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20 de maio de 2024

meus retalhos 28

Era madrugada. Estava encostado a descansar o corpo. O cérebro fervilhava de imagens que vinham através dos sons. Era a máquina de café da enfermaria, era o elevador que subia ou descia, qualquer coisa trazia-me à ideia trabalho. Dizia-me que era a adrenalina mas eu sabia era a ansiedade de a qualquer momento chegar qualquer coisa e eu não estar à altura. Mas todas as noites de urgência eram assim. De dia nem tanto, mas o silêncio interrompido da noite tinha destas coisas.
Toca o telefone. Vá que descer porque chegou um acidentado e é preciso autorizar o pedido de TAC. 
Mais gritos na porta de entrada. Todos correm e gritam por mim. Também corro. Um fiat uno parado á porta da urgência, portas abertas e gritos. Muitos gritos. Ninguém a consegue tirar do banco de trás do carro. Ela irremediavelmente grávida com contrações de parto e histericamente agarrada ao que podia. 
 - Ok. Queres parir aqui, a gente faz o parto aqui. disse-lhe eu com a voz mais cândida no sentido de arranjar um momento de calma para a tirar dali. Nada. Mais gritava e mais se agarrava. Rasguei-lhe as cuecas e ao observar vejo já um couro cabeludo .
- Meninos, tragam-me lençóis e chamem o pessoal da obstetrícia - digo eu para o pessoal que me observava.
Ajudo a pôr a criança cá fora, embrulho num lençol e ponho-o na maca e já a consigo trazer para fora do carro.
- E agora quem me paga a limpeza do carro. Vem um gajo para o hospital e fazem esta merda aqui na rua.
Ainda hoje estou para saber o que é que o sogro fez ao carro, à nora e ao neto.


Sanzalando

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