A Minha Sanzala

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3 de junho de 2024

tem coisas e tem gente

Tem coisas que deixam de mexer com a gente para que coisas novas mexam na gente. A gente aprende a viver com emoções e situações e demais confusões. A gente sabe que a prioridades mudam tal como as nossas dores. A gente sabe que cresce, que amadura, porém não sabe se da melhor maneira ou não. Não tem termo de comparação. Sabemos que tem coisas que vemos e revemos de maneira diferente. Tem dias que sentimos novas dores e outras alegrias. Tem alturas que a dor que parecia ser forte abranda ou piora. Tem dias que sem dor a alegria não veio e tem dias que mesmo dorido a alegria surgiu. A gente se torna adulto porém a montanha da vida é a mesma. Pessoas, sentimentos, sensações, prioridades se alteram, se modificam. Tem coisas que a gente não queria mexer mas as coisas mexem com a gente.


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1 de junho de 2024

nenhuns

Todos os meus caminhos dão a lugar nenhum. Nenhum é um lugar extenso onde cabe toda a minha imaginação em conjunto com a realidade. É onde gosto de estar e é onde eu sempre vou parar. Aquís há muitos e eu sempre estou num aqui. Todos eles fazem um nenhum. Tantos nenhuns fazem um todo.  Eu estou em todos os nenhuns

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30 de maio de 2024

disfrutar

Me sento e descanso como que a pensar em como vou passar o dia. Não tenho planos. O tempo está bom. Vou fazer qualquer coisa que me dê alento, que me dê mais alegria e me divirta sem me cansar. 
Na verdade a minha consciência está tão tranquila que nem vou pensar que opinião têm de mim. Vou mesmo só tirar o dia para disfrutar.


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29 de maio de 2024

A Bicicleta que tinha bigodes


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Krónica 10 programa K'arranca às Quartas


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Programa 18 K'arranca às Quartas (integral)

Programa de Rádio com palavras, livros e música  - 29 de Maio de 2024. 

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meus retalhos 31

Era início da noite. Faz pouco tempo tinha jantado. Devo ter comido coxas de frango porque os jantares de segunda-feira eram sempre. Bebia o café no bar e chamam-me com urgência à urgência. Desatei a correr. Sempre fui assim. Rápido e instintivo. 
Um jovem na reanimação, consciente, culto, educado e dizia que não sentia nada do pescoço para baixo. Não tinha feito nenhum exame porque acabava de chegar. A areia da praia no seu corpo denunciava de onde vinha. 
- Jovem, vamos com calma e conte-me o que é que estava a fazer. disse eu com a minha voz mais meiga e suave que conseguia. 
- Estava a mergulhar na praia. Nem era das Rochas. Era mesmo só da praia.
- É habitual ou só usa a praia neste mês de verão? eu tentava manter conversa calma e fazer com que as lágrimas não me caíssem olhos abaixo.
- Só no verão e até nem é hábito dar mergulhos. Mas Estava na brincadeira com a minha namorada e nem vi se estava onda ou não quando mergulhei.
- Vamos lá fazer um TAC...
- É grave?
- Sem um TAC não lhe sei dizer. Esperemos que não. mas acho que esta última frase ele não chegou a ouvir porque não consegui mentir com convicção e a voz sumiu.


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28 de maio de 2024

é a vida

A vida não espera que esteja bem, levanto-me todos os dias e continuo seguindo em frente. Só assim ela pode seguir o seu caminho. Já me sentei e esperei. Desesperei. Ergo-me, sorrio e sigo em frente. Não há obstáculo intransponível. A morte?! Não é um obstáculo, é simplesmente o fim da vida. O ponto final e ninguém sabe se parágrafo. Para quê pensar nisso? Isso há de ser quando for. Adivinhação é capacidade perdida. Por isso vivo já que só tenho esta vida. Não é única nem alternativa. É a vida. Tal qual simples. Cada momento é único. É por isso que a minha vida é inimitável. Como qualquer outra. Vive-se e isso é que importa. Com sorrisos ou lágrimas. Isso já é dependente de cada um. Há escolhas possíveis e momentos improváveis. Há opções e acasos. Há interpretações e respostas.

É a vida.

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27 de maio de 2024

Da minha janela

Da minha janela vejo muitas cores. O azul vindo do céu, o branco das nuvens, o verde das árvores, o negro do alcatrão e o portão castanho do vizinho. Da minha janela eu vejo um fragmento do mundo. Não do meu mundo que é bem maior que isso, mas do mundo todo. O outro mundo eu imagino. Este eu vejo. E às vezes ouço a mora do carteiro. Não espero carta e não sei se hoje ainda alguém escreve cartas. Mas tenho sempre a esperança que ele me traga alguma coisa. Quem sabe um dia ele traga uma com uma fotografia desde lá muito longe, onde ficou a minha infância e eu consiga assim ressuscitar a minha imaginação que se perdeu no calor do tempo. 
Eu gosto de ver o pedaço de mundo da minha janela e gosto de sonhar com o resto do mundo que eu posso ter para lá deste fragmento.

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25 de maio de 2024

meus retalhos 30

A Sala de Espera estava à pinha. Acho hoje todos resolveram ficar doentes ou sem nada para fazer vieram fazer companhia a quem da Urgência precisava. O barulho era mais que muito. Todos falavam e todos protestavam. Todos estavam piores que todos e todos tinham prioridade. 
Na verdade ninguém sente a dor ou a doença de outro. A minha doença é a pior que eu tenho. Como vou explicar àquela amalgama de gente que eu tenho de fazer escolhas. Não há capacidade de ver todos em simultâneo. Por isso inventaram essa coisa da triagem. É verdade que quando não havia triagem, cada um esperava a sua vez e era ter fé. Ter fé e não ser honesto não ficava bem. 
Como Chefe de equipe lá me enchi de coragem e enfrentei a manifestação. Mal entrei na sala fui logo ouvindo gritos imperceptíveis. Tantos eram ao mesmo tempo que o melhor que fiz foi ficar calado a olhar para lado nenhum. Literalmente eu tinha os olhos abertos mas não via nada. As bocas mexiam mas eu estava como que nem lá. Silêncio no meu cérebro. 
- Se eu morrer quem é que me vai acudir?
ouvi isto no meio de toda a gritaria que eu transformara em silêncio
- Quem é que está a morrer? perguntei retoricamente sem esperar resposta
- Eu. Há uma semana que estou com anginas e febres altas...já não aguento mais.
- Ok. Não vai morrer hoje pelo que pode esperar. Respondi e virei-me para outro lado. 
- Dr. Sou diabético e falta-me os comprimidos. Preciso de fazer análises para ver se estou descontrolado.
- Ok. Escreva num papel a medicação em falta e marque consulta no centro de saúde porque aqui não vai fazer análises, pelo menos hoje.
E assim fui fazendo 360 graus e reduzindo as urgência a 3 casos que ordenei que entrassem. 
- Até que enfim que alguém dá a cara - diz um dos pacientes
- E os tomates - acrescenta uma idosa que nunca se havia manifestado


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24 de maio de 2024

oceano de paixão

Se eu fosse um pintor, com o mínimo jeito para a coisa, e tentasse pintar uma aquarela ela era simples e fácil, já que teria tons de azul mar e um sabor salgado. Era uma aquarela viva, transbordante e calma, serena e preenchida. Ao olhar eu sentiria a paz de espírito permanente e duradoira.
Se eu fosse um poeta eu cantaria o mar, as ondas e as brisas com sabor a maresia e o ritmo cadenciado do marulhar.
Mas assim limito-me a ver o mar, nos seus tons azulados, no seu perfume de mar, no seu barulho de mar, na sua essência de mar.
Eu se fosse mar era um oceano de paixão.

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A Rádio onde estou às Quartas

https://radioonline.com.pt/portimao/ Sanzalando

23 de maio de 2024

pelo tempo que faz

Se me perdi no tempo em que tempo estou agora? O meu corpo gasto diz-me uma data, o meu cérebro fresco refere-me outra. Na dúvida, deixei de contar o tempo e só me interessa o tempo que faz.
Deixei de ter lutas entre a mente e o corpo, deixei de ter insónias e pesadelos. Quando a dúvida quer ressuscitar levo-me a ver o mar, a ouvir o marulhar e a perfumar-me de maresia. Deixo os pensamentos serem dissolvidos na atmosfera, que a imensidão azul dissolva-me pecados e pecaditos, ideias tristes ou tristes ideias. 
Perdido no tempo desconto as subtrações de momentos inesquecíveis e deixo-me levar pelo tempo que faz.


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22 de maio de 2024

Programa 17 do K'arranca às Quartas - 22-05-2024

Programa de Rádio com palavras, livros e música  - 22 de Maio de 2024. 

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Tereza Batista Cansada da Guerra um livro no programa K'arranca às Quartas


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Krónica 9 de K'arranca às Quartas


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eu, a sebenta e o medo das palavras

Agarro uma sebenta de capa vermelha e na minha lapiseira e desato a rabiscar. Não sei se a letra amanhã será legível ou precisarei de um egiptólogo para me decifrar. Também não é preocupação minha reler-me. Gosto mesmo de escrever para ficar escrito nas minhas palavras o que eu pensei. Importante? Cada palavra tem a sua importância e essa é uma variável indefinida.
Eu sempre amei o sol, amei assim assim a lua e amei a simplicidade de cada dia. Para mim sempre foi um mistério o cair da noite. Com o sol eu consigo ver o objecto e a sua sombra. Na noite eu desconsigo ver para lá da minha imaginação. A lua, romântica quando cheia, ainda vá que não vá. Aos quartos nem por isso. E quando a lua se esconde na neblina... sobra-me a imaginação pesada que transforma pensamentos em pesadelos.
À noite sem a luz do sol nem me apetece rabiscar na minha sebenta. Vivo a noite com a vontade de chegar o amanhã. Durmo para não sentir a noite, para não a ver sonolentamente passar.
Agarro a sebenta e rasgo a folha onde nem consegui escrever o luar de uma lua cheia que me ilumina em sombras de medo.
A noite fresca arrefece-me as palavras, tira-me o brilho de cada som. A escrita feita de sombras não me cativa.
Vou confidenciar à noite o amor que sinto em cada dia de sol.


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21 de maio de 2024

meus retalhos 29

Para mim sempre foi mais que evidente que o ser humano, eu, nunca iria conseguir viver em isolamento. Quando estudava ou quando li qualquer coisa sobre ética e civismo, aprendi o conceito de sociedade e de viver em conjunto. Eu nunca daria para viver como um ermita. Tanta solidão ia me matar em menos que um nada de tempo. E assim sem minha autorização apareceu essa de pandemia e o isolamento consequente. Literalmente passei a ser um doente, mesmo sem doença. De repente fui impedido de tocar, de ver com as mãos. O calor humano era filtrado por máscaras e escafandros. Passei a sofrer de distância, de distanciamento e de desamparada alma. Eram os doentes e era eu, todos estamos doentes. Sentia. Eu impedido de tocar, de sentir o meu doente. Ia virar médico de espírito? Pequei vezes sem conta. Arrisquei, mas preferia sofrer física do que mentalmente.
Acabou a pandemia, mas acho a minha mente não recuperou daquele enjaulamento. Tanto escafandro que me afogou e me prendeu em ressentimentos e confinamentos ao ponto de eu pensar que a solidão é uma dor insuportável.


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20 de maio de 2024

meus retalhos 28

Era madrugada. Estava encostado a descansar o corpo. O cérebro fervilhava de imagens que vinham através dos sons. Era a máquina de café da enfermaria, era o elevador que subia ou descia, qualquer coisa trazia-me à ideia trabalho. Dizia-me que era a adrenalina mas eu sabia era a ansiedade de a qualquer momento chegar qualquer coisa e eu não estar à altura. Mas todas as noites de urgência eram assim. De dia nem tanto, mas o silêncio interrompido da noite tinha destas coisas.
Toca o telefone. Vá que descer porque chegou um acidentado e é preciso autorizar o pedido de TAC. 
Mais gritos na porta de entrada. Todos correm e gritam por mim. Também corro. Um fiat uno parado á porta da urgência, portas abertas e gritos. Muitos gritos. Ninguém a consegue tirar do banco de trás do carro. Ela irremediavelmente grávida com contrações de parto e histericamente agarrada ao que podia. 
 - Ok. Queres parir aqui, a gente faz o parto aqui. disse-lhe eu com a voz mais cândida no sentido de arranjar um momento de calma para a tirar dali. Nada. Mais gritava e mais se agarrava. Rasguei-lhe as cuecas e ao observar vejo já um couro cabeludo .
- Meninos, tragam-me lençóis e chamem o pessoal da obstetrícia - digo eu para o pessoal que me observava.
Ajudo a pôr a criança cá fora, embrulho num lençol e ponho-o na maca e já a consigo trazer para fora do carro.
- E agora quem me paga a limpeza do carro. Vem um gajo para o hospital e fazem esta merda aqui na rua.
Ainda hoje estou para saber o que é que o sogro fez ao carro, à nora e ao neto.


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19 de maio de 2024

como quero ser

Hoje me sentei na secretária, papel branco na frente, caneta de tinta permanente, para permanentemente deixar escritas as decisões que tenho de tomar.  Às vezes a vida nos leva por caminhos complicados, às vezes nos perdemos em sonhos e desejos, às vezes tememos sombras e ilusões, pelo que, estando escrito o que de facto desejamos, é mais fácil remendar, corrigir, recuar ou simplesmente seguir em frente. Assim a gente, acho eu, nunca se perde, mesmo que às vezes a gente nem saiba bem para onde está a ir. Assim escrito a gente cabula, dá uma espiada, volta ao carreiro e segue caminho, pelas oportunidades, espaços vazios, lacunas e outros sombras fatais.
Não importa quanto bons fomos lá no atrás do tempo. Tem sempre gente que passa a gente. É bom assim porque a gente deixou escola e só pode é melhorar. Importa é não voltar pelo caminho errado, por isso me deixa apontar as decisões.
Nunca serei melhor que ninguém nem quero grande espaço para mim. Uma linha de desejo é suficiente. Quero mesmo ser só eu tal e qual.


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16 de maio de 2024

Momentos incertos em certezas absolutas

Ao sabor do vento deixei ir ideias, sonhos e desejos. Perdi-os num desprender de coisas mundanas, num desapegar de lugares e marcas. Mas tenho a certeza que todas as decisões que tomei me trouxeram algo bonito. 
As vezes que chorei no travesseiro, esperneei na solidão ou me afundei em trabalho, foram longos processos de grande satisfação que explodiram posteriormente sem sentimentos de culpa, nem raiva e nem insegurança. Tinha a coerência da experiência, do pensar, do sentir e do que me fez ver fácil.
Ao sabor do vento recebo agora a herança num misto de liberdade e alegria de viver.



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14 de maio de 2024

imortal

Meditativo me encontro. A vida é um ciclo constante, um movimento imparável, uma sucessão de momentos porque é que então eu estou sempre à procura de alguma coisa? Pareço um eteno insatisfeito, um inconcluído modo de ser. 
Já sei, ando em busca da eternidade, mesmo sabendo que ela acaba naquele incógnito instante.
Sou imortal. Todos somos imortais. Há sempre um qualquer lugar numa estória onde permanecemos. Convencido? Esquecido, deslembrado, nublado ou simplesmente desligado porém nunca apagado. Há um pouco de cada num lugar qualquer. 

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13 de maio de 2024

a minha baía é um U

Me sento na marginal. Faz de conta estou na base do u a ver toda a saída da baía. Privilegiado me perco em sonhos e desejos. Deixo os meus olhos levarem a imaginação para lá do que alguma vez fui. Inventei o balão, a asa delta e o foguetão e não sai daqui onde olho para o meu longe sem imaginar que um dia eu lhe vou chegar sem ser de bico de pés..
Me olho à procura de cicatrizes, das que contam a minha estória, a minha sobrevivência, o meu sofrimento, a minha fraqueza ou fracasso. Desencontro-me e sem vontade de usar forças sobrenaturais e poderes mágicos, me deixo ficar sentado a recordar feridas descicatrizadas, descarecterizadas e não sofridas que, fizeram de qualquer maneira, parte da minha estória e me moldaram num hoje de agoramente.



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12 de maio de 2024

um dia olharei para amanhã

Sentado, olhos perdidos no horizonte, cabeça vazia de preconceitos e preconcebidas ideias, vou meditar sobre tudo mas quase de certeza sobrenada. Estou aqui a formular perguntas para as quais nem me interessam respostas. É a nova formula de dialogar. Perguntar ou questionar para quê e sobre o quê se eu sou especialista nisso? Independentemente do que é isso. O diálogo é monocórdico e unidirecional. Também, eu a conversar comigo ia dar em mais o quê?
Tão cinzenta está essa cabeça...
Não, os meus olhos vêm um mundo colorido, ele é que se acinzenta aos olhos da gente. Porque ele é um conjunto de gente cada vez mais isolada no meio duma multidão. 
Dá-me conselhos desde que sejam iguais ao que eu penso...
Que piada tem a conversa de hoje. Os livros esquecidos na mesa de cabeceira, as páginas amarelecidas e empoeiradas, as teias de aranhas, a penumbra. Artes de passado.
Fico sentado e um dia olharei novamente para amanhã.

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11 de maio de 2024

pesadelo

Se te olhas e nada vês, companheiro, muda de rumo porque tu já eras. 
E assim comecei a passear. Pé ante pé, devagarinho, porque ia ser uma caminhada longa. Não tinha nenhuma ideia na cabeça. Nada brilhava em forma de ideia, de luz ou vagamente lembrança. Eu me olhava e nada via. Não sabia o meu rumo, nem o que havia tomado faz muito tempo. Desespero porém sem desesperança, caminhei. Primeiro devagar e aos poucos fui acelerando. Eu havia de me encontrar. Eu tinha de me ver. Eu havia de estar nalgum lugar.
Cada passo parecia mais pesado que o anterior. Eu ia mas sem norte e desnorteado andei. A minha estrela polar, o meu cruzeiro do sul, qualquer constelação. Nada. Vaziamente me encontrava. Aspirado por qualquer máquina extraterrestre, lunático, apático, patético. 
Foi quando acordei, levantei-me e pensei não voltar a adormecer na praia,


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10 de maio de 2024

introspectivo

Assim como eu acho que toda a gente tem um lugar escondido que não gosta de visitar ou só lembrar, pois eu também tenho um capitulo de vida assim, que lhe fujo da memória, das imagens, das gargalhadas e das lágrimas. Lhe fujo a sete pés, mesmo eu só tendo dois porque os outros eu peço emprestado. Não importa se já chorei todas as lágrimas, se já paguei as contas passadas ou se não procurei todas as saídas.. Esse lugar está lá e de vez em quando até parece está com um lencinho a me chamar. Eu não quero mais esse lugar, esse momento nem um instante. Eu quero o meu lugar de futuro, sem esquecer os meus lugares passados, porém vamos só riscar bem riscado esse momento capitulado num tempo passado. 
Ah. O problema é que eu me importo com todos os meus lugares e sentidos e não há escolha possível de apagar o que é que seja. 
Me deixem só na minha vida e não me perturbem nesta discussão intrínseca.


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6 de maio de 2024

sou leve e de pouca monta

Na verdade poucas pessoas sabem quem que sou. Muitas poucas pessoas conhecem, atrevo a dizer, que poderia contar pelos dedos duma mão, quem eu realmente sou. São poucas as pessoas que entram na minha intimidade e raras mais nos meus sentimentos. Não só porque é sem interesse, como as restrições intimistas que fecho na minha capa que pouco destapo nas letras que uso, são fechadas a dualidades porque zeloso do meu centro emocional, guardo a sete chaves na esquinas da minha vida desenhada numa folha quadriculada com geométricas figuras. Permito que se sentem ao meu, que brinquem com franjas da minha existência porém tolero pouco que pressionem o balão em que me envolvo, com que me defendo das amarguras da vida.
Tenho pensamento próprio, tenho opiniões e pouco me deixo manipular, porque quando o permito é só para que a superficialidade seja polida e desempoeirada e que brilhe nos dias de sol.
Não, não gosto de me desnudar nas minhas palavras que deixo serem levadas pelo vento ao deus dará. Não tolero ser pressionado, não gosto de ser esquecido, não gosto que me mudem o estilo. Em qualquer situação tenho as malas feitas para me mudar para outro estado de alma. Sem rancor nem recordações arreigadas a amarras dolorosas. Sou feito de pouca coisa e pouca coisa é simples de embalar e levar

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5 de maio de 2024

Mãe



Crescer

gerar

aguardar


Gerir, criar...


Ser mâe:


a arte de se doar

Chorar silêncios

sorrir gargalhadas interiores





Uma vida dentro de outra


Viver por dois, as vezes três


Priorizar outra vida


Praticamente passar a vez






E embora seja inadequado


É ainda mais valorizado


Já que ela acaba dando conta


Mesmo quando pensa não estar pronta




Mãe.


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4 de maio de 2024

até hoje

Sentado no recreio do liceu estava eu matutando pensamentos e outras ilusões quando num repente pareceu ter havido um ciclone. Me falaste.
- Que fazes aqui tão quieto e sozinho?
Eu pensei que era mais um delírio mental duma juventude apaixonada. Mas te olhando eu vi que estavas ali e me falavas directamente. Só pode ser um vento do deserto a me fazer ter alucinações. Mas a realidade palpável era que eras mesmo tu.
Balbuciei que nada e sem mais força mental para travar a avalanche de pensamentos me fixei nos teu olhos e me calei. 
Eras assim, imprevisível que de repente te preocupaste comigo. Eu, burro todos os dias, fiquei sem folego, sem palavras e se calhar sem sangue. Até hoje.


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3 de maio de 2024

Cacimbou

Cacimbou. Não dá para vestir fato de banho e dar mergulhos. Só no pensar e o corpo se arrepiou. Sento-me nas arcadas e olho as palmeiras que lhes intervalam e vejo como cresceram na minha ausência. A jangada está em terra, a areia não tem nem uma pessoa nem uma gaivota e não vejo nenhum caranguejo a passear na beira do mar. Também a minha vista já não como é que era. 
Cacimbou e eu medito sentado na arcada a ouvir o marulhar deste mar a se espraiar na areia. Imagino a temperatura e me arrepio. Custa olhar esse mar e não entrar nele. Nem um joguinho de bola na areia apetece. País tropical e com tanto frio? Devo estar a ficar velho ou o tempo já não é o que era.
Os biquinis que vejo na minha memória nada têm a haver com os que via quando era o calor quente dum verão que não tínhamos na escola. A memória se defeituou e os corpos enrugados já não mostram a frescura quente desse verão. 
Os másculos adolescentes que jogavam à bola sem se importar se incomodavam os novos que queriam ficar a admirar os corpos esbeltos daqueles biquinis deixaram crescer a barriga e já devem ter saudade de conseguir apertar os sapatos sem artifícios ou outras acrobacias. 
Os kotas que trazem a família e suas merendas para um dia completo de praia já não moram neste mundo e cada um foi para seu lado e já não piquenicam em lugar nenhum. 
Cacimbou e as zangas de verão se vão manter em casa, até que no próximo verão vêm à rua novamente e tudo recomeça faz de conta é guerra de bairro ou de namoradas desfeitas em lágrimas que ninguém viu.
Cacimbou e eu fico nas arcadas a ver o tempo passar.


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2 de maio de 2024

vou na marginal

Vou passear na marginal. Vou fazer a recta curvada sobre o mar, em passo lento para saborear a brisa e perfumar-me de maresia. Se já tivessem inventado os fones eu ia a ouvir música para não me afogar nos pensamentos. Como ainda não tem essa coisa de só para profissionais e não me apetece andar de rádio ao ombro eu vou ouvindo o mar a bater nas pedras e cantando no meu silêncio as baladas de embalar. 
Eu tenho saudades de fazer a marginal a pé e ás vezes ver o comboio a levar ou trazer coisas do porto e sonhar eu sou o maquinista. Eu tenho saudades de ver o pessoal a acelerar os carros pensam estão nas corridas porque é a única estrada citadina que não tem cruzamentos nem entroncamentos nem parecenças. Eu tenho saudades de olhar as traineiras a balouçar ao sabor das ondinhas que aqui são assim lentas que não tem calema. Eu tenho saudades de olhar daqui de baixo para cima e ver o palácio e a Igreja a mostrar que são grandes.
Me deixa só ir no meu silêncio mental vagabundear por lages do passeio faz de conta estou a jogar à macaca. Me deixa ir sonhar que ainda sou a criança que não sabe que a vida é um intervalo finito entre o nascimento e a morte. Me deixa olhar longe que a vista ainda não se estragou com a idade.
Vou na marginal que é o mais infinito que posso caminhar com as minhas pernas de criança.


Sanzalando

1 de maio de 2024

meus tempos outros

Estava sentado debaixo do caramanchão de buganvílias que um dia resolveste fazer no teu quintal, avó. Elas estavam plantadas em metade de barril de vinho que chamavas de cilha. Esse caramanchão faz uma lixeira que a tua filha todas as 6 horas da madrugada vem varrer para que tu não notes ou é só mania dela de ocupar o tempo sem perder o pensamento da razão? Não sei mesmo já, se são só as flores ou se também as folhas se deixam cair num desanimar de tempo. Num repente me lembrei de ti, avó.
E o avô que vinha no seu fato, do seu sempre trabalho, nas suas horas sempre certas, me atiraste os braços e eu te disparei uma pergunta com a minha voz de criança, de meia dúzia de anos:
- Que me trouxeste?
-Nada. Me responde invariavelmente porque sabias que eu ia lhe revistar todos os bolsos e ia, invariavelmente, encontrar um caramelo, um rebuçado ou uma chuinga num dos seus bolsos. Sempre num bolso diferente para dificultar a minha paciência e aguçar o meu apetite
De imediato te retribuía com um beijo. Era o preço que eu tinha que te pagar por esta carícia.
Me lembro que todas as noites desse tempo de criança, me acompanhavas ao quarto e antes de te recolheres ao teu, conferias a minha posição e me aconchegavas a roupa de cama. Se alguma coisa não estava do teu agrado chamavas a avó para compor ou mudar. 
Me lembro que isso durou uns poucos anos. Hoje, ao recordar tudo isso sinto o desejo que tudo voltasse numa repetição moderna, actualizada e de preferência com muitos capítulos. Foram muitos insuficientes, esses poucos anos.
Hoje, caminhando ao longo do zulmarinho, eu grizalhado, me custa saber que não estás aqui, que não me vais fazer as cócegas que adoravas fazer quando me apanhavas distraído num olhar para um futuro indefinido através da janela da velha marquise, não me vais perguntar se fiz os trabalhos da escola, não me vais fazer as perguntas de História e nem vais pedir à avó para fazer o leite creme que descansa na janela da cozinha para não comermos ainda quente que faz mal na barriga.
Um dia assim, que já nem me lembro que tempo fazia, deixei de te ver. Assim o mais do mesmo que já tinha acontecido com o meu pai, estava a acontecer-me com o meu avô. Me lembro de ver a avó chorar. Não sei se mais alguém chorava lágrimas que se vissem, mas tenho a certeza que muitas lágrimas caladas ganharam liberdade. A mim me disseram só que tu tinhas partido e agora eras mais uma estrela do céu. Eu, nessa noite, escolhi a estrela que eras tu. Já te mudei de posição no céu algumas vezes, mas ainda lá estás para eu te olhar e te falar as nossas coisas.
É avô e avó, também a vossa filha já não limpa o quintal, não porque a buganvília deixou de deixar cair as flores e as folhas mas porque ela foi ter convosco e me deixou aqui a recordar lembranças dos meus tempos de criança.. 


Sanzalando

29 de abril de 2024

hoje sou

Quantas vezes pensei em destruir-me, em chorar minhas perdas, em desfazer minhas recordações. Quantas vezes fui fraco e quase me deixei levar pela negação de mim. Quantas vezes eu desejei que o tempo tivesse parado naquele instante feliz da minha vida? 
É praticamente impossível não ter estes pensamentos. Acho teria tido uma vida aborrecida e monótona. Não teria dado valor aos outros momentos, não teria recordações equivocadas do meu passado. Eu era um filme a preto e branco carregado de cinzentos monstruosos e sem aceitar que sou uma evolução constante de mim. Hoje sou uma actualização daquele miúdo de calções e sandálias de borracha, desajeitado e apaixonado, vivo e activo da sua própria fantasia de ser grande.


Sanzalando

26 de abril de 2024

estórias tristes há

É verdade que estórias tristes nunca são boas, mas elas fazem parte da nossa vida e a gente não pode só lhes esquecer, de fazer com elas nem existiram. Quantas versões têm a minha estória? Qualquer estórias. Quantas vezes meus olhos se encheram de lágrimas? Qual a quantidade de lágrimas? Importa, se são lágrimas? Importa se valeu a pena?
Não há estórias certas nem pessoas certas. Há estórias e suas versões. Há pessoas e pessoas. Fazem parte da estória e ponto no final. Quando começou a estória? Importa? Se estiver a começar uma agora vale menos que a antiga? É triste? Desiste. Fácil. Porém não o é. É estória e é minha e eu lhe levo a peito enquanto a minha cabeça estiver a funcionar. Depois se foi no vento da desmemória e já não importa a sua qualidade.

Sanzalando

23 de abril de 2024

livro é vida ou vice versa

Caminho à beira-mar como que passeando por mim, num desconstruir para reconstruir melhor. Passos seguros, olhar descansado, pensamento firme e tranquilo. Sigo cada página de mim como se estivesse a ler-me na forma de livro. Sigo perfumado pela maresia, despenteado pela brisa refrescada pelas gotas das ondas rebentadas na areia e descubro que o que tem sido mais importante para mim é assumir responsabilidades na ajuda, na construção e na livre circulação dos pensamentos. 
Caminho sem medo de molhar as páginas lidas porque não perdidas. Caminho sem medo de não conseguir ler palavra apagada pelo olhar cansado e miope da idade. Caminho página a página no livro que escrevo a cada momento e que titulei a minha vida.


Sanzalando

22 de abril de 2024

um tema, um livro no Programa K'arranca às Quartas

 “Balada da Praia dos Cães” de José Cardoso Pires. 
Do Autor temos que referir que de estudante arrependido de Matemática, marinheiro da marinha mercante e tradutor até se fixar como jornalista e escritor, tudo temos um pouco neste autor português, nascido nos arredores de Castelo Branco em 1925, imigrado em Lisboa, exilado no Brasil e regressado a Lisboa onde viria a falecer em 1998. Deixa-nos uma vasta obra, onde destaco mais dois para além do livro de hoje, O Delfim  e Hospede de Job. 
A Balada da Praia dos Cães inicia-se com o relatório da descoberta de um corpo por uma matilha de cães numa praia, vindo posteriormente a saber-se que se tratava de um militar, major Luís Dantas Castro, que havia fugido da prisão após uma tentativa de golpe de estado. Mena, a grande paixão do major, arquitecto Fonte Nova que estivera preso também em consequência da tentativa de um golpe e o cabo Barroca que era um soldado a cumprir o serviço militar na prisão são os quatro que se tinham reunido após a fuga do Major. Reunião em casa de Mena, A Balada da Praia dos Cães inicia-se com o relatório da descoberta de um corpo por uma matilha de cães numa praia, vindo posteriormente a saber-se que se tratava de um militar, major Luís Dantas Castro, que havia fugido da prisão após uma tentativa de golpe de estado. Mena, a grande paixão do major, arquitecto Fonte Nova que estivera preso também em consequência da tentativa de um golpe e o cabo Barroca que era um soldado a cumprir o serviço militar na prisão são os quatro que se tinham reunido após a fuga do Major. Reunião em casa de Mena,

 


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21 de abril de 2024

Sanzalando e falando de livros e autores

Sanzalando e falando de livros e autores
Falando de um autor, falo de Fernando Gonçalves Namora, Fernando Namora como nome literário, nascido em Condeixa a Nova em 1919, tendo falecido em Lisboa em 1989. Iniciou-se na poesia com RELEVOS em 1937. Em Coimbra tirou o curso de Medicina, colaborou em múltiplos jornais e revistas de cultura. É autor de coletâneas de poesia e de pelo menos 13 livros em prosa. Fernando Namora também foi pintor. Dos livros que lhe conheço ressalvo, sublinho e releio RETALHOS DA VIDA DE UM MÉDICO.
Não só por ser um tema actual mas porque a narrativa situa-se entre a ficção e a analise social de 1949, data da primeira publicação e 1963, segunda publicação.
Nesta obra estão fragmentos da sua vida, relatos da sociedade da época, não é uma novela ou romance. Não sei se poderei considerar contos, biografia ou um diário. Certo-certo é que é um Relato de vida. A sua maneira peculiar de escrita cativou-me. Daquele ontem ao hoje de hoje parece que não houve mudança, a não ser social.
Repito que este livro constitui um documento importantíssimo da sociedade do início do seculo XX, revisto em 1963. A História de um Médico de Aldeia com as suas dificuldades quer na comunicação com o povo provinciano e simples, habituado a charlatães, crenças e superstições. A sua luta para fazer-se ser aceite e ao mesmo tempo lutar por um povo sub-alimentado, económica e culturalmente pobre, agarrados à sua avareza e desconfiança é obra que hoje nem se imagina que ali ao virar da esquina o ser humano era tão pequeno intelectualmente. Nestes retalhos, Fernando Namora reage com ironia, com dúvidas e mostra o seu cansaço.

1º livro falado no programa K'arranca às Quartas na Rádio Portimão a 24 - 01 - 2024

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preocupação

Tem gente que se preocupa. Olho na palavra e me desmonto nas sílabas. Fico logo chocado. Antes do tempo já ocupei. Não tem como não ser assim. Ainda não aconteceu e já eu ocupei a cabeça com tristeza. Ninguém pré ocupa com alegria. Raio de sílabas que me desfazem o sossego.
Fico preocupado só para saber o que que pode vir a ser ocupação da mente. 

19 de abril de 2024

tudo tem principio e fim, meio e contrariedades

Tudo tem principio e fim. Não sei tudo e acho nunca vou a ficar a saber. A gente nasceu e um dia a gente vai morrer. Eu irei contrariado. Podem crer que será contra a minha vontade. Mas é a lei natural da vida. Olhando para as flores do meu jardim nunca dei por uma planta a solicitar à sua flor que não caísse. É um ciclo, um círculo. Tudo depende do raio. Mas é o raio que o parta, quando termina. 
Tem gente que tem estabilidade emocional mantida: passam todo tempo mal e se queixando. Mas não lhes vejo lutar para mudar. Só sabem fazer uma coisa de cada vez e estão ocupadas a se queixar. Não olham as plantas nem as árvores. Estáticas, sofrendo ventos e chuvas, sol e frio e ali estão embelezando o mundo.
Tudo tem principio e fim e no meio tem também qualquer coisa. Só precisa a gente olhar bem


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18 de abril de 2024

Programa K'arranca às Quartas de 17 de Abril de 2024

Programa de Rádio com palavras, livros e música  - 03 de Abril de 2024. 

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Krónica 7 do programa K'arranca às Quartas


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Portugal e o Futuro


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se eu gosto de mim...

Falando verdade eu gosto muito de mim. Parece ser egoísta. Acho não fica bem dizer, para além de ser desconfortável.eu gostar de mim. Mas pensando melhor se eu não gostar como posso eu esperar que os outros gostem. Quem tem de gostar de mim primeiro sou eu mesmo. É bem mais fácil eu gostar de mim para poder gostar dos outros. É sinal que tenho bom gosto. Para mim e para os outros de quem eu gosto.
Agora com essa coisa da inteligência artificial eu lhe vou perguntar se gosta de mim? Ainda não gastei a natural e já estou à espera da prótese mental? Acham que a IA gosta de mim? Para já escusam de responder que eu não quero saber. É pergunta retórica. Só gosto de ser gostado pela inteligência natural. Quando gosto de alguém é com a minha natural ideia e gosto.


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17 de abril de 2024

imagina-me

Imagina-me um jogo de peças fragmentadas, um brinquedo para construir. Agarram em cada peça de mim e reconstrói-me ao teu gosto. Faças tudo o que te apetecer com as minhas fragmentadas peças mas não me peças para eu pensar que nem tu. A minha integridade está na mente e não nessas peças soltas que vais apanhando pelo caminho. 
Imagina-me uma foto a preto e branco e desfocada. É a minha antiguidade amarelecida pelo tempo, mas não sou eu que eu sou o pensamento que desconsegues apanhar por mais moderna que seja a tua máquina. 
Imagina-me um saco de vácuo e não conseguiras observar-me porque eu sou bem maior que o teu vazio do teu olhar. 
Para teu descanso, não me imagines, vive-me.


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16 de abril de 2024

e tu, já sorris?

Parei no tempo. Hoje voltei atrás e parei no tempo. No dia em que eu me vi com olhos de ser gente. No dia em quem o amor saiu da obscuridade cósmica da minha inexistência como adulto. Voltei atrás, ao dia em que te vi. Se calhar teria sido melhor ter parado no último dia em que te vi. É que assim tenho muito para recordar-te. 
Foi naquele dia que passamos a ser colegas de turma das aulas da tarde. Me olhaste e me sorriste. Quantas vezes já me tinhas visto do vidro de trás do lado direito? Eu tinha sido inúmeras... tantas as vezes quantas eu percorri a cidade porque sabia que ias passar ali no tal do passeio dos tristes do fim de tarde de todos os dias da semana. No último dia que te vi só ia lembrar o NÃO que me disseste quando me ia dirigir a te cumprimentar. Ao mesmo tempo do Não deste-te as as costas e ignoraste a minha existência. E tinha acabo. Agora no primeiro dia que as nossas vozes se cruzaram ao mesmo tempo que os olhos... é obra do diabo. Com muito diabo pelo meio. É mesmo para fazer sofrer os anos de amor platónico que me querias obrigar até acabares de estudar. Longa vida de espera ia ser a minha, mas me faltou a paciência e num relâmpago mental me deste uma berrida que mudei de vida num segundo. Mas os nossos amigos continuam a ser os mesmos. 
E tu, já sorris?


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15 de abril de 2024

nos meus antigamente

Nos meus antigamentes, em que andava de calções e chinelos feitos de pneu dum carro velho, piso careca mas cómodo de andar, eu tinha manias de ser boa pessoa para toda a gente. Podia não ter para mim, mas eu dava e se não dava faz conta ficava a dever em remorso. Era tipo boa gente, não era tipo pessoa de yo-yo que sobe e desce umas vezes até que desaparece no esquecimento da brincadeira. Eu era mesmo presente no presentemente de quem queria. Eu hoje tenho saudade de não poder mais ser assim, porque tem gente que partiu antes de mim, faz de conta foi água de barragem embora e eu fiquei ali aprisionado.
Nos meus antigamentes de ser eu, era que nem agora. Mudou o cabelo e o penteado, mudaram os kilos e as formas, mudou o andar para uma pouco nada prático devido ao reumático, mudou o olhar por esforço de ver. Desmudei a forma de ser porque desconsegui ser outra pessoa, embora eu não consiga ser um consertor de pessoas como cheguei a pensar ser


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14 de abril de 2024

ter tido passado

Não é fácil ser eu. Ter de me aturar um dia inteiro e anos a fio, não tem sido tarefa fácil. Mas desconsigo fazer diferente. e para fazer diferente escrevo. Escrevo por desespero e para meu descanso. Se não fosse eu descarregar em palavras o pouco que sou eu morreria simbolicamente toda a hora e nunca teria oportunidade de dizer que valeu a pena ter o passado como tive.


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