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14 de setembro de 2006

02 - Estórias no Sofá - Uma morte anunciada 1

Só te conto que tenho dormido mal. Não sei se é por causa do factor emocional de não caminhar ou estar horas a ver o zulmarinho.
Como desconsigo dormir assim tudo numa seguida, eram para aí umas quatro horas da madrugada e eu fumava um cigarro na cozinha, quando ouvi bater na porta. Fiquei apanhado numa surpresa pela hora tardia. Assustado abri a porta sem pensar muito.
O meu maior espanto foi lhe olhar nos olhos e ver que era a morte que me vinha buscar. Lhe olhando na cara cavernosa não dava para enganar, mesmo que eu fosse cego.
Numa voz rouca e abafada, parecia que tinha engolido uma almofada ela me disse que eu devia estar era a dormir, lhe ia facilitar a vida, pois assim comigo acordado ia ter que me contar uma estória, ter uma trabalheira enorme a me convencer a lhe acompanhar e coisas e tal. Ao mesmo tempo que me fala assim roucamente, caminha para o frigorifico, olha e reolha como se estivesse a fiscalizar o conteúdo e prazos de validade. Mas não pára de falar no leite desnatado, margarina com fibras, frutas e legumes, carne de frango e outras coisas que dizem que são saudáveis e que estão por ali arrumadas. Me pergunta se tudo aquilo ali é que é comida que eu como. Tento recuperar a voz e sussurrando digo que aquilo é saudável. Ao mesmo tempo, para não perder o fôlego lhe pergunto o porquê daquela visita assim, naquela hora e neste dia. Eu queria entender mesmo, não era ganhar tempo. Fechando o frigorífico com força, aquela cara cavernosa me olha no cigarro que se queimava sem ser fumado, ao mesmo tempo que encolhe os ombros. Sabes, disse-me ela na sua voz rouca e abafada, não tens que entender nada. Eu cumpro ordens e não há outra volta a dar.
Escusas de fazer essa cara de já falecido pois ainda faltam umas horas para o comboio do inferno passar.
O comboio é só mesmo às sete da manhã.
Que até me lembrei duma canção.
Sanzalando

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