A Minha Sanzala

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1 de fevereiro de 2005

Senta-te e escuta

"Fio": Um café na Esplanada

carranca
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senta e me escuta Hoje, 10:20
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Conversas de Café
Senta aí, mermão, manda vir umas quantas para mim, e me escuta com toda a atenção que tens. Se não tens inventa que eu hoje estou mesmo que precisado de falar contigo. Já sei que me vais dizer, mermão, que jé te bastam os teus problemas, etc e tal, e que não queres saber de mais. Pois é, mermão, mas hoje tens de ter a paciência para ouvir, calar e pagar as que eu derramar para afogar o corpo, a alma e tudo o mais que possa afogar.Ontem, mermão, não tive tempo de estar aqui o meu segundo contigo. Falhei e não tive mesmo um segundo para saborear o perfume que brota desse zulmarinho do meu contentamento.Mas, avilo, como sabes amigos a gente não escolher por escolher, acontece, a empatia e essas coisas todas que vem nos livros nos fazem gostar mais deuns que de outros. Assim nasce a amizade e tu ficaste meu sem nenhum dos dois saber ler nem escrever. Aconteceu. Mermão, a nossa amizade te trouxe até quase que na família, por isso tens mesmo que me ouvir.Camba, estive 24 horas a dar ali no físico e no intelecto e acabo esse tempo te posso dizer que foi dia não para mim. Só faltou mesmo o céu cair, esse zulmarinho afogar-me. 24 horas depois saio com a sensação que não foi feito nada. Custa mesmo, mermão ver 49 pessoas, dos 20 aos 92 anos, estendidos num corredor onde faltou só nevar, deitados na macas, sem privacidade, sem dignidade, sem ter tempo para mostar um sorriso, dar uma palavra amiga, senti-los. Mermão, ontem que acabou à pouco, foi para mim um fim do mundo. E nota, mermão que não era eu que estava deitado.Manda vir mais umas muitas porque preciso mesmo afogar-me.Pois é, mermão, custa mesmo muito ver um fim do mundo acontecer num corredor gelado, de temperatura e calor humano, porque um homem não é de pau. Tem dias mesmo que eu não devia ter acordado, e te digo, mermão, ontem foi esse dia. E sabes, mermão, não tive a capacidade de dar a volta na coisa, não consegui parar a desumanização, não consegui minorar um sofrimento porque logo outro era criado.Deixa-me aqui a afogar-me com a vista desse zulmarinho gelado que me faz deslizar o pensamento se já estás farto de me ouvir. Pronto, avilo, sei que amanhã recupero e podemos falar de sonhos e imaginações, mas hoje estou mesmo saido do inferno, queimado por mim e raivado em mim.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca

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