Às vezes dou comigo a falar sozinho num até parece estou a gravar um discurso. Parece mesmo mandei uns copos para baixo e de voz arrastada vou falando como se estivesse a gravar para mais tarde recordar. Mas juro que não estou com os copos, porque não bebo. E apenas por isso.
Na verdade eu devia estar a ler. Isto é, eu devia escrever primeiro e falar depois. Te confesso que enrolo as palavras apenas para ganhar tempo para não falar num assim à toa parece eu estou louco, já que não estou bêbado porque não bebo.
Bem, não discurso sobre angustia, não guardo para a posterioridade a nostalgia, não retrocesso no querer e não avanço no fazer porque não quero nada de nenhuma destas coisas. Futuro só a ele pertence e mesmo assim tenho dúvidas que o próprio futuro saiba o que lhe resta de futuro.
Mas eu falava e falava num não mais parar era sobre quê?
Já sei. Era a dor. Chata que é a dor. Não, não e não outra vez. Não era sobre dor que eu falava. Ela é chata e sobre isso eu não falo, não rascunho e muito menos escreveria.
Lá estou eu a falar sozinho como que à procura de alma gémea. Pôpilas, aturar um já me dá um trabalhão quanto mais dois iguais. De almas também não falo.
Ciúme? Ciúme é uma paixão diferente, é uma coisa assim a dar para o bravio, para o incivilizado. Foge. Daqui também não sai discurso porque não estou para levar com a minha possessividade toda e ainda sair a rir de cara feita bolacha dalgum chapadão numa qualquer esquina da vida.
Falarei de coração. Do sentimental, não do cardíaco que mata. Também não, que o outro também mata e faz doer e eu perdi as palavras dele num vale de caídos qualquer.
Falei, falei e não disse nada, como tem gente que conheço por aí.
Às vezes até parece eu estou a gravar uma dialéctica poética sem métrica só para dizer para me deixares estar ao teu colo porque tenho frio.
Sanzalando
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