A Minha Sanzala

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8 de março de 2005

Na curva da estrada

"Fio": Um café na Esplanada

carranca
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Hoje, 18:00
Forum: Conversas de Café
Mermão, como hoje é dia especial para as Mulheres te vou contar uma estória que lhe chamo: Na curva da estrada. Assim, mermão, enquanto me ouves e olhas o zulmarinho que te transporta para o filme, vais pagando umas e outras. Não me deixes ficar seco que assim eu desconsigo de ver o fim.A chuva batia forte no vidro do carro, colorindo de cinza a paisagem, qual nevoeiro que impedia a visão magnífica das montanhas e falésias que se debruçavam sobre as praias. A tarde caía rapidamente e Lucilinda já estava com medo de ter que viajar noite dentro para atingir o lugarejo onde havia planeado passar alguns dias de suas merecidas férias. De repente, atrás de uma curva traiçoeira, daquelas que parecem ter sido acabadas de fazer só mesmo para chatear, dá com uma enorme barreira que impedia a passagem. O pé deslizou fundo no travão logo que a vista registou o perigo, mas não foi possível evitar o susto, o pânico e sei lá mais o quê que até dava para molhar o banco do carro.. Quando outro carro parou, logo atrás, Lucilinda ainda tremia muito e se sentia sem capacitada de sair do banco. Um homem saiu do carro e bateu na janela de Lucilinda. - Tudo bem? Não está ferida, está? - Não, não -- gaguejou Lucilinda. -- Mas, puxa, que susto! E que contratempo! Como vamos passar? - Ah, não vai dar, não -- avisou ele. -- Conheço esse problema faz tempo. Olhe, se quiser pode passar a noite em minha pousada, perto daqui. Amanhã já terão limpo a estrada e poderá seguir a sua viagem. Lucilinda suspirou. Não via outra saída. Voltar parecia-lhe pior e o homem parecia confiável. Olhou de novo para ele. Só agora notava como era bonito, com aqueles olhos azuis e os cabelos negros caindo na testa. Devia ter uns trinta e poucos anos e se vestia de maneira jovial, com calça jeans e t-shirt azul. - Tudo bem. Onde fica a pousada? - Temos de voltar atrás uns dois quilometros e apanhar a estradinha de acesso à pousada. Siga-me, por favor. Pouco depois Lucilinda estava acomodada numa deliciosa hospedaria, satisfeita por ter resolvido tão bem o seu contratempo. Felizmente havia encontrado João, o anfitrião, um dos homens mais gentis que já conhecera. As nuvens tinham desaparecido e uma enorme lua cheia clareava agora a praia e prateava as águas daquele zulmarinho. Na varanda, Luci era uma romântica espectadora do show da natureza no silêncio daquela praia isolada entre dois morros. João aproximou-se para compartilhar de seus instantes de descontração. Vamos até a praia? -- convidou ele. Vamos, sim -- aceitou Lucilinda. Foi delicioso caminhar pela praia ao luar, pés descalços na areia, ao lado daquele homem excitante, entregando-se a uma sensação de liberdade nunca por si vivida. Como era possível que um incidente quase acidente a trouxesse tão depressa ao mundo dos sonhos? Sim, porque João era uma figura de sonhos, que o dia seguinte tornaria real, instalado num mundo ao qual ela não pertencia. Quando sentiu que o silêncio tomava o caminho perigoso do clima de magia que envolvia os dois, Lucilinda pediu licença e se refigiou-se no seu quarto. Já deitada, suspirou, qual adoleceste. Ah, como teria sido fácil entregar-se ao romance convidativo que o momento sugeria. Mas não, não podia. Amanhã iria dali embora e não mais veria João. Se ficasse com ele, como ele lhe pedira ainda há pouco, antes de se despedirem, seria apenas para viver uma aventura. Ao final das férias breves de uma semana, voltaria para casa, para o marido que lá deixara, tranquilo e confiante. E João seria apenas uma lembrança, como aliás era preciso que fosse. Apagou a luz e afastou os desejos proibidos embalando-se num sonho carregado de magia. Bem, mermão, agora podes colorir o filme, dar um beijo na companheira e esperares que o sonho seja mais real que a realidade.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca

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