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4 de setembro de 2005

Loucamente no Zulmarinho


"Fio": Um café na Esplanada

carranca
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Loucamente Zulmarinho Hoje, 02:04
Forum: Conversas de Café
Me sento na esplanada, ouço o marulhar desse zulmarinho a se espreguiçar na areia. Na verdade, mermão, ele a esta hora parece um pretomarinho pois só lhe vejo mesmo os reflexos das luzes que vistos daqui parecem almas se reflectindo nele e se estendem como a querer se dirigir a mim e me abraçar. Naquilo que lhe consigo descobrir ele me parece querer dizer segredos, mesmo dos que vêm de lá da linha recta que é curva, mesmo do início dele.
Hoje te falo em surdina para não atrapalhar a calma desse zulmarinho, que sinto sem lhe ver, que aproveita a noite para descansar e reflectir de coisas que lhe passam na alma e ele me segreda depois como que a querer dar-me luzes.
Tudo que um dia era, hoje já não é mais. Tudo está perdido, tudo está acabado, tudo pertence a um passado já consumado que não pode ser reescrito e cujos prazeres não podem ser resgatados, todas as estórias foram já te escritas, te foram já contadas, mas continuas a querer saber de como vou conseguir te ocupar os ouvidos e a tua atenção, sem parecer que sou uma mente louca.
Tu sabes, mermão, que por muito tempo fui obcecado por conseguir um plano inicial que me tirasse deste fundo de abismo: meu plano perfeito para a felicidade plena tinha sumido no fogo das promessas mas eu não conseguia aceitar desfazer-me dele... e tentei até a loucura, mas desisti antes do fim da minha vida e sinto que ainda tenho tempo para um recomeço...Mesmo vendo que há cambas que têm medo de começos.
Porque quando tudo dá errado e sinto que nada vai melhorar, tento me apoiar no que resta dele e tento traçar um plano B para ser feliz... Mas nessas horas, mermão, em que elimino da minha alma todos os resíduos daquilo que se perdeu, me resta muito pouco para me apoiar e aparecem os amigos próximos com o suficiente para me ajudar. Sabes, mermão, que detesto a metade deles, mas mantenho-lhes o telefone na agenda porque sei que um dia qualquer precisarei deles, porque é consciente de que sou um inútil que não consegue fazer nada sozinho.
Assim num repente, mermão, dá-me uma luz e verifico que não preciso de amigo nenhum.
Se paro para pensar verifico que estou assim mesmo por causas de pessoas. O que vale mesmo, mermão, é cortar o mal pela raiz e me livro das pessoas, porque as pessoas são o mal do mundo e da minha desgraça particular.
Depois, mermão, a luz fica mais brilhante, vês melhor, pensas melhor e mais longe e verificas que a desgraça não é tua, é deles, dos outros mesmo.
É nesta altura, mermão, que costumo bater com a cabeça na mesa de cabeceira e acordo.
Sanzalando em Angola
Carlos Carranca

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