recomeça o futuro sem esquecer o passado

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30 de novembro de 2009

Instantes (16)

Não sei em que instante me encontro mas na verdade tenho ganas de sair por aí a correr, correr contra o vento que trás a areia amarela e fina do deserto e que me pica as pernas nuas dos calções de caqui como se fossem afiadas agulhas dum qualquer vodoo. Tudo porque sei que nesse instante eu me ia esquecer do teu gelado modo de me tratar, a ortografia das palavras que não pronunciei iam ser esquecidas nas páginas do tempo e eu continuareia a ser o menino rebeldemente apaixonado na contra natura da classe. Nesse exacto instante eu não me iria preocupar com o que hoje estaria a dizer sobre ti, nem me iriam cair as lágrimas secas dum choro surdo que faz tempo choro na escuridão da solidão. Nesse instante, que eu não sei qual é, jámais me iria preocupar com os erros que posteriormente cometi, os sorrisos que fiquei por sorrir, a verdade que calei, os gostos que fingi não ter.

Nesse instante, ou noutro qualquer semelhante, eu não me lembraria de perguntar o que é feito de ti depois deste tanto tempo que durou o instante.


Sanzalando

28 de novembro de 2009

Instantes (15)

Pensando em ti peguei no carro e com a minha falta de experiencia o deixei ir abaixo uma ou duas vezes. Queria ir espairecer, esquecer-me de estar ali na varanda a ver se te via, porque isso não é vida. Depois de ter conseguido arrancar, de janela aberta, ouvindo o vento que soprava para dentro afoguei as palavras que ia me dizendo em surdina. Nessa altura, me lembro como se fosse hoje, fumava, conduzia e falava os meus discursos indirectos numa sintonia do rádio que dava a mesma música umas tantas vezes por dia porque estava na moda. Estacionei o carro na beira da praia e fiquei a admirar o azul celeste do céu em contraste com o azul mar do mar.

Parou o barulho do vento em turbilhão na janela e as minhas palavras eram audíveis pelo que me silenciei por estar farto de me ouvir lamentar dos amores que não me tinha e que eu apaixonadamente sofria. Era Sábado, Domingo ou Segunda, porque podia ser um dia qualquer, já que quem sofre de amor não escolhe nem a semana.

Ainda me parece ver reflectido no vidro a minha imagem de gente triste sem lágrimas, ouvir o choro que não se via e apanhar no chão as tristezas que soltava nos ais calados.

Peguei novamente no carro, abafei-me nos ventos laterais e segui sem rumo numa estrada que ainda percorro como se esse instante não fosse mais que a eternidade da paixão efémera.

Ainda hoje, quando olho nas estrelas eu vejo o céu azul celesta dessa adolescência glorificada.


Sanzalando

27 de novembro de 2009

Instantes (14)

Foi apenas mais um dos erros que eu cometi: calar-me sob o teu olhar quando te podia dizer as coisas todas que afinal nunca te cheguei a dizer. Foi um erro eu ter dado conta que não eras o que eu queria que fosses mas apenas eras o que eu queria para mim. Foi um erro dar-te todos os meus instantes nas oportunidades que não me deste em troca, para eu te demonstrar a minha verdade, o meu querer e a importância que eu queria ter em tua conta. Foi um erro eu querer dar-te abraços e muitas palavras de amor sem ser o teu igual mas o teu paralelo assimetrico que te via nas esquinas dos passeios com ganas de ser gente antes de tempo.

Foi um instante errado que me fez tremer de medo ou de frio. Ainda espero ter respostas para os instantes em que dei conta que pensava que podia ser feliz contigo.



Sanzalando

26 de novembro de 2009

Instantes (13)

De instante a instante o tempo passou. Voltaram os medos, as dúvidas e me fui esquecendo do som das suas palavras. Não me esqueci de ver o porte altivo como às vezes me olhava. Não era para me ver nem para perceber o que eu fazia ali. Era mesmo só para dizer que eu não devia estar ali. Nem era preciso dizer uma só palavra. Bastava ouvir o seu olhar.

E eu, sempre fixado na mesma ideia, sentia no ar uma promessa de encontro. Reenconro afinal, porque eu já tinha tido um olá. Eu sabia de cor e salteado todas as palavras que lhe ia dizer. Ia ser um regalo. Mas afinal foi apenas galo. Nunca houve esse encontro que eu pensava ia ser reencontro. Foi um instante que se evaporou por falta de tempo para ele acontecer.


Sanzalando

25 de novembro de 2009

Instantes (12)

É hoje, me disse eu para me encher de coragem. Ninguém imagina, ninguém espera, por isso hoje é um bom dia para eu lhe dizer tudo o que lhe sinto. Desde madrugada que eu decoro as palavras, o calor que lhes ponho, a entoação que lhes devo dar. Ensaiei tantas vezes que até de olhos fechados eu vejo o lugar, as testemunhas e o ar do sítio que eu escolhi. Bastar-me-á uns segundos para uma nova era da minha vida começar.

Basta um instante e a normalidade feliz voltará a mim.

Todo o caminho repeti vezes sem conta. Cheguei e talvez por ser feriado não havia ninguém. Era feriado e estava frio. Querem-me ver que hoje não abre a praia? Voltei para casa e me esqueci de mim porque mais uma vez eu tinha perdido por outras causas o meu instante.


Sanzalando

24 de novembro de 2009

Instantes (11)

Naquela noite fui ao cinema. Queria sair da rotina e como sempre impontual cheguei estava no intervalo. Mas foi no cinema que ela me tinha dito a primeira palavra. Um longo e eterno olá. Três letras que me marcaram como um discurso de horas doces. Como eu queria ser feliz, voltei ao mesmo lugar e tentei ali reouvir o olá como se ele tivesse ficado estático ali para eu lhe ouvir tantas vezes eu me tivesse vontade. Cheguei e ouvi o silêncio do ruído circundadnte e nem uma letra saída da voz que eu reconhecesse ser a dela. Devia de ser por eu ter chegado tarde ou ter escolhido erradamente o momento.

Foi um equívoco meu. Afinal de contas eu só queria ser feliz e reviver o momento e não tinha esse direito. Só podia ser castigo da minha impontualidade e de ter perdido o instante real.


Sanzalando

23 de novembro de 2009

Instantes (10)

Recordo-me daquele instante como se ele tivesse sido agora. Já o vivi tantas vezes de memória que basta clicar aqui num pay mental e ele se projecta que até parece um filme.

Naquela tarde em que chovia, como só chovia na minha terra, uma gota a cada 10 minutos ou coisa parecida e a gente ficava desolada com tamanha chuva, ela me olhou, sorriu e me disse olá. Era para mim porque ali só estava mesmo era só eu. Aceitei aquele olá como se ela o tivesse dito com todos os amores do mundo e sorri num engasgar de sons que tentavam dizer um olá de retribuição. Era de todo inesperado aquele momento que seria igual a tantos outros se não houvesse no ar o som estático dum olá que me foi dito.

Aquele lugar ficou marcado para sempre como o lugar do primeiro encontro. Pena mesmo é que a chuva não deixava ouvir uma música dum carro ou de outro lugar qualquer para eu dizer que a música tal era a nossa primeira música e ainda hoje eu lhe ia cantarolar.

Aquele instante ficou marcado. Era o primeiro encontro.

Aquele instante também ficaria marcado como o último.


Sanzalando

21 de novembro de 2009

Instantes (9)

Hoje me deu para ver uma manhã de praia, quando lhe ia de noncakus, tronco nú, mostranto meu corpo de Tarzan, após rigorosa dieta e esqueleto bem desenhado sobre a pele bronzeada. Quando lá cheguei, a vi esbelta no seu biquini, que tenho uma vaga ideia de ser um azul certeza, se é que essa côr existe. Olhando-a, deu para ver que ela antes de sair de casa pergunta ao espelho quem é a mais bela da cidade. A ideia não foi porque lhe achei mais bonita que nunca, isso já me havia passado com o tempo, foi apenas porque me recordei que as bruxas devem ter espelho em casa e eu agora tento lhe arranjar defeitos para mais rápido lhe esquecer.

Me sentei no ecran de cinema e fiquei ali a lhe olhar para ver que o nariz assim, o peito assado, as pernas eram pernas. Vulgarmente diria que fiquei ali a arrajar defeitos que não consegui ver.

Olhei-a de alto a baixo e raios me partam que perdi a vontade de sair daquele poiso onde tinha amplo campo de visão.

Ela foi dar um mergulho e naquele instante acabei por ficar sozinho a pensar-me.


Sanzalando

20 de novembro de 2009

Instantes (8)

Sempre me disseram que a aventura da vida era bonita e merecia a pena ser vivida. Só que nunca me disseram que às vezes doi. Doi quando sofremos desgraças mesmo que essas sejam a felicidade de outras. Na verdade ela não olhava para mim e via outros. Eu dorido odiáva-os silenciosamente nesses instantes.

Doi quando nos deixam no silêncio dos sentimentos vazios, recolocados num lugar secundário, na insignificancia da quase inexistência. Afinal de contas eu era tão transparente que ninguém me via.

Mas eu tinha de ter força para ultrapassar todas essas dores e esperar que um dia o dia ia sorrir para mim, eu ia ver o que eu sempre quis ver, eu ia sentir o que sempre desejei sentir. Mas um dia, assim num instante, mudei de ideias e as dores passaram a ser outras, os olhos passaram a ver doutra forma.

Enfim, doi por instantes ter instantes.


Sanzalando

19 de novembro de 2009

Instantes (7)

Era de manhã, uma manhã de cacimbo, daquelas manhãs em que apetece é ficar na cama e deixar o corpo ir embora no repouso, na falcidez da descontracção e se tiver tempo sonhar com coisa nenhuma de importância. Mas nessa manhã isso não pode acontecer e lá fui eu na rotina de aluno de liceu. Como sempre me cruzei com ela e lhe disse olá com todos os meus orgãos e ela mais uma vez ensurdeceu selectivamente para mim. Me disse para mim num grito gritado para dentro que acabou, me fui desse amor donde nunca devia ter entrado. Era tão tarde que a lágrima correu pela cara como naquele quadro replicado mais que as casas todas deste e doutro mundo. Doia dentro do corpo e fora dele uma dor surda como os ouvidos dela e cega como quem vê apenas com o coração e se esquece da razão.

O cacimbo mais se cerrou ao ponto de eu me ter escondido atrás dele num ninguém me vai ver sofrer de amor mais vez alguma na vida.

Como sempre, também esse instante passou.



Sanzalando

18 de novembro de 2009

Instantes (6)

Lembro-me que um dia acordei, sem me lembrar de ter dormido, com um deslumbrante sorriso na cara. Acho que me deitei com ele, ou sonhei e ele se me colou na cara. O amanhecer se me entrou no quarto e me fez erguer como nunca havia conhecido. Sai correndo. Me cruzei contigo e nem me parei para te admirar o que me admirou ainda mais. Corri sem parar até chegar ao liceu. Entrei nele como nunca tinha acontecido. Dei-me a pensar se quem estava ali no meu corpo era mesmo eu ou estava possuido. Era estranho e nem o sorriso se me descolava e o amanhecer não parava de acontecer. Deu para ver que no liceu estava mais gente. Afinal de contas o meu mundo não era só ela. Eu ri, eu gargalhei e eles outros muitos me olhavam com ar de espanto e me retribuiam sorrisos e abraços. O sol estava lindo como que a tirar todo o sobreado que podia restar na minha cara.

Ela chegou e me disse olá. Olá retribui e o instante se acabou ali.


Sanzalando

17 de novembro de 2009

Instantes (5)

Já não me lembro a que horas anoitecia porque era no tempo em que o tempo não me fazia falta. Mas era no tempo em que eu esperava sentado na cadeira de baloiço, que era do meu avô e estava na sua varanda, que tu chegasses e fosses à tua varanda receber o entardecer. Eu olhava-te sabendo que tu nem sabias que eu estava ali. Mesmo que virasses o teu olhar para mim tu não me vias, porque tu não querias ver pequeno. Eu odiava-me e acho que o fazia por ti. Mas todos os dias eu fazia o mesmo ritual porque sabia de cor o teu. Adivinhava-te.

Quantas vezes me entreguei à tua presença e tu nem notaste, nem reparaste.

E depois do anoitecer, recolhia-me e sonhava naquele instante em que altivamente respiraste o entardecer que te entrou na varanda.


Sanzalando

16 de novembro de 2009

Instantes (4)

Às vezes apetece viver rápido para não ter tempo para pensar. É um sentir frágil, assim tipo bolinha de sabão que voa num até rebentar. Tu fizeste-me ser essa bolinha de sabão porque cada vez que as minhas pernas tremulamente me levavam para ti, eu tinha uma fracção de segundo para ver o teu perfil e a eternidade para ver as tuas costas.

Ainda hoje penso porque é que elas teimavam em caminhar na tua direcção. Certo é que até as minhas pernas queriam ver as lágrimas choradas para dentro. Assim foi um dia, um mês, um tempo que me esqueci faz tempo. Mas a fragilidade de te olhar ficou, a instabilidade da bolinha de sabão, cá está.

Hoje, não me tremem as pernas, treme-me a voz quando te penso. Esse instante, quando acabará?


Sanzalando

14 de novembro de 2009

Instantes (3)

Ela gostava de ouvir as minhas estórias e eu contava-as todos os dias. Acrescentava todos os dias uma nova especiaria como querer dar um gosto especial. Tentava sempre ser o protagonista principal, mesmo quendo a estória só tinha passdo ao lado ou na imaginação. Eram as minhas estórias que ela ouvia. Eram estórias cadentes de sentimento, constelações de argumentos, nublosas de paixão. Cada palavra era composta por letras escolhidas com ternura para dar colorido ao enredo. Algumas vezes as estórias eram escritas numa sebenta de capa vermelha para mais tarde serem relidas, mas não tinham o mesmo sabor porque estavam arrefecidas de sentimento. Tinha sido esse o caminho que eu tinha escolhido para lhe conquistar o coração. Não queria espadas nem outras armas, violências apenas de carinho nas corres berrantes de cada letra pintada na minha voz sentida da estória contada.

Como qualquer instante, este também passou.


Sanzalando

13 de novembro de 2009

Instantes (2)

Sentia felicidade em pensar nela, imaginava o seu corpo sedoso ser percorrido pela minha mão, trentava trasportar-me para além do desejo, ultrapassar a fronteira da resistência do espirito e ter capacidade de lhe dizer tudo o que sentia por ela. Sentia-lhe o perfume, ouvia-a respirar e ainda não lhe via. Diziam-me era química. Todos os dias era química e todos dias viajava na imaginação a caminho da felicidade. Quantas e quantas vezes desejava ter ar para respirar, afogado que estava em tanta paixão. Platónica, claro. Tantas e tantas vezes a minha mente rebolava para instantes de loucura, actos imaginados de verdadeiro prazer.

Foram instantes que passaram na minha vida.


Sanzalando

12 de novembro de 2009

Instantes (1)

A vida mais não é que a soma de uns instantes de ternura, amor, desejo, paixão, felicidade, tristeza, dor, loucura, desespero e sofrimento. Estes instantes podem ser fugazes ou duradouros, estão na memória ou num qualquer baú do esquecimento. Fazem-nos parte mesmo que não estejam presentes neste instante.

Hoje dei-me a sonhar com as fotos dos meus 13 anos, da altura em que não imaginava o que eu queria ser quando fosse grande, interessava-me apenas em ser feliz naquele instante. E era-o. Se eu pidesse recuar no tempo tenho a certeza que não retocava em nenhum instante desse tempo.

Enfim, foi apenas mais um pequeno instante da minha vida.


Sanzalando

11 de novembro de 2009

tenho um coração

Tenho um coração que bate ao ritmo dum relógio, às vezes parece-me que bate acelerado, mais depressa que outras que bate lentamente como que a poupar-se. Mas ele bate no meu interior e na maior parte das vezes nem me lembro que ele está por lá, no meio dos meus medos e sentimentos, na amalgama das minhas dúvidas e emaranhados de certezas. Algumas vezes eu penso mesmo que ele está ausente em parte incerta, vagueando demente por esse mundo louco e deixa-me pensamentos que eu chamo de sonhos, labirintos de incertezas, lágrimas de muitas cores e causas. Outras vezes dá-me um deserto de palavras para eu compor um puzle que compreenda a minha existência, pese o valor dum amor impossivel, observe um sorriso inexistente.

Tenho um coração que me deixa enfrentar o futuro, que me atira para um mar desconhecido em que suspiro em cada braçada, que me eleva às nuvens num apara quedas irrecuperáveis, que me desperta melancolias e gemidos de saudade.

Tenho um coração que hoje faz anos, lentamente num ritmo acelerado.


Sanzalando

10 de novembro de 2009

49 - Estórias no Sofá - O Príncipe e a Princesa

Era uma vez um conto de fadas. Ao contrário, é claro. Um conto de pessoas imperfeitas e em que as acções não têm nem valentia e nem aparecem heróis lendários. Até o próprio lugar é um lugar comum, poluído pelos gases dos muitos carros que engarrafam todas as ruas da cidade. Cidade repleta de prédios, onde num por aqui ou por ali se encontra ainda um que tenha uma história do tamanho da memória. Não muito grande, é claro! Uma cidade cheia de obras, que não são de arte, embora muitos sejam os artistas que nela circulam.

Mas dizia eu que era uma vez um príncipe e uma princesa, sem reino próprio qualquer deles, que viviam felizes nessa cidade, ou pelo menos viviam tranquilos, transparecendo um mar de calma que era interrompido de quando em vez por banquetes faustosos ou viagens luxuriantes por estrangeiros fora de portas. Mas eram felizes estes príncipes amantes. Tudo lhes parecia perfeito e o futuro não lhes incomodava.

Mas na verdade, um dia, sempre há um dia nestas coisas da vida, a princesa desconseguia de ver o horizonte e agarrada à escuridão da vida se deixou levar pela letargia. Todas as noites gritava, sonhava que a morte lhe beijava os lábios e perdida de medo foi-se fechando cada vez mais, putrefacta em ansiedades irreais.

O príncipe, angustiado, lutou contra fantasmas e foi desferindo golpes carregados de irracionalidade e de indiferença. Mas toda a sua luta caia num vão sem fundo e a princesa cada vez falava menos enquanto construía um muro de incompreensões.

O reino inexistente, aos poucos, se foi consumindo e os meses passavam mortos num cinzento calendário enquanto a cidade se engalanava para grandes festas que em breve iam acontecer.

Um dia, ao acordar numa qualquer manhã, a princesa deu conta que nessa noite não tinha sonhado com a morte. Esboçou um sorriso, curto, rápido que ninguém teve tempo para dar conta. Aquela pessoa que havia sido um complemento perfeito da felicidade tinha para sempre desaparecido dando lugar a um ser vivo quase morto, vazio e carente de alma.

O príncipe tentando manter a mente sã rodeou-se de gordura e deixou-se perder na floresta de cimento, todos os santos e diabólicos dias e noites. Cada vez com mais frequência voltava ao seu palácio, madrugada alta, descalço, desorientado no andar e carregado de falsos pôr de sois que lhe queimavam os poucos pensamentos de outrora.

Na cidade passou a reinar o silêncio, o sorriso era pálido para não dizer incolor e já ninguém se lembrava do príncipe e princesa que embelezavam as festas faustosas e badaladas. Dela nem um rumor se ouvia. Dele, contavam-se estórias, quase sempre nocturnas, carregadas de vinhos e fumos de fazer rir, mulheres bonitas e paixões de faca e alguidar.

E a cidade crescia, para os lados e para cima numa similitude ao príncipe que se afundava no pântano da divida, traição, vingança, bruxaria, feitiçaria e onde mais iria parar se esta estória não acabasse aqui?



Sanzalando

9 de novembro de 2009

Novembro, mais um

Suspiro como se o oxigénio estivesse a acabar e me recolho no meu passado como se tivesse medo de olhar para amanhã. Me abraço, num apertado abraço, como se estivesse a segurar-me para não fugir, muito embora nunca me tivese prometido que ficava.

Se eu pudesse prometer estar eternamente a teu lado… mas nada é eterno e é possivel que o estarmos de mãos dadas num espaço não seja mais que um pequeno esquecimento, um vício de forma e que os maus momentos acabem por esconder todos os bons momentos que juntos tivemos.

Amanhã já é o futuro?

Como é que me sinto?

Pergunto-me coisas sem nexo, apenas para não me lastimar as horas que perdi sem brincar.

É um Novembro quente. Mais um.


Sanzalando

8 de novembro de 2009

Aniversário do BLOG

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2003, 8 de Novembro editei aqui o primeiro post.
Era um estilo diferente. Era temática diferente. Mal de mim se estivesse sempre na mesma linha. Arthemis veio dar uma preciosa colaboração, criando verdadeiros momentos de arte gráfica.
Agora, neste início de futuro só me resta descubrir se continuarei por aqui.
É por isso que ontem fui agraciado com mais uma deferência. Amanhã logo se verá.
Estará cacimbo ou um radiante dia de sol?
Este blog não sabe porque nunca sabe como é que vai ser o dia de amanhã.
Sanzalando

As Horas de Domingo (7)


Sanzalando

7 de novembro de 2009

BLOG INSTIGANTE

Nothingandall é um blog instigante


Nothingandall nomeou A Minha Sanzala como Blog Instigante.
Ao que sei a origem do selo de reconhecimento 'Blog Instigante' premeia os blogs que, além da assiduidade das postagens e do esmero com que são feitos, provoca-nos a necessidade de refletir, questionar, aprender e – sobretudo – que instigam almas e mentes à procura de conhecimento e sabedoria.

Quero agradecer esta nomeação.

Como é da norma "os blogs agraciados devem escolher cada um 7 blogs com as características acima descritas e deverão copiar a imagem do selo e o texto acima , adicionando-a aos espaço que convier", aí vão agora os sete blogs nomeados pel' A Minha Sanzala:



Sanzalando

6 de novembro de 2009

Hoje doi

Esta manhã, quando acordei, tentei, de olhos fechados saber de ti. Procurei, estendendo os braços, algo que dissesse que estavas ali ou que eu estava em ti. Por não te ter conseguido acariciar abri os olhos para te ver ainda em sono profundo. Apaixonadamente procurei-te como quem levita numa nuvem de paixão. Infelizmente, mais uma vez, não estavas ali nem eu estava em ti. Gargalhei num gargalhar nervoso, transpirei suor de ansiedade, iludi-me no perfume que imaginei cheirar. Tentei imaginar a causa desta paixão, rebusquei memórias, fui buscar todos os sonhos sonhados e por sonhar, revi imagens, retratos, pinturas e um cento de outras coisas. Desde o mais antigo ao meis recente artigo encontrado no aquivo da memória vejo apenas paixão e desconsigo encontrar a causa, dessei o porquê desta doença que me mina a saúde e me leva o sorriso até se afogar nas lágrimas de dor que não se sente. Só sei que deixo sempre a porta entreaberta na esperança que tu um dia por ela adentro entres.

Hoje doi, porque doi sempre a transição, o medo de não ter capacidade de sonhar mais sonhos, de mudar o rumo do futuro na incerteza do que pode vir a sê-lo, o fim do planeamento e o recomeçar de cada instante como se fosse o primeiro de sei lá o porquê. Hoje doi, porque não sei se sei contar um conto, uma estória, que me deixe docemente adormecer sem saber se cheguei à perfeição, ao ponto final do meu desejo. Hoje doi, porque não sei se te inventei ou se existes mesmo. Hoje doi, porque não sei se o sonho chegou ao fim ou não.


Sanzalando

5 de novembro de 2009

dourados sonhos sem côr

Me sentei na secretária com o olhar de ver para dentro.
Tem hora que é preciso a gente se espreitar, ver se tem algum ponto que não levou a tinta que costuma dourar o dia.
Hoje o dia não parece que quer ficar dourado e a janela entreaberta faz com que o assobio do vento ainda mais o empalideça. Me olho num rever de pontos cardinais e até parece que já não sei onde fica o norte, o sul, o este e o oeste, sendo que apenas me lembro é dos filmes de cóbois em que este assobiar do vento é acompanhado por um novelo de capim que percorre em velocidade uniformente acelerada a rua principal que por sinal é a única. O sol já não brilha quando ainda é hora dele estar replandescente, o silêncio da metade da tarde é interrompido por um precoce cair da noite.
Hoje não vou dourar o sonho apenas porque não lhe sonhei.

Sanzalando

3 de novembro de 2009

sonho que sonharei ainda

Vou a passo lento até a um qualquer café ou bar, onde me possa sentar à sombra, saborear mentalmente um cigarro, que assim não me faz mal nem me polui o ar à volta, ler umas páginas dum jornal recente ou antigo que as notícias faz tempo são iguais, beber uma ou outra cerveja gelada, degustando-a como se fosse a última e esperar que a barba se me cresça num grisalho aspecto vagabundo.

Já sei que me sentarei de perna cruzada, dispararei os olhos para além do alcance visual até conseguir ver as coisas que desejo num desejo quase pesadílico.

Já sei que quem me olhar vai ver o mar da tranquilidade reflectido na minha cara como que esboçado sorriso dum estar tudo bem para além dos sonhos.

De vez em quando regressarei ao meu físico poiso, olharei à volta e verei o temperado tempo que passou desde a última vez que me interessou ver o que me rodeava. Encontrarei os nobres, fidalgos de outras eras, os novos e velhos ricos, os pobres que o continuam sendo, as mulheres que tiveram os seu tempo e os homens que se esqueceram de ter tempo, as crianças barulhentas deixaram de brincar na rua que passou a ser imperturbável caminho para lado nenhum, o passeio leva ao passado gravado nas fotos trabalhadas dos novos retratos, os apaixonados seguirão as lágrimas como se fossem papagaios de papel, presos numa guita já não visível pelos meus cansados olhos.

Retomarei a leitura enquanto me projecto para os sonhos que sonhei num passado que não sei quando foi e tento adivinhar para onde me dirijo enquanto o perfume do outono me seca a pele, me entope as veias, me quebra o cabelo e me leva, como se fosse ao colo, para os cacimbos que o perfume da terra molhada teima acordar todos os dias.

Sanzalando

2 de novembro de 2009

como gostava de ter sido um sonhador

É de tarde duma tarde que avança rápido fazendo com que a minha intranquilidade se instale a uma velocidade inesperada. Com isto vou esquecendo pequenas coisas da minha estória, regresso à vida sabendo que há sonhos que ainda não sonhei, que a minha bela estampa se ofusca nas rugas do tempo. A cada tarde segue-se uma noite veloz, escura, que me apaga a silhueta antes esguia e me leva a sonhos pesados de esforço.

É o tempo que viaja sem se deter no presente e deixando-me o passado como um fardo pesado. Valem-me os sonhos que sonhei no tempo de ter tempo para os sonhar. O tempo não é magnânimo e não me dá alternativa ao túnel que atravessa a tarde até ao chegar da noite. Quando ele era lento eu não tinha medo dos sonhos que um dia o iam deixar de ser. Agora… muitos sê-lo-ão para sempre apenas sonhos. Antes, de chapéu sobre a farta cabeleira e cigarro no canto da boca eu sonhava nos períodos incertos nas certezas que ia tendo, agora, cabeça queimada do sol que os brancos cabelos já não têm força de proteger e respirar ofegante dum cansaço inato, mal consigo chegar ao zulmarinho onde possa estar de olhos postos no amanhã sorridente dum dia de outono pensado em cacimbo que se vai levantar não tarda.

Foi o tempo que passou, às vezes a passo lento, outras em veloz correria, umas vezes sem deixar marca, outras marcando-me com indeléveis riscos o corpo.

Bebo uma água mineral fresca, recordo a arrumação dos sonhos por capítulos, cruzo as pernas, enquanto olho com olhar tranquilo, para os casos das coisas que ainda me falta catalogar.

Como eu gostava de ter sido um sonhador.


Sanzalando