26 de outubro de 2025

Faz 49 anos que não a vejo. Se a visse hoje?


Talvez não a reconhecesse. Ou talvez a reconhecesse antes mesmo de terminar de lhe olhar. Um gesto da cabeça, o modo solto do cabelo, a pausa entre palavras ou outra coisa qualquer.

Há coisas que o tempo não apaga, apenas cobre com poeira fina, assim parece penugem de tempo.

Lembro dela na luz do fim da tarde, o sol a atravessar o quintalão que nos separava, o ar distraído da varanda onde nos víamos diariamente. Disse que voltava logo. Nunca mais voltou.

Durante anos, sonhei. Depois, aprendi a esquecer o tempo. Ou pensei que tinha aprendido.

Hoje, ao atravessar a rua, vi uma mulher de cabelos prateados, sentada no banco do passeio, a olhar os pombos. Senti o coração tropeçar numa pirueta seguida de estatelado e admiração conjunta..

E se fosse ela?

Não fui até lá.

Há encontros que só fazem sentido enquanto permanecem possíveis.


Sanzalando

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