recomeça o futuro sem esquecer o passado

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31 de março de 2007

Nada é por nada (2)


Aproveitaste o tempo para pensar que nada nasce do nada? Então, continuemos a nossa caminhada, assim como assim os passos são para gastar e não vale a pena estar a olhar para nada, quando há tanto que podemos ver.


Porquê mesmo temos de ter resposta para todas as perguntas?


Quando um homem encontra uma mulher, quando uma mulher encontra um homem, é porque os dois se estavam à procura. Por solidariedade, por saudade, dor ou por quererem insuflar de oxigénio as suas vidas.


Mas porque é que temos de ter uma causa e o respectivo efeito?


A casualidade não existe e nada acontece por coincidência.


Ouve o marulhar, sente a maresia, apalpa a solidão de estarmos aqui calcorreando esta areia das mil cores e te pergunta se é por acaso que aqui estamos? Calhou nos encontrarmos aqui? Desde quando tens vindo a aproximar-te, desde quando eu esperava que tu chegasses? Porque não seguiste outro rumo, não foste a outra praia, a outro mar? Porque pensas que eu me detive à espera que tu chegasses? Quantos passos deixei de dar para que te aproximasses? Quantas palavras calei para as falar quando tu as ouvisses?


Coincidências?


Não!


O somatório das nossas vidas é que nos levou até aqui, cantinho de intimidade extrovertida na razão da nossa existência.


Poder abraçar-te com as minhas palavras, com a minha ternura afagar-te num despertar de ideias e pensamentos. Eu precisava falar e tu sofrias por não ouvir-me. Precisávamo-nos de despertar, de deixar de estar sós.


Já sei que me vais falar nas noites compridas, intermináveis, que nos atormentam, que nos fazem deitar lágrimas que dariam para encher o zulmarinho.


Essas noites existem por somatórios de negações que fazemos, medos que não exorcizamos, fantasmas que teimamos em alimentar.


Às vezes estamos sós porque não olhamos à volta, porque não fizemos aquela chamada, porque não demos aquele passo, não dissemos a primeira palavra, porque não construímos a ponte. Ninguém encontra o que não procura.



Sanzalando

Figurado Português 4


30 de março de 2007

Nada é por nada (1)

Já viste que neste caminhar eu falo, salto de palavra em palavra, assunto em assunto, desconectado com a realidade que há para além das margens deste final de zulmarinho. Não é opção, não é premeditação. É o eu mesmo ser assim. Salto de vida em vida fazendo a minha vida de um somatório de vidas.

Sabes bem que as coisas não aparecem do nada. Mas se vires chover, uns dias depois dela parar vês uma linda flor – beleza é relativa – num aparente deserto, onde não havia sinais de nada. Estava ali uma semente, se calar há uma eternidade, à espera das gotas dessa chuva para se transformar nessa harmoniosa flor. Seja que flor for, num deserto fica sempre bem.
Portanto, as coisas não aparecem do nada.

Agora caminhemos a olhar para a linha recta que é curva e imagina-te a fazer equilíbrio sobre ela, num constante desequilibrar para o lado de lá. Não é por acaso. Será por opção? Será por desequilíbrio mental? Será porquê mesmo? Decerto não é por acaso!

Vamos. Caminha ao meu lado e pensemos no íntimo do nosso silêncio.

Sanzalando

Figurado Português 3


29 de março de 2007

Borbulhas de tempo

Anda. Vamos neste passo lento respirando o vento que nos entra no corpo, sabor a mar. Acompanha-me neste caminhar de palavras.

Às vezes passa muito tempo sem fazeres o que gostas, de imediato o nada que te rodeia te envolve de tal forma que até parece entraste numa borbulha, e te leva a pensar que não existe mais nada lá fora, que não merece a pena ver o que se passa lá fora. Entras num supor que te parece dar prazer, acabas adormecendo um sono profundo em que o pensamento é vazio, transbordante de nadas.

Quando acordas, a borbulha se rompe, as coisas te parecem diferentes, têm cor e texturas que parece nunca tinhas visto antes. Existem estações do ano, dias da semana, noites de luar.

Então dás contigo a pensar onde estiveste todo este tempo…




Sanzalando

Figurado Português 2


28 de março de 2007

Afinal de contas


Anda, me acompanha novamente neste caminhar à borda do zulmarinho, num vai e vem sem parar. Eu falo e tu ouves. Se não te apetecer ouvir-me ficas no teu silêncio interno e olhas a linha recta que é curva numa introspecção que só a ti diz respeito. Eu respeito-te como sei que respeitarás eu não me calar, mesmo que não te diga nada, mesmo que não ouças nada.

Tu sabes, se é que me estás a ouvir, que as batidas do coração indicam se estás ou não agitado, se te importuna alguma coisa real ou fictícia, a tua respiração se torna ofegante na exigência de ar que mais não serve para te fazer fluir oxigénio até ao cérebro. Respiras sem sentires que o fazes, mas sentes os efeitos através duma maior capacidade de colocares os neurónios mais activos, mais alerta.

Te apetece gritar mas o som é abafado pelo marulhar das ondas se espreguiçando na areia.

As tuas pernas parecem que não são tuas, os teus braços parecem carregam toneladas de coisa nenhuma. A tua visão se torna nublada, não consegues focar os horizontes.

Afinal de contas estamos à beira do zulmarinho e temos a capacidade de poder sonhar com as coisas reais e com as coisas que só passam pela nossa cabeça.

Afinal de contas a realidade e a ficção se podem misturar, os amores e ódios se podem pesar ou comparar.

Afinal de contas somos invenções dos nossos cérebros.

Afinal de contas os nossos sonhos são as nossas baterias, estímulos e placas orientadoras dos espaços siderais.

Ficaste aí siderada por alguma razão especial ou foi mesmo porque te lembraste de me ouvir quando me calei?




Sanzalando

Figurado Português (de santos e diabos está o mundo cheio)


27 de março de 2007

Na dúvida de ter a certeza

Na dúvida de ter certezas, começo a falar-te enquanto caminho à beira do final do zulmarinho, palavras soltas, aparentemente sem continuidade. Pareço mesmo as ondas desse mar que se atira na areia sabendo que terminam aqui a sua existência. Eu sei que sou eterno enquanto existir. Depois, bem, depois logo se verá. Se por um lado eu tenho a certeza que tenho algo seguro e certinho, por outro eu tenho a dúvida e a oportunidade de viver um turbilhão de emoções de cores e formas.
Quando eu digo que é assim a minha escolha logo surge outra questão no meio que me faz rebobinar os pensamentos e filtrar tudo num novo filme de sensações.
Já sei que a certeza é tranquila. Sempre me disseram que mais vale um pássaro na mão que dois a voar. Mas será que o pássaro quer mesmo ficar preso nesta mão? Se calhar eu estou a fazer com que o pássaro termine aqui a sua existência e perca a oportunidade de seguir um seu qualquer outro voo. Por outro lado eu tenho a dúvida, alguma coisa totalmente subjectiva, em que a minha intuição me diz que o dar certo é só uma questão de tempo.
Mas se a minha intuição estiver errada?
Bem, feita a soma das parcelas, eu tomo a opção de ficar com ambas. Fico com a certeza de ter dúvidas e assim continuo a minha caminhada no perfume da maresia.

Sanzalando

Texturas do tempo 25


26 de março de 2007

Afinal ainda é hoje que te falo

- Oi, tenta!
dizes-me tu com vontade de me ouvir.
- Nem oito nem oitenta…
te respondo eu com vontade de estar calado.
- Sábado, Domingo e Segunda sem dizeres nada?!
Eu sei que te habituei mal, penso cá para mim… mas na verdade aproveitei estes dias para ir dar um abraço amigo aos amigos, dar-lhes a minha voz ao vivo e a cores sem ter decorado nenhum discurso de circunstância.
Assim, fui calcorreando terras, distribuindo palavras, apertando abraços.
Fui, sem pressas nem hora marcada. Simplesmente indo!
Agora chego, alma tranquila, mente aberta e corpo cansado e tu ainda queres que eu te conte uma estória que mesmo que não tenha acontecido não deixa de ser verdadeira? Deves estar a brincar comigo…
- Vã lá, uma palavra só – dizes-me tu com voz doce de quem a trabalhou para estas ocasiões.
Na verdade, para surpresa minha, inibe-me ir interromper este meu silêncio com palavras soltas atiradas ao acaso.
- Olha, te vou falar mesmo uma estorinha verdadeira. Tem aí um blogger, Estados Gerais, que não sei por carga de água, um dia descobriu que eu existia nestas estórias de além e àquem mar. Hoje fiquei a saber que tanto eu como ele somes de carne e osso. Estivemos uns minutos, que o tempo era mesmo só uma passagem, num frente a frente. E sabes que mais? Gostei mesmo de lhe ter conhecido e com vontade de um dia combinar com ele e estar mais tempo num blá-blá de raízes que passam das simples palavras aos altos pensamentos. Tas a ver, assim como as cerejas.
Prontos, outros dias virão…

Sanzalando

Texturas do tempo 24


23 de março de 2007

Me apetece olhar o zulmarinho (3)

Ainda no aconchego de poder ver a linha recta que é curva como a querer marcar o limite do zulmarinho, mas que eu sei que ele continua muito para além dela, começando bem depois da linha que divide o mundo em dói e que parece é paralela a esta linha recta que é curva, continuo na minha meditação. Não levito, mas a espiral do meu pensamento não pára de me sustentar muito para além dos limites do sonho que ficou por realizar e que eu sei que um dia deixará de ser sonho para ser realidade. Nesta levitação pensativa continuo a ver os nomes, escalonados numa ordem arbitrária e anárquica.
Que será que é feito desses nomes. Sim, porque alguns ficaram apenas nomes soltos.
Já sei porque já disse que me tornei numa má pessoa, desnaturado, despreocupado, no que respeita às amizades. Mas a verdade também que o meu feitio não é mais que estúpido. Eu sei e admito.
Quantas vezes me dou a falar-me no que eu te vou falar se tu também não me falas, e deixo-me arrastar por razão inexistencial. Mas o mais estúpido é pensar que eu nunca vou precisar de ninguém, quando verifico, todos os dias, que se não fossem essas pessoas todas, desde os tempos de bibe e sandálias de pneu até às de hoje, eu me teria resumido a uma insignificância insignificante.
Afinal de contas tudo isto para mostrar o meu arrependimento e poder dizer um muito obrigado a todos, mesmo aos que me tenho esquecido mais amiúde, às que me recordam, às que me falam, às que não me falam, às que sabem que eu existo na carne e no osso e às que mesmo não sabendo que eu existo se não através das estórias que a minha voz lhes vai contando.
Até um dia destes que pode ser amanhã, ou não, logo se verá, que por agora fico a contemplar o zulmarinho algures por aí.

Sanzalando

Texturas do tempo 21


22 de março de 2007

Me apeteceu ver o Zulmarinho (2)

Continuo sentado a olhar o zulmarinho com olhos de ver ao longe, deixando-me arrepiar pela brisa que de certo vem dum pólo qualquer antes de chegar aqui.

Água gelada, vento gelado.

Que é mesmo o que faço aqui? Faço enredos nas teias dos pensamentos.

Mas me dá paz olhar esse zulmarinho, me dá calor ver a minha história nas estórias que enredo e com a música do marulhar me envolvo na revivência da vida vivida.

Recordei nomes, caras e algumas emoções. Mas, como é da lógica, nenhum desses nomes é importante para a continuação da minha vida futura, mas reconheço que foram importantes nesse passado que não registo em nenhum álbum de fotografias, que não estão gravados em salvas de prata ou diários de um bordo de adolescência.

Na verdade não penso muito neles, alguns quase nunca, mas há dias assim, que chegam num repente e me dá a curiosidade de querer saber deles, que gostava apenas de os ver, que gostava de estar com eles e sem as conversas sérias que nunca tivemos.

Eu sei que me tenho tornado numa má pessoa, desnaturado, despreocupado, no que respeita às amizades. Simplesmente não lhes falo e às vezes me vão falhando os apelidos, às vezes os nomes e algumas vezes as caras.

Tudo isto porque ando muito ocupado comigo, só penso em mim e nos meus problemas, ou então não me apetece falar, ou quando vou tentar digo para mim que não vale a pena, que não há assunto para além do tudo bem e eu responder que sim e continuar numa banal conversa de vazio conteúdo, sendo certo que eu não gosto de encher os outros com os meus problemas e não estou com vontade de ouvir problemas mais em cima de mim. Reservei-me o direito de ser reservado. Distanciei-me e reservei-me, e isso faz de mim uma má pessoa em relação às amizades.

Na verdade, aqui, junto ao final do zulmarinho, ressalta-me o arrependimento, salpicam-me gotas dele que rolam pelos meus olhos abaixo.

Hoje vou-me levantar daqui e regar as flores do meu jardim




Sanzalando

Texturas do tempo 20


21 de março de 2007

Me apeteceu hoje ver o zulmarinho

Quando abri os olhos depois de ter dormido, vi que o sol estava ali a meia haste como a dizer-me para ir ver o zulmarinho. Lhe obedeci num sim nostálgico.
Ele marulha aqui igual que nem lá, mesmo que a cor e o seu calor não sejam mais parecidos. Também é verdade que ele arrefece de tanto andar para chegar aqui.
Me sentei na areia porque a brisa parecia eram canivetes a me cortar a pele a cada passo que eu dava. Me aconcheguei em mim e colei os olhos no vai e vem das ondas, embalado no marulhar.
Como eu gostava de estar agora com as pessoas que fui perdendo o contacto ao longo do tempo.
Lembro-me assim num repente do Rui, o filho da D. Beatriz Miranda, que foi o primeiro grande amigo. Brincávamos muito e não me lembro se no meio da nossa amizade alguma vez existiu uma conversa. Na verdade também ainda nem sabíamos falar as palavras mais sérias. Tudo era simples. Uma qualquer coisa apanhada na rua era o necessário para o início de uma brincadeira nesse mesmo lugar. Ambos tínhamos muito jeito para jogar à bola, só jogando quando a bola era mesmo nossa propriedade ou faltava mais alguém para dar certo e não dizerem que ganharam porque tinha mais ou menos um, como se nós fizéssemos parte dessas contas. A bola nos atrapalhava a ambos e nós atrapalhávamos os outros. Mas nunca falámos sobre a importância que isso teve nesses tempos.
Recordo o Zé, filho da Fernanda Corado, eléctrico, culto, sempre a pensar onde ia aprontar mais uma das dele. Não me recordo se alguma vez falámos das coisas que não as da rua. Lembro-me do Pedro, filho da D. Fernanda, professora na Escola. Lembro-me do criado dele, o Acácio, que num dia de nevoeiro fez ao contrário do D. Sebastião. Desapareceu. O Acácio era mesmo bom de jogar à bola e tinha muita força. Acho mesmo, embora nunca lhe tenha visto, ele fazia musculação nas escondidas da gente. Não me lembro de nenhuma vez termos posto cara séria para falarmos. É verdade que foi com o Pedro que eu fui pela primeira vez à Praia Azul. Era longe ali tão pertinho.
Me veio à memória assim num repente o Douglas, filho do Santana, que sendo mais novo entrava nas nossas brincadeiras com a simplicidade dos seus verdes anos.
Passam-se imagens de festas de aniversários em que as casas pareciam não ter espaço que chegue para acolher tanta alegria que se juntava. As portas ficavam abertas e era um entrar e sair, o buscar da gasosa e doces e sem perder tempo voltar para a brincadeira de rua.
Recordo, recordo, recordo. Os nomes passam na minha memória como o genérico de um filme.
Recordo que a única grande responsabilidade era fazer os trabalhos de casa. Feitos a correr para não perder tempo de rua.
Brincar, brincar, brincar.
Era doloroso, angustiantemente raivoso, ouvir os berros da minha mãe a me chamar para o banho. Nem me apercebia que se passava igual com os outros nesse mesmo tempo.
Como era bom poder bater na porta dos outros e desafiar para as brincadeiras de rua.
Como foi bom ter estado sentado a ver o zulmarinho nos primeiros raios de sol.

Sanzalando

Texturas do tempo 19


20 de março de 2007

É a vida

O sol vai nascendo de forma tímida. Nem ainda é aqui primavera nem eu estou virado para o lado em que ele nasce. Mas se notam os seus raios porque à minha frente vejo sombras. E eu já não tenho medo das sombras.
Ainda não são horas de caminhar à beira do zulmarinho ou estar sentado a admirá-lo. Há horas para tudo e muitas vezes faltam horas para nada.
As nossas vidas são ciclos. Uns abrem e outros se fecham. Tudo tem um início e um fim. Tal como a lua, a vida é feita de fases.
A única coisa que sei é que os meus despertares agora serão mais alegrs, mais coloridos, mais cheios de vigor. Os próximos serão os melhores amanheceres, porque os passados ou já me esqueci ou faço por isso e como o próprio nome indica são passados.
Fiz a barba. Limpei os óculos, vesti roupa colorida e formal. Penteei-me.
Não tenho escapatória. Agora é que é. Novo ciclo, vida nova. Tremem-me as pernas. Vício do passado ainda não ultrapassado. Mas olho em frente, sem ser com o olhar tímido e ar de medo de ter dúvidas. Decidido é o termo certo. Ferve-me a vontade no peito.
Inicia-se uma nova rotina que se fechará um dia num novo ciclo de vida.
É a vida!

Sanzalando

Texturas do tempo 18


19 de março de 2007

Só se sabe o que se tem quando se perde

Há um ditado qualquer que diz que a gente só sabe o que tem quando o perde. Se não existe este ditado ele passa a existir pois é assim que eu quero e mais nada. Não me apetece andar a fazer buscas na Internet, uma vez que quando faço uma busca perco-me em centenas de coisas importantes, mas que não naquela exacta altura e eu agora não me quero perder. Se eu pensei na frase é porque ela existe, pois eu não sou de inventar frases feitas.

Mas dizia eu que só se sabe o que se tem quando o perdemos. Isto pode dizer respeito à saúde, dinheiro e milhentas outras coisas que não vou enumerar pois isto não é nenhuma folha de cálculo ou lista de supermercado. Usem a imaginação que é um bom exercício.

Quantas vezes nos apercebemos que temos algo, que nem imaginávamos possuir, e não sabemos expressar a gratidão por o ter?

Quantas vezes não damos o abraço quando alguém o necessita e quando o vamos quer dar já não fomos a tempo?

Isto tudo porque tenho consciência que vou perder algo de muito valioso num breve espaço de tempo. Algo que me é importante mesmo!

Agora estão a pensar que eu volteei os pirolitos, que virei futurologista e outras coisas similares para não dizer pior.

A verdade verdadeira é que não é nada disso. Todos nós perdemos diariamente algo de importante. Quanto mais não seja tempo.

Eu só quer é ter consciência do que tenho antes de perder. Por isso hoje decidi dar um abraço aos muitos amigos que aqui passam a ouvir-me falar das coisas simples da vida complexa.

Isto tudo porque está a amanhecer um dia de sol.


Sanzalando

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Texturas do tempo 17


16 de março de 2007

Voltarei 2ª feira

Obrigado por estares sempre aí e perdoa-me de ainda não te confiar a minha existência, de não te ter mostrado a minha lealdade, não te ter dado todo o meu carinho.
Pois é, hoje o vento levou-me as letras, deixando-me só esta vontade de ter dizer estas palavras.
Tem dias assim, nesta solidão de monitor e teclado, ficam os sentimentos fechados em copas e as palavras são de imediato levadas pelo vento…
Voltarei 2ª feira. Volto, volto!
Bom fim de semana.


Sanzalando

Texturas do tempo 14


15 de março de 2007

Valeu a pena


Vá lá, esperemos que amanheça num amanhecer de sol, mas façamos algo de útil, alguma coisa que nos dê prazer, que nos faça feliz no instante deste momento.


Se eu tivesse um espelho para olhar-me, ver as curvas da cara se vincarem numa marca indelével do tempo, que abstractamente não existe porque o tempo é real, e ver-me sorrir porque me sinto feliz.


Depois de uns tantos anos de sonhos e fantasias queria olhar-me e ver se valeu a pena, queria perguntar-me se é o destino que me conduz ou se é a força de um trabalho que me alcançou até aqui. Queria ver-me, numa de cara a cara, e saber se o desejado tinha sido alcançado e se por algum motivo eu devia estar arrependido dos caminhos até então percorridos.


Sem o espelho eu imagino que o esforço das vontades confluíram até este momento em que sorrio porque estou feliz. Sem o espelho penso que valeram a pena os anos, os dias e as noites de insónia.


Esse lugar que me persegue nas horas que têm os dias está ali. Espera-me. Eu lhe olho outra vez desde longe. Experimentei-o, saboreei-o, vivi-o. Cresci, amadureci e aprendi. Sem o espelho digo-me que valeu a pena, mesmo que eu me sinta prisioneiro dele. Mesmo que a força dos meus desejos arrastem para longe as moscas que, num equilíbrio instável, pairam sobre a minha cabeça como se fossem helicópteros tentando ler-me o pensamento. Mesmo que os meus suspiros façam acinzentarem os castanhos cabelos que ainda teimam em resistir. Mesmo que o sorriso fácil tenha dado lugar ao esboço e eu me sente sobre as piadas contadas. Mesmo que olhares confusos me olhem. Valeu a pena!


Sanzalando

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Texturas do tempo 13


14 de março de 2007

Parabens Árthemis


Aproveito este cantinho para cantar os parabens à colaboradora deste BLOG, onde os sinais do tempo mais tempo nos dão para curtir a amizade virtual que nos une e agradecer o grande enriquecimento que veio emprestar a este 'pintor' de letras, umas mortas, outras vivas e outras ainda mortas-vivas, com os seu trabalhos gráficos magníficos.



Tentei escolher um dos muitos que ela aqui tem postado para ilustrar estas palavras, no entanto tal tarefa tornou-se difícil, porque afinal são tantos os MUITO BONS que desconsegui escolher um.



Obrigado e Parabens

Sanzalando

Serenamente tranquilo



Caminho sereno em direcção aos raios de sol. Sem pressas, sem ultrapassar passos, sem galgar degraus das escadas que se me aparecem. Serenamente sereno. Um dia vai ser um dia de sol. Quem não consegue sonhar não é capaz de viver, por isso sonho com a chegada desse dia, aprendendo sempre naquilo que vejo e sinto. Serenamente seguro de mim, ausente das incertezas, caminho para que o dia chegue brilhante de sol, quente de paz interior, afagado nos carinhos entretando espalhados por uma brisa de fectos.



Caminhos com os olhos postos no amanhã sem deixar de ver o hoje e sem esquecer o que ontem vi.



Era fácil entrar nos caminhos da política, porta que se entra sem pedir licença, porém é um caminho sinuoso, beco de muitas saidas, deglutição de batráquios, jogos de cintura, maquilhagem e rostos sem expressão. Por ser fácil não me apetece ultrapassá-la, não me petece olhar em bússola para ver o quanto estou desviado do caminho pensado, não me apetece engasgar nem tenho ar de quem precise máscara. Prefiro mesmo caminhar em direcção aos raios de sol em pé firme, olhar tranquilo, sorriso na cara que se vê nos olhos.



Prefiro caminhos mais difíceis, porem mais certos, porem mais demorados.



Prefiro ver o zulmarinho, onde quer que ele esteja, sabendo que um dia, cedo ou tarde, eu estarei na sua nascente, sereno e de tranquila consciência.

Sanzalando

Texturas do tempo 12


13 de março de 2007

Let it be


Os raios de sol vão despontando lá para os lados do horizonte.
Acordei estranho. Acho durante a noite a minha cabeça rolou como bola de ping.pong de raquete em raquete e muitas vezes no chão. Verdade verdadeira.
Acordei a recordar o nome das namoradas todas que namorei, incluindo as que acabaram o namoro quando souberam que eu namorava com elas. Pois, muitas vezes estive perdida e loucamente apaixonado que nem forças tinha para lhes dizer e muitas delas. Namorava no meu interior, vivia-as no meu segredo. Se um ou outro amigo descobria, era mais certo que ter a certeza, que lá vinha o inferno e mais dia menos dia esse namoro platónico acabava assim ainda não tinha começado. Por isso até neste ramo o segredo era a alma da vida.
Mas o que é que me havia de acontecer ao acordar. Tenho coisas mais importantes que pensar. Recapitular quase toda uma viva dá trabalho e num dia assim é desnecessário. Bem que podia ter acontecido num dia qualquer onde não houvesse nada para fazer. Mas quem afinal escolhe como acordar? Eu pelo vistos não.
Durante o dia vários nomes me saltaram à cabeça assim num sem propósito. Como é que eu posso me concentrar numa tarefa se sou interrompido por mim?
Acho melhor ouvir o Let it be dos Beatles e deixar correr o resto do dia ao sabor das ondas oscilantes do pensamento. E sorrir!



Sanzalando

Texturas do tempo 11


12 de março de 2007

Hoje tirei o dia ao dia

Quantas vezes dou comigo a escrever como que a querer justificar alguma coisa. Cumpro com o meu dever de escrever, muito para além do que o que eu escrevo possa valer. E se me disserem que o que escrevo não passa de nada e pouco ficará na memória de quem possa ter lido? Creio que não ouviria isto com alegria, com satisfação, porem continuaria a escrever, nem que fosse só para mim.
Li qualquer coisa parecida com isto em José Luís Borges, faz algum tempo, pelo que reproduzo aqui de memória, estando certo que não foi bem assim que ele disse. O que me importa agora é mesmo só ter o mote e não o texto certo.
Tudo porque hoje nem para mim escrevi.
Tirei o dia para organizar as fotos digitais que se vão amontoando pelo disco rígido do computador.
Hoje tirei o dia para me solidarizar com o momento triste de um amigo (Fifer – Tabanka do Huambo) a quem faleceu o pai.
Hoje tirei o dia ao dia.


Sanzalando

Texturas do tempo 10


11 de março de 2007

Filosofando num Domingo

É, amanhece vagarosamente mas com indicação de ser um dia lindo de sol. Pacientemente me sento a divagar sobre tudo e sobre nada. Não me quero cansar de pensar, de criar os meus sonhos e balizar-me sempre para um amanhã. Prefiro, vezes mais, sentir a dor de não ter dado certo a minha primeira tentativa do que a vergonha de não a ter tentado. Não me interessa saber de como vivo, o que eu quero mesmo é saber se sou capaz de sonhar e encontrar as aspirações dentro de mim. Não me interessa a idade que vai crescendo mas sim a capacidade de me aventurar na capacidade de viver. Não me interessa saber qual o planeta que está no quadrante da minha lua, quero é saber a minha capacidade de saltar do centro da minha tristeza sempre que eu bater nele. Pouco me importa saber se as estórias que vos conto são verdadeiras ou vos comovem, quero é saber se continuo a desapontar outros para ser verdadeiro comigo, de não trair a minha alma. Não me interessa saber onde moro, quero é saber se sou capaz de fazer o que deve ser feito.
Olha só como os raios de sol rompem suavemente a aurora. É preciso ter olhos limpos para lhes apreciar.
Posso ficar ansioso, irritado, desesperado, mas não me esqueço que a minha vida é a maior empresa que existe e só eu posso evitar que ela entre em falência ou seja sujeita a uma opa hostil.
Ser feliz não é ter um céu sem tempestades, estradas sem acidentes, trabalhos sem canseiras e relacionamentos sem fracassos e decepções. Ser feliz mesmo é encontrar força na batalha, segurança no palco do medo e amor nos desencontros. Ser feliz não é espelhar o sorriso, mas conseguir reflectir sobre qualquer tristeza, sentir o jubilo nos aplausos mas conseguir encontrar alegria no anonimato, é não comemorar só os sucessos mas aprender nos desaires da vida.
Ser feliz não é uma fatalidade do destino, mas uma conquista de quem sabe viajar dentro de si.
Deixa-me sentir como brilham os pequenos raios de sol.

Sanzalando

Texturas do tempo 9


10 de março de 2007

Na dúvida culpa-se o Sábado

Deve ser hoje é sábado. Mas na verdade de toda a sinceridade não me apetece matraquer palavras. Se calhar nem isso, não me apetece pensar nelas. Deve de ser porque é sábado hoje. Mas quem é que me mandou pensar que era sábado? Ai esta cabeça também está a querer ter dias de folga. Está aqui e está a pedir décimo terceiro mês e subsídio de férias. Vamos lá a ver...
Não. É mesmo porque hoje é sabado!

Sanzalando

Texturas do tempo 8


9 de março de 2007

O meu credo

Amanhece num devagar preguiçosamente lento e eu, lentamente e com preguiça, vou acordando. Mas afinal de contas no que é que acredito? Assim num repente, sem me esforçar para não me cansar, penso.
Creio na existência dos próximos cinco minutos. Acredito na dor que sinto nas pernas pelo esforço que fizeram para me erguer da cama, creio nas dores de cabeça de aparecem sempre que não são necessárias, creio na fadiga do tempo e na busca do tempo novo, creio nas emoções e no triunfo da imaginação.
Creio que não sou um corpo com alma mas antes uma alma envolta neste corpo.
Acho que por hoje já pensei demais, é melhor recolher-me e esperar que amanheça de vez.

Sanzalando

Texturas do tempo 7


8 de março de 2007

Pontuemos

Ainda estamos na madrugada. O sol parece mesmo estar fraquinho para lhe romper com os seus raios brilhantes, mas que eles estão a aparecer isso eu não lhe tenho a menor dúvida.
Mas até que nasça o sol eu me divago devagar.
Mas onde é que eu ponho a vírgula? Se colocar ali ela muda o sentido que eu quero que ela, a frase, tenha. Se não ponho vírgula a gente até se cansa de lhe tentar ler. Soletremos. Vír gu la. Assim sem mais nem menos. O problema está em lhe arranjar um sítio onde ela esteja bem. Acho mesmo que é melhor ela lhe ficar no tinteiro. Se ela lá ficar temos duas vantagens: 1º eu não arranco os cabelos para lhe arranjar sítio; 2º poupo na tinta. Mas eu gosto tanto de virgular que me custa tomar esta decisão. Bolas para o raio da vírgula. Hoje ficamos sem a vírgula e passemos para o ponto, que mais não é que uma vírgula sem perna para baixo. E ponto. Sem parágrafo nem travessão. Mas o ponto me corta logo o raciocínio. Porque é que aqui fica bem o ponto e não a vírgula? Bolas, lá vem ela aqui outra vez. Esquece a vírgula. Agora estamos no ponto que não é rebuçado nem pêra doce. Distribuímos-lhe um lugar onde fique bem bonitinho e esquecemos a gramática. É o ponto estético. Pronto, és um ponto e como ponto que és ficas ainda mais final. Logo és o ponto final. Mas se tem ponto deve haver lugar para a vírgula. Esquece a virgula, não sejas casmurro. Estão fazemos assim, usamos o ponto e vírgula e ninguém vai levar a mal e faltar a um próximo texto. Por favor não me compliques. Eu já tinha problemas com a vírgula, passei a ter com o ponto que não era final e ainda me vais lembrar o ponto e vírgula e depois se calhar ainda me mandas com os dois pontos para não falar com as reticências que mais não são que quatro pontos sem o ponto final.
Mas se hoje é o dia internacional da mulher o que faz este texto sem contexto aqui? Não sei. Virgulei-me todo que até estou com dor nas costas.

Sanzalando

Dia Internacional da Mulher


7 de março de 2007

Palavras soltas

Estamos naquela hora em que a noite ainda não deixou de ser noite nem o dia começou a ser dia. Os raios de sol aparecem tímidos como que com medo de romper a aurora.
Na minha cabeça ainda rolam os pensamentos e as recordações dos acontecimentos. Os que aconteceram, os que podiam ter acontecido e os que eu não deixei acontecer. Conversas únicas, inesquecíveis, se desenrolam sobre a mesa, numa transparência de clarividência. Eu comigo espraio-me em palavras soltas mas bem arrumadas sob o tampo da mesa.
Respiro fundo, abrindo os pulmões como se eles fossem uma mala de viagem. Estou independente do tempo e do tempo que faz lá fora também.
Falo de recordações. Disseco letra a letra na tentativa de escolher as melhores letras, as que não me ferem os ouvidos, a alma, o sentimento. Escolho as que traduzem verdade, sem mágoas e sem rancores. Converso-me de ilusões arredondando as palavras ácidas com a saliva dos meus lábios, tornando-as importantes, porem sem feridas ou retirando-lhes a força de arma branca.
Estamos em Março e neste dia, há muitos anos atrás, eu era registado. Ainda não estamos na Primavera nem faz calor de falso verão.
Retrato-me em palavras como quem quer ver a luz entrar na janela, ouvindo-me confissões e presságios.
Chegámos ao fim do Inverno ou para lá caminhamos. Sinto-o na força do vento.



Sanzalando

Texturas do tempo 6


6 de março de 2007

As minhas metades

Olha, olha bem ali na tua frente e vais ver estão a aparecer os primeiros raios de sol. Acho mesmo está a começar nascer do sol também para mim. Vês como até já consigo esboçar um sorriso nesta cara de esfinge? São só os primeiros raios de sol. Não vá o céu se encher de nuvens e ficar assim um dia de trovoada que nem as que eu já tive.
Te vou dizer, como se fosse a última vez, que eu pensava que uma parte de mim tinha morrido, que uma parte de minha existência tinha acabado na hora de dizer adeus. Eu não existia, eu era pouco mais que o fruto da minha imaginação encarnada neste corpo deambulando ao acaso.
Eu estava de luto de mim, da minha culpa e da miséria existencial que havia dentro de mim.
Agora digo que há uma parte de mim que está mais viva que nunca, mais enriquecida porque mais esclarecida, porque mais vivida. Essa parte sabe que eu aqui, ali ou onde quer que seja, tenho utilidade, não sou moeda de troca, nem de um sorriso, nem de um olhar agradável, nem de palavra simpática.
Me tenho descoberto e me tenho visto que não sou a maldade personificada, cobardia feita gente, alma penada em busca dum corpo. Mesmo que alguém assim me queira classificar.
Sinto-me, e por acaso já sinto a paz interior. Sinto-me bem.
Mas aqui entra o dilema, esta minha parte ainda não consegue abafar por completo a outra parte, ainda não consegue tapar por completo o vazio ocupado pela outra metade.
Pronto, eu sei que não há uma vida perfeita, uma pessoa perfeita como também não há a felicidade infinita.
Mas já me chega para esboçar o sorriso, falar com a voz doce, segura e serena.



Sanzalando

Texturas do tempo 5


5 de março de 2007

Espelho da vida

Enquanto olho o céu à espera do meu nascer do sol vou vendo filmes mentais, filmes de autor, com a particularidade de estar sempre a mudar de cenário, de enredo e de cor.
Há alturas da vida em que a vida nos coloca um espelho à frente para que nos possamos ver. Nesse espelho podemos ver-nos. Quantas vezes não lhe damos conta, não nos olhamos e não nos vemos.
Faz pouco tempo, sentei-me no meu banco de jardim, não para ver borboletas, não para apanhar banhos de sol. Simplesmente porque às vezes apetece-nos estar connosco e não encontro melhor sítio que um simples jardim público.
Reparei que noutro banco estava alguém que me parecia familiar. Procurei rever todas as faces conhecidas e não havia uma que correspondesse. Porém eu continuava a teimar-me conhecer aquela cara de algum lugar. Talvez fosse dum filme. Na verdade era-me familiar, penso eu. Apeteceu-me meter conversa pois achei que seria agradável ter uma conversa com esse desconhecido mas familiar. Reparei então que ele, sozinho no seu banco não parava de falar.
É verdade que eu às vezes também falo sozinho, mas de uma maneira contida e não perceptível para outras pessoas, porque nunca em lugares públicos.
Fiz um esforço para lhe ouvir e entender. Nada percebi. A sua língua parecia-me adormecida, se calhar por efeitos de álcool em excesso, coisa que vista aquela distancia mão me parecia. Se calhar por efeitos da medicação de algum psiquiatra.
Sei lá, também não me apetece estar a fazer conjecturas que nunca poderei corrigir.
Se calhar era um génio debaixo daquela capa de extravagância. Se calhar estava a resolver um problema terrível da humanidade, teria encontrado a solução e estava ali a divulgar publicamente. E eu que não conseguia entender as palavras que aquela boca dizia.
Ele continuava sozinho no seu banco e eu sozinho no meu. Lhe olhava e não me cansava de procurar no meu arquivo mental uma cara que fosse igual àquela que ali, com sapatilhas novas de barata marca, não parava um instante no seu infindável discurso.
Será que era um momento da vida em que me via ao espelho?

Sanzalando

Texturas do tempo 4


4 de março de 2007

A noite mais longa de Fevereiro

Enquanto aguardo que nasça o meu sol, vou divagando no vagar das letras, das frases e parágrafos.
Hoje, no ir buscar de coragem ao fundo do sótão da alma, fui ver o final do zulmarinho e lhe falei as coisas soltas que tinha necessidade de lhe dizer.
Nada lhe mudou, as mesmas ondas, o mesmo marulhar, a impontualidade das suas forças no galgar espreguiçado sobre a areia das mil cores.
Lhe falei da minha noite maldita. Uma noite inteira em que me debrucei sobre mim e me falei as coisas que não estava preparado para me ouvir. Passava uma semana certa da quarta-feira das cinzas. Devia ser a quarta-feira dos infernos.
Nessa noite fui folha de cálculo, base de dados e processador de texto. Essa noite fui um escritório sobre a minha cama. Tinha ligação à Internet, intranet e outras ligações mais poderosas à capacidade fria de análise.
Nessa noite tomei o pulso ao impulso e friamente falei-me, escrevi-me e ditei-me.
Somei encontros e desencontros, valorizei palavras, exponenciei conselhos.
As horas passavam lentamente como que a dar-me tempo de ter tempo para fazer todo o trabalho de casa.
Não tinham passado três semanas mas pouco faltava e eu já estava a ver, já estava a par da realidade. Adio ou decido já? Para quê adiar o inadiável?
A minha actividade é cara. Tão cara que quem tem o poder de a comprar tem tempo de ir fora, ali ao virar da esquina quase. Só mesmo o inadiável pode acontecer. E se não acontecer? É um risco.
Todas as palavras ouvidas foram somadas. Desde o homem de rua de quem me tornei amigo por tantas vezes nos termos cumprimentado, até ao topo de uma das hierarquias.
Mas eu ali, onde estava desde as 8 e picos da manhã até às tantas da tarde ou noite, sou útil, necessário e se calhar fundamental. Mas vou viver mesmo mais de quê? Estou a adiar porquê? Se não for agora vai ser numa das próximas semanas.
A minha actividade é exageradamente cara.
Me avisaram que não podia baixar o preço que a folha estava escrita, que era assim e mais não podia fazer. Me intimidei, me amedrontei e nada podia fazer. Eu estava a dar os primeiros passos, como um bebé que aprende a andar.
Vou fazer mais o que e mais como?
Nasceu o sol na caótica cidade. Comecei a ouvir os primeiros pregões. A decisão não estava definida. Havia ainda mil papéis por arquivar na Torre do Tombo do meu cérebro.
Na hora de que se tornou hábito ali estava a caminhar para o meu destino. Fui logo falar com o Director. Lhe expliquei-me, lhe falei da minha noite, lhe contei as minhas dúvidas.
- Estás a ver claro, cristalinamente. me disse do alto dos seus muitos anos de experiência. Não acrescentou mais nada e se pôs a olhar-me, como a dizer que a decisão não era de mais ninguém se não minha.
Fui fazer o que tinha combinado fazer. Olhos inchados de uma noite não dormida. Correu bem pois eu não estava nem cansado nem tinha a mente turva. Sentia-me como que perfeitamente bem.
Acabado o programa é que foram elas. O peso da noite tinha acabado de cair sobre mim, a dúvida era pesada demasiado para o meu fragilizado corpo, a mente explodia em premissas.
Num impulso, telefone em riste, desato a telefonar aos amigos. Comuniquei-lhes a minha decisão. Não adio.
Sinceramente não ouvi as respostas do outro lado da linha. Talvez porque as não quisesse ouvir, talvez porque o impulso era mais forte que o pulso. Não gravei os sins e os não porque eu não estava a referendar nada.
Depois à noite, como que aliviado, dormi um sono recuperador e não voltei a pensar no assunto porque decidido estava.


Sanzalando

Texturas do tempo 3


3 de março de 2007

à espera de um nascer do sol

O nascer do sol no deserto é um espectáculo de luminosidade, místico, em que o mundo que nos foi abandonando na tarde e desaparecido na noite, regressa. É como o regressar da gente, do céu e da terra. É o renascer.
O nascer do sol é talvez o único acto real e sinceramente ecuménico.
Espero o meu nascer do sol.

Sanzalando

Texturas do tempo 2


2 de março de 2007

Me confesso

Cansado e muito.
Triste e muito.
Frustrado e muito.
Cada vez que me sinto em mim os meus lábios suspiram, os meus pés pedem tréguas e os meus olhos pedem que os feche, o meu corpo pede que o deite.
Não, não é falta das horas de sono que o meu corpo reclama. É só mesmo um cansaço do espírito, a falta de tréguas de uma guerra interior, a ausência dum armistício.
Triste porque não encontrei o meu éden quando lhe estava próximo, quando o tinha ao alcance dum olhar, porque a minha miopia ideológica não me deixou caminhar por pisos inclinados de vertentes não viradas para sul mas, num desnorte sem rumo em que não se vê o nível nem o fio de prumo, desconsegui de lhe sentir no meu horizonte.
Frustrado por ser culpado deste esgotamento em que me enrolei como me enrolava nas velhas mantas de contratado quando dormia na velha cubata da tia Maria, ali para o lado da terra dos sonhos, e ter deixado de sentir-me por causa do frio intenso que me gela a alma e não ter conseguido me aquecer nos braços dos amigos, dos conhecidos e dos que me olhavam com olhos de pedido.

Sanzalando

Texturas do tempo 1