recomeça o futuro sem esquecer o passado

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30 de junho de 2007

Caminhos 4 - destino

Me sento junto a ti e nem tenho tempo de te olhar.

Falamos um tempo indefinido de assuntos de nada como dois loucos que têm tanto para dizer e o tempo escasseia. Permanecemos em silêncio como que a querer absorver com lentidão o que sofregamente foi falado.

Não sabemos quando voltaremos a estar juntos outra vez, porque não sabemos qual o nosso destino.

Encontrar-nos-emos numa qualquer ocasião, num qualquer lugar, com o mesmo sorriso e com o mesmo olhar. Me disse um velho sábio e se ele disse é porque é verdade. Ou se não foi quem disse foste tu que falaste por ele, o que vem a ser a mesma coisa aqui para mim.

Dissemos tanta coisa e não podemos fazer uma fracção dela. Um passo que se segue ao outro sem sair do mesmo lugar. Razões estranhas, razões distantes, razões internas, razões sem razão.

A verdade mesmo é que é necessário estarmos sentados e falarmos, mesmo que não haja tempo para troca de olhares. Não pode ser só momentos de felicidade instantânea. Não pode haver só despedidas, lenços brancos a acenar e lágrimas caídas numa leveza insustentável.

Não é tempo de fantasias porque daqui a pouco tempo o tempo termina. A tua partida, a minha fuga, o nosso voltar de olhos secos e palavras surdas. Não há tempo de fantasiar desencontros. O velho sábio disse e se ele falou está escrito algures num sítio qualquer.

Não há tempo para recordações quando pouco tempo sobra para a realidade.

Não há tempo para a falta de tempo.

Não faz sentido alegrar a vista, saciar a alma em paralelas palavras que te falo e te recordo. Não faz sentido desligar a televisão da realidade e fantasiar filmes de imaginação.

Não faz sentido procurar caminhos quando as estradas estão feitas, os mapas actualizados e as coordenadas definidas.

É o Destino que destina-me.



Sanzalando

"Medusas" de Angola




29 de junho de 2007

Caminhos (3) - quero ser vento

De volta ao caminho, matutando nas palavras sábias dos mais velhos, saboreando as frases dos mais novos, caminho em busca da minha porta, que sei está algures por mim entreaberta como na espera de mim.
Dou voltas e voltinhas, caminho dentro da alma e ouço o sibilar do vento como se estivesse a me cantar uma canção de embalar.
Não é aquele vento que leva tudo de arrasto como que a fazer remoinhos de areia que vem do deserto e mais parece alfinetes que me picam as pernas nuas de quem anda de calções e calça uns nonkakos. È um vento suave que lhe ouço parece canção de namorar, um som magnífico se eu soubesse o que é que isso quer dizer mas te traduzo na minha palavra desconstruída que é uma silêncio de carícia.
Eu sei que este matutar me está a levar aos anos de calções, futebol de rua, gargalhadas inofensivas, namoros inconsequentes e irresponsáveis, aos cacimbos da manhã, à asma da humidade que vem do mar e que serve de desculpa para tudo quando convém, aos tempos em que queria ser vento, sobrevoar o jardim da vizinha que faz de conta não sabe quem eu sou só porque sabe eu lhe gosto mais que muito e ela não quer nem saber disso e chegar à sua janela e lhe sibilar como agora lhe estou a ouvir, numa canção de amor. Mas às vezes eu queria ter o seu poder, de abrandar ou enfurecer conforme lhe está ou não de feição, ficando tão forte que não há força que lhe sustenha e me consiga levantar do chão me arrancando os pensamentos que me trazem uma lágrima a rebolar na cara, deixando um carreiro de sal.
Mas agora eu queria ser este vento que ouço com música de amor e poder sair por aí e lhe abraçar com ternura, com a minha leveza lhe acariciar o corpo num gesto de carinho como se fosse seda mais pura que a pura seda.
Mas afinal de contas já não ando de calções e de nonkakos, já não jogo à bola na rua, já não gargalho inofensivamente.
Mas afinal eu tenho mesmo é saudade de sentir o cacimbo do mar e de querer ser vento ainda.


Sanzalando

Porque hoje ainda não é sábado!


28 de junho de 2007

Caminhos (2)

Tentei correr sobre as águas para ver se conseguia assim diminuir a distância que me separava da linha horizontalmente curva.
Corria e me afogava na incapacidade respirar, no cansaço e no desespero de não conseguir atingir a linha.
Foi neste momento que encontrei um velho mais velho que o tempo. Tinha aspecto venerável por trás da sua branca barba. Me perguntou na sua voz doce para onde eu ia naquele louca correria. Lhe respondi ofegante que procurava a porta da horizontal linha curva.
- Está ali! me indicou ele com o indicador da sua mão direita carregada de rugas marcadas pelo tempo, apontado como se para mim.
Pensei calado que o velho devia estar louco, pois faz tanto tempo que enveredei pelo caminho, continuo a ver a linha recta que é curva na mesma distância com que iniciei a marcha, a corrida e as paragens de repouso e ele me diz que está ali. Como poder estar ali a porta da minha liberdade?
O velho falou como se tivesse escutado o que eu pensei, que eu sei que foi mesmo dentro de mim que me falei.
- Te enganas. Essa porta não está na linha do horizonte, porque ela não está lá, assim tão longe. Essa porta está mesmo contigo e tu só tens de a encontrar e atravessar. Como pudeste pensar que as aves eram livres, que as toupeiras o eram, assim como os golfinhos? Tu podes fazer isso tudo! Tu pensaste que as aves, as toupeiras e os golfinhos falam? Não, eles não falam, agora tu tens um dom que te faz livre que é tu podes imaginar. Tens a capacidade de imaginar o coração da terra e os limites do céu. O universo é o teu ilimitado espaço.
Parei a caminhada, fechei os olhos e tentei recuperar os anos perdidos na caminhada. Assim matutei sobre como me saberia agora um prato de matete comido na infância e cujo a receita a minha avó não me deixou em testamento adornado com o carinho que ela lho fazia e descobri que os sonhos são a minha porta da liberdade.






Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


27 de junho de 2007

Caminhos (1)


Olha só como é que eu estou. Assim mais ou menos como que entalado entre o céu e a terra, encarcerado sem liberdade, e vejo como única saída possível é fugir para a linha do horizonte. É por isso que eu caminho sobre o zulmarinho, subindo e descendo ondas, parando nas passadeiras para que os barcos passem, pulando sobre rios de água gelada que lhe correm na indiferença da mistura. Quando quero descansar paro à sombra duma nuvem. Aqui parado consigo ver as aves que parecem me imitam, só que caminham no céu usando a sua leveza de ser. Elas me olham e devem imaginar coisas deste que caminha sobre o zulmarinho na direcção da linha recta que é curva. Eu devo ter dito em voz de pensamento que sorte eles têm de poder voar, porque ali naquele deserto de mar eu ouvi um voz quase muda me dizer que não é por voar que se é livre, pois não pode voar mais alto que as nuvens altas, portanto era um prisioneiro do céu. Na minha voz de pensar retorqui, porque não sou de ficar calado, que a prisão dele era mais larga, mais ampla que a minha, bastando lhe dar uso nas asas. E recomecei a marcha sem saber se houve resposta ou não, em direcção à linha recta que é curva que me parece sempre à mesma distância independente do comprimento dos meus passos.
Cada passo eu vivi um pensamento. Posso conhecer a terra mas não lhe sei os segredos. Posso conhecer o céu, mas não lhe consigo tocar. Uma toupeira conhece melhor a terra que eu, pois lhe está mais perto do coração. Mas ela não lhe pode ver porque os olhos não lhe permitem ver. A toupeira é prisioneira da terra também.
Mudei a velocidade dos passos encurtando o seu cumprimento e segui rumo à linha recta horizontalmente curva.
Fui bafejado com a visita de golfinhos. Lhes imaginei a sorte de nadarem livremente por aquelas águas. Mas meu pensamento deve estar surdo porque devo ter dito em voz alta uma vez que o delfim que parecia quem era o mandador daquele rebanho me olhando nos olhos me respondeu que só podia sair daquela água para morrer, pelo que era um prisioneiro deste zulmarinho por onde caminho.


Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


Sanzalando

26 de junho de 2007

Verão, sem explicação

Se há coisas que eu não posso entender, há coisas que não posso explicar-te porque nem a mim eu consigo explicar-me. Não as entendo e pronto, assunto arrumado. Ponto final parágrafo. É assim, sem mais nem menos, sem rancores ou decibéis de gritos. Quando o sol se põe o mundo não pára. Quando eu não entendo não posso parar. Simplesmente assim.
Procuraria modelos matemáticos se eu fosse um matemático, procuraria esquiços se fosse um desenhador, a fórmula molecular se fosse químico e por aí fora.
Como não sou nada disso, limito-me às coisas simples, refugo de palavras que se diluem nas frases feitas em tubos de ensaio do laboratório da vida.
Já sei que é uma questão de expectativa. Afinal de contas que mais sou eu senão uma expectativa de mim?
Não entendo o dia de amanhã, e por isso vou parar-me no hoje e ficar aqui sentado a ver-me correr os segundos na sua cadência imparável?
Que nada, vou partir para o laboratório e estudar: a rua!
Música, som, ruído, gente que invade a praia, as ruas e os becos. Gente feliz como que a correr de fogueira em fogueira esquecendo os infernos da vida. Dormir na praia até amanhecer, calcorrear sítios, descobrir mundos novos nos mundos mais que usados.
É cada ano o mesmo ciclo que se abre num fecho de esperança.
Afinal é o verão.
Como é que vou explicar-me se eu não me entendo?

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


25 de junho de 2007

era uma vez

Mas porque é mesmo que eu tenho duas pedras na mão?
Ah, já sei! como se eu estivesse ficado espantado...
Uma é para usar como riscador e outra mesmo para usar faz conta é papel que parece ainda não foi inventado, e assim escrever o que me vai no pensamento e me corre na vida e faço um livro feito calhau que alugarei de porta em porta, começando na do vizinho que sempre fica mais perto e eu tenho que ficar à espera que acabe de ler, porque ainda não inventaram a impressora que escreva na pedra porque ainda não inventaram o papel, e por aí em diante.
Bato à porta do vizinho e como ele não responde e ainda não inventaram a porta propriamente dita eu lhe entro pelo buraco onde ficaria a referida porta se lhe tivessem inventado. Depois de eu entrar vejo que não está ninguém além dum cacto, que, para espanto meu, quase me atirou no chão de susto pois estava vestido de camisa branca, assim tão bem passada que até parecia já tinham inventado o ferro de carvão de passar a ferro. Consegui ainda ver com olhos esbugalhados que ali, onde deveria ser o coração, se já tivessem feito a discrição da anatomia e a geografia do corpo, estava que nem pintado um verde jacaré. Cambaleando imaginei o que estava a ver: um cacto, carregado de picos e vestido de camisa branca sem ruga e de jacaré pintado de verde. M’equilibrei e consegui recuperar as forças, ainda não tinham inventado o 112 e eu não podia desfalecer ali na casa do vizinho sem ninguém por perto. Refeito desse espanto tombei com grande estrondo noutro espanto. Ele estava virado para uma caixa de madeira que debitava imagens e vozes que até pareceia eram de verdade. Eu sei que não teria caído nesse espanto se já tivessem inventado a televisão, mas a verdade é se ainda não inventaram a porta como poderiam ter inventado a televisão?
Com tanto espanto eu já não trazia o meu calhau feito livro na mão. Estava algures no chão daquela casa, largado num cambalear qualquer, e nem o recuperei quando passei a correr pelo buraco onde deveria estar a porta, se já a tivessem inventado, tal era o meu ar de susto.
E como fiquei só mesmo com o riscador, perdi o calhau que será daqui a uns anos o papel, quando lho inventarem, deixei de escrever o que me vai no pensamento e me corre na vida e passei a contar nas palavras faladas todas as estórias, que mesmo que não se tenham passado não deixam de ser verdadeiras só porque adiadas.



Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


24 de junho de 2007

Me sento onde ninguém me vê

Me sento aqui neste canto, assim como quem não me vê e falo de mim para mim numa voz calada que eu não me sou surdo.
Olho e vejo que o mundo gira como se não houvesse outra coisa mais para fazer. Matuto na infância que tive, relembro os amigos que fiz e desfiz, m’atrapalho nos episódios que vivi e que agora não queria ter vivido, me gargalho doutros que foram belos e por isso ainda me lembro.
Afinal de contas quantos anos tem a hora? É! tudo depende mesmo da velocidade com que passam as lembranças assim neste cinema das recordações, neste filme de imaginação.
O zulmarinho está nas minhas costas como que a marulhar para ver se eu lhe dou atenção, que hoje eu não estou para ali virado.
Mas hoje mesmo me sento neste canto a ver para que lado se orienta a minha bússola. Nas raízes ou em novos troncos? Mesmo melhor é deixar passar as imagens do filme e ver onde é que aparecem as legendas, que eu não sou árvore mas tenho as minhas raízes, tenho o meu tronco e os meus ramos que dão outros ramos e por aí fora que isto não é aula de biologia.
Me lembro que um dia me contaram que o dia se apaixonou da vida numa paixão de ferver o gelo de um dos pólos se não mesmo dos dois. E nessa paixão que era correspondida, nunca se queriam separar um do outro. Daí resultou que a vida se murchava nessa não separação e o dia, ao ver esse mirrar na permanência, resolveu partir assim num suave descair de claridade até à escuridão fechada, dizendo à vida que se tinha apaixonado pela noite e que lhe ia visitar.
A vida, que não é parva de todo nem de nada, achou mesmo que ali havia mentira e deixou cair-se na tristeza, amargamente chorou lágrimas salgadas. Ainda hoje chora, cada vez que se lembra do seu amado dia, por isso de vez em quando chove nos dias de nostalgia, por isso ainda hoje existe noite para que a vida possa continuar sem definhar-se na sua paixão pelo dia e por isso cada dia nasce um dia como forma de nascerem novos amores.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


Sanzalando

23 de junho de 2007

meu querido Zulmarinho

Meu querido zulmarinho

Te escrevo hoje uma carta porque hoje não estou com vontade de falar com ela, que jaz ali estirada na areia como se não houvesse coisas mais importantes no mundo para fazer. Por isso me calo e te escrevo. Ela não sabe ler, acho eu, e se por acaso o soubesse, naquela posição não ia conseguir ver nada.
Mas te escrevo porque sinto medo de sair por aí a correr, entrar-te e ir a caminho da linha recta que é curva, querer saber profundamente dela, lhe sentir o cacimbo me humedecer até nos ossos, lhe falar com amigos de que lhes tenho saudade de ouvir gargalhar, da Armanda, da mesa farta cozinhada pela D. Fernanda, dos cigarros seguidos da Di, de reaccionar a Té e lhe levar a levantar a voz até parece está zangada mas é só mesmo até ela descobrir que lhe descobri o ponto fraco, de ouvir o chorar da viola do Manel, de perguntar no Vasco a que horas ele ma vai buscar no Mussulo, mesmo hoje que tem cacimbo que não lhe deixa nem ver.
Sei que é difícil mudar sem a gente conhecer a gente no seu todo de interioridade profunda que não transparece na periferia. Sei que é difícil ficar sentado na esperança, que é impossível voar no vento e caminhar sobre palavras até lá lhe chegar.
Não te parece lógico o que eu te escrevo? A mim é mais lógico que a própria lógica, logicamente.
E assim deixo o lápis rabiscar estas palavras que te vou entregar em mão própria para não se perder num mão em mão até à mão final, com o acrescento de pontos e letras que essa via pode acrescentar,
Zulmarinho, fica a saber que toda esta sensação é de quem anda perdido, desamparado, desequilibrado de não ter nada para além da obscuridade de lhe ser ninguém, de sentir frio porque está sozinho neste infinito de longe.
Escrevo-te zulmarinho, para que saibas que me abraço e não me sinto calor, porque fecho os olhos e não me acho.
Escrevo-te, zulmarinho, porque quero que me tires o medo para poder estar comigo e encontrar-me completamente onde quer que eu esteja. Quero sair deste buraco e poder ver o sol mesmo quando a noite estrelada invade este canto.
Te escrevo, zulmarinho, porque foste sempre tu que sentiste as minhas emoções e me deixas acom uma paz que me ilumina, mesmo quando a tempestade se cai dentro de mim.
Te escrevo, zulmarinho, porque sei que vais ler esta carta e me vais dar a satisfação de responder, mais cedo ou mais tarde, antes de enloucar docemente.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


22 de junho de 2007

Porque hoje ainda não é sábado!


Sanzalando

hoje falo pouco

Vamos por esta areia fora, assim num brincar de crianças, saltando ondas, pulando pegadas alheias, correndo, parando. Vamos fazer o que as outras pessoas fazem numa praia.
Eu falo ou me calo, consoante a vontade do momento, tu ouves ou te surdas conforme o vento.
Eu sonho e te conto e nós ouvimos os recados que chegam desde lá do outro lado da linha mágica que nos separa, que vêm através das ondas do zulmarinho, num festival de letras soltas.
Mas não te esqueças mesmo que pode ser que seja a inteligência quem procura, mas que é o coração mesmo que é quem encontra.
Hoje te pouco falo porque hoje me apetece mesmo é correr.
Olha, senta aqui a meu lado a ver se passa.

Sanzalando

21 de junho de 2007

caminhos de silêncio

Vamos caminhar ao longo do zulmarinho, beber-lhe o perfume e embriagar na suave ondulação com que se atira na areia das mil cores. Hoje não deixo marcados os meus passos porque levito sobre a areia fina levantada pela brisa enquanto tu me segues mais esguia e longa como nunca te tinha visto.
Troco as palavras por silêncios. Os salpicos salgados do zulmarinho se me confundem com as lágrimas, o brilho do sol parece faz estrelas cintilarem no suave azul do zulmarinho.
Eu caminho e tu me segues. Serenos e sem destino, rumo aos sonhos sonhados nas insónias do dia a dia, nas dores da saudade e no cinzento da alegria feita recordação.
Eu me calo e tu me ouves os silêncios escutando todas as palavras que eu já te disse.
Amar-te-ei eternamente, mesmo que a eternidade termine já ali, mesmo que me feches as portas e construas muros de fantasia.
Amar-te-ei mesmo que os meus passos já não consigam levar-me a lado nenhum.
E tu, sombra, acompanhar-me-às, mesmo que eu não me mova para além do silêncio.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


20 de junho de 2007

o vento de mar

Anda, vamos dar de caminho, deixar os meus pés marcados nesta areia de mil cores até que uma onda assim mais rebelde lhes venha apagar.
Vamos caminhar neste final de zulmarinho sem rumo. Encadernando as palavras que eu te digo e tu me acompanhas neste caminhar de solidão. Caminhamos aproveitando ventos e marés, por portos de águas mansas e transparentes.
Agora estou aqui atracado sem poder, ou querer, sair. Tens de ser tu a ajudar-me a encontrar o caminho de volta que ainda tenho a certeza de querer conhecer. Ainda quero sentir o perfume, ainda quero ver os lugares, ainda quero viver a vida.
Vê se ouves algum recado que chega de desde o lado de lá da linha recta que é curva, se encontras algum sinal nas nuvens.
Vamos dando passos nas palavras como quem monta um caminho.
O vento me sussurra que talvez devesse aproveitar a corrente que nos é favorável para nos encontrarmos e saber alguma coisa mais de nós. Consegues ouvi-lo? Talvez devêssemos caminhar mais juntos, eu sem sombra e tu sem corpo, numa repartição de tarefas, de silêncios e de palavras, de lágrimas e de sorrisos, de euforia e angústia.
Vamos aproveitar o vento que está a trazer o sabor a mar.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


Sanzalando

19 de junho de 2007

Hoje digo Não

Vamos seguindo esta rota que delineamos nesta areia de mil cores, num vai e vem de maresia e de marulhar deste final de zulmarinho, tropeçando palavras e rasteirando fases nas frases de cada dia.
Tu ouves e eu falo, ou silenciamos os dois embalados nas memórias trocadas em passadas antigas directas a um amanhã. E hoje te digo não.
Não é não e só há uma maneira de lhe dizer. Sem admiração, sem exclamação e sem interrogação. O Não só se pode dizer mesmo assim: Não. Curto, monocórdico e rápido. Não só se diz numa só vez, Não, com uma só entoação como se fosse um disco riscado. Se eu te disser um Não que necessite toda esta caminhada como se fosse uma reflexão não é um Não, porque o Não não necessita explicação ou justificação. O Não tem a brevidade de um cagagésimo de segundo. O Não não deixa portas abertas nem esperanças nas fotografias da memória, porque o Não não deixa de ser Não mesmo que as lágrimas corram para o mar como se fossem rios. O Não é o último degrau da dignidade, o final do capítulo. Não se diz Não por carta nem por silêncios, não se diz gritando nem em voz baixa, nem de cabeça erguida ou envergonhada, nem com pena ou satisfação.
Não é Não e mais nada, nem voz tremula, nem agressiva. Não.
O Não aprende-se desde pequenino. Tem poder.
Vês, tanta coisa para eu te dizer que hoje Não.

Sanzalando

Batata Quente


Desafiado por Lágrimas e Sorrisos deixo no canto superior direito os cinco livros que me vieram assim à memória e, se tal aconteceu num repente, é porque de alguma maneira me deixaram marcas.

Agora passo a Batata Quente para outros cincos:







Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia



18 de junho de 2007

os olhos, entrada da alma

Anda, senta-te junto a mim. Olha o zulmarinho e me ouve no teu silêncio de sepulcro.
Anda, senta-te junto a mim e falemos o tempo que nos apetecer perdendo tempo de falar com dois loucos que falam ao mesmo tempo de nadas, mesmo que permaneçam em silêncio.
Anda, senta-te ao pé de mim e sorrimos as palavras que nos apetecer, no tempo que quisermos.
Anda, senta-te ao pé de mim, de olhos no zulmarinho, à espera duma mukanda que vai chegar desde lá do início dele.
Anda, senta-te ao pé de mim e vamos fazer a lista dos desejos e não esquecer que a minha glória é amar o mundo, em particular aquela fracção que está ali ao virar da linha recta que é curva. Eu sei que não devo fazer crer que ela é importante nem que lhe sou estranho, que lhe estou distante, porque lhe gosto mais do que muito. Eu sei que não quero a felicidade instantânea que nem café que só tem que juntar água quente, porque essa dura pouco tempo e destrói tudo lentamente. Eu quero lhe ver os olhos com os meus olhos, escutar os seus sons e lhe viver os sonhos e pesadelos.
Anda, senta-te ao pé de mim e me ouve com o teu silêncio carregado de sons calados.
Te lembras de eu já te ter dito que os olhos são a entrada da alma? O quê? Eu não disse? Acho mesmo já não tens a memória das coisas que te digo. Se calhar nem eu.
Mas então te digo hoje. Os olhos são a entrada da alma e por eles ela deve entrar quando eu lhe olho, porque é sinal que a minha alma está aberta para ela. Se ela entrar poderá ver todos os cantos que lhe apetecer, procurar esconderijos que possa haver, perguntar-lhe tudo o que lhe apetecer, do que entender e do que não entender. Acaricia-la, beija-la, suspirar e até pode estar em silêncio, gritar ou sussurrar. Sabes, tudo o que ela lhe fizer não cairá no vazio porque sei que a minha alma lhe pedirá apenas que ela olhe nos olhos dela, porque ela é a sua alma também.
Te explico, desde já, que não é sonho nem pesadelo. Se a minha alma está aberta para ela então é dela e ela lhe pode sonhar também.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia



Sanzalando

17 de junho de 2007

Insónia

Caminho mil passos nesta areia de mil cores, sentido o perfume de mil ondas do zulmarinho se espreguiçando na areia, sempre à procura do caminho que me leve ao sonho. Umas vezes me parece inútil toda esta caminhada, porque a minha ausência de ti deu feridas que não sei se sararam ou irão sarar, porque se criam ilusões que poderão desapontar ou se é do vazio de mim que tenho medo de continuar a caminhada.
É a saudade que me afoga e que me salva, porque é a saudade que me mantém desperto nesta caminhada de mil passos, mil palavras, mil ondas, porque é a saudade que me desespera na insónia dessonhada.
E nesta insónia me irás encontrar acordado quando um de nós o outro encontrar.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia



16 de junho de 2007

Quem nunca chorou de amor?

Vamos caminhando nesta areia de mil cores que às vezes nos incomoda porque se cola no pés e não nos deixa ter a agilidade de outros tempos, trocando silêncios teus com as minhas palavras, como se fosse ficar nu.
Despido de palavras, acaricio o que está para lá da linha recta que é curva, mimo-me de ternura numa forma de amar definitivamente eterna.
Tu que me segues, imaginaste a um passar de brasas nos seus braços? O seu calor a nos afagar, o seu perfume a nos perfumar, a sua doçura a nos ternurar. Hum… caté me dá vontade de desatar a correr sobre esse zulmarinho, me esquecendo que ele é feito de água.
Já sei que vais dizer que também tenho os meus momentos de debilidade, que me entristeço, que choro. Mas quem nunca mesmo chorou de amor?

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia



Sanzalando

15 de junho de 2007

por montes e vales

Vamos caminhar no passo lento das palavras e ver se te consigo dizer uma de tantas coisas que eu acho ainda tenho para te dizer. O zulmarinho na sua serenidade me inspira, a maresia me ilumina e a brisa fresca me aquece os sentimentos.
Te posso contar agora, porque só agora me lembrei, que tentei subir montanhas e quando estava bem lá no alto me coloquei a questão da utilidade de ter feito tamanha subida. Estava lá em cima sozinho, nem me lembrei de ver se estavas silenciosamente a meu lado ou não. Me sentia solitariamente sozinho e concluído que continuava sem atingir o inalcançável. Olhei para baixo e vi que tinha um grande caminho a percorrer, outra vez. Quantas vezes fossem as precisas… para a chegar ao principio do final que eu tinha atingido, numa cegueira de correr mais rápido que o tempo certo que as coisas devem de ter. Afinal das contas a vida é um movimento, um sobe e desce, um calcorrear de calçadas, de estradas desertas, de gritos manifestantes.
Uma coisa eu ganhei para além do jogo da sedução muscular, que foi eu ter descoberto que tu, sombra, não me desamparas nem nas horas que esse zulmarinho que salpica de gotas que parecem são lágrimas.



Sanzalando

Porque hoje ainda não é sábado!


14 de junho de 2007

Os sonhos que sonho

Hoje caminhamos ao sabor das palavras. Eu, tu, o zulmarinho, a brisa, a maresia e a força do que querermos. Não posso esquecer o que trago dentro do coração, os sonhos que sonhei e lhes vivo em cada dia que vivo. Não posso esquecer o perfume da terra molhada depois duma tropical chuva que se abate sobre mim, me molhando até aos ossos sem me dar tempo de procurar um abrigo, Não posso esquecer o cheiro do óleo de palma a ser cozinhado, me abrindo o apetite num esquecimento de que a vida é mais que comer e dormir. Não posso esquecer a areia dourada se perdendo de vista numa calma que até atrofia o mais nervoso. Não me posso esquecer de olhar no horizonte e ver o verde mais verde do calor tropical.
Nesta caminhada que fazemos aqui no final do zulmarinho, se fosse feita lá no início dele, já tínhamos feito sauna, marcha e tomado banho, assim num piscar de olhos em que as lágrimas são lavadas.
Já sei que me vais dizer que eu me deixei conquistar por uma ilusão e que me perdi no rasto da minha estrada. Eu sei que é isso que estás a pensar, porque se percebe na tua silhueta.
Mas na verdade eu te digo que pode ser sonho, mas é um sonho bom de ser sonhado, é um sonho que procuro viver sempre.
Se eu não tivesse este sonho tu estarias a viver a minha vida como se fosse um deserto mais arenoso que o deserto dourado que te falei, estarias a morrer de sede de viver, estarias sob um céu desestrelado onde não podias nem respirar por estares afogada de infelicidade.
Foram tantos os momentos bons que lhe vivi que ainda hoje sinto as suas carícias e o seu perfume parece estar entranhado dentro mim.
Foram tantos os momentos bons que lhes sinto nos meus lábios como se fossem beijos que ainda não beijei.
São todos esses momentos que procuro e outros que eu sei lhes vou um dia encontrar e então, de sorriso aberto, peito descoberto te gritarei que sou feliz mesmo.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


Sanzalando

13 de junho de 2007

Chamas na alma

Vamos continuar aqui sentados a falar sobre tudo e sobre nada, assim num diálogo em que falo e tu ouves com a tua fome de ouvir-me.
Olhamos o final do zulmarinho porque é ele que ilustra as minhas palavras que se desamparassem no vento, é ele que perfuma de maresia as frases que se perdem.
Eu bebo uma birra loira estupidamente gelada para me olear a goela e tu de orelhas à brisa para lhes arejares.
Este é o nosso cenário. Simples e ao mesmo tempo irrequieto. As nuvens se movem, o zulmarinho não se imita em cada instante e a maresia é por vezes intensa outras quase passa sem ser sentida.
Falamos as palavras que me saem da boca assim directamente de dentro, como tivessem sede de liberdade. Lhes captas no instante para que não se percam por aí, as que não captares se voam sem rédeas.
Às vezes tem dias, que de manhã, no acordar, se desaba o mundo como se ele fosse um inferno e a gente agarra quem está assim mais à mão e lhe desanca a raiva, assim num modo de parecer bombeiro a lhe apagar as chamas que lhe vão na alma.
E porque te falo eu disso?
Porque quando vinha ter contigo para este caminhar com sabor a maresia, neste olhar para lá da linha recta que é curva, neste cantinho onde recebo as mukandas das kiandas do início do zulmarinho, alguém me gritou assim no ouvido:
Acabe com o choradinho da sua pagina, das saudades, deste e daquela, dos seus escritos de baba e ranho!!!! Para quê ? ISSO TEM UM NOME !!!!!!
Me lembrei depois podias ser tu a querer desprender-te de ser a minha sombra. Olhei para um lado e depois para outro e não eras tu porque tu estavas ali, serena, agarrada aos meus pés, sem esboçar qualquer movimento de liberdade. Me continuaste a seguir até aqui chegarmos e aqui a meu lado estás esparramada na areia das mil cores a me ouvir e eu a compreender os teus silêncios.
Diria mesmo que podes estar triste porém não estás infeliz, porque és grande para te deixares enrolar numa resposta que às vezes até te pode apetecer dar e não dás porque somente não queres te desfazer dela.
Afinal de contas era só mesmo alguém a querer apagar o seu incêndio. Isso tem nome e se chama vontade de ser feliz, mesmo que seja amarrado num pesadelo de ter que se aturar.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e parao dia


12 de junho de 2007

Silêncio de hoje

Me sento aqui na areia a te contemplar. Esparramada na areia, ali estás junto a mim. Me segues se eu seguir, ficas se eu ficar. Ouves-me se te falo, compreendes-me se me ponho em silêncio. Só tu me podes aturar nas minhas certezas nas minhas dúvidas.
Hoje te podia dizer que me doem as costas de carregar o mundo e se me fecha o sorriso por trazer a infelicidade do mundo dentro de mim.
Mas não te vou dizer nada disto.
Vou só mesmo dar-te o meu silêncio e contemplar a imaginação com o que existe para além da linha recta que é curva, saboreando o marulhar como se fosse música.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia

11 de junho de 2007

duvidamente cego

Vamos mesmo só ficar aqui sentados, quietos, bebendo o som do zulmarinho se espraiando na areia ou preferes desenferrujar as penas numa caminhada sem fim? Quer uma quer outra está certo para mim.
Tu sabes que sempre que procuro alguma coisa, mesmo que eu não saiba o quê, a minha cegueira mental não me deixa ver. É uma cegueira que eu não te sei explicar nas palavras simples, nem nas rebuscadas nos mais importantes livros que nunca leste. É assim um andar perdido de mapa na mão, bússola e outras coisas mais modernas. É um não encontrar a saída quando acabo de entrar. É assim uma paralisação que me entrava o corpo assim num ângulo esdrúxulo. Me perco mesmo após me ter reencontrado.
Após os meus tristes olhos terem dado com o que procuram nesse instante parece já não é importante, já não faz falta seguir na procura.
Sabes mesmo que eu queria era agora sentir nos meus olhos o perfume, o calor e o sorriso de vida dela?
Pois. Vou fazer mais como então se sempre que lhe procuro e lhe acho eu paraliso num voltar de perder-me?
Desculpa mesmo, mas na verdade eu vou continuar na procura e se meus olhos não quiserem ver vão ter que me aguentar que eu lhes vou contrariar até à exaustão.
Anda, vamos dar de caminho, deixar os meus pés marcados nesta areia de mil cores até que uma onda assim mais rebelde lhes venha apagar.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


10 de junho de 2007

sobrevivência

Te abro também uma birra loira estupidamente gelada ou ficas aí estendida no chão a me ver olear a garganta?
Bebo, caminho e falo. Falo-te no ritmo desse espraiar do final do zulmarinho. Sem cadência.
Acho mesmo ando à procura da causa da minha existência. Depois de ter calcorreado palavras e frases, intervalado nos silêncios calados de brilhar nos olhos, acho tropecei com ela. Acho mesmo a causa é a esperança e eu tinha esperança de lhe encontrar, assim mais cedo do que tarde.
Tu sabes, porque eu sei tu sabes tudo, que toda a consideração abstracta dos problemas não serve para consolo nem para afogar tristezas. A gente sobrevive mesmo porque tem esperança. Felizmente a gente não é só feito de feitio desesperado, de lágrima e morte. A gente tem esperança e se a tem vai fazer mais como então?
Vai vivê-la, pois então. Há que ser feliz num mundo desesperançado. Aí mesmo nesse ponto sem vírgula, é que está o centro da questão. Se é ponto e tem centro então é mesmo circunferência e se é assim redondinha então tem 360º. Tal e qual que nem a esperança. Às vezes vai, mas depois ela volta sempre. Pode ter eclipse, mas depois tem luz outra vez.
Me acompanhas neste pensamento profundo que nem as profundezas desse zulmarinho que é fronteira mas também é ponte de união?
Vamos lá olear a goela com mais uma outra, para que as palavras saíam assim que nem balas de metralhadora que tu agarras num ouvir ininterrupto.
Deixa só te dizer mais uma coisa e depois paramos para olhar a linha recta que é curva. Com tanto amor que eu sinto por ela que quase ia-lhe jurar amar para a eternidade, não fosse a eternidade assim coisa pequena.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


9 de junho de 2007

Minha Luz da noite

Olá, sombra! Como tas tu, coração externo do meu corpo?
Vamos no nosso passo de passeio calcorrear esta areia de mil cores que aprisona o zulmarinho duma maneira que ele quase nem mexe aqui no final dele?
No caminho eu te falo que faz dias, assim uns quantos que nem sei se tenho dedos para te dizer quantos, que tenho caminhado assim quase sem ti, debaixo da luz da lua, em que lha vejo assim espelhada no chão de mar que ele se torna enquanto dorme, e os meus olhos se escapam, faz conta têm vontade própria, à procura, nesse milhar de estrelas que fica, assim num pisca pisca lhe adornando como missanga brilhante, duma luz assim especial que eu não sei se se foi embora, se teve algum acidente ou se simplesmente se esqueceu de mim. À noite, no silêncio da profundidade dos meus sonhos eu lhe via a me observar e lhe ouvia murmurar palavras de calor e de ânimo, lhe sentia fazer-me carícias no corpo e na alma.
Lhe venho procurar aqui na noite de lua cheia e afinal eu não lhe encontro. Será mesmo, sombra, que lhe perdi?
Eu sei, e se te compreendo bem tu também sabes, que ela vai voltar e ser igual a que nem antes, a minha luz da noite.



Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


8 de junho de 2007

Delírios sob nuvens

Vamos aproveitar o tempo e desenferrujar as gambias neste areal de mil cores. Ouvir o marulhar como se fosse música, sentir a maresia como se fosse perfume. Se te falar é porque te falo, se te fizer silêncio é porque estou a escutar as mukandas que me chegam desde lá do início deste zulmarinho que os serve de pano de fundo nesta fotografia do realmente.
Pois é, de tanto ela me negar eu confundo o nome dela com silêncio e a minha voz soa assim que nem eco quando lhe pronuncio o nome. De tanto ela me negar me parece um reflexo sem contornos, uma inconstante sombra mais ténue do que tu. De tanto ela me negar, as suas formas estão repletas de neblina e se me confunde com o cacimbo. De tanto ela me negar parece ela só habita nos meus sonhos e delírios.
Me parece sempre noite mesmo que eu esteja de dia, me pareço um nada feito coincidência de um sítio que se transforma apenas num ponto.
De tanto ela me negar deixei de existir e passei a ser apenas uma ideia, um novelo de pontos de encontro, um erro de paralaxe.
De tanto ela me negar eu virei chuva, vento e neblina.
De tanto ela me negar eu até me esqueço de mim.
Parece mesmo eu estou a dizer-te um poema que mais não é que uma prosa que sai de dentro sem filtros nem barreiras.
E tu pacientemente me acompanhas nestes delírios.

Sanzalando

Porque hoje ainda não é sábado!

6 de junho de 2007

Filosofia de vida

Sento-me aqui enquanto na posição fetal te deitas na areia de mil cores sem deixar uma única marca. És a leveza instantânea do ser sombra. Te deitas e escutas as minhas palavras como se elas fossem totalmente tuas. Bebes-me as palavras, porque depois de eu as dizer olho em redor e não as vejo.
Hoje te falo de mim, do eu mesmo que existe aqui dentro e que se transparentiza nestes dia´logos contigo como se fosso ema frágil folha de vidro voando através da brisa marítima que me despenteia os ralos cabelos que ainda teimam crescer na cor natural deles, porque os outros de tão claros nem se dá por eles.
Na verdade , e como tu sabes porque eu ao longo destas nossas conversas já te devo ter dito e se não te lembras é porque já esqueceste nessa oca cabeça de vento, uma pessoa não chega a ser ela mesmo se não se esquecer de si e não se entregar ao amor. Independentemente de que amor a gente queira mesmo é pensar. Para quem não tenha encontrado um rumo, usando sextante, traçando no mapa da vida a rota, de esquadro e transferidor que nada transfere, segundo as estrelas, os satélites e o impulso, todo o seu passado se converte assim numa carga, o presente num problema e o futuro não passa de uma ameaça.
A felicidade não está no final do caminho, mas está só depois da acção realizada com sentido, quer a gente tenha necessidade ou não. Ela mesmo não está no fazer o que se quer mas sim no querer com que se faz. Num esquece nunca que eu sou filho do meu passado e penso ser pai do meu futuro.
Ouve bem o que eu te digo, porque não sei se algum dia te vou repetir as palavras que te digo.
Desde que tu tenhas um desejo de viver és capaz de aguentar qualquer coisa, porque a vida tem mais sentido quanto mais difícil ela é. A vida fácil é difícil.
Portanto, e assim numa forma de resumo, eu te digo, olhando o zulmarinho e saboreando o perfume da maresia, que sem sentido a existência não se vive plena e a vida não é sã.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


5 de junho de 2007

Angústias

Vamos caminhar nos nossos passos seguros de equilíbrio instável. Eu falo e tu ouves, ou finges que ouves. Tanto faz, porque o que eu gosto mesmo é de falar.
Às vezes parece estar contaminado com a ideia do ser e perco um pouco a noção da realidade, de não crer na real existência.
Sabes, tenho que acreditar que quando fecho os olhos o mundo não desaparece. Ele continua ali, à minha volta na sua fervura lenta até à evaporação total.
Te parece estranho o que eu te falo logo hoje? Hoje porque é agora, logo é agora, tudo é hoje, intemporal tempo marcado no calendário da vida.
Fecha os olhos, finge que os tens. O mundo parece desapareceu e se agora os abrires lá está tudo na mesma como te rodeava nuns instantes atrás.
O mundo não desaparece quando fecho os olhos. Mas é pena, te digo eu. Não é porque eu queria que alguma coisa desapareça, mas sim para que enquanto eu estiver de olhos fechados não perca um instante deste mundo.
Mas a realidade é aquilo que os teus olhos vêem, que o teu corpo sente?
Tenho medo que a realidade que eu sinto não seja a real forma de existência.
Me entendes?
Pelo teu silêncio parece que sim. Ou não?
Olha, eu tenho medo que na realidade nada seja real e eu ande a perder tempo com angustias inexistênciais.
Mas a verdade é que a angustia está aqui, rodeando-me, embrulhando as minhas palavras que te dirijo, como se fosse uma prenda qualquer.
Olha, o melhor mesmo é embrulhar-me de angustia e não pensar em nada, seguir o caminho como uma marioneta, procurar-te num outro lugar, onde possa descansar à tua sombra.
Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


4 de junho de 2007

Outros dias são não


Anda, vamos dar um passo, depois outro e por aí fora.

Não vens?


Quê?! Não me ouves?


Pois é, hoje estou afónico de ideias. Tem dias que é assim. Te quero falar e as palavras não saiem do tinteiro da cabeça que não pára.


Deixa lá, outros dias haverá, outras palavras vão sair, outras frases doutras fases vão pintar-te o ouvido de cores berrantes. Outras ideias vão nascer para eu te contar nesta voz que não é a de hoje.





Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia

3 de junho de 2007

um vitral no zulmarinho


Te senta aqui a meu lado e descansa os pés, repousa a cabeça na areia de mil cores e vamos viajar na magia dos sonhos sonhados com a imaginação e o querer.
Olha só o final do zulmarinho até parece um vidro azul de tão quieto que está. Vais ver está só a reflectir na vida dele.
Se eu tivesse aqui umas tintas, dessas que dizem ser tinta de água, eu lhe pintava uma paisagem e lhe ia chamar de vitral. Depois, quando ele ia acordar, assim mais ondulado, o vitral se mexia e parecia aqueles brinquedos de ver numa posição uma coisa e noutra outra coisa.
Estás a ouvir o que eu te estou a dizer ou estás a pensar que te estás nas tintas para o que eu te digo?
Como tu sabes, às vezes a vida te indica um caminho, que não é propriamente aquele que tu queres seguir, mas tens que lhe agarrar, mesmo que seja só por necessidade. Se já tentaste aquele que tu caminho que tu pensas é o teu e por razões que a razão desconsegue explicar não deu certo, então entras na realidade, baixas a cabeça e segues por essa necessidade. De cabeça baixa e braços caídos segues o caminho e logo alguém te diz que não te preocupes porque há de chegar o dia que vais pelo caminho escolhido. Olha-lhes nos olhos e pensas nesse consolo tonto, sabendo que a realidade é mesmo assim.
A tua cabeça baixa não quer dizer que desististe, pode dizer mesmo que o peso do que pensas te verga mas não quebra.
Os teus olhos deixam cair uma ou outra lágrima, a tua boca solta um raro lamento. A tua cabeça fervilha de ideias que começar de novo.
Olhas para trás e te perguntas quantas vezes podes começar de novo, e não consegues achar a resposta.
Segues o caminho com cabeça baixa e braços caídos, mas não te roubaram a capacidade de sonhar, a força de lutar pela escolha do caminho. A estrutura mental não desabou, só tens mesmo é que lhe mudar de roupa e começar de novo. Sei que jamais serás a formiga a caminhar no carreiro, como uma ovelha por esse caminho. É, lá dentro está a força da razão de ser.Já viste como o vitral mudou de forma assim num repente que até parece mais bonito nas formas do início do zulmarinho.


Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia

2 de junho de 2007

Acordo, sonho e vivo

Vamos caminhando em passo imperfeito. Segues-me, sigo-te, tudo depende do sol.
Uma coisa é certa, falo-te mesmo que seja no meu silêncio e por mais que eu grite as minhas palavras caiem num manto branco de espuma feito pelo zulmarinho que se estende na praia como que a me querer agarrar, como a morte me agarrará um dia na sua forma metafórica de palavras minúsculas.
Afinal de contas quantos versos calei na minha garganta porque ela não estava oleada ou porque eles eram assim mais do que vulgares lugares comuns? Quantos palavras calei porque eram armas de arremesso que eu estava a tentar atirar?
Não estou preocupado com poesias nem com o lugar de viver a morte. Me preocupa mesmo é o lugar de viver a vida, de sorrir o sorriso.
Não me encontro perdido na estória, em grandes praças e avenidas, em substantivos e adjectivos, em verbos desconstruidos.
Me encontro mesmo aqui ao teu lado na ânsia de te dizer as coisas que me vão assim perdidamente na alma, desse grande labirinto de vida que não é das nuvens.
Aqui, deliciado a ouvir o marulhar, embalo-me nas palavras do coração, as coisas impossíveis de descrever, os versos por declamar. Imagens.
Afinal de contas eu acordo para viver, vivo para sonhar e depois volto a acordar.

Sanzalando

Nostalgia para a noite e para o dia


1 de junho de 2007

me lembrei é dia de ser criança outra vez


Hoje caminhamos num passo que nem sei como nos movemos. Lentamente, para não deslocar o vento que não sopra, não vai ele acordar e dar umas de rajada que nem joeira ia ficar quieta lá no céu rodopiando seu rabo colorido feito de papel celofane.
Ai uê! me fui recordar dos caniços cortados em quatro para ficar assim que metade de meia cana, cola branca se havia ou então cola de farinha, papel colorido de muitas cores, barbante de sapateiro e uma alegria enorme de construir a joeira que outros lhe chamavam de papagaio de papel que eu nunca soube porque já que joeira não fala, por isso não pode ser mesmo papagaio. Se joeira falasse ia só dizer palavrões, que nos tinha ouvido quando as coisas ficavam mal feitas da primeira vez e tinha de ser reconstruído. Nessa altura mesmo, ainda não tinham inventado essa coisa de manual de instruções para as coisas feitas em casa de ver outros fazer. Acho mesmo ainda não tinham inventado a física e o aerodinâmico. Havia mesmo era só vontade e entusiasmo no coração.
Vais ver me lembrei porque é dia de ser criança outra vez.
Já sei, a memória é assim como que selecciona aquilo que a gente quer recordar, o que convém e nunca faz comentários, não protesta nem reclama com o entender porque sabe que às vezes o entender só trás confusão a mais nela. Eu e a minha memória nos entendemos. Às vezes ela me faz traição, outras vezes sou eu que lhe corto a raiz, assim ficamos quites.
Minha memória é assim como que nem os meus olhos. Estes só observam mesmo o que acreditam ser a realidade e não me deixam ver o que eles vêem.
É assim como que o meu corpo, feito de cartolina que fica mole em dia de humidade, que rasga se eu tento mexer os braços e as pernas de encontro às inconsequências da vida.
Agora já entendes porque caminhamos nesta velocidade de palavra a palavra?
Vá lá, faz mais um esforço e me ouve enquanto eu tiver forças e vontade para te falar. Afinal de contas, mesmo a gente estar assim separados mas ligados não deixas de ser parte de mim e vice versa também.
Cada vez acredito mais que o meu sangue, e o teu que não tens também, é água desse zulmarinho que começa lá e acaba aqui. As minhas veias são assim como estradas que ele usa para se entranhar aqui na terra e se aprofundar como se fossem as suas raízes.
Meus dedos são assim como que abanam esse zulmarinho e lhe fazem ondas.
Hoje te falei assim porque me lembrei que hoje é dia de ser criança outra vez.

Sanzalando

Porque hoje ainda não é sábado!