recomeça o futuro sem esquecer o passado

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31 de agosto de 2006

A calma que precisas

Me sento à beira mar. Num lado tenho a birra estupidamente gelada, no outro estás tu com a tua sede de me ouvir. Te falo, numa surdina para que os outros muitos que nos atropelam, nos borrifam com areia e nem nos olham com um olhar de pedir desculpa, não possam nem ouvir nem suspeitar do que estamos a dialogar numa voz só.
Tu sabes que tem muitas vezes que dou de mim, a falar em ti que é ela, aquela coisa enorme que me enche o coração, que preenche todos os meus momentos, os meus risos, as minhas lágrimas, as minhas saudades.Tu sabes que eu lhe sinto por vezes, o seu olhar no meu ombro, sem pressa, na noite adormecida, nos silêncios afogantes da solidão. Tantas vezes percorro os caminhos ao longo deste zulmarinho que aqui termina com os olhos lá no início dele, fazendo as minhas madrugadas passadas em claro. Eu lhe afago os cabelos, lhe vejo, lhe sinto, lhe cheiro e me reconforto em todas as suas recordações.
E tu? Será que te dou a calma que precisas na calma que te dou nestas caminhadas falantes?
Sanzalando

Outra casca de noz

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30 de agosto de 2006

Uma explicação

Hoje nem me apetece caminhar, nem estar sentado na poltrona esculpida na rocha nos dias de fúria do zulmarinho. Não, não estou zangado. Não, não me aborreci com a vida. Não, não enraivei-me assim num repente. É que estamos no mês que é de Agosto e ter de bulir no duplicado, ter os herdeiros me arrastando para as brincadeiras, ter os almojantas, ter os amigos, ter tempo de ainda fazer as minhas caminhadas ou os meus tempos de contemplação, falta tempo no que resta do dia. Cansaço sobra que até dava para vender em resmas, paletes ou montes.
Neste mês minha vida parece um filme a preto e branco dos anos 50, camaralentando todo um ano de amores, mimos, carinhos e palavras docemente proferidas.
Chegará Setembro e ficarei com saudades deste mês. È sempre assim como sempre tem sido.
Tu, que me acompanhas neste caminhar sabes que é assim por isso não estranhas, por isso tu me segues mesmo atrás do meu silêncio que nunca é duradoiro.
Tem amigos noutros caminhos que visito mas que nem deixo pegada porque o cansaço se arrasta até na ponta dos dedos para teclar as falas que eu gostaria de falar.
Chegará Setembro e tudo ficará em dia, todo o outro mundo volta na existência do meu dia a dia. Até ao ao dia em que me porei ao caminho de encontro com ela, a outra, a que está amarrada no meu coração e que eu não vejo a hora de lhe tocar e sentir como que a fazer parte dela.
Mas eu sei que esse dia vai chegar, Tarde ou cedo chegará.

Sanzalando

Diaporama (20)

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29 de agosto de 2006

Platão e eu

Caminho com ar de erudito e me ponho a falar-te de Platão. Esse mesmo, o grego que escreveu a Alegoria da Caverna. Acho que é o texto mais conhecido dele. Não sei, porque não lhe conheço muitos. Mas esse conheço e lhe gosto.
Tem pessoas que vivem anos a fio dentro duma caverna e só vêem as sombras da realidade, pois para além de estarem acorrentadas, estão ainda de costas voltadas para a abertura da caverna. Assim a visão delas é totalmente ofuscada, já que a única luz que conseguem ver é projectada pela sombra de uma fogueira que vem desde a entrada da caverna. Se habituaram a isso e se alguém conseguir sair da caverna e descobrir a existência do sol, voltar dentro da caverna e contar a realidade que viram, ele será, na opinião de Platão, morto. Os que estão dentro da caverna não vão acreditar no relato daquele que conseguiu sair.
Me estás a acompanhar? Me consegues seguir neste dia de coisa erudita? Se não conseguires, deixa estar que eu te explico.
Quando nos escondemos na caverna do nosso eu e fechamos os olhos às coisas que acontecem à nossa volta, porque essas coisas perturbam, mostram a dura realidade de um mundo frio, criado por pessoas que se fecham dentro de si mesmas, para se esconderem do medo que sentem, da falta de iniciativa, achando que nada tem a ver com as crueldades que acontecem, com aqueles que passam necessidades, com as vítimas de toda espécie de violência, com todas as guerras, com a fome, a falta de sistemas de saúde, de educação, de casa para morar; de justiça, com pessoas que sofrem perseguições, com aqueles que estão a necesitar de uma ajuda, mesmo que seja apenas uma palavra encorajadora estamos indo contra o projecto de felicidade individual.
Quando vivemos nesta caverna nos cavernamos. Passamos a ignorar a beleza das coisas neste mundo que é nosso. Vivemos só da sombra, como os personagens de Platão, não querendo saber da existência do sol que há lá fora, pois quando há luz se vê com clareza a lixeira que está à nossa volta e lixeira é coisa que incomoda muito. Ver com clareza significa contemplar as maravilhas deste mundo. Mudar significa ter no mínimo a coragem para enfrentar a opinião daqueles que nos querem moldar à sua maneira, teremos que ir contra e para isso é preciso muito esforço e firmeza.
Sol é luz forte e nós somos um espírito de luz e quando a gente se afasta dessa luz a gente se afasta da gente mesmo.
Tá na hora de mostrar a luz , de sair da nossa caverna e levar os nossos sonhos avante, nem que a gente tenha de nadar esse zulmarinho todo até no outro lado, até no início dele, olhar na lixeira e ver que pode ser limpa, olhar na nossa volta e iniciar uma cruzada que no seu início pode ser molhada mas depois ficará o sal que tempera uma vida, uma estória, uma herança.
Está a chegar a hora. Tem de estar.
Me acompanhaste? O teu silêncio perturbante me deixa sempre nessa dúvida.

Sanzalando
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A tua VOZ

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28 de agosto de 2006

Intimidades (2)

Caminho nesta areia de mil cores com direcção a um sentido sentido na alma. Não estou na melancolia nem submerso na tristeza. Caminho num caminhar cabisbaixo porque o tempo de ir a tempo lhe vejo escorregar pelas mãos e os passos dados são assim como dois na frente e a exponencial na retaguarda, fazendo a distância se aumentar e a visão já não tem capacidade para ver assim tão longe. Ou é mesmo que eu quero o que é amanhã já hoje mesmo?
Mas eu te digo que o imperfeito não participa do passado. Actualmente ando mesmo implicado é com o futuro do pretérito. É que para mim, o futuro do pretérito é um tempo verbal absolutamente perdido na linha temporal. Não é futuro, não é pretérito e não é presente.
Pensa comigo: ele expressa uma condição e condição é um esquema que ainda não aconteceu e que por este andar pode nem acontecer. Te reafirmo com o coração nas mãos que esta maçã daria uma excelente torta. Daria. Só que ainda não deu e isso me deixa assim como que sem saber o sentido da direcção da caminhada. Porque alguém já podia estar a comer esta maçã há muito tempo e maçã comida não vira torta. Mas eu te dizia que se é futuro, não pode ser pretérito e se é incerto, não pode ser futuro. Acompanhaste meu pensamento?
E antes que me perguntes, não, eu hoje não bebi não bebi a minha birra estupidamente gelada.
Só caminho contigo nesta intimidade da transparência carregada de inocência e de esperança
Sanzalando

Diaporama (19)

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27 de agosto de 2006

Intimidades


Voltando a ter a minha luz dentro da minha alma enegrecida pelo caruncho dos sonhos não realizados porém nunca esquecidos. Adiados, apenas eternamente adiados, num eterno que pode terminar ali naquele instante ou lá, naquela noite de trevas, relâmpagos e trovões.
O problema é que tu percebeste o problema. E o problema é ela e não os outros.
Os outros têm crescimentos, maneiras de estar e de ser diferentes dos dela. Os outros são os outros. E ela não pertence a eles, aos outros.
O problema é que meu lugar não é este. Estes assuntos não são dela e o mundo muito menos.
Foste deslocada novamente do teu eixo. Puxaram o meu tapete. Ela não se adequa à minha presença, eu não me adequo à sua ausência de mim.
Quando será que eu vou poder viver num mundo em que eu não me sinta tão fora do centro? Quando eu vou poder conviver com as pessoas que eu queria estar? Talvez nunca, talvez amanhã, talvez num talvez qualquer da vida. Talvez esta seja a parte séria da minha sina de ficar num só. De sempre estar só.
Eu devo ter feito muito mal a alguém numa minha vida passada ou, simplesmente, o meu estilo de vida não é para ser vida. O pior é que eu fico com a segunda opção. Te desabafei este desabafo enquanto caminhamos ao longo da areia das mil cores porque hoje me apeteceu te abrir um pouco a minha janela do meu aposento mais interno da vida. Tu me mereces saber coisas de mim que eu às vezes nem sei que existi nelas
Sanzalando

Numa casca de noz

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26 de agosto de 2006

O mundo que roda ao contrário

Caminho levando-te no meu paralelo assimétrico. Segues-me como lapa se segura numa pedra deste zulmarinho. Eu sei que tantas vezes eu gosto. Outras vezes o teu riso, que eu sei que ris pelos olhos que eu vejo, me incomoda, o teu jeito de andar, mesmo que eu não te veja, me incomoda, a tua vida, que desconheço na totalidade, me incomoda. A música que vem das ondas do zulmarinho me atrapalha, a conversa alheia é ruído surdecedor que ao meu jeito eu detesto.
Eu não me adequo, não me enquadro, sou deslocado.
Tem vezes que a conversa não me cabe. São cochichos soltos, assuntos perdidos, desconexos.
Não parecem meus amigos.
As coisas mudaram realmente.
E meu nome se é por alguns deles dito em voz alta me parece martelada ao entrar no meu ouvido.
Sou eu, ou o mundo que está a rodar ao contrário?
Vais ver foi que apagaram a luz e não me avisaram e eu me encontro na fase escura da vida. Vais ver eu me encontro desligado da minha corrente alterna numa alternância de consistência indefinida.
Desligado por tempo indeterminado deve ser o meu estado de mente na demência desconsertada de muita birra gelada vertida pela goela.
Mas por favor, não me deixes aqui a falar para as pedras e para as gotas do zulmarinho que me chegam desde lá do início dele e que são a minha bateria de um móvel estático.
Sanzalando

Zulmarinho ao sábado

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25 de agosto de 2006

Um segundo depois de outro e volta ao normal

Posted by Picasa Me sento na poltrona e caminho com os olhos. Disparo-os assim mesmo para o outro lado da linha recta que é curva e consigo lhe sentir os perfumes, o bafo quente do sol que lhe cai em cima. Consigo sentir-lhe como se eu estivesse a lhe pisar, eu lá, inteiramente lá. Pouco me importa que a minha areia de mil cores esteja a abarrotar de gente, que haja um coro de sons desafinados e desavindos a quererem ensurdar-me, uma nuvem de salpicos do zulmarinho enfurecido a bater na base da minha poltrona a me querer parece dizer que eu estou a mais. Me fico aqui e daqui só vou sair num breve que não faço ideia quando é que é.
Tu me olhas com ar de quem nem entende o que eu consigo frasear. E pelo teu ar imagino que imaginas que nem eu me entendo. A loucura é o caminho da certeza e eu tenho quase a certeza.
Olha que eu queria mesmo era uma birra loira estupidamente gelada e entender-me no desejo de me encontrar onde o meu coração, fábrica de amor, queria gostar de estar.
Me recuso a aceitar os segundos que me querem dar. Me recuso a ser um segundo mais aquilo que querem que eu seja. Me recuso porque eu sei que eu gasto esse segundo e me vão prometer outro e assim sucessivamente.
Eu quero mesmo é fazer um intervalo de mim para mim.
Já te vejo a vociferar palavras desconexadas no teu cérebro. Mas não te preocupes, é só mais um segundo.
Sanzalando

Diaporama (18)

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24 de agosto de 2006

Sombra de solidão

Caminho debaixo do sol, perseguido pela minha sombra. Sussurro palavras que só tu consegues ouvir porque são os sons do meu silêncio, a introspecção da minha alma, os segredos que me chegam nas ondas e correntes do zulmarinho. Tu segues-me, tal qual a minha sombra, porem não me rodeias como ela, ao sabor do sol. Te ouço que respiras e soluças lágrimas conforme os dias das estórias que te falo, ela, a minha sombra, segue-me como ruína imóvel da minha alma num silêncio de molduras e desformações do terreno que piso, sei que está ali porque tenho corpo. Se fosse fantasma teria a sorte de ser assombrado. Tu, minha musa de ouvidos atentos, choras as minhas lágrimas de saudade, de angústia e melancolia. Conto-te as estórias de kiandas, kibandas e outras andas de um andar anárquico por vezes utópico. Absorve-las como um papel mata-borrão absorvia a tinta de uma caneta impertinente.
Adoro-te porque me segues ou segues-me porque te adoro? Ou outra coisa que não vem para aqui, porque está do outro lado da linha recta que é curva?
Estou-me a imaginar em novos e imprevistos horizontes. Estou quase ansioso novamente por tocar as linhas desses horizontes que eu te encanto nos meus diálogos solitários.
Sanzalando

Um livro

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23 de agosto de 2006

Ser feliz amando

Me ponho ao caminho, trazendo-te a tiracolo e mais o teu silêncio de quem me escuta até no respirar. Caminho neste vai e vem de areia de mil cores de quando em vez molhado pelo espreguiçar desse zulmarinho que me afasta unindo ao início dele. Caminho e te pergunto, numa voz oleada pelas birras já bebidas e pelas que ainda falta verter pela goela abaixo, o que é afinal essa coisa de ser feliz?
Ao mesmo tempo que te pergunto te vou dando respostas para não gastares os teus neurónios na nobre arte de pensar. Ser feliz pode ser cumprir as muitas regras dadas pelo Dalai-Lama, os versículos e salmos de outros livros que não têm erros porque são feitos por deuses e similares? Pode ser levar à letra as pregações dos mestres que queremos imitar; pode ser um exercício de consciência consciente; pode ser o esforço físico num qualquer caminho de Santiago? Pode ser a escolha de virarmos um ermita num isolamento voluntário e contemplativo? Pode ser um estar despojado de tudo como o Buda, ser um simples sem acumular bens já que estes um qualquer ladrão nos pode roubar ou as traças devorem? Ser feliz pode ser tanta coisa, como um não ser tão sério, compreender que o mundo é um estado de eterna impertinência e incoerência? E o tempo que não controlamos pode mexer com essa coisa de ser feliz?
Ser feliz pode ser conquistar um desafio? Não, isto te digo que é uma alegria momentânea. Ser feliz é algo mais profundo e agarrado ao espírito e não apenas gozo de corpo? O sexo dá prazer imediato, mas nem sempre confere felicidade. O amor confere felicidade porque é mais profundo e dá-nos um pleno e nos une num mais agarrar de alma.
Mas te lembra que o ter, como estado de posse, é ilusão. Mas como convencer o corpo dessas coisas todas? Ser feliz deve ser, antes de tudo e do nada, não ser escravo das nossas sensações, razoes e emoções. Hoje tem quem inventa fórmulas assim como mágicas de alcançar a felicidade. Usam drogas, comprimidos, pastilhas e outras coisas mais que muitas. Mas aí nem sempre o efeito é bom, duradouro e real. O ter, de possuir felicidade, pode ser falso e desastroso. Felicidade não se possui já que é um estado de libertação dos apegos pregados ao longo de anos ou séculos.
Bolas, hoje te macei num amassar de coisas bem pesadas de ter.
Dizem os mestres que a dor é uma condição, mas sofrimento é escolha!Venha o diabo e lhe escolha.
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Diaporama (17)

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22 de agosto de 2006

Aprender a amar e ser feliz

Caminho num caminhar de passo incerto.
Paro para olhar o zulmarinho.
Paro para olhar a areia das mil cores.
Paro para olhar todo o conjunto de gente que se esparrama no sol a lhe querer absorver todo e não deixar nada para ninguém. Caminho e te falo num mesmo ritmo, cadência das lágrimas que me vêem molhar os pés. Te falo de goela oleada pelas birras geladas e estupidamente loiras, outras vezes te falo num contrário, que aqui num tenho nem regra nem período, parágrafo ou travessão, que vou vertendo
Daqui, te falo sobre algo que podemos fazer assim numa classificação de Amor. No entanto nunca to qualifiquei, cataloguei, ou mesmo to diferenciei.
Será mesmo que o verbo amar é todo igual?
Será que a gente coloca tudo da gente, cada vez que amamos?
Teremos mesmo a consciência do quanto amamos?
Estas são significancias que raramente a gente se colocamos a nós e aos outros.
Sim, tu sabes que eu tenho amado muito. Sim, tu sabes que eu amei com diferentes intencidades, mas também sabes que ainda não amei tudo.
Qual o meu amor que é o maior? Qual deles me merece mais respeito e consideração? Todos, de formas diferentes, em tempos diferentes. Uma coisa tenho aprendido na caminhada que percorri no caminho da vida. Nascemos apenas para aprender a amar. Me acredita que o valor maior que a gente tem a atingir, seja em que vida fôr é aprender a amar.
Caminha comigo e verás que és feliz e terás a coragem de amar, como eu amo esse outro lado da linha recta que é curva.

Sanzalando

Mariazinha

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21 de agosto de 2006

Aqui, espaço aberto

Me sento nesta poltrona de rocha, decorada por bicos e picos que a força do zulmarinho ainda não arredondou. É esta a minha sala de reuniões e de conferências. Os tons da decoração vão desde o azul celeste do céu que é o meu tecto até ao azul do zulmarinho que é o meu chão, passando pelo castanho molhado cor de rocha, onde me sento e olho para o outro lado da linha recta que é curva. Todas as outras paredes estão abertas para o mundo, criando um espaço enorme sem pilares nem colunas. Afinal aqui estou e tu. Eu que falo, oleando a goela com umas e outras birras estupidamente geladas de modo a que a voz não saia num desafino ensurdecedor e tu de ouvido atento, sorrindo ora com os olhos ora com o corpo todo. Aqui não existe penumbra, sombra ou sol. Existimos na grandeza da nossa existência, na dimensão dos nossos caminhos.
Aqui assistimos ao cair da gotas salgadas imitando lágrimas choradas pelo zulmarinho na sua calma se estendendo na areia das mil cores.
Aqui se espera o tempo que não existe numa iluminação sem sombras ou penumbras, sem ventos e sem chuvas.
Nesta sala, final do zulmarinho nos vamos passeando, melancólicos, esperançosos, sorridentes, chorosos. Tem cantos e recantos para todos os encantos. É o nosso palácio, a nossa cubata, o nosso espaço de ser vida. Falo e tu ouves. Ouves mesmo o meu silêncio assim como choras as minhas lágrimas. Aqui te iludes nas vontades e desilusões, aqui carregas a vida de ambição, de desejo de carinho.
Aqui neste final de zulmarinho olhamos atentos para o início dele com a vontade acrescida de lhe encontrar num estender de mãos. Aqui existimos na nossa existência real de quem quer viver a vida do desejo desejado em momentos de lucidez.
Daqui levamos a nossa vontade aos quatro cantos do mundo. Se ele é redondo vai ser tarefa difícil, mas também não escolhemos o caminho fácil para chegar onde chegamos no espaço que queremos estar, no horizonte da nossa verticalidade sonhada nos sonhos que te sonho acordado.
Aqui estamos.
Por enquanto!


Sanzalando

Jacarandá

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18 de agosto de 2006

Gosto-te, separavel companheira

Caminho levado num sexto sentido indefinido e proibido. Sigo os meus passos numa incerteza de destino. Sigo-me porque me obrigo a não ficar aqui em contemplação, enquanto tu me segues porque me gostas de ouvir e eras incapaz de me deixares para aqui a falar sozinho uma qualquer empolgante estória. Sem seres descarada mostras interesse e isso me faz falar-te, deixando-me na dúvida nesse teu jogo de olhar. És minha amiga em todas as horas, seja a hora qualquer do dia ou da noite. Me segues carregando o teu silêncio, mostrando quase sempre um sorriso de olhar. Não fazes pau de cabeleira quando num sorrateiramente dás uma fuga para me deixares com os meus espíritos e voltas calada num teu igual de sempre. No teu silêncio me elogias, sem me envergonhares, me indicas as indirectas que eu entendo, me levando directo ao assunto sem emitires um som. Se eu te digo não tu sabes que é mesmo um não aquilo que eu disse. O inverso também é verdadeiro.
Me és sempre gentilmente simpática, mesmo nos dias em que descarrego as pilhas de fel num alcalino campo nunca neutro, estás sempre pronta a mostrar esse teu sorriso de olhar, a serenidade da tua presença, a candura do teu carinho, a remeter-me na caminhada serena paralela ao zulmarinho, indicando-me que do outro lado está a outra que preenche o meu corpo, alma e tudo que possa ser preenchido.
Estás sempre pronta para todas as situações, todos os climas, para o verão da manhã e inferno do fim do dia.
Estás sempre a meu lado quando te preciso e mesmo quando não te quero, sabendo que desapareces assim num piscar de olhos, carregando o teu silêncio e regressas na mesma, tal e qualzinha.
Não me pedes exclusividade porque sabes que eu só sou exclusivo naquela que me segue dentro da alma e coração.
Gosto de pensar no que estás a pensar, no que estás a ouvir, trazido nas ondas deste mar que nos afasta e nos une ao outro lado vindo de baixo, a caminho de um sul.
Gosto-te e gostar-te-ei sempre nessa eternidade que termina apenas quando acaba.
Sanzalando

Diaporama (15)

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17 de agosto de 2006

Tem dias, horas e minutos

Sentado na poltrona esculpida na rocha, abrigado dos temporais e outras coisas mais, me reservo no meu direito de te falar sobre assuntos alienantes, que despolitizam e desinformam, totalmente descomprometidos, com os sentimentos e acontecimentos, abusando do teu silêncio hexagonal. Os meus assuntos podem não acrescentar nada nem mudar nada na tua vida, que não te fazem nem melhor, nem pior, que te seja indiferente, que seja apenas uma carranquice, ou seja, o acto simples de eu te falar coisas simples.
Quando quiseres algo culto, que te acrescente algum saber, algum tijolo na construção do teu eu, lê um livro, um poema, um jornal e na pior das hipóteses e por falta de alternativa liga a TV.
Me olhas com ar indignada?
Tu sabes que eu só te falo mesmo do que me apetece falar. Nada ou muito tem a haver com os dias, com as luas, tal como as marés. São coisas assim sem explicação no sentido simples das palavras simples.
Te podia filosofar coisas sobre isto e sobre aquilo e tu ficarias na mesma, nas tuas ideias, nos teus claros e escuros. Tu sabes, porque me conheces melhor que nem eu, que eu só falo desse zulmarinho porque ele me liga lá ao início dele, onde está a minha alma, onde está a minha placenta, onde está o meu sangue. Aqui, neste lugar que te falo te apresenta um corpo fantasma, despido de saberes ancestrais, despido de culturas bibliotecadas, despido de palavras lidas nos livros da saudade.
Te falo mesmo de coração na boca e olhos postos para lá da linha recta que é curva e que tapa assim num não ver imediato a alma gémea que me espera em cada minuto dum tempo marcado num qualquer tic tac.
Num é preciso ficar assim de olhos esbugalhados que até parece querem sair da cara.
Tem dias, horas e minutos.
Calhou falar-te neste minuto.
Sanzalando

Diaporama (14)

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16 de agosto de 2006

Hoje não é sexta-feira

Caminho num passo incerto, olhos fixos no vazio da multidão que me rodeia. Falo num sussurrar que só tu me podes ouvir. Os dias são diferentes ou a gente é que acorda diferente? Hoje, ainda sentado na poltrona de rocha esculpida pelas forças zangadas do zulmarinho nos seus dias maus, aninhado com meu pensamento navegante, dei por mim a falar sozinho em pensamento devagar divagando. Pensei em tantas coisas que nem vou conseguir falar-te tudo aqui e agora. Se é que alguma vez consigo lembrar os passeios que faço nos sonhos.
Te começo por resmungar porque hoje ainda não é sexta-feira. Queria que já fosse sábado ou outro dia qualquer que não o de hoje.
Na verdade não queria que aquele momento acabasse no momento em que me pus a caminhar. Estava tão bem ali sentado navegando nas ondas do pensamento, uma manhã fresca, um aconchego no silêncio da manhã acabado de ser interrompido pela avalanche de gente que busca a pele morena na força de estar num deitar ruidoso de absorção dos raios desse sol que quando nasce deva ser para todos. Mas hoje é hoje e contra isso desconsigo de fazer alguma coisa. Obedeço ao calendário e me vou preparando para encarar mais um dia de vida, do jeito que ele tem que ser.
Esta é a necessidade de improvisar, fazendo dar certo um sonho que sonho acordado. Esta é a capacidade de fazer valer os meus pergaminhos na certeza de um dia estar onde está o conteúdo do meu coração.

Sanzalando

Diaporama (13)

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15 de agosto de 2006

Agosto

Caminho com olhos na areia das mil cores. Não me apetece ver o dia porque não estou virado para esse lado. Me olhas de olhos espantados, quase a saírem da cara. Mas continuo cabisbaixo e silencioso. Não estou rouco nem afónico. Simplesmente é Agosto.
Penso-lhe no cacimbo, brisa gelada da noite. No início deste zulmarinho que aqui termina ninguém lhe se aproxima com medo de gelar o dedo grande do pé. Agosto.
Mês do desgosto, do desagrado, do desconforto. Um dia de Agosto. Não sei o que fazer, se penso no frio de lá, se destilo no calor de cá. Não sei o que me fazem, não sei o que fazer. Agosto. Desgosto do gosto do que poderia ser e não é. Poderia ser Janeiro. Agosto tem ogosto de açúcar aguado, insípido. Quando tu sabes que vais me perder, mais cedo ou mais tarde. Derrota prévia, antecipadamente avisada. O teu jeito de me olhar hoje me incomoda. Tua mania de liberdade presa às minhas palavras. O jeito que tu pensas num errado acertado. Do jeito que eu fui e que não gosto de o ter sido. E é certo fazer o que se pensa? E é certo não ter limite? E isso é certo Agosto? Desgosto de que se segue num movimento e a carência computada e configurada num momento. Pensar Agosto deve mesmo acontecer? Quem sabe se não seria melhor onze meses ser um ano.
E meu coração que bate descompassado, arritmia de dores e injúrias. E entra em compasso directo ao caos.
Agosto. Gente muita nuns lados, poucas noutro.
Se por acaso estivesse lá, descobria-lhe no denso cacimbo e beijar-lhe-ia com o ardor que há muito se acumula.
Mas, nessa impossibilidade, fico nesta vidinha mesmo a falar mal de Agosto.
Sanzalando

Diaporama (12)

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