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31 de março de 2006
Uma estória verdadeira (83)
Temos que ir e vamos fazer mais como?
Sei que dei por mim a falar baixinho na frente da Kipola parecia estava a rezar. Sei que o meu silêncio se foi tornando um marco de cimento armado, carregando o meu semblante como se tivesse caído num sarcófago de vários andares e tivesse me esquecido de qual era a minha prateleira. Não sei quantos quilómetros andei assim. Eu estava de luto de mim. Aos poucos fui recuperando o fôlego, fui caminhando para a realidade e me encontrei estava perto do desvio que nos ia levar até à primeira paragem prevista que era o desvio da Lucira para almoçar. Mas foi engano porque ainda parámos no Bentiaba para fazer uma homenagem silenciosa a todos aqueles que antes do antigamente ali estavam fechados porque tiveram a ousadia de pensar. Foi coisa rápida que o tempo na auto-pista não pode ser de escuridão se não a gente não vê um calhau que lá está à nossa espera e corta a lateral. As coisas que eu aprendi nesta viagem. A lateral é mais importante que o rasto mesmo. Seguimos viagem na estrada tipo sandes, de asfalto e terra conforme os buracos eram muito ou poucos. No desvio eram horas de almoço. O reforço do café Avenida com umas birras e umas latas de atum foram o nosso repasto. Aí aparecem dois naturais dali mesmo que apontaram para cima da serra que era ali, e nos fizeram companhia na admiração da abertura fácil da lata de Atum. A catana já estava pronta para a abertura quando o Ti lhes explicou que era só puxar a argola e já estava. Foi gargalhada que começou neles. Mais uns dedos de conversa, uns saberes de outros tempos, umas vidas vividas debaixo de fogo assim mais ou menos que disseram ali não ouviram muita coisa só mesmo alguma pouca. Como se poderá quantificar? Fiquei sem saber e também se diga que não interessado, é passado para ser enterrado.
Retomemos a aventura de fazer a serra, as subidas e descidas sobre calhau, pedra pontiaguda, precipício, andar de lado como se o Tico fosse um barco à vela. Co-pilota estava perita. Vais ver se conduz melhor assim nesta estrada que noutra bem feita. Vimos uns primatas grandes lá no meio das mini árvores mas os sacristas não se deixaram fotografar para a posteridade, ou será que o cachet era alto. Foi mesmo foto assim de raspão.
Sanzalando em AngolaSei que dei por mim a falar baixinho na frente da Kipola parecia estava a rezar. Sei que o meu silêncio se foi tornando um marco de cimento armado, carregando o meu semblante como se tivesse caído num sarcófago de vários andares e tivesse me esquecido de qual era a minha prateleira. Não sei quantos quilómetros andei assim. Eu estava de luto de mim. Aos poucos fui recuperando o fôlego, fui caminhando para a realidade e me encontrei estava perto do desvio que nos ia levar até à primeira paragem prevista que era o desvio da Lucira para almoçar. Mas foi engano porque ainda parámos no Bentiaba para fazer uma homenagem silenciosa a todos aqueles que antes do antigamente ali estavam fechados porque tiveram a ousadia de pensar. Foi coisa rápida que o tempo na auto-pista não pode ser de escuridão se não a gente não vê um calhau que lá está à nossa espera e corta a lateral. As coisas que eu aprendi nesta viagem. A lateral é mais importante que o rasto mesmo. Seguimos viagem na estrada tipo sandes, de asfalto e terra conforme os buracos eram muito ou poucos. No desvio eram horas de almoço. O reforço do café Avenida com umas birras e umas latas de atum foram o nosso repasto. Aí aparecem dois naturais dali mesmo que apontaram para cima da serra que era ali, e nos fizeram companhia na admiração da abertura fácil da lata de Atum. A catana já estava pronta para a abertura quando o Ti lhes explicou que era só puxar a argola e já estava. Foi gargalhada que começou neles. Mais uns dedos de conversa, uns saberes de outros tempos, umas vidas vividas debaixo de fogo assim mais ou menos que disseram ali não ouviram muita coisa só mesmo alguma pouca. Como se poderá quantificar? Fiquei sem saber e também se diga que não interessado, é passado para ser enterrado.
Retomemos a aventura de fazer a serra, as subidas e descidas sobre calhau, pedra pontiaguda, precipício, andar de lado como se o Tico fosse um barco à vela. Co-pilota estava perita. Vais ver se conduz melhor assim nesta estrada que noutra bem feita. Vimos uns primatas grandes lá no meio das mini árvores mas os sacristas não se deixaram fotografar para a posteridade, ou será que o cachet era alto. Foi mesmo foto assim de raspão.
Carlos Carranca
30 de março de 2006
Uma estória verdadeira (82)
A cada metro da saída da cidade um baque eu ia sentindo. Estava que parecia ia entrar em convulsão. Eu só pedia no silêncio do meu pensamento que o Tico andasse mais depressa não fosse dar-me uma coisa na tola e segurar uma palmeira, um pé de Buganvília, um candeeiro da Avenida, e começar a gritar eu daqui não saio e ninguém me tira. Cada metro me custava a deixar
para trás. As oliveiras das hortas, o leito seco do rio, a linha paralela do caminho de ferro, tudo parecia estava a atirar-me os seus braços e segurar-me. Mas eu tenho de ser forte e sair para voltar. Como posso eu voltar se não sair?
Mas sabes, falta-me ver tanta coisa. Falta-me decorar cada fachada de casa, cada lancil onde me sentei, cada lage de passeio que eu já tinha pisado. Ainda me falta tocar em tanta coisa. Apetece-me entrar no Liceu. Invadir o Colégio das Madres, entrar na Igreja. Apetece-me agora que eu estou a ficar na distância do atrás, fazer coisas que na altura eu não tive no pensamento.
Não me grites que temos de voltar em Luanda para tratar de coisas que ainda ficaram para tratar. Eu sei e não é preciso estares sempre a repetir. Eu sei que nem abres a boca, mas a verdade é que os meus ouvidos te estão a ouvir. Eu sei que me apetece mandar vir contigo. É um escape, uma manobra de descompressão. Mas bolas eu vou só ali e já volto. Espero que este ali não seja cerca de trinta anos.
A rua dos Pescadores, a Rua das Hortas, a Rua da Fábrica essas continua a ter os mesmos nomes, continuam a ter os mesmos números nas portas. As outras ruas eu não sei e nem nunca soube o nome. Eu quero é saber outras coisas. Tas a ver? Temos que voltar para trás porque eu tenho de ver mais coisas. Eu tenho que decorar porque sabes que eu não uso caderninho para rascunho ou apontamentos. Tudo fica só gravado na minha tola e como é que eu vou ter a certeza que não estou a esquecer nada se não fizer uma revisão? Vamos voltar para trás e rever tudo direitinho? Já sei que este diálogo só se passou entre mim e eu. Co-pilota e Ti nem me ouviram e nem adivinharam o que ia na minha cabeça. O meu corpo estava a ir com eles e eu, o meu pensamento, a minha alma estava sentado na Pastelaria Oásis.
Sanzalando em AngolaMas sabes, falta-me ver tanta coisa. Falta-me decorar cada fachada de casa, cada lancil onde me sentei, cada lage de passeio que eu já tinha pisado. Ainda me falta tocar em tanta coisa. Apetece-me entrar no Liceu. Invadir o Colégio das Madres, entrar na Igreja. Apetece-me agora que eu estou a ficar na distância do atrás, fazer coisas que na altura eu não tive no pensamento.
Não me grites que temos de voltar em Luanda para tratar de coisas que ainda ficaram para tratar. Eu sei e não é preciso estares sempre a repetir. Eu sei que nem abres a boca, mas a verdade é que os meus ouvidos te estão a ouvir. Eu sei que me apetece mandar vir contigo. É um escape, uma manobra de descompressão. Mas bolas eu vou só ali e já volto. Espero que este ali não seja cerca de trinta anos.
A rua dos Pescadores, a Rua das Hortas, a Rua da Fábrica essas continua a ter os mesmos nomes, continuam a ter os mesmos números nas portas. As outras ruas eu não sei e nem nunca soube o nome. Eu quero é saber outras coisas. Tas a ver? Temos que voltar para trás porque eu tenho de ver mais coisas. Eu tenho que decorar porque sabes que eu não uso caderninho para rascunho ou apontamentos. Tudo fica só gravado na minha tola e como é que eu vou ter a certeza que não estou a esquecer nada se não fizer uma revisão? Vamos voltar para trás e rever tudo direitinho? Já sei que este diálogo só se passou entre mim e eu. Co-pilota e Ti nem me ouviram e nem adivinharam o que ia na minha cabeça. O meu corpo estava a ir com eles e eu, o meu pensamento, a minha alma estava sentado na Pastelaria Oásis.
Carlos Carranca
29 de março de 2006
Uma estória verdadeira (81)
Mas o que tem de ser tem muita força. O sair ficou marcado para as sete horas porque é a hora que abre o café Avenida e a gente vai lá mesmo tomar o matabicho, depois de ir no Xonera comprar gelo para encher a caixa dos caranguejos que a gente vai levar até à capital.
No deitar senti uma dor que me apertava. Sentia o chão a fugir-me debaixo dos pés. Tas a ver, né? Custa ter que partir outra vez. Mas voltarei. Com este pensamento adormeci e rapidamente se passou a noite. Estas noites têm sido tão curtas, todas que se fosse no outro lugar eu estaria assim já como que a rastejar por falta de forças, mas aqui estou forte e vigoroso. Na hora marcada os despertadores tocaram e foi um aviar. Havia que arrumas as bicuatas e carregar o Tico bem carregadinho para nada se perder pelo caminho. Não nos esquecendo que a gente ia voltar pela auto-pista da Lucira. Passámos ainda pela que foi a minha casa e que agora é, nos meus olhos, a casa mais bonita e bem cuidada da cidade do Namibe. Um adeus e até breve, que ela merece.Lá fomos nós até quase que na subida da SOS buscar o gelo. Está aberto 24 horas em cada dia da semana. Tudo bem acondicionado para os ditos bichos não secarem nem ficarem assim com cheiro que depois a gente nem os podia ver, quanto mais comer. Dali directos ao café Avenida matabichar e comprar uns bolos para a viagem, uns pães com chouriço. Tas a ver, coisas práticas para comer assim sem parar. Mas depois nos lembrámos que tínhamos que voltar na área de Serviço da Laurinda para dar o último abraço desta viagem ao Lan. Foi o que fizemos e depois, já passava das oito da manhã quando descolamos o nosso Tico em direcção ao Rio Bero e depois da Kipola virar na direita e seguir até ao Giraul e depois aí apanhar a estrada que nos havia de levar até à Lucira. Que é como quem diz, ao desvio que desvia para a Lucira que a gente vai seguir mesmo em direcção ao Dombe Grande que fica já ali depois daquelas pedras todas
No deitar senti uma dor que me apertava. Sentia o chão a fugir-me debaixo dos pés. Tas a ver, né? Custa ter que partir outra vez. Mas voltarei. Com este pensamento adormeci e rapidamente se passou a noite. Estas noites têm sido tão curtas, todas que se fosse no outro lugar eu estaria assim já como que a rastejar por falta de forças, mas aqui estou forte e vigoroso. Na hora marcada os despertadores tocaram e foi um aviar. Havia que arrumas as bicuatas e carregar o Tico bem carregadinho para nada se perder pelo caminho. Não nos esquecendo que a gente ia voltar pela auto-pista da Lucira. Passámos ainda pela que foi a minha casa e que agora é, nos meus olhos, a casa mais bonita e bem cuidada da cidade do Namibe. Um adeus e até breve, que ela merece.Lá fomos nós até quase que na subida da SOS buscar o gelo. Está aberto 24 horas em cada dia da semana. Tudo bem acondicionado para os ditos bichos não secarem nem ficarem assim com cheiro que depois a gente nem os podia ver, quanto mais comer. Dali directos ao café Avenida matabichar e comprar uns bolos para a viagem, uns pães com chouriço. Tas a ver, coisas práticas para comer assim sem parar. Mas depois nos lembrámos que tínhamos que voltar na área de Serviço da Laurinda para dar o último abraço desta viagem ao Lan. Foi o que fizemos e depois, já passava das oito da manhã quando descolamos o nosso Tico em direcção ao Rio Bero e depois da Kipola virar na direita e seguir até ao Giraul e depois aí apanhar a estrada que nos havia de levar até à Lucira. Que é como quem diz, ao desvio que desvia para a Lucira que a gente vai seguir mesmo em direcção ao Dombe Grande que fica já ali depois daquelas pedras todas
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
28 de março de 2006
Uma estória verdadeira (80)
Acho mesmo que só faltou uma. A rua que passa entre os Correios e os Caminhos de Ferro. Todas as outras foram passadas a olho fino. Aqui era isto, ali aquilo, aqui morava cicrano e ali beltrana. Corri a cidade com todos os olhos, ao mesmo tempo que sentia um medo enorme. Mas sinto medo mesmo de que? De não a voltar a ver? Mas se eu sai daqui foi mesmo só o corpo, porque a mente essa não desbou daqui nem um segundo. A cidade estava mais igual à cidade da minha memória. Ruínas quase nenhumas, reconstruções mais que muitas. E me disseram depois que não há mais porque há falta de cimento. Mas também ouvi dizer que é por pouco tempo. Se eu ouvi é porque vai ser. Tudo mexe e isso é importante. O trânsito de Luanda tem muito que aprender com o trânsito daqui. Penso eu, que não sou especialista. Também numa cidade desenhada com régua e esquadro e sem compasso, não é difícil dizer que se esta sobe, aquela desce e assim sucessivamente. Olha, aqui foi o primeiro trabalho sério que tive. Porque o primeiro mesmo era na câmara escura da casa de fotografias que o Bauleth abriu por trás da DTA. Estava a falar do Rádio Club. Hoje mora lá gente que o rádio agora é mais em baixo, quase a chegar ao Impala que ali está igual, a Sanzala dos vBrancos tá na igualmente igual ao que era. Cores e tudo. O Bairro da Mineira, por trás do colégio das madres idem aspas e tudo. No Impala só falta mesmo os cartazes a dizer que filme é que eu vou ver hoje à noite, sentado num daqueles bilhetes que estão sempre marcados nas três primeiras cadeiras da terceira fila, a contar de cá de cima. Como era divinal ir ao cinema com ela. Mas agora é de tarde e não há filme. Nem logo à noite vai haver filme. Se houvesse, te juro, que ia comprar os referidos ditos cujo bilhetes. Hoje parece que só abre para festas. Passámos e rodopiámos no Bairro Heróis do Mucaba, Bairro da Facada, subimos a rua dos Pescadores até à Casa de Saúde, virámos em direcção à casa do Lara e dali seguimos até à escola 56. Com este passeio, este meu mostrar-me a cidade, chegou a hora combinada para o jantar que era na casa do Zeca e da Té. Vamos aviar os que vimos acabadinhos de chegar, que os outros foram embalados para o Huambo. Nos esperavam à porta. Foi sentar e começar as marteladas e saboreamentos. Foi mesmo até que a mente ainda saliva. Um gosto. Muita conversa depois chegou a hora de ir para o Hotel. Amanhã é dia de iniciar o regresso à Capital. Porque é que eu tenho de partir. Vão vocês e me deixem aqui de onde eu nunca saí. Olha, eu monto uma Cubata lá na Lagoa do Arco e fico ali mesmo a pensar nos problemas do mundo. Pode ser? Não digas que não. Eu não quero mesmo sair daqui. Olha que faço birra como quando era criança.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
27 de março de 2006
Um abraço meu amigo
Uma estória verdadeira (79)
Essa praia mesmo devia ser chamada das Rochas porque o que ela sempre teve muito era ondas grandes e muita pedra e não está nada diferente. Aproveitamos para brincar e ver desde caranguejos até espinhos do mar, peixes e outras lapas nas pequenas piscinas que eram do nosso contentamento quando a gente não tinha ainda idade para pensar. Parecia mesmo ainda tinha voltado nessa idade. Depois o Lan disse que a gente tinha de ir mais a norte. Eu pensava que o meu mundo tinha acabo ali pois eu não conhecia mais nada para o lado norte dali. Andámos por altos e baixos, aos esses desviando de pedras e rochas que até que parámos. Outra maravilha do Arquitecto. Outro recanto do mundo que eu nunca tinha tido o privilégio de conhecer. A foz do rio Giraul visto daqui de cima. Uma enorme lagoa que terminava a dez metros do mar. Quando o rio enche vai no mar. Mas agora ele fica preso em terra, alimentando um vale que merece a pena ser visto. O Arquitecto não dorme em serviço. Entre o mar e a lagoa se vê uma praia que é uma outra maravilha. Infelizmente a gente está uns 30 metros em cima de uma escarpa que não sendo alpinista não dá para descer e depois subir, mas que até apetece dar um mergulho desde aqui de cima isso dá. Mas como é que a gente desconhecia esta coisa? Vais ver era só eu que não conhecia. Mas também a minha kota não ia por o mini dela a andar nestas estradas. Além de que a carta de condução dela acho que dizia que só podia conduzir de casa para a Estação do Caminho de Ferro e vice versa. Lá ao longe se vêem as duas pontes do rio Giraul, a dos comboios e as carros que vão no caminho do Lubango. Fiquei embevecido. Como o Lan tinha que ir bulir que ele não está de férias que nem a gente, pelo que a gente voltou na cidade do deserto e do mar. Que é que vamos fazer agora? No regresso passámos por outro quartel militar com aqueles supositórios mais grandes que um camião a apontar, penso, já coisa nenhuma. Passámos ao largo mas deu para ver que havia jogo de bola para lá dos arames que o delimitam. Perguntei eu como que alguma resposta surgisse dum lado nenhum. Deixamos o Lan no sítio que ele pediu. Fomos na Praia Amélia cumprimentar Zeca que ainda não lhe tinha visto por manifesta falta de tempo de ambos os lados, na concomitância que ele tinha que bulir e eu de decorar cada pedra, cada caminho, cada rua, cada casa, cada rosto. É verdade que eu não estava aqui para ver rostos. Sabia que X e Y e mais uns Z estavam bem. Eu estava aqui para ver a minha História, para ver as marcas marcadas no tempo que eu vivi. Chegados na Praia Amélia encontrámos Zeca a descarregar o barco que tinha acabado de chegar carregado daquelas coisas que chamam caranguejos e que tinham um aspecto de quem ainda estava vivo. Abraços grandes na hora. Recuar anos e vivê-los na memória. Visitámos a fabrica e logo combinámos que o jantar estava já marcado. Dali fomos para a Praia Azul. Desta vez eu ia que mais que preparado para mergulhar no início do zulmarinho que me estava a chamar e eu ainda não lhe tinha feito a vontade. Dei mergulhos. Mas desta vez, perdido que estava o fulgor de outros anos, estes eram mais assim perto da areia que as ondas, por serem maiores que arranha céus da cidade me assustaram que eu não consegui destravar as minhas pernas para andar mais uns passos à frente e ficar onde os meus olhos queriam e o meu corpo se recusava. Co-pilota e Ti não se aventuraram. Eu comigo mesmo também fiquei na retranca e foi como disse. O corpo se recusou a ir onde queriam ir os olhos. Mas saboreei quanto pude o salgado mar da praia Azul. Pic-Nic na praia e ali ficámos a saborear um sol que estava tímido mas era o meu sol. Ao começo do fim da tarde voltámos no hotel. Banho de dessalinização tomado e agora, ainda dia vamos percorrer todas as ruas da cidade.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
26 de março de 2006
Hoje foi Domingo
Hoje foi dia de cortar á faca. Escrito assim alguém vai logo pensar que houve maka aí num sítio qualquer. Mas a verdade é que não. Hoje não posso ver o zulmarinho, não posso sentar na areia que ele vem acariciar com a suavidade das suas ondas. Hoje foi dia de bulir e sentir na virtualidade o perfume da maresia, misturado com o hálito de um febril, sentir o massajar do rebentar de ondas numa mistura de encontrar com a ponta dos dedos uma massa abdominal. Mas sempre tem de haver uma pausa. Um relaxar recuperador. Uma conversa Sunguilar, um prazer de ver que o PI não é 3,14, ou será que é? - que a régua e o esquadro servem para mais do que rabiscar uns traços, que a areia do deserto precisa de ser ornamentada com uma flôr, que o Teorema de Pitágoras nada tinha a haver com a bruma, que a Fénix não era mais que uma figura da mitologia, qua a Atlantida não tem a haver com a fábrica de cristais, que uns scones só se comem no Inverno e outras coisas mais.Como eu gosto de estar sentado a ver o Zulmarinho embalar os meus sonhos. Como eu gosto de olhar para trás e gostar do que vejo.
Como eu gosto de gostar.
Se acabou o Domingo mais curto do ano!
Sanzalando em AngolaCarlos Carranca
25 de março de 2006
Mais um sábado
Chegou o meu dia preferido. Mas já está acabar e este ainda por cima vai ter menos uma hora que ou outros. Estou infeliz por isso.
Assim, pouquinho, escrevi num sábado!
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
Assim, pouquinho, escrevi num sábado!
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
24 de março de 2006
Uma estória verdadeira (78)
Nova manhã e descobrimos o Café Avenida. Novo no sítio do velho. Metade é café outra metade é restaurante. Assim a gente tenha tempo e vem aqui dar umas garfadas em qualquer coisa. Hoje ficamos só pelo matabicho que é um café e um pastel de nata. Bom por sinal. Gostei do sítio. Ficou feita a promessa. Se combinou com o Lan que a gente hoje ia visitar as praias da costa norte. Se a gente não sabia de geografia estava feito. Ponto de encontro na área de Serviço da Laurinda que fica ao lado da antiga escola de condução que agora é a sede local da Sonangol. Mais um café que é para estar bem acordado, mesmo que não precise. Antes de irmos para norte a gente vai até à ponta do Noronha. Faz muito tempo que eu não vinha nem aqui. No tempo em que não pensanete a gente ia ver o par de namorados que escolhia estes sítios para conversar, penso eu. Outras idades, outros tempos. Vimos a cidade como quem vê quando vem do mar. Como ela cresceu para dentro do deserto. O antigo aeroporto está mesmo quase rodeado de casario. Cidade linda que é esta. Palácio e Igreja de Santo Adrião ali estão imponentes marcando o olhar. Bem depois arrancámos que não temos todo o tempo do mundo. Aí vamos nós a caminho da Aguada. Passámos no Mamede dos Caranguejos das Hortas, passámos no Rio Bero que continua vazio que é sinal que anda a chover pouco lá nas terras altas, na Quipola que continua no mesmo sítio e no mesmo estádio de conservação. Hoje não há procissão pelo que não tem paragem, fizemos o S grande que é para passar sobre a linha do caminho de ferro que antes corria do lado esquerdo da estrada e depois passa para o lado direito, e seguimos rumo ao Saco. Parámos no porto mineiro, depois de termos avistado uma fábrica de iodização do sal. No porto mineiro vimos toda aquela maquinaria parada e cor de ferrugem, quase a mesma cor que tinha antes de terem parado a exploração de Mavinga. Também chamarem Companhia Mineira do Lobito e estar tudo entre o Lubango e Namibe não fica bem, né? Eu ia jurar que tinha visto fotos de há cerca de um ano com aqueles espaços ainda com minério que tinha ficado ali assim como que esquecido. Agora não resta nem nada mais que o pó. Do porto propriamente dito está a funcionar a parte de combustíveis que é logo no primeiro terço daquela ponte qie é o porto. O resto está parado. Me disseram estão a pensar reabrir tudo. Nova vida está à espera daquela gente. Subimos a falésia e seguimos rumo até na Praia das Conchas.
Carlos Carranca
23 de março de 2006
Uma estória verdadeira (77)
Porque é que só agora eu vou descobrindo estas coisas nas minhas duas terras? Aqui só pode ter mau olhado. Eu vi mal ou andava mesmo cego. Vais ver esses matumbos que viveram ao lado da minha vida, também não sabem disto. Serão poucos os que sabem, porque se muitos soubessem eu quase de certeza seria um deles. Já sei que nessa altura os meus olhos e o meu pensamento estavam virados para outra coisa que eu pensava ser mais digna de um adolescente. Será que tou a virar cota e a ligar a coisas assim? Hum, não me cheira que seja assim. Andavam era a esconder estas coisas para a gente não solidificar algumas coisas na cabeça. Penso eu, que dessas coisas pouco sei. Já conheci mais maravilhas do Arquitecto nestes dias que numa vida que passou.
Depois dali e de ter desistido de ir no Tombua , virámos e fomos andar no deserto. Ver o pôr-do-sol no deserto com a esperança de ver alguma gazela. Mas acho era dia de folga delas e por isso nem uma só a gente viu. Como já estava escuro a gente ao longe vu mais alguém que estava a passear no deserto. Depois a gente viu-se a placa a dizer Virei e aí a gente virou para trás. Nos esperava um banho quentinho que a gente já merecia de tanta emoção que até fez transpirar a alma. Voltámos no nosso Hotel e nos lavámos. Hoje era dia da gente ir jantar os três. Fomos comer, para não variar, no mesmo sítio, um peixinho mais fresco e saboroso que até apetecia repetir, mas isso foi logo ali repensado que era impossível pelo excesso de peso que a gente podia acusar no Tico quando a gente voltasse para trás na auto pista da Lucira. Fizemos questão e Lan fez-nos companhia para jantar e depois para mais uns quantos dedos de conversa no Murianga Bar.
Foi assim que a gente terminou o dia 2 na terra que me viu cair das pernas a primeira vez e onde eu bebi o primeiro gole de água.
Depois dali e de ter desistido de ir no Tombua , virámos e fomos andar no deserto. Ver o pôr-do-sol no deserto com a esperança de ver alguma gazela. Mas acho era dia de folga delas e por isso nem uma só a gente viu. Como já estava escuro a gente ao longe vu mais alguém que estava a passear no deserto. Depois a gente viu-se a placa a dizer Virei e aí a gente virou para trás. Nos esperava um banho quentinho que a gente já merecia de tanta emoção que até fez transpirar a alma. Voltámos no nosso Hotel e nos lavámos. Hoje era dia da gente ir jantar os três. Fomos comer, para não variar, no mesmo sítio, um peixinho mais fresco e saboroso que até apetecia repetir, mas isso foi logo ali repensado que era impossível pelo excesso de peso que a gente podia acusar no Tico quando a gente voltasse para trás na auto pista da Lucira. Fizemos questão e Lan fez-nos companhia para jantar e depois para mais uns quantos dedos de conversa no Murianga Bar.
Foi assim que a gente terminou o dia 2 na terra que me viu cair das pernas a primeira vez e onde eu bebi o primeiro gole de água.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
22 de março de 2006
Uma estória verdadeira (76)
Depois, espírito lavado, seguimos em frente e parámos naquela árvore que ali está faz anos e que se esqueceu de crescer. Também quem foi que foi plantar uma árvore ali? A árvore dos desejos. Silenciosamente eu fiz o meu. Depois optamos que não íamos ao Tombua. Vais lá fazer o quê? Ver, disse eu com voz de quem não estava também muito virado. Então no rio flamingo se virou em direcção ao mar para ir ver Welvitchias. A gente foi mas aí o Tico pregou partida na gente. Não entrou com a tracção nas quatro rodas e se ficou atolado que até parecia areia movediça. Tira ar nos pneus. Se empurra e nada. Engrena. Desengrena. Co-pilota vai no guiador e os três marmanjos fazem força na substituição do reforço. Lá saiu ele dali e nós com quilos de areia em cima que é bom e deve fazer bem à pele. Digo eu que não sei. Vimos e fotografámos as referidas dita cuja planta que dizem que só há naquele deserto, mas que me garantem tem também na Namíbia. Não sei nem vou discutir. Mas que é a planta do meu deserto aí ninguém vai discutir comigo que eu não deixo. Voltámos à estrada e descemos mais um pouco para sul até que virámos à esquerda e vamos no Arco. Pensei vamos ver mais Welvitchia. Mas que nada. Andámos aos zigue-zagues, falésia à direita e falésia à esquerda e nós a nos afastar da estrada do asfalto. Bem, vimos uma cubatas de barro e capim e a bandeira do meu partido ali, no meio de nenhures. Depois de mais uns metros andados encontrámos uma floresta. No meio do deserto pode ter assim uma floresta? Pode sim, tanto que está aí na tua frente. Encontramos uma cambas que estavam a pic-nicar. Eu estava assim com a boca bem aberta de espanto. Como pode estar aqui esta maravilha e eu aqui tão perto e não sabia dela? Vais ver foi feita pela dipanda, me disse um dos pic-niqueiros. Rimos a bom rir e depois a boca não dava para abrir mais. Tem um lago de agia doce que até a vista não alcança. Pode haver assim tanta água num deserto e ele não lhe bebe toda? Como é? Não tas a acreditar nos teus olhos? Minha cabeça começou logo ali a fazer um filme. Não vos conto porque depois vocês iam copiar e lá se ia o meu Óscar das Américas. Escalámos, percorremos uma infinitésima parte da lagoa. Fotografias muitas. Eu não podia perder a oportunidade de fixar o paraíso do deserto. Por mim montava ali a minha cubata e ali ficava em contemplação por um período indefinido de tempo. Só mesmo o tempo necessário para pôr o equilíbrio entre mim e eu numa horizontalidade que nem balança do antigamente, daquelas em que se tinha que ir pondo pesos até que os dois patos estivessem com o bico mesmo frente a frente. Mas me dizem que não pode ser. Mas tem ali cavernas que davam suites que eu nem te conto para não ficares a salivar de inveja. Como é que é possível que eu nunca tenha ouvido falar deste canto paradisíaco aqui ao lado da terra que me viu cair das minhas pernas pela primeira vez?
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
21 de março de 2006
Carta a meu pai
Só tenho 4 anos e tu partiste para uma viagem que não tem retorno. Lembro de 2 ou 3 coisas que se passaram entre ti e mim. Não me lembro de mais nada. Lembro-me de uma birra que fiz numa noite que querias ir ao cinema com a mãe e eu fiquei com a Maria, empregada de alguns anos lá de casa, mas agarrado a um bidon dos Caminhos de Ferro, berrei tanto que vos foram chamar ao cinema. Será que quem fez a birra fui eu ou foi a mana? Lembro-me que um de nós foi. Lembro-me de tu me ires chamar á cubata da Titia, nunca soube o nome dela pois foi sempre assim que a chamavamos, pois o que eu gostava mesmo de comer era o pirão que ela fazia, e tu chamavas para ir almoçar. Lembro-me ainda da tua NSU vermelha. Não me lembro mais nada. Depois, muito depois, boca aqui, boca ali, vim a saber coisas de ti - tirando o facto de seres 'doente' do Benfica até que parece que eras mesmo porreiro. Que pena eu não ter tido tempo de ter aprendido e vivido coisas contigo. Aprendi-as indirectamente e agradeço por teres deixado tantos amigos que nos deram a mão. Quero ser como tu, meu pai.
carta escrita em 19 de Março de 2004
porque o meu filho faz anos hoje lembrei-me de ressuscitar esta carta. Hoje e estória verdadeira fica parada.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
20 de março de 2006
Uma estória verdadeira (75)
Amiga Té a nos pôr a par de tudo. Falámos que ninguém sentiu nem a barriga a dizer que as horas tinham passado e era hora de ir almoçar. Voltámos e fomos ver as casas, o cinema cogumelo, o Hospital, a Escola Industrial, o Colégio das Madres, a escola 55 e saltei de propósito a 56 que foi onde andei da 2ª à 4ª classe. Saltei porque me apeteceu e a máquina estava sem bateria. Porque tem de falhar sempre alguma coisa nos momentos importantes? Na 55 andei só na primeira classe e depois a senhora directora se lembrou de dizer que eu fazia parte da área da outra e lá tive que mudar e deixar o Professor Amaral que dava reguadas e era grande como vara de caniço. Feita a ronda escolar deixámos a Té e a sua melancia na casa dela e lá fomos nós para outras paragens. Como o único sítio que a gente conhecia era o restaurante da Praia das Miragens optámos por lá ir almoçar. Nós os três nos abancámos e pedimos as coisas e comemos fazendo planos para essa tarde e dias seguintes que não seriam muitos. Entrou a tia e mais a sua família. Como minha prima cresceu…já tem filho na marinha e filha ainda com os dez anos. É a filha quem comanda agora os negócios. Bem comidos e lá íamos nós com outro destino quando descobrimos que a tia tinha pago o nosso almoço. Não havia necessidade. Depois dos agradecimentos lá seguimos a nossa rota.
Esta tarde estava destinada a fazer-se uma visita ao sítio onde o kota caiu por terra nos idos anos de 1961. Apanhámos a estrada doe Tombua e lá fomos. Estrada boa em grande parte do percurso. Lan estava connosco e era o nosso guia. Mais ou menos no quilómetro 65 parámos e lá estava o marco que marcava o local. Quando fizeram o realcatroamento da estrada fizeram uma coluna maior e lá estava ele bem visível. Parámos e eu fiquei ali parado. Eu sei o que pensava mas não conseguia nem mexer, não conseguia segurar as lágrimas que voltaram a inundar a minha cara que até parecia tempo de chuva. Incontrolável! Reflecti. As decisões se estavam assim como num equilíbrio na corda do pensamento se fixaram na solidez de uma decisão. Estava decido qual o rumo definitivo que a minha vida vai ter. Ali no meio do deserto, ali na aridez de um horizonte de perder de vista, escrevi com tinta permanente no meu pensamento a decisão decidida. Já não tem retorno. Falámos, conversámos ali junto ao marco que marca o sítio onde houve dois falecimentos.
No mesmo dia dois períodos de grande reflexão. No dia de finados se acendeu a luz de uma forma permanente. Essa luz andava a oscilar qual falta de intensidade. Se fixou e por isso a rota no GPS da vida foi marcada não em quilómetros mas em meses que não podem ser mais que 24. Assinatura reconhecida na forma presencial por mais três ávilos. Lan com sorriso nos lábios disse que sim. Lhe vi uma alegria no rosto. Ou pensei que vi. No meu estava estampada a felicidade de ter desfeito a indecisão.
Esta tarde estava destinada a fazer-se uma visita ao sítio onde o kota caiu por terra nos idos anos de 1961. Apanhámos a estrada doe Tombua e lá fomos. Estrada boa em grande parte do percurso. Lan estava connosco e era o nosso guia. Mais ou menos no quilómetro 65 parámos e lá estava o marco que marcava o local. Quando fizeram o realcatroamento da estrada fizeram uma coluna maior e lá estava ele bem visível. Parámos e eu fiquei ali parado. Eu sei o que pensava mas não conseguia nem mexer, não conseguia segurar as lágrimas que voltaram a inundar a minha cara que até parecia tempo de chuva. Incontrolável! Reflecti. As decisões se estavam assim como num equilíbrio na corda do pensamento se fixaram na solidez de uma decisão. Estava decido qual o rumo definitivo que a minha vida vai ter. Ali no meio do deserto, ali na aridez de um horizonte de perder de vista, escrevi com tinta permanente no meu pensamento a decisão decidida. Já não tem retorno. Falámos, conversámos ali junto ao marco que marca o sítio onde houve dois falecimentos.
No mesmo dia dois períodos de grande reflexão. No dia de finados se acendeu a luz de uma forma permanente. Essa luz andava a oscilar qual falta de intensidade. Se fixou e por isso a rota no GPS da vida foi marcada não em quilómetros mas em meses que não podem ser mais que 24. Assinatura reconhecida na forma presencial por mais três ávilos. Lan com sorriso nos lábios disse que sim. Lhe vi uma alegria no rosto. Ou pensei que vi. No meu estava estampada a felicidade de ter desfeito a indecisão.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
19 de março de 2006
Para pensar
Para pensar
Heróis de verdade
Heróis de verdade
são aqueles que trabalham para realizar seus projetos de vida,
e não para impressionar os outros.
Roberto Shinyachiki
Qualquer um pode zangar-se - isso é fácil!
Mas zangar-se com a pessoa certa, na hora certa, pelo motivo certo e da maneira certa - não é fácil.
"Aristóteles"
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
18 de março de 2006
Porque hoje é sábado
Porque hoje é sábado e como tal é dia da santa preguiça, dia que não escrevo, dia de leitura e audição. Hoje só sou ouvidos.
Bom Sábado para todos
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Bom Sábado para todos
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17 de março de 2006
Um dia não
Uma estória verdadeira (74)
Cá fora recomecei a respirar. Se pode dizer que foi encontro de cortar a respiração. Nunca mais ficarei tanto tempo a dever um encontro.
Telemóvel tocou e amiga Té só perguntava estava onde que já vinha ter com a gente. Na porta grande daquele mundo de mortos a gente ficou-lhe a esperar. Ele chegou que foi trazida pelo pai. Como ele tá novo, pensei eu nos meus botões. E a minha amiga? Mesmo sorriso acorda adornado nuns cabelos curtos que lhe imaginava de longos e esticados, castanhos, agora cinzentos. Mas o sorriso o mesmo desde aqueles tempos. Ali mesmo, naquele sítio, trocamos as palavras que estávamos a dever-nos. Depois entrámos no Tico, maravilhoso Tico que está sempre desejoso da gente, e seguimos na circunvalação até que fomos mesmo ao lado, pela parte de trás do Liceu de outras andanças e batemos numa casa. Senhora mais velha assim como que olhar na dúvida nos veio abrir e eu disse olá. Não estou a ver quem é, disse ela. Sou eu tia, o filho de fulana de tal e coisa e tal. Ai como tas crescido! Disse logo e prontamente ela. Pois é, tia, estou crescido 30 anos mais coisa menos coisa. Ficámos nas trocas de palavras, nas perguntas de fulano e de outro e outro mais. Foi um navegar ali no passeio por gerações da família. Chegou o companheiro dela que vinha da horta. Ganhámos logo ali uma melancia, que mais tarde na viagem de regresso a Luanda nos ia dar um jeito que nem vos conto agora, mas fica já falado no caso de eu me esquecer. Depois de mais uns abraços e beijos de despedida, talvez me tenha despedido umas três vezes, arrancámos e fomos ver as praias. As praias da zona sul. Nunca na minha vida eu tinha visto a geografia da terra nesse prisma. Era só ir na Praia Amélia ou na Praia Azul ou raramente na das Barreiras. Agora a gente ia ver as praias da zona Sul. Virou moda saber geografia. Está certo. E lá fomos nós. Torre do Tombo continua igual do lado direito mas cresceu mais que a conta no lado esquerdo. Também no lado direito tem a falésia ia crescer mais como. A velha Sede do Ginásio da Torre do Tombo ainda lá está construída mesmo em cima do único pedregulho que aquele zona tem. Mas ainda está e igual ao que era nos outros tempos. Me disseram que j+a não existe o Ginásio pelo que penso mora lá gente agora mas não afirmo com categoria porque podia meter água. E lá fomos sempre para sul, passando na cadeia que só não está igual porque agora não está isolada, está só rodeada de gente por todos os lados menos no lado da estrada. Vimos a base militar com foguetes a apontar agora para lado nenhum, vais ver é só mesmo a carcaça e mais nada. Também não perguntei porque não sou curioso assim. Fomos e só parámos na Praia Amélia. Não sei se foi pelo passar do tempo se foi por esquecimento meu ou se é mesmo assim me pareceu que tinha mais gente que outras épocas que por lá me fui banhar e fingir que era pescador na ponte da fábrica dos Duarte. Eu que nunca agarrei um fio com anzol estou para aqui a mentir com meias verdades. Ia lá mesmo só quando sabia que certa pessoa tinha ido lá. Coisas próprias da idade, penso eu agora. Dali voltámos a seguir e parar na Praia das barreiras que os Mapundeiros de agora gostam de invadir e como é chique lhe chamam a Praia das Escadinhas.
Telemóvel tocou e amiga Té só perguntava estava onde que já vinha ter com a gente. Na porta grande daquele mundo de mortos a gente ficou-lhe a esperar. Ele chegou que foi trazida pelo pai. Como ele tá novo, pensei eu nos meus botões. E a minha amiga? Mesmo sorriso acorda adornado nuns cabelos curtos que lhe imaginava de longos e esticados, castanhos, agora cinzentos. Mas o sorriso o mesmo desde aqueles tempos. Ali mesmo, naquele sítio, trocamos as palavras que estávamos a dever-nos. Depois entrámos no Tico, maravilhoso Tico que está sempre desejoso da gente, e seguimos na circunvalação até que fomos mesmo ao lado, pela parte de trás do Liceu de outras andanças e batemos numa casa. Senhora mais velha assim como que olhar na dúvida nos veio abrir e eu disse olá. Não estou a ver quem é, disse ela. Sou eu tia, o filho de fulana de tal e coisa e tal. Ai como tas crescido! Disse logo e prontamente ela. Pois é, tia, estou crescido 30 anos mais coisa menos coisa. Ficámos nas trocas de palavras, nas perguntas de fulano e de outro e outro mais. Foi um navegar ali no passeio por gerações da família. Chegou o companheiro dela que vinha da horta. Ganhámos logo ali uma melancia, que mais tarde na viagem de regresso a Luanda nos ia dar um jeito que nem vos conto agora, mas fica já falado no caso de eu me esquecer. Depois de mais uns abraços e beijos de despedida, talvez me tenha despedido umas três vezes, arrancámos e fomos ver as praias. As praias da zona sul. Nunca na minha vida eu tinha visto a geografia da terra nesse prisma. Era só ir na Praia Amélia ou na Praia Azul ou raramente na das Barreiras. Agora a gente ia ver as praias da zona Sul. Virou moda saber geografia. Está certo. E lá fomos nós. Torre do Tombo continua igual do lado direito mas cresceu mais que a conta no lado esquerdo. Também no lado direito tem a falésia ia crescer mais como. A velha Sede do Ginásio da Torre do Tombo ainda lá está construída mesmo em cima do único pedregulho que aquele zona tem. Mas ainda está e igual ao que era nos outros tempos. Me disseram que j+a não existe o Ginásio pelo que penso mora lá gente agora mas não afirmo com categoria porque podia meter água. E lá fomos sempre para sul, passando na cadeia que só não está igual porque agora não está isolada, está só rodeada de gente por todos os lados menos no lado da estrada. Vimos a base militar com foguetes a apontar agora para lado nenhum, vais ver é só mesmo a carcaça e mais nada. Também não perguntei porque não sou curioso assim. Fomos e só parámos na Praia Amélia. Não sei se foi pelo passar do tempo se foi por esquecimento meu ou se é mesmo assim me pareceu que tinha mais gente que outras épocas que por lá me fui banhar e fingir que era pescador na ponte da fábrica dos Duarte. Eu que nunca agarrei um fio com anzol estou para aqui a mentir com meias verdades. Ia lá mesmo só quando sabia que certa pessoa tinha ido lá. Coisas próprias da idade, penso eu agora. Dali voltámos a seguir e parar na Praia das barreiras que os Mapundeiros de agora gostam de invadir e como é chique lhe chamam a Praia das Escadinhas.
É Praia das Barreiras e pronto que eu não vou mudar agora de nome só porque lhe houve alguém que lhe baptizou. Mas agora tem bar e apoio de praia, rede de volei e espaço para estar. Também ainda não é verão, estamos só em Novembro. Mas hoje a gente não veio para fazer praia e lá seguimos até à Azul. A minha praia de contentamento. Sempre lhe gostei e sempre nunca soube bem porquê. O mar ali tem ondas que metem medo e susto que eu só de pensar ainda fico com pele de galinha. Mas sempre gostei desta praia. Talvez porque ao sábado à tarde vínhamos aqui verter umas loiras e comer uns caranguejos, quando o Rádio Clube pagava o chorudo ordenado. Sei lá mesmo porquê. Gostava dela e não tem mais falações. Já só tem as ruínas da esplanada dessa altura e uma outra ruína que me contaram que serviu para coisas que não cabem aqui neste meu pensamento, muito menos em dia de finados
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
16 de março de 2006
Uma estória verdadeira (73)
Em frente estava o Forte de Santa Rita. Nunca soube e não é agora que vou ficar a saber porque é que se chama assim. Nunca lhe vi lá nenhuma fortificação, nem ruínas que lhe tivessem baptizado disso. Pode ser só ignorância minha, mas também nunca pensei em ser assim como uma enciclopédia, nem de bolso quanto mais assim tão grande. À minha direita lá estava uma grande área murada de branco, de modos que toda a gente sabe o que é aquilo. O Cemitério mantinha o mesmo ar. Hoje muito florido porque é Feriado Nacional, dia de louvar os mortos. Eu estava ali. Ramo de Flores na mão. Sabia onde tinha de ir. Parecia mesmo não tinha nunca deixado de ir ao encontro. Fui lá direitinho. Ia assustado porque faz tempo tinha ouvido que tinham feito isto e aquilo, que tinha acontecido o pior que nem descanso davam nos mortos. Foi mesmo só asneira o que tinha ouvido. Táva lá tudo, e mais ainda. Ele tinha crescido. Parei no ponto do encontro marcado. De diferente tinha só que tinha passado ali quase trinta anos e a chuva era pouca pelo que estava só com tom de castanho em vez de estar branco da cor do mármore. Me olho e vejo nos meus olhos que as lágrimas estavam a correr que nem rio bravo depois de uma chuva de muitas horas. Faz tempo não me vejo assim. Queria parar mas a força lá dentro era bem maior que a força que eu fazia. Lágrimas só mesmo umas atrás das outras.
Quase trinta anos depois estava ali em frente ao sítio onde o meu pai se deitou naquele dia de Junho de 1961. Eu queria dizer palavras mas nem um som ou ruído saia da minha boca. Era só mesmo lágrimas, umas atrás das outras. Fui abaixo. Uma voz desconhecida é que foi quem travou aquele rio, é que foi quem fez parar e me pôr a pensar. Ela disse toma balde e pano e água e lava tudo que fica como novo. Saiu-me um obrigado que nem sei em que tom. Co-pilota e Ti fizeram isso que eu fiquei ali, em sentido a conversar com o meu kota. Conversa só mesmo de filho para pai, silêncios trocados em transmissões de pensamento que ninguém tem ou teve acesso.
Devargarzinho recuperei sem ter em conta que de quando em vez ia haver recaída. Mas o diálogo teve os seus frutos. A última morada dele ficou que nem nos tempos de antigamente.
Sai dali e fui procurar mais uns quantos que eu tinha prometido ir visitar. Uns encontrei, outros não. Eu não tinha o mapa da cidade dos mortos na cabeça e não podia lembrar tudo passados quase 30 anos. Conversei com família, cumprimentei amigos. Foi um encontro que não pode mais ser intervalado de tanto tempo. Ficou essa promessa.
Voltei no meu kota. Lhe disse mais uma ou outra palavra. Saí dali parecia tinha morrido.
Ao caminhar para a porta fui recuperando. Muito lentamente.
Quase trinta anos depois estava ali em frente ao sítio onde o meu pai se deitou naquele dia de Junho de 1961. Eu queria dizer palavras mas nem um som ou ruído saia da minha boca. Era só mesmo lágrimas, umas atrás das outras. Fui abaixo. Uma voz desconhecida é que foi quem travou aquele rio, é que foi quem fez parar e me pôr a pensar. Ela disse toma balde e pano e água e lava tudo que fica como novo. Saiu-me um obrigado que nem sei em que tom. Co-pilota e Ti fizeram isso que eu fiquei ali, em sentido a conversar com o meu kota. Conversa só mesmo de filho para pai, silêncios trocados em transmissões de pensamento que ninguém tem ou teve acesso.
Devargarzinho recuperei sem ter em conta que de quando em vez ia haver recaída. Mas o diálogo teve os seus frutos. A última morada dele ficou que nem nos tempos de antigamente.
Sai dali e fui procurar mais uns quantos que eu tinha prometido ir visitar. Uns encontrei, outros não. Eu não tinha o mapa da cidade dos mortos na cabeça e não podia lembrar tudo passados quase 30 anos. Conversei com família, cumprimentei amigos. Foi um encontro que não pode mais ser intervalado de tanto tempo. Ficou essa promessa.
Voltei no meu kota. Lhe disse mais uma ou outra palavra. Saí dali parecia tinha morrido.
Ao caminhar para a porta fui recuperando. Muito lentamente.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
15 de março de 2006
Uma estória verdadeira (72)
Eu aqui na terra em que dei os primeiros passos e os primeiros trambolhões, onde tive a primeira paixão, para não exagerar e não ser mentiroso não digo que a única. Num quarto de Hotel, dá para ver todo o filme da minha vida a passar no tecto branco transformado em tela do imaginário. O que vale é que mesmo só eu via. Cada segundo. Cada passeio, cada rua, cada pedra me lembrava uma estória. Aqui deitado e a reviver o passado sem saudosismo mas a ver que eu não podia ter existido se não tivesse esse tempo nas minhas costas, se eu não carregasse comigo esse peso dos anos. Era um filme que teve um intervalo, longo por sinal. Neste cinema deu para puxar o filme para trás as vezes que me apeteceu, saltar cenas, ver em câmara lenta. Era o meu filme interactivo. Nem deu para sentir que o dia estava a chegar. Ouvi o romper da aurora. Doce e suave como sempre aconteceu na minha cidade.
Há hora combinada tomou no silêncio a alvorada. Tocou é forma de dizer pois quem já está mesmo habituado a levantar de madrugada não precisa nem de despertador para tirar o corpo de cima das molas que formam o colchão. Sorridente me levantei como se tivesse dormido uma noite sem intervalos. No calendário marcava 2 de Novembro. Feriado Nacional. Dia de eu ter o encontro adiado quase trinta anos. Não podia faltar esse encontro. Jamais me perdoaria se faltasse, jamais me olharia no espelho. Pequeno almoço de 1 estrela tomado no Hotel e lá fomos nós no nosso Tico que ansiosamente nos esperava estacionado na porta. Virámos na Rua dos Pescadores, subindo a grande subida dos futebois de antigamente em que muda aos dois e acaba aos quatro para que não sejam sempre os mesmos a jogar ao sabor da descida. Deu para parar na frente da que eu sempre considerei a minha casa. Desde os 4 anos, desde o dia que aquele com quem eu tinha encontro marcado hoje deixou de aparecer, deixou de fazer a companhia que estava habituado e que mesmo sendo puto tinha na lembrança alguns pormenores. Toda reconstruída que eu tive a ousadia de dizer que estava melhor agora do que quando a deixei. É que está mesmo bonita. Me gabo agora de dizer que eu morei na cada agora mais bonita da minha cidade. As outras casas me vão desculpar, mas eu sinto eu digo e não há meias medidas. Depois, virei para a esquerda, Casa de Saúde que agora é Hospital Pediátrico lá estava. Igual. A casa do Martins, a que eu pulava o muro das minhas traseiras para lá ir brincar com os meus cambas, é agora um apêndice do Hospital pediátrico da frente. Já não tens as figueiras de figos de pingo de mel de outros tempos. Depois voltamos à esquerda novamente, passámos em frente do meu primeiro liceu que antes fora escola industrial e comercial e antes ainda tinha sido escola de pesca. Agora, mantendo a sua genética é um colégio da minha amiga Té que ainda não tive oportunidade de ver e abraçar nos muitos beijos que lhe tenho para dar. Fomos descendo a rua. Aqui era isto e ali era aquilo. Aqui morava fulano e ali sicrano. Eu sei tudo de cor parece foi ontem eu estive aqui. Mas não podia haver paragens. O encontro estava marcado e não podia adiar. Fomos só descendo mesmo até que no Bairro da Facada tivemos que virar na direita e depois na escola 49 virámos na esquerda e seguimos até lá.
Há hora combinada tomou no silêncio a alvorada. Tocou é forma de dizer pois quem já está mesmo habituado a levantar de madrugada não precisa nem de despertador para tirar o corpo de cima das molas que formam o colchão. Sorridente me levantei como se tivesse dormido uma noite sem intervalos. No calendário marcava 2 de Novembro. Feriado Nacional. Dia de eu ter o encontro adiado quase trinta anos. Não podia faltar esse encontro. Jamais me perdoaria se faltasse, jamais me olharia no espelho. Pequeno almoço de 1 estrela tomado no Hotel e lá fomos nós no nosso Tico que ansiosamente nos esperava estacionado na porta. Virámos na Rua dos Pescadores, subindo a grande subida dos futebois de antigamente em que muda aos dois e acaba aos quatro para que não sejam sempre os mesmos a jogar ao sabor da descida. Deu para parar na frente da que eu sempre considerei a minha casa. Desde os 4 anos, desde o dia que aquele com quem eu tinha encontro marcado hoje deixou de aparecer, deixou de fazer a companhia que estava habituado e que mesmo sendo puto tinha na lembrança alguns pormenores. Toda reconstruída que eu tive a ousadia de dizer que estava melhor agora do que quando a deixei. É que está mesmo bonita. Me gabo agora de dizer que eu morei na cada agora mais bonita da minha cidade. As outras casas me vão desculpar, mas eu sinto eu digo e não há meias medidas. Depois, virei para a esquerda, Casa de Saúde que agora é Hospital Pediátrico lá estava. Igual. A casa do Martins, a que eu pulava o muro das minhas traseiras para lá ir brincar com os meus cambas, é agora um apêndice do Hospital pediátrico da frente. Já não tens as figueiras de figos de pingo de mel de outros tempos. Depois voltamos à esquerda novamente, passámos em frente do meu primeiro liceu que antes fora escola industrial e comercial e antes ainda tinha sido escola de pesca. Agora, mantendo a sua genética é um colégio da minha amiga Té que ainda não tive oportunidade de ver e abraçar nos muitos beijos que lhe tenho para dar. Fomos descendo a rua. Aqui era isto e ali era aquilo. Aqui morava fulano e ali sicrano. Eu sei tudo de cor parece foi ontem eu estive aqui. Mas não podia haver paragens. O encontro estava marcado e não podia adiar. Fomos só descendo mesmo até que no Bairro da Facada tivemos que virar na direita e depois na escola 49 virámos na esquerda e seguimos até lá.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
14 de março de 2006
Uma estória verdadeira (71)
Arrumámos as coisas no quarto. Quem terá sido quem dormiu neste quarto? Isso importa alguma coisa depois de tantos anos? A mim não, pelo que saltei já essa parte. Eu conhecia quem cá morava mas nunca tinha passado para além da porta. Banhinho quente e refrescante, que é como quem diz, banho refrescante com água assim naturalmente morna. Fomos dar mais uma volta. Era noite. Foi só como que assim um estudar do terreno. Deu para eu pensar que a cidade estava congelada desde o dia que eu sai. Eu sei que parece importância maior da minha parte mas foi isso que eu senti e se eu não dissesse a verdade estava a mentir pelo que eu digo-o. Tal e qual. Mentira. Tem rua nova que é avenida de quatro faixas que circunda toda a cidade, desde a estrada para Tombua até mesmo no cemitério, passando pela Igreja nova e quase no quartel da Tuga. Pelo menos é assim que vem na lista telefónica. 5 estrelas eu digo dessa coisa nova. Estava a cidade iluminada com os seus candeeiros e não dava para ver muitas coisas assim como com a natural luz, mas deu para ver que o parque infantil está cercado a toda a volta para obras. Mais tarde me disseram que era para abrir no dia dos 30 anos que é daqui a 10 dias. Lan foi ter connosco ao jantar. Ou a gente é que foi ter com ele? Igual, que o jantar decorreu na mesma, no restaurante simpático que fica pertinho da ponte velha da Praia das Miragens. Ponte que me lembro de um kota bem velhinho ter-me dito noutras eras que viu ali descer um de tal D. Luís de qualquer coisa. Pois a ponte servia os escaleres que ajudavam os passageiros dos vapores a vir até terra. Tempos em que não havia o porto comercial. Dados nunca confirmados por mim que sempre acreditei nas palavras dos kotas mesmo daqueles que não tinham andado na escola e não sabiam do Capelo Ivens nem do Paiva Couceiro, e naquela altura eu estava mais virado para outras coisas do que saber as coisas da História. Jantámos bem sim senhor, que o serviço é quase bom. Falta só limar umas arestas e prontos. Depois fomos verter uns escoceses ali debaixo das casuarinas, a seguir ao Clube Náutico num bar muito simpático de nome Murianga. Dedos de conversa que duraram bons pares de horas até que alguém se lembrou que amanhã também é dia e não vale gastarem tudo hoje. Ainda deu para estar com o Xonas, camba de outras eras e que continua igual que nem os anos passam por ele, mesmo na porta do trabalho dele. Vais ver ele desvia dos anos. Uns quantos dedos mais de conversa e mais um encontro marcado para o jantar.
lá consegui meter as fotos.Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
13 de março de 2006
Uma estória verdadeira (70)
Uma estação de Serviço parece que dá as boas vindas a quem acaba de chegar. Pena mesmo é que no outro dia não tinha gasóleo e eu diria que não fica a dever nada as outras que conheço de outras paragens. Mas também não pode ser tudo perfeito, assim eu ia pensar que a cidade se tinha posto nos oqueis todos só para me receber. Não é que eu não merecia, mas assim tanto? Rotunda mesmo perto da primeira casa dos meus avós quando eles casaram dá as boas vindas na entrada da cidade propriamente dita, não tivesse ela crescido mais do que aquilo que eu pensava. Não me lembro mesmo qual era a casa porque se fizerem as contas eu ainda não tinha nascido, eles casaram sem filhos e portanto a minha mãe ainda não tinha nascido também. O velho campo de futebol já não existe assim como o velho Matadouro. Mas lá está imponente no seu porte colonial a Estação dos Caminhos de Ferro e a Estação dos Correios. Iguais, nas mesmas cores e nas mesmas operacionalidades. Continuamos a subir a Avenida do Bonfim caté fomos no Tribunal, não estivesse em obras e eu ia dizer que os anos se esqueceram dele, ou até que eu não tinha nem saído para comprar cigarros. O sol estava a querer ir-se deitar que também tem esse direito pelo que resolvi telefonar a um camba para ver essa coisa de ir dormir, como tínhamos combinado, não tivesse ele ido na capital. Sim, mermão, te estou a esperar mesmo aqui em frente do Clube Náutico, acabadinho de chegar de Benguela. Meia volta e se desce pelo grémio, Minhota e na Sotrage (que é que queria isto mesmo dizer que a cabeça já esqueceu?), de frente na capitania se tira um retrato, e se volta na praia. Lá estava ele. Igual como era da última vez que lhe vi vai aí mas três dezenas de anos. Abraço de até fez estalar os ossos aqui do franganito, salvo seja. Arrancamos para trás do parque de campismo, passando pela casa do Caminho de Ferro, mesmo ao lado do posto médico do dito cujo, onde acho que dei as primeiras passadas da minha vida erecta, a ver se havia lugar no ‘lodge’ para assim a gente acordar com o barulho desse zulmarinho que começa mesmo aqui. Lotação esgotada. Vamos tentar um outro. É novo. Era casa de família que depois virou casa de oficiais e agora é hotel. Ficámos aí mesmo que é bom e está com localização mais que óptima. Muitas recordações me prendem a esta zona. Muitas eu não posso falar aqui pois senão vocês iam a ficar a saber tanto quanto eu. Na primeira oportunidade passei na casa que foi durante mais tempo a minha casa, ao lado da casa da menina do biquini azul e do chapéu de sol cor de laranja de outras eras. Regressei uns anos antes na minha imaginação e de olhos abertos sonhei e o que vale é que ninguém viu, pois se calhar agora estava com os olhos inchados e incapaz de te estar a contar estas coisas que te vou contando e que sabes que são verdades da minha alma.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
12 de março de 2006
Num domingo
E hoje vou escrever sobre o quê mesmo? Nada. Vou fazer mais como, então? Podia falar de Fado mas não é do meu gosto. De Fátima? Assim só me estou a lembrar de uma amiga que vive na Suiça e que para além de muito simpática é mesmo amiga e não sei se ela me autorizaria a estar para aqui a falar dela. Futebol? Ainda não sei os resultados do girabola pelo que estaria aqui a escrever sobre divagações e hoje é domingo a divagação tem direito ao repouso.
Em resumo: hoje não escrevo e está dito.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
Em resumo: hoje não escrevo e está dito.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
11 de março de 2006
Uma estória ao sábado
Estava aqui a penar sobre o que eu escreveria hoje, que é sábado e ao que parece tenho alergia aos sábados. Dá cá uma preguiça que eu nem sei contar direito. Daí lembrei-me de contar como conheci a minha namorada. Não sei porquê, mas nunca tive curiosidade em saber como começam as histórias de amor. Mesmo assim já ouvi algumas histórias engraçadas, outras nem tanto. Ao ouvi-las, apercebemo-nos que o amor pode acontecer onde e quando menos imaginamos. Pode ser no corredor do supermercado, no videoclube, na paragem do autocarro, na discoteca, no cinema ou mesmo na net.
Estava eu na net, numa chuvosa tarde de sábado quando o amor bateu à minha porta, melhor, no meu monitor. Na verdade, encontrámo-nos num chat, trocámos piropos, trocamos o número de telefone e combinámos conversar novamente quando eu pudesse entrar no chat num outro dia. Naquela altura a minha vida era uma correria. Tinha a pressa de correr para lado nenhum. Tinha uma vida obcessiva. Inventava o que fazer mesmo que não o fizesse. Só me apetecia era correr. Parar era sinónimo de loucura.
Só nos voltámos a encontrar no chat no fim de semana seguinte. Teclámos muito e resolvi que ligaria para ela naquela mesma noite. Para confirmar voltei a pedir o número de telefone e liguei. A vida é feita de riscos, não é? Então vamos corre-los com cuidado, é claro.
A conversa telefónica decorreu muito bem. Parecia que já nos conhecíamos há muito tempo, vimos que os gostos eram muito parecidos na música, no cinema, na vida em geral...
Os dias se seguiam uns aos outros e numa dessas tardes de de ar chuvoso e melancólico, estava de papo para o ar no sofá e mandei um sms para o telemóvel dela perguntando-lhe se ele estava com vontade de ir beber um café. Na verdade, ela já tinha me convidado para sair, mas eu nunca podia. Tinha sempre algo para fazer. Compromisso já assumido. Coisas...
Então foi naquele fim de tarde de sábado que nos conhecemos. No início estava tenso. Nunca sei muito bem como agir no primeiro encontro. Quem já passou por isso sabe como é. Quem não passou que experimente.
Aos poucos a conversa foi andando e o clima também, se transformou num final de tarde de verão. Voltei para casa feliz da vida. Naquela mesma noite conversamos pela net e pedi-lhe namoro. Ela disse que ainda era muito cedo. Deixei a conversa teclada desenrolar-se e umas horas depois voltei a insistir.
Ás vezes assusto-me com a rapidez com que tudo aconteceu, mas como disse anteriormente a vida é feita de riscos e se não corrermos riscos nunca saberemos como poderia ter sido.
Afinal hoje é sábado e reparo que esta estória nunca poderia ter acontecido comigo. Ao Sábado? Nunca!
Estava eu na net, numa chuvosa tarde de sábado quando o amor bateu à minha porta, melhor, no meu monitor. Na verdade, encontrámo-nos num chat, trocámos piropos, trocamos o número de telefone e combinámos conversar novamente quando eu pudesse entrar no chat num outro dia. Naquela altura a minha vida era uma correria. Tinha a pressa de correr para lado nenhum. Tinha uma vida obcessiva. Inventava o que fazer mesmo que não o fizesse. Só me apetecia era correr. Parar era sinónimo de loucura.
Só nos voltámos a encontrar no chat no fim de semana seguinte. Teclámos muito e resolvi que ligaria para ela naquela mesma noite. Para confirmar voltei a pedir o número de telefone e liguei. A vida é feita de riscos, não é? Então vamos corre-los com cuidado, é claro.
A conversa telefónica decorreu muito bem. Parecia que já nos conhecíamos há muito tempo, vimos que os gostos eram muito parecidos na música, no cinema, na vida em geral...
Os dias se seguiam uns aos outros e numa dessas tardes de de ar chuvoso e melancólico, estava de papo para o ar no sofá e mandei um sms para o telemóvel dela perguntando-lhe se ele estava com vontade de ir beber um café. Na verdade, ela já tinha me convidado para sair, mas eu nunca podia. Tinha sempre algo para fazer. Compromisso já assumido. Coisas...
Então foi naquele fim de tarde de sábado que nos conhecemos. No início estava tenso. Nunca sei muito bem como agir no primeiro encontro. Quem já passou por isso sabe como é. Quem não passou que experimente.
Aos poucos a conversa foi andando e o clima também, se transformou num final de tarde de verão. Voltei para casa feliz da vida. Naquela mesma noite conversamos pela net e pedi-lhe namoro. Ela disse que ainda era muito cedo. Deixei a conversa teclada desenrolar-se e umas horas depois voltei a insistir.
Ás vezes assusto-me com a rapidez com que tudo aconteceu, mas como disse anteriormente a vida é feita de riscos e se não corrermos riscos nunca saberemos como poderia ter sido.
Afinal hoje é sábado e reparo que esta estória nunca poderia ter acontecido comigo. Ao Sábado? Nunca!
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
10 de março de 2006
Uma estória verdadeira (69)
Lá fomos nós numa viagem que se tornou rápida. Abrandamentos só para fotografar os vários ângulos possíveis do Morro Maluco que me deixa doido de tanta perseguição e sem sair do mesmo lugar. Caraculo. Era ponto de paragem mas devido ao passar corrente dos minutos se optou mesmo por ver de longe e assim fiquei sem saber se as minhas ovelhas ainda lá estão com o seu pelo encarapinhado. Minhas porque me divertia a vê-las a correr noutras eras em que ainda não protestava com o matar dos bichos para proteger os costados de umas quantas poucas elites. Mas a verdade é que cresci e se calhar agora não ia ficar lá muito contente em ver as carapinhas negras a correr de um lado para outro e saber que alguns primos dessas aí já estavam noutros costados. Assim foi melhor e só de longe vi as casas típicas que nunca ninguém me explicou porque aram assim e não de outra forma. Se calhar porque nunca perguntei a ninguém. Mas a verdade é que na altura estava pouco ligado a essas coisas de cota. Eu era mais garinas e mini-saias e coisas assim como o santo sacrifício da saída da missa. Tas a ver? Yah!
Dali ao Giraul foi um pulo. Ou será que adormeci? Não que estes olhos estão sempre bem que abertos que não pode escapar nada que mereça ser visto. Agora resolveram chamar isto de mini-Leba? Mapundeiros são doidos. É o Giraul e mais nada. Que susto. Saídos de uma curva desce a 0 quilómetros por hora um camião e lá teve o Tico que fazer uma travagem assim num repente que até quase fui limpar o pára-brisas por dentro com os meus cabelos cinzentos. Traço contínuo assim num repente passou a descontínuo e lá se ultrapassou o camião sem haver azares pelo meio. Giro foi que logo o traço passou a continuo outra vez. Milagre gritei eu. Gargalharam os outros e lá fomos directos à ponte nova com os seus candeeiros de luz solar. Gira ponte que nem vos conto. Se vê ao lado a passadeira de antigamente, no leito do rio seco. Ainda não é Março para ele mostrar a sua vida. Segue viagem que a hora se põe tarde e não tem combinação de recepção na chegada e ainda vamos dormir a ver miragens na praia da dita cuja. Hortas. Saudade. Me apetece imitar a Cesária Évora mas logo sou proibido. Ninguém quer ficar sem tímpanos e sem vidros na viatura. Triangulação mostra, ao lado das oliveiras que dão azeitonas assim do tamanho de tangerinas – esta é para brincar com uma loira do deserto que diz que ali são as maiores azeitonas da face da terra. Vais ver ela viu um fruto de imbondeiro e lhe disseram que era da oliveira. Com esta fiquei a rir no pensamento até que chegados na referida triangulação e para a direita se vai para o Saco e na esquerda para a cidade do mar e do deserto. Se vai logo na esquerda. Dá tempo para olhar a Kipola e ver que ela continua no seu sítio. Porque é que havia mesmo procissão uma vez por ano lá no meio das hortas? Se alguma vez soube esqueci e não me lembro mais. Tas a ver só a quantidade de dúvidas que já tenho e ainda não entrei na referida miragem da minha cidade. Aguada. Era assim chamada porque era do rio Bero que se tirava a água para os vapores. Me dizia a minha avó e eu acredito porque ela não era pessoa de enganar o neto sedento de saberes. Fizeram ponte nova no rio. A velha, a do comboio agora é mesmo só para o comboio. As margens do rio estão a ser regularizadas para quando houver as enchentes não fazer aquilo que o Bero adorava fazer – devastar tudo na sua passagem. Mas chegado na Aguada se vê que a Sofrio e posto de transformação de electricidade que vem da Matala ainda estão ao que me pareceu funcionais e para as curvas.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
9 de março de 2006
Uma estória verdadeira (68)
O carro arranca com destino no Namibe escrito no livro de bordo que não existe mas faz de conta. Lá segue ele até no palácio, se dirige na Senhora do Monte que é sempre a direito e ligeiramente a subir. Quando eu era mais novo pensava que era longe e agora tudo me parece ser assim tão perto. Mas o Tico lá vai lentamente. Parece ele também não tem vontade de sair de onde está. Se pára para uma última foto numa placa onde se lê que o álcool é inimigo dos automóveis. Tantas vezes adiada a foto que é desta mesmo que se lhe vai tirar o retrato. Também parece que todo o conjunto, de Tico e da gente misturado, está com vontade mesmo de abalar daqui que nem pedra do seu sítio. Se passa frente ao Casino e mais fotos. Repetidas? Se calhar mas a disposição agora era outra. Agora era mesmo como que a querer agarrar a qualquer coisa e dizer daqui não saio daqui ninguém me tira. Se a SISTEC tivesse inventado um Vontadómetro de certo ele daria um resultado igual a zero. Mais coisa menos coisa. Se sobe e se volta a parar no miradouro. Um último olhar por agora na cidade onde tive o privilégio de ter nascido. Se arranca. Antes da Humpata mais uma paragem para olhar o futuro mais uma vez. Tem de ser aqui e está decidido e não se fala mais no assunto que agora estamos de férias e no Namibe é mesmo para curtir o sol e as pedras que lhes conheço de cor. Tico sem vontade de andar lá segue até na descida da Leba, onde se paga a portagem e depois se vira outra vez para a esquerda para dar uma olhada desde a frente e ver esta maravilha da engenharia que foi toda reconstruída não faz um ano. Pópilas que é mesmo um espanto. O Engenheiro e o Arquitecto estiveram mesmo bem aqui. Foi um trabalho conjunto que alegra qualquer alma, mesmo uma penada ou empenada. Mais umas quantas não sei fotos a memorizar este momento de beleza e crepitação na alma, bebendo a última birra NGola ainda bem geladinha. Depois lá lembro, tristemente, que a gente tem de arrancar que hoje é dia 1 e amanhã é dia 2 e eu tenho de estar lá. Tenho encontro marcado há 29 anos e não posso perder. Marcado com tanta antecedência que ficava mal comigo mesmo se eu faltasse. 29 anos! Mesmo sendo a descer o Tico lá ia no seu passo de caracol em dia de sol. Eu sei que culpa não era dele. Vais ver ele tem alma e o pedal do acelerador está como que perro e não dá para carregar mais. Filmo toda a serra, todos os centímetros ficam registados na fita. Espero que a câmara não empeere ela agora. É uma maravilha. Um fio de água que corre, uma sombra desenhando no penhasco uma imagem surrealista. Qualquer coisa de fantástico me liga a esta paragem. A velocidade do Tico é quase como que parado. Ele também está a contemplar. Acabada a descida o Tico retoma a velocidade normal, até que pára assim outra vez. Desta vez é para admirar e comprar os Cogumelos e gindungo da Leba. Imperdíveis. Se retoma a marcha. Se reduz quando se vislumbra aquele que nos iria perseguir por um bom par de quilómetros: o Morro Maluco. Se vai registando nas máquinas os vários ângulos. Um jeep com pneu feito num buraco pede ajuda. A gente pára a dá uma mão que é como quem diz, empresta a máquina sopradora para encher o suplente que também não deve fazer muitos mais quilómetros não. Mas não há outra forma de resolver ali o problema e eles quando chegarem lá na cidade do planalto que se desenrasquem.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca
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