fazer imaginar. E eu lhes via no interior bichos, sujos, peganhentos, coisas de outras vidas noutros planetas, fantasias minhas, dizia-me. Acho lhes conseguia ver a outra encadernação e não aquela que me mostravam. As cores não eras as reais de ver com olhar comum, não via ali brancos ou negros, apenas cores garridas de berrantes, riscadas de listas assimetricas num confuso circo de que apenas sobrava a tenda esfarrapada dum temporal doutro século mais antigo que a minha memória não tinha ainda registo.
O que elas não sabiam de si era-me assustador. Era terrível o dilema de lhes dizer ou não. Alguns corpos estavam enterrados fazia mais que muito tempo e eles próprios não sabiam. Ninguém me perdoaria se eu dissesse, desculpe, você não está aqui porque está sepultado há mais de um século. Ninguém me desculparia se soubesse que eu sei o que eles são e o que eram.
Dou por mim a olhar-me na escadaria da loucura, no afogamento da nostalgia e no enforcamento da memória.
Pé ante pé me afasto de mim. Desisto de olhar, apenas revejo as memórias, apontamentos soltos numa sebenta vermelha em que o U desenhado da capa mais não era que o U dum universo que eu não sei se existe, mas que me recordo, isso eu sei. Ultrapassado tempo do tempo não medido num relógio mecânico.
Sanzalando
Brilhante.:)
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