Me vens dizer que aqui a areia está molhada, que gruda nos pés parece tem cola, faz impressão nos dedos e coisas e tal. Que a praia é para outras gentes, que o zulmarinho isto e aquilo, te causa arrepio que até faz tremer a coluna mais vertical e te dói a coxa deste pesado caminhar. Mas aqui não tens a têvê que te faz paralisar os olhos, te arrepia e te mostra as coisas mais cinzas da vida que está a passar tão rápido que a gente está aqui e está a dar os pêsames a ela num ápice. Tu aqui, na ajuda do silencioso marulhar do zulmarinho se espreguiçando na areia, podes cantar e podes sorrir, podes sonhar e navegar, podes ser as tuas fantasias que se alguém te olhar te vai dizer apenas que estás feliz. Guarda esse fato velho num sótão, atira para o lixo essa carranca triste e enrugada em que se tornou a tua cara. Anda sentar aqui, falar mesmo que seja no silêncio dos lábios. Vem porque aqui tu és mesmo tu, o teu eu que está lá dentro à espera de um dia ser largado e no teu rosto martirizado pelo tempo volta a aparecer o sorriso, a criança que nunca deixaste de ser porque dentro da gente existe sempre, muitas vezes bem escondido, o nosso lado infantil. Só de olhar na tua cara eu estou a ver as perguntas que estás a fazer dentro de ti. Esse gajo loucou de vez, cacimbou, fundiu os fusíveis visíveis e invisíveis ou anda a fazer coisas que já não tem mais idade. Mermão ou mermã, eu simplesmente libertei-me de prisões, elevei-me num patamar de sensibilidades, numa palete de cores vivas e transformei o cinzento em arco-irís. Tudo, mermão foi nas minhas caminhadas aqui ao lado do zulmarinho, tudo foi aqui nas estórias que conto e ouço, que invento ou deliro.
Sabes que dá arrepio só de lembrar que nesta vida que vivo, posso passar ao lado de coisas que eu devia de saber e só mesmo por falta de tempo ou cansaço eu não vou saber?
A nossa vida, quando vivida empoeirada, está só mesmo à espera de um empurrãozinho para se desequilibrar perigosamente para o lado falso da encarnação. Aí, sais dessa encadernação e viras folhas de memória.
Tá na tua cara mais uma pergunta: se é que eu virei filósofo?
Quem sabe, mermão. Neste caminhar encontrei certezas, descobri dúvidas que procuro tirar a limpo como que a fazer os trabalhos de casa dos tempos de infância. Tas a ver como aqui se encontra o equilíbrio do mim e do eu?
Aqui não tens a pressão de ver se a novela vai começar, se o golo foi ou não foi. Aqui vertes umas e outras, falas, calas e ouves, nos respeitos dos silêncios, nos olhos trocados, esboço de sorriso. Aqui, mermão, foges do fingimento de fingires que és outro. Aqui, no perfume da maresia, podes ser tu que ninguém tem nada com isso. Fazer mesmo mais como? Sendo só mesmo tu!Tas cansado? Senta aí um pouco, verte mais uma para te olear as ideias. Respira o ar que vem desde lá do início dele
Sanzalando
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