recomeça o futuro sem esquecer o passado

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30 de dezembro de 2010

poucas palavras soletradas

Sentado saboreando o vento e o perfume de maresia, olho o mar camuflado de nuvens, abrigado dalguma outra carga de água que aí venha, encontro-me dentro e fora de tudo, como ar envolvendo sonhos e esperançado que um dia os caminhos me levem a ti.

Sanzalando

29 de dezembro de 2010

Ora bem, vamos lá ver...

Maneira estranha de começar uma conversa. Ora bem, vamos lá a ver... Até parece eu estou zangado ou me pisaram os calos. Na verdade nem uma nem outra coisa. Na verdade nem sei que palavras vou usar. Soletrar vogais, que são só cinco e não cansa, mas parece uma lenga lenga que não vai a lado nenhum e nem me leva a nada. Consoantes ainda parece estou a falar alemão que para mim até parece chinês. 
Silêncio que é o melhor.
Um dia vou voltar a ter palavras para usar e gastar. Enquanto isso vou lendo notícias que me chegam do lado de lá da minha imaginação.

Sanzalando

28 de dezembro de 2010

pausa ou talvez fim

Acho chegou a hora de fazer um silêncio.
Acho bateu o sino de repouso da memória.
Acho fez eco a paragem da imaginação.
Acho apenas.
Tudo porque ainda não consegui construir um fragmento da minha vida. Novo de espelhar até o pensamento. Sinto-me cansado, por vezes vergado na insónia do medo. A imaginação prega partidas se falha.
Após conseguir combater a inércia do repouso voltarei aos meus sonhos, velhos ou novos, às minhas congeminações idealizadas num acordado inexplicável.
Acho eu, que não consigo hoje ter a certeza de nada.

Sanzalando

27 de dezembro de 2010

rescaldo de Natal

Me deixo enrolar no turbilhão das palavras cruzadas como se elas fossem os aros das bicicletas que serviam de brinquedo. Como mesmo se chamava? Brincar ao aro? Já me vai a memória... mas me lembro que foi o primeiro e único monociclo que tive. A gente corria, a gente andava e era quase o dia inteiro. E o meu primo brincava era tampa de panela a servir de guiador do seu imaginário camião. O arame que empurrava o aro, era o eixo? Ai uê que se me vai a memória... Mas naquele tempo não havia reumático nem falta de ar. Faltava só mesmo era tempo para brincar mais.
Tás a ver, me deixei enrolar nas palavras da memória e me esqueci de falar dos presentes ausentes deste Natal. Mas também quem é que vai querer saber o que eu ganhei de ser menino bem comportado?
O mais importante foi mesmo que ganhei tempo de não ter tempo de ver o mar e ainda de me lembrar do meu velho aro que foi o meu primeiro monociclo.

Sanzalando

26 de dezembro de 2010

simples 26 de Dezembro de 2010


Faz sol
e eu anoiteço no sofá
preguiçosamente.
Petisco, 
enfardo
e digo sou feliz,
pelo menos até daqui a pouco.
Simples Domingo!
Festa!
Sanzalando

25 de dezembro de 2010

ora bolas

Era madrugada e o céu caía em forma de chuva. Me assustei pois não podia ir ver o mar.
Tocou o despertador e era hora de ir trabalhar. Doeu de pensar que apetecia ficar na cama a sonhar e não podia.
Veio o sol e eu continuava sem poder ir ver o mar. Cambaleando andei o dia todo. Estava apenasmente embriagado de saudade de ver o mar e de lhe olhar com a esperança de lhe ver o outro lado.
Se deitou o sol e a impossibiliadde de ver o mar se mantinha. Cambaleando me deitei com ele.  Acordei e me disseram que o mar não deixava ser visto porque estava noite escura que não dava para ver nem um palmo à frente.
Ora bolas, não foi nada disto. Simplesmente eu estava de serviço e não podia ir ver o mar.

Sanzalando

24 de dezembro de 2010

boas festas

Me deixei estar por aqui sentado enquanto respirava de alívio por ter sido salvo da espera.  A espera afoga, abafa e cansa. Faz anos que me estava a afundar na espera, que me soletrava palavras de desespero e angústia porque me enterrava na espera. Agora fui salvo pelo simples facto que já não espero. Desejo-o na mesma, mas já não sofro desenfreadamente. Um raio de sol faz-me sorrir e talvez me traga a ténue lembrança da sua existência ou do meu intimo querer. Apenas isso. Já não espraio razões nem faço subir marés com lágrimas. Sorrio e um dia, se calhar, eu terei o que quero, sem ter tido que esperar. Mais, diga-se.
Timidamente imagino o que teria sido a minha vida sem essa espera. Desinteressante por certo. Mas agora, o interessante é que não espero e não morro por isso e as imagens que imagino já nem sei se são reais ou força do hábito.
Calcorreio com os meus dedos o mapa. O outro lado do mar está a um palmo. Ali. Deixa-o estar, talvez qualquer dia ele esteja a um dedo de distância. 
Dia da Família, sem neve, calor tórrido, vento fraco, ar irrespirável. Insuportavelmente desejado ontem, querido hoje e amanhã logo se verá.
Me deixo estar por aqui sentado a ver o tempo passar e, salvo da espera, canto canções que invento nas imagens que imagino. Que lindo pôr do sol! Que perfume a terra molhada! Que lindo colorido me rodeia.
Boas festas a todos!
Sanzalando

23 de dezembro de 2010

54 - Estória no Sofá - quando eu era garoto, uma história no Natal

Hoje me lembrei de me sentar sobre o passado e matutar nas contas de cabeça assim como quem faz a prova real para confirmar a dos nove. Quando eu era garoto, assim miúdo de já deixar os calções e pensar sou homem que anda de calça comprida, meu sonho era assim de encontrar a alma gémea, aquela pessoa que pensa assim que nem a gente, que gosta das mesmas coisas que a gente, que faz rir e se ri como a gente. Um dia eu lhe vi e foi um relâmpago duma trovoada na cabeça e no corpo da gente. Parecia haver tremor de terra quando nos encontrávamos. Era o céu. Eu lhe gostava e ela me gostava assim numa força de nada nos desligar.
Foi passando o tempo, num tempo que a gente nem deu por ele e eu me fui desligando e só estava com ela quando não tinha os amigos para me acompanhar. Minha alma gémea tinha virado boneca, assim como as bonecas da minha irmã. Tal e qual. A minha irmã só brincava com a velha e preferida boneca quando tinha vontade, ou não tinha outra coisa para fazer, ou se enjoava duma boneca nova.
A minha boneca começou a ficar muitas vezes mais na estante ao pó. Um dia, acho que foi de repente, porque eu nem vi como é que foi, ela ganhou vida que nem a história do Pinóquio, e quando eu lhe fui tirar da estante e lhe ia levar a passear ela me deixou num raspanente que nem deu para decorar as palavras todas que ela disse.
Sem mostrar eu estava a rir, estava livre para poder sair assim num sempre sem explicações e invenções. Comecei logo a pensar em arranjar uma outra boneca, que ia ser boneca desde o início para não estranhar depois.
Mas à minha volta nada estava mais igual ao tempo em que eu circulava de poiso em poiso e de quando em vez eu ia ter com a minha boneca. O céu agora era cinzento e já não tinha os amigos que também tinham arranjado as suas bonecas. E eu olhava e não via outra alma gémea, porque nos meus olhos da consciência estava gravada a cara da boneca que me chutou num repentemente linear. Pior mesmo, foi quando passado uns tempos que eu não sei quanto tempo, mas para mim foi assim num brevemente logo a seguir, eu senti, eu vi-a ao lado doutro rapaz que fazia mais tempo não andava de calções.
Deu assim um coice de arrependimento que ainda hoje sai lágrima num escondido canto da solidão.
Era eu um garoto, moço miúdo armado em gente grande. 
.


Sanzalando

22 de dezembro de 2010

isoladamente sozinho

Hoje acordei e senti-me sozinho. Não é normal, porque normalmente sinto a responsabilidade do mundo em cima de mim. 
Não é que eu seja importante, esteja convencido de superioridade ou coisa parecida. Apenas porque eu me sinto irremediavelmente responsável de existir, de viver, de querer-te no querer tanto que ainda não inventei uma medida capaz de definir esse gostar tanto. Apenas porque o mundo gira e eu com ele. Talvez por estar frio, talvez porque a maresia saiba-me a gelo salgado, talvez porque o cinzento céu me escurece as pupilas.
Não sei, hoje acordei isolado. O mundo parecia que não existia. Acho tive um eclipse e me deixei ficar na penumbra da minha insignificância. Mas mesmo assim me olhei no espelho e me disse que ia seguir em frente. Tive medo. Seguir em frente sozinho pode ser pesado para um ser fragilizado pelas desilusões e outras contradições. Mas o mundo gira e eu com ele.
Hoje acordei  e senti-me sozinho, por isso não fui ver o mar. Me encerrei em casa e recordei os tantos recordares que tenho na minha memória, o teu perfume, o teu calor, a tua cor tórrida de muitos tons. 
Hoje recordei-me e tive medo.
A vida continua mesmo quando eu estou parado num nada de mim. Será que ainda me lembro de todas as curvas da vida?
Hoje acordei isolado até de mim e me deixei ver-te de perfil.

Sanzalando

21 de dezembro de 2010

um the end, como tantos outros

Me sento debaixo de chuva e desapego-me de dores e lágrimas, tentando-me reinventar num sorriso um novo eu, alegre, feliz e desapegado de consciências virais, males de amor e outras coisas que tais. Procuro dentro de mim, como quem cata piolhos numa cabeleira farta e sem medidas de tempo, o lugar onde eu me possa encontrar.
Me sento por aqui e escancaro um grito que se me estampa no rosto revelando as minhas perfeições, feições e confusões num exorcizar de fantasmas que inventei.
Debaixo de chuva me purifico procurando palavras inéditas que revelem o meu novo eu.
Aqui sentado, sob uma chuva de inverno pensando no verão do inferno mental, me afogo em olhares, me perco em novidades e me desprendo do que aprendo.
Criei-me à imagem e semelhança dum sonho e hoje me apago e digo que foi um filme que vi num cinema no momento em que aparecem as palavras the end.


Sanzalando

20 de dezembro de 2010

balanço-me no tempo

Sentado num por aqui algures continuo a fazer o balanço. Não sei se vale a pena, se aprendo ou apreendo alguma coisa. Não sei mesmo se a quantidade de matéria tem forma de ser contada, analisada, quantificada e classificada. Mas faço um balanço, quanto mais não seja, para ver se já perdoei erros imperdoáveis, se já substitui gente insubstituível na minha vida, se já me decepcionei com gente indecifrável, se já abracei para me proteger, se já ri quando o não devia ter feito, se já chorei quando devia sorrir, se já fui amado e não soube amar, se já abafei o silêncio da dor calada da saudade, se já me calei para ouvir a tua voz, me sentei para te admirar na penumbra da minha inexistÊncia.
Sentado por aqui, morrendo de tristeza, afogado de nostalgia e saturado de saudade, contabilizo o tempo que falta para deixar de tempo.
Se eu soubesse que era amanhã eu diria que ainda tenho tanto para fazer e pedia um adiamento.  Mas como não sei quanto tempo tenho de tempo para pensar no tempo que me falta, contabilizo amores, saudades e lágrimas, sorrisos e gargalhadas, cartas rasgadas antes de serem escritas. 
Sentado por aqui contabilizo-me num balanço, como quem repousa na beira do mar sereno dum dia de inverno.




Sanzalando

19 de dezembro de 2010

pedi

Pedi uma Cuca e me deram uma Nocal. Bebi sem protestar. Eu queria mesmo era matar a sede da saudade.
Pedi uma praia de água quente e me trouxeram uma areal de água gelada. Desesti mergulhar. Eu queria mesmo era afogar a nostalgia e adiei.
Pedi um sol de luz brilhante e me deram um cinzento pardo de um meio dia polar de inverno. Desisti de pôr os óculos escuros. Eu só queria era clandestinamente chorar e calei o choro até noite cerrada.
Pedi uma gargalhada alegre de gente que brinca no passeio e na estrada. Me deram o barulho de carros interminavelmente parados. Eu só queria recordar os meus tempos de criança e desisti de imaginal.
Pedi uma letras quentes para escrever uma frases tórridas e me deram palavras soltas. Desisti de poetizar.
Pedi-te e se esqueceram de me ouvir.

Sanzalando

18 de dezembro de 2010

agasalhado a ver o mar

Agasalhado como quem está num dos polos, me sento a ver o mar. 
Lá, está sol, há gente na praia que brinca, outros mergulham e outros namoram sabendo que uns anos mais tarde vão recordar estes anos como os anos de ouro das suas vidas.
 Eu sentado aqui, agasalhado até mais não, recordo os momentos de felicidade que ao pé do mar senti. Tu estavas perto, ali ao meu lado e se calhar hoje nem te recordas de mim, nem sabes se existo ou se o sabes não o sabes onde. Também quem me vai reconhecer aqui sentado e agasalhado com ar de sonho?
É, às vezes as coisas correm mal e por mais que procure um culpado, porque tem de haver sempre um, eu não me encontro. E estou aqui agasalhado a ver o mar.
Tento esconder nas dunas do esquecimento a tua imagem, a tua presença constante, o teu ar altivo, mas, não sei se é do frio, se é só mesmo da saudade, não me sais do pensamento. Não sei se é por causa dos deuses ou dos diabos mas a verdade é que me assusta estar aqui sentado, agasalhado a ver o mar e ter-te dentro de mim a olhar-me constantemente e eu a tentar-te esconder de mim e sem o conseguir.
Já sei, é a memória, é a imaginação, é a nostalgia, é a doença doentia de te amar e a tristeza de ver as coisas frias num dia de inverno em sonho de verão.

Sanzalando

17 de dezembro de 2010

Paragrafozinho

Percorro a praia num passo lento, como quem quer observar cada grão de areia, cada onda que se espraia num preguiçar dolente. Cada brisa perfumada com odores tropicais me eleva a um patamar de sonho e nostalgia que eu acho que mesmo sabendo aqui é inverno há outras maneiras de sentir o verão. Eu estou num verão ornamentado de cinzento inverno, perdigotado de chuva miuda e soprado de frio polar. Eu estou num lugar onde quase consigo ver outros lugares. Preciso só mesmo de me pôr em bico de pés na imaginação e pular de memória em memória.

Sanzalando

16 de dezembro de 2010

balanço

Me sento num algures por aqui, ou por ali, tanto faz que hoje estou apenas para amar. Ouço o mar, vejo o mar, sinto o mar. Por aqui me deixo estar e talvez recapitular a matéria dada. Não é nesta altura que se faz o balanço? Mas que balancei eu? Solilóquios de nostalgia e saudade também contam como fazer dalguma coisa? Lágrimas choradas nas noites claras de silêncios escuros, também contam? Esperas em vão duma voz que não se ouviu também podem ser contabilizadas?
Me sento por aqui à espera duma qualquer coisa que qualquer dia já nem sei o quê que é.
Hoje não vi o sol, apenas ouvi o mar, vi o mar e senti o mar. Hoje me balancei no baloiço dum parque infantil que um qualquer Sousa toma conta e me lacrimejei de esperar.

Sanzalando

15 de dezembro de 2010

verão de saudades

Hoje me sento de frente para esse mar e espero ouvir um marulhar que me diga as coisas que eu gostaria de ouvir. Hoje ele se recalmou num ar de inocência e de tranquilidade que até parece é um inocente lago dum interior qualquer. Com dificuldade lhe ouço no quase silêncio das suas não existentes ondas. 
Enquanto nada me chega vou pensando no quase salvamento desse naufrágio que é a espera. Aproveito um raio de sol deste quase inverno para inventar um verão de outro lado e me levar por pensamentos que vão das raízes aos dias de hoje.
Me estico nas lembranças com um preguiçoso deitar e perco-me nas esquinas da memória com medo de me esquecer. Tantos são os nomes que eu os soletro um a um e fico com a ideia que cada dia um a um se vai perdendo. Nem mesmo o mar mos diz e me corrige.
Sento-me frente ao mar num verão de ideias, nado num mar de lembranças e bóio num lago de imagens virtuais.
Hoje me sento frente ao mar e me veraneio de saudades.

Sanzalando

14 de dezembro de 2010

ouvindo o silêncio

Hoje caminhei até aqui, ao meu mar, para estar em silêncio. Queria ver se me encontrava. É que ando um pouco fugido de mim e até os meus amigos têm-me procurado. Sempre em vão. Desapareci para parte incerta de mim. Dizem-me. Então está na hora de eu me encontrar e dizer-lhes depois que estou aqui e com eles.
Mas na verdade tem sido difícil suportar-me, ouvir-me chorar sonhos, sentir-me irrequieto em imagens de memória e saber-me preso à imaginação do passado que não existiu na forma como eu queria.
Por isso ouvindo o mar, pensei, em silêncio eu me vou encontrar e vou saber as coisas que estão do outro lado de lá da linha horizontal que a vista alcança e vou voltar a ser o eu que eu queria ser.
Na verdade eu não posso aguentar mais estar sem contar-te as minhas coisas, aquelas que passam no coração, aqueles que fervilham na alma e que eu banho em palavras doces que te digo.
Hoje, aqui perto do mar, no meu silêncio, mordisquei os meus dedos enquanto me recordava dos teus olhos e  procurava ouvir palavras saídas da tua boca.
Hoje vim ouvir o silêncio.

Sanzalando

13 de dezembro de 2010

Eu e o Natal ou vice versa

Acordei ainda era noite escura, assim como a memória apagada nos labirínticos tempos perdidos. Me disseram sussurando que era Natal. Fiz um esforço para encontrar o significado. Me disseram era a família, a paz e a comunhão. Me lembrei de recordar memórias que estavam adormecidas assim como a roupa nova que sempre vinha acompanhada de um par de meias. E assim o tempo foi passando até quase já era madrugada. Foi então que resolvi fazer, de cabeça, uma árvore de Natal, em que em cada ramo coloquei um sonho realizado, como se fosse uma bola de enfeitar. Fiz tudo com alma e muito esforço. Deu resultado.

Sanzalando

12 de dezembro de 2010

tudo passa, me disseram

Me disseram que tudo passa. Até mesmo esse capim que teima em crescer à volta de mim como se eu fosse uma estátua de tanto tempo eu lhe estou à espera. Mas é assim este mundo de maldade em que eu não consigo desgravar da memória o amor dum coração. Tudo passa, me disseram.
Mas estou a ver que não deve ser assim tão verdade essa linha de pensar. Se diz só para animar.
Tudo passa. Não tem ferida que não cure. Pode ficar marca, mas cura sim. Me disseram. Mas quem me disse não sabe a quantidade desse amor que me arrasta no tempo faz tempo.
Tudo passa, basta sé encontrar o caminho certo.
Então é isso. 
Já me passou. Eu é que não encontrei o caminho certo ainda e por isso é que ainda não dei por isso.
Tudo passa mesmo que sintas cansaço e dor, me disseram.
Cansado estou, dorido também mas o amor continua cá como se estivesse dentro dum livro, numa estante da memória e o vento lhe teimasse em abrir na página tantas onde ele se encontra.
Tudo passa, me disseram.

Sanzalando

11 de dezembro de 2010

Sol mas vento

Ensolou outra vez, mas o vento veio me atrapalhar nesta espera dum esternamente adiado sonho. Aqui na areia longe do revoltado mar que até está rouco no seu marulhar e não lhe consigo perceber os recados que possam chegar desde o outro lado. Me apetece até cantar, sabendo que o vento vai empurrar as minhas palavras para dentro outra vez e ninguém se vai assustar.
Mas eu já não sei canção nenhuma. As que eu sabia se esconderam nas teias do esquecimento, se camuflaram nas areias do pó memorial e agora só me restam títulos. Ah, acho vou inventar uma canção que cante os meus sonhos e naufrague as minhas lágrimas. Impossível? Então nem vou nem tentar. Impossiveis já me sobram os outros meus sonhos. Este eu descarto num baralho de areia e com ele faço castelos de brincar à espera que o mar me venha derrotar.
Aproveito o sol e deixo me levar pelo vento que sopra contrário ao que eu queria.
Não há modo de chegar a ser feliz.


Sanzalando

10 de dezembro de 2010

aproveitei um solinho

Caminho pela praia, aproveitando uma aberta do sol. Olho para lá da linha que me separa do horizonte que não vejo e procuro encontrar-te. Tantas e tantas vez o fiz e outras tantas me perdi. Vais ver esse túnel que escolhi não tem luz nem no fundo dos fundos dele, pois eu encontro só interrogações e pontos que me parecem são reticências. Assim, um dia, eu vou é chegar ao infinito das possibilidades e tu ainda longe. Já sei que não basta só caminhar, é preciso também querer e se calhar também um pouco mais de garra… mas como posso ter tudo isto se eu só consigo pensar-te.
Se eu estivesse a olhar para a estrelas, se procurasse sentado numa sombra duma qualquer bananeira ainda que aceitava eu não te encontrar.
Mas não olho nem estrelas nem me deixo dormir.
Aproveito só este pedaço de sol para poder sentir-te um pouco dentro de mim. Já sei que me vai dizer que eu já te fotografei memóricamente milhares de vezes, mas eu ainda não te tive sem ser na minha imaginação as vezes que eu acho eu merecia.
Caminho cansado pela praia aproveitando uma folga com sol.


Sanzalando

9 de dezembro de 2010

me acordaram no susto

Me deixei dormir noite dentro. Sonhei os sonhos do costume. Me embalei e sonhadamente decidi que não ia acordar. Nem hoje nem nunca mais. Ia ficar mesmo assim sempre a dormir e a sonhar até acabarem todos os sonhos a que tenho direito. Mas num susto me acordaram. Pensei eram o rufar dos tambores a saudarem a minha chegada ao ponto de partida. Acordei e vi que eram apenas trovões a me assustarem antes de deitarem litros de água rua abaixo.
Me assustei porque era no momento em que eu sonhava com ela estilizada, alta e morena, nova, porém madura e os seus olhos negros fixados nos meus. Era a primeira vez que ela me olhava e eu via e sentia. Ela sorria-me e eu lhe sorri. Não tive tempo de lhe dizer uma única letra. Fui abruptamente acordado.
Me assustei porque ela me olhava e no momento que acordei pensei que morri e o sonho se apagou. Mas afinal eu ainda estava vivo, apenas o sonho fora interrompido pelo trovão. Amanhã, eu sei, vou pegar nele, no momento da interrupção e vou continuar a lhe sonhar, ela morena, alta, nova e madura, de olhos negros cativantes e não vou deixar que nenhum trovão me acorde outra vez.


Sanzalando

8 de dezembro de 2010

eu queria ter um sol

Já não sei onde chove, se na rua ou apenas na minha alma. Sinto o sabor salgado, não sei se foi uma lágrima que escorreu ou se foi uma gota desse mar revoltado que me molhou. Eu estou molhado porque não me abriguei da chuva e porque me atiro nos sonhos estejam eles onde estiverem.
Hoje, apenas hoje e nuns tantos hojes que tenho tido, acho merecia um sol só para mim. Um sol onde eu pudesse reflectir todas as memórias que te tenho como se fosse numa tela dum cinema maior.
Mas hoje chove e as imagens estão a ficar tremidas, assim como minúsculas lentes que passam à frente da máquina que as projecta. Ou será que a memória se está a cansar e já não tem a força de outrora?
Eu hoje devia ter um sol só para mim e assim como num caminho de volta eu poder sonhar sonhos novos e deixar-me embalar.
Hoje eu devia ter um sol que me deixasse ver para além dos meus telhados, para além do limite deste meu mar, para além da minha imaginação.
Hoje eu queria ter o brilho de verão no olhar.

Sanzalando

7 de dezembro de 2010

flash

Abrigado da chuva e vento olho esse mar grande que está branco de raiva espumante e faz barulho que até me assusta. Nos separa um frágil vidro. Simples obstáculo transparente encardido que com um ligeito toque se esfrangalha em cacos pelo chão. Já sei, estou eu nos meus filmes de antes de entrar a verdadeira acção, se é que algum dia a vou ter.
Mas na verdade nem apanho chuva, nem me despenteia o vento e nem eu tremo de frio. Tremo apenas de medo que alguma onda mais revoltada me venha desassossegar. 
De repente tive um flash, me veio à ideia a morena alta, a que no verão veste biquini azul e que no inverno passeia todas as seis da tarde pelas ruas da cidade. E nesta imagem ela sorria, o que me fiz sorrir atrás da minha timidez e escondendo a vergonha de que alguém me visse sorrir num nada. Mas ali estava ela, superior às ondas, indiferente à chuva e ao vento e algum trovão que ouvia vindo lá de longe. Sempre altiva, a moça.
Dei um passo atrás como que a dar espaço para a conseguir ver de corpo inteiro. Meus olhos me estavam a mentir. Ela não estava ali. Fora apenas um flash de recordação.
A chuva é real como o é o vento e o mar revoltado. O resto é a minha memória a se confundir num retrocesso mental, na doce loucura de voltar a ser jovem, na minha rua, no meu lugar de ser feliz.

Sanzalando

6 de dezembro de 2010

53 - Estórias no Sofá - uma história de amor

A mulher se sentou no sofá da sala sóbria, de mobiliário robusto esculpido em madeira nobre, fruto dalguma herança que novos não eram, apesar de muito bem conservados. Estava só. Pouco importa e muito pouco relevante para a sua constante, procurada e desejada, solidão. Aliás, a solidão e o silêncio faziam-na conhecer-se melhor e amplificavam todos os seus sentidos.
Às vezes o silêncio era demais, pensava.
Quando assim acontecia punha uma música no ar, suave e quase em surdina, e se deixava embalar nos sonhos que estavam adormecidos no ar daquela sala. Outras vezes... era o absoluto silêncio.
Umas vezes rabiscava em papel branco com um lápis de carvão as suas lembranças, os seus lamentos, as suas saudades, os seus medos e as suas alegrias. Conversava consigo em forma de palavras escritas. Dizia, memórias passadas para uma vida futura. Quem a visse pensava estava louca, pois tanto podia parecer estar a dormir um sono profundo, como num estante estava a rabiscar uma tantas letras, a atirar com raiva uma folha amassada de papel contra a parede assim num libertar de angústias, como serenamente olhava pela janela. Nesta altura quase de certeza estava à procura da palavra exacta, pois de seguida ia correr paras o sofá e raivosamente escrevia com medo de a perder. 
Terminada a música, umas vezes o silêncio era notado e lá se levantava ela para pôr outra, sempre suave e quase sempre em surdina., outras vezes o silêncio permanecia silenciosamente calado e não parecia incomodar. Tantas e tantas vezes inspirava sofregamente duma só vez o ar daquela sala, como se tivesse medo de sufocar por se esquecer de respirar, outras vezes imóvel, sonhava, ou se recordava ou apenas se ausentava esquecendo de levar o corpo. Mas no instante seguinte voltava para o papel como por magia.
Acho eu quer nunca lhe ensinaram a esperar e nunca lhe disseram que o mundo anda às voltas. Fora sempre a menina rica, mimada e que tudo tinha.
Agora, mulher madura, solitária, viúva de meia dúzia de anos, sentia a falta do seu Manuel. Não, não era na cama. Era o perfume, a gargalhada fácil, a voz compassada num ritmo frenético. Não, não era a carícia. Era só mesmo a presença enorme daquele corpo volumoso enchendo a sala e o seu olhar ternurento disparado contra ela.
O que ela escrevia afinal, vim a descobrir muitos anos depois, eram cartas ao seu Manuel, ao falecido e saudoso marido. Ela não conseguia viver sem ele, mesmo quando mostrava ser a mulher forte, a chefe, a dona, a rígida e fria senhora de seu nariz.
No sofá regressava a mulher doce e humana que ninguém sabia existia naquela figura.
Afinal de contas, a mulher que procurava o silêncio e desejava a solidão fingia não ser a mulher madura que sofria no silêncio da solidão.

Sanzalando

5 de dezembro de 2010

gelado mar calado

Janela sardenta de pingos de chuva me separam deste mar que teima em estar calado nos segredos que tem para me contar. Eu sei que ele tem vezes, muitas, que me faz sofrer só para me ver triste. Quem é que pode compreender um mar? Esse mar que esconde segredos que nem à lua, está ali revoltado parece eu tenho culpa de ele estar quase gelado e a outra parte dele quase a ferver. Por isso estou deste lado da janela aquecido pela lareira da esperança, mimado pelas gotas de chuva que rolam nos vidros e parecem são lentes de ver ao longe mais perto.
Vou mordiscando os meus dedos mostrando uma timidez enquanto observo o mar e me deixo levar para a minha rua, para o meu café, para minha mesa onde os kotas toleram a minha presença porque sabem um dia eu vou contar as estórias que lhes ouvi ou fingi ter ouvido.
Vou torcendo o lábio enquanto penso nelas, as meninas formosas da minha escola que nunca me olharam mesmo quando me falavam. Eu sei que tinham medo dum susto ou que um dia eu lhes podia dizer o nome em voz alta.
Vou fechando os olhos enquanto me embalo na cadeira de balouço feita de aduelas de barril que estava na minha varanda, qual meu posto de controlo.
E o mar gelado continua calado no que tem para me contar. Um dia, ele vai querer falar e eu não vou estar aqui para lhe escutar, nem para me recordar desses tempos todos que guardei na memória de adolescente que se esqueceu de crescer.

Sanzalando

4 de dezembro de 2010

mar gelado

Apesar do gelo que me rodeia atirei o meu corpo para dentro do mar, sentido figurado é claro, que ainda não adoidei, e comecei a caminhar rumo a sul. Pensava que vou conseguir lá chegar. Não posso é partir assim com força sôfrega porque ainda escorrego nalguma palavra mal pronunciada, ainda me canso antes do primeiro olhar para trás. Sim, a gente sempre tem uma hora que olha para trás e eu não sei porquê. 
Mesmo com o gelo que me rodeia desconsigo ficar no quente duma lareira a sonhar labaredas e chamas nos seus desenhos anárquicos. Aqui, caminhado sobre o mar, mesmo em sentido figurado, eu estou mais perto. Basta-me chegar só até ali e ainda mais perto estarei.
Eu pensava que sabia tudo sobre este amor, mas agora me sinto um completo ignorante. Pensava que tudo não era mais que um jogo de palavras, um baralhar de ideias sonhadas, um desejo ardente de ser diferente, mas agora estou nas tuas mãos, sentido figurado é claro, pois isso mais não é que outro desejo. Caminhando sobre o mar gelado eu vou até ao fim do mundo se for esse o meu destino e ver-te ao longe o meu querer. 
Neste mar gelado transpiro-me de sonhos e desejos.

Sanzalando

3 de dezembro de 2010

cinzentei de luto

Faz assim é madrugada baixa ou noite alta, que eu ainda não sei quando é que uma termina e outra começa, foi talvez porque nunca vi um fio a lhes separar. Mas era assim a horas mais impróprias para mim, que vagabundeava por aí e fui ver o mar. Não lhe vi o azul, azul de marinho, e nem lhe vi calmo como eu precisava. Me sentei a lhe apreciar sem a luz das estrelas que estavam tapadas por uma cortina de escuridão. Procurei apenas lhe adivinhar a alma, se é que mar tem alma, e consegui apenas ouvir o lamento forte das ondas a se rebentarem na areia.
Madrugada baixa ou noite alta não é hora de eu andar por aí a vagabundear memórias, recordações ou saudades. Me arrepiei no frio, me enervei nas cores fortes de cinzento medo e me calei no barulho assustador desse mar que não está azul marinho.
Afinal de contas foi uma noite em que eu perdi um sonho e me acinzentei de luto e raiva.

Sanzalando

2 de dezembro de 2010

é mesmo melhor só

Me deixo sentado por aqui a ver o tempo passar e ver se chega a hora dum pôr do sol que encha as medidas. Que seja uma fracção de minuto... quero é ver-me sorrir. Não sorriso de lábio, sorriso mesmo de alma toda. Aquele sorriso que mostra um brilho, puxa estilo e faz parecer é dia à volta.
Mas enquanto esse momento não me chega, aqui me fico a deambular por pensamentos e sonhos como se fosse essa a minha sina. 
Acho mesmo eu devia ser assim descartável. Eu explico. Se não me apetecesse ver coisas, eu tirava os olhos e eles ficavam ali a descansar sem tendência para se entreabrir e espreitar. Se não me apetecesse sentir, eu punha o coração ali ao lado a bater devagarinho só para se manter. Se não me apetecesse pensar eu tirava o cérebro e ficava eu de cabeça vazia a descansar. Se não me apetecesse sonhar eu tirava a alma e dormia.
Eu sei que não é assim muito possível porque tem gente que logo aproveitava para trocar umas peças daqui por outras que não sei qual a origem e eu não ia dar mais certo.
É mesmo melhor por enquanto ficar aqui só a ver o tempo passar.


foto d'aqui
Sanzalando

1 de dezembro de 2010

aqui, paralelo

Me passeio nesse mar fora, assim num paralelo em que nem me molho e nem me entro nele porque não me apetece hoje atravessar fronteiras para encontrar uma vida nova, uma vida em que me reinventava em cada segundo, esquecendo o passado insignificante duma existência quase anestesiada. Queria mesmo era andar de mão dada com a serenidade e que os meus olhos deixassem de chorar esse choro silenciado num sorriso triste. Queria mesmo era poder dizer que caminho, em direcção ao futuro, com passos seguros e sem estar estéril de sentimentos. 
Mas a minha calma e a minha esperança não me acompanham e, despido de força, caminho paralelo na praia lacrimejando silêncios abafados em sorrisos tristes.
Mas pelo menos aqui eu sinto o teu olhar, gravado na memória eu sei.
Mas aqui também sinto o teu perfume, recordações dum passado.
Mas aqui sei que estou aí, desejos de futuro incerto.
Na verdade daqui pergunto se tu te recordas de mim, te lembras do meu perfume e consegues ver o meu olhar profundo de passado?
Aqui, paralelo a esse mar, minha ponte, gasto as palavras no tempo e imagino a minha nudez transformada em força baseado num querer mais forte, embriagado de esperança, desejo de ver sonhos tornados realidades.

Sanzalando