A Minha Sanzala

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2 de fevereiro de 2006

Uma estória verdadeira(52)


Conversa servida à volta da mesa alguém diz que amanhã é dia de trabalho e todos respeitamos essa coisa pelo que lá para as duas fomos para a cama. Para variar seria uma noite curta. Mas não é que a gente já estava mesmo habituado? Levantados depois dos que iam trabalhar, esperava-nos um lauto matabicho. Hum, acho que o Tico vai ter que ter reforço no regresso à selva Luandina, por levar carga a mais. Mas isso é mesmo problema do Tico e ele que lho resolva quando for hora disso que agora nem pensar. Saídos de casa, outro casal de ventos novos, que arrumaram as bicuatas e regressaram à terra que lhes viu nascer, nos foi buscar para andar por aí pelo que primeiro fomos mesmo que direitinhos à casa que me viu nascer. Está em obras de melhoramentos assim como a loja que lhe ficava colada e onde eu muitas vezes cortei o bacalhau com aquelas facas que estão presas no balcão e que mais parece guilhotina. Fotografia para marcar o feito e seguimos para beber uma bica no Café da Huíla. Café que está na moda, que fica ali para os lados da casa onde que eu nasci, antiga estrada da Mapunda. Será que ainda se pode ir por aqui? Esqueci perguntar e hoje ainda não sei. No café, que me parece é novo, gente conhecida de outras épocas. Abraços e cumprimentos. A família como está? E fulano? E Fulana? E assim sucessivamente que até parece que foi ontem que eles não sabiam que muitos já não estão aqui para me ler ou me ouvir contar as estórias. Agora vamos direitinhos na Lage que era onde morava o patriarca da família e onde o respeito ficava sempre muito bem, porque ele era kota mas não era burro para ir nas nossas conversas de adolescentes inconscientes. Eu sei que várias vezes ele foi na oficina porque o carrão dele gastava bué combustível. Mecânico sacana lhe ensinou a marcar os quilómetros à noite e confirmar de manhã e ia ver que o carro até parado onde ele deixava andava que se fartava. Assim terminou de forma abrupta umas inocentes saídas à noite. A casa está que nem antes, só mesmo o telhado foi mudado. Ao lado lhe construíram uma sede de um clube e como o apontamento cerebral foi levado pelo vento das emoções posteriores já não lembro. A bomba de gasolina do Vasco Gouveia ainda lá está e a funcionar. O Muro da esquina que era assim como que o ponto de encontro de vários cambas que dali partiam ou para sítio nenhum ou para a Senhora do Monte ou para outras vadiagens estava também em obras pelo que não pude matar as saudades de estar sentado à esquina debaixo da mangueira que ainda lá está a dar de borla a sua sombra. Para os lados da casa do Leitão cresceu uma outra cidade de barro e zinco impedindo de fazer o caminho até à Senhora do Monte como nos antigamente na vida. Mas agora também tem o Tico para levar a gente. Nos outros tempos era mesmo o caminho que mais dava jeito. Até para ir na Pousado do Turismo ver alguma garina, algum carro de corrida ou mesmo para jogar à bola no campo inclinado que lhe ficava ao lado. Assim sendo lá fomos no Tico ver a minha amada Senhora do Monte. Parámos onde eu nunca havia parado. No parque de estacionamento da piscina. Nunca lá me tinham levado antes de carro, era sempre a butes que o físico era outro e ela também ia a pedantes. Ela que morava um bocado abaixo da casa do meu grande kota, na descida que ia dar na Igreja da Lage onde um padre de cabelos compridos e motoqueiro dava missa com conjunto de música rock e tudo. Não sei se iam à missa pela música, se pelas garinas se pelo que fosse ela estava cheia nos sábados à tarde.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca

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