recomeça o futuro sem esquecer o passado

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31 de outubro de 2006

Tem dias assim

É sabido e bem notório que muitas vezes tenho a tendência de olhar para o passado, encontrando razões para justificar a frase que diz que todo o passado foi melhor.
Claro está que muito que realizo hoje, o devo ao passado. Porém sinto-me tranquilo em ver o meu passado a passar.
Muitas vezes ecoa-me na cabeça a frase: eu queria estar ali.
Porque não estou? nem eu sei bem a resposta. Ou será que sei?
Será que estou a cavar a minha própria sepultura?
Espero bem que não, pois eu jamais choraria por mim, pelo meu desaparecimento.


Hoje não me apeteceu escrever nenhuma estória, não tenho nenhuma em armazém, não me apeteceu vaguear com nenhuma personagem.
Simplesmente hoje estou em dia de não querer falar.
Dias!

Sanzalando

N'golart XIX

30 de outubro de 2006

a8 - Estórias no Sofá - O deserto

Me contaram e eu reconto num encontrar de areias de memória
Uuma lenda da terra dos horizontes infinitos, onde existe algo de espantoso e belo naquele Deserto, naquela imensidão de areia a perder de vista, uma miragem, fico sem saber, decerto, do que se trata, porque nesse areal se tranca uma aragem de séculos, como se resguardasse curiosidades alheias e protegesse melhor os seus segredos e mistérios.
O Deserto, o Sol e o Vento.
No princípio, era o Deserto; e o Sol amava-o, ternamente, todo o dia. No princípio, o Deserto era liso, todo aberto à luz do Sol, que o abraçava, estreitamente, todo o dia. O Deserto era quente e brilhante e vivia numa passividade feliz - quieto e silencioso.
De noite, o Sol queria o Mar, e o Deserto dormia sozinho, na escuridão. Mas guardava o calor que o Sol lhe dera. E vivia quieto e silencioso, numa passividade feliz.
O Vento chegou de noite, quando o Deserto dormia.
Olhou o Grande Deserto solitário. Soprou-lhe devagarinho, num beijo de aragem...e o Deserto sentiu um arrepio e acordou. O Vento soprou com mais força e o Deserto estremeceu.
Quando o Sol, de manhazinha, voltou, abriu muito os olhos e empalideceu.
Alguém passara a noite com o Deserto: em vez de areal sem forma, que se deixava doirar passivamente, era um Deserto novo, de dunas altas, belas e orgulhosas que recusavam ao Sol uma das faces.
Então o Deserto afirmou sem pestanejar:
- A minha vida, Sol, recebia-a do Vento. A minha vida é areia em movimento e o som que dela se desprende eu guardo em mim.
O Sol muito zangado respondeu:
- O movimento é dor; o som é queixa.
O Deserto muito firme termina este diálogo, respondendo:
- Aceito a dor que é vida; e cantarei, no braço do vento, a dor e a alegria de criar, com ele, as minhas dunas.

Sanzalando

À SOMBRA

28 de outubro de 2006

Há um ano foi assim




Aqui estava uma apresentação de slides com imagens do meu 49º aniversário, numa homenagem sentida a Abraão, amigos de outros e actuais tempos, que comemorava o seu aniversário a 29 e que num gesto sem palavras para o defenir fez-me uma festa que me marcou devido à sus senbilidade e, há cerca de 15 dias, deixou este mundo sem ter tempo de se despedir.
Mas este slideshow estava a causar uns problemas no normal funcionamento e abertura deste blog pelo que, com pezar, tive que o retirar.
Abraão, onde estiveres, recebe o meu abraço


Sanzalando

ANIVERSÁRIO

27 de outubro de 2006

13 - Estórias no Sofá - Descoberto depois de morto - 4 de 4

Morto do autocarro tinha vida dupla. Era este o título. Tentei logo fazer um filme mas quanto mais lia, mais a minha estória se afastava da realidade. Parecia eu ter visto um filme passado num ia de chuva, homens de gabardine falando entre dentes.
Justino da Silva Justo, empregado há 45 anos numa firma de import-export, sem uma única falta e com muitos dias de férias por gozar, falecido há seis dias na viagem que diariamente fazia para se deslocar para o emprego, cujo resultado da autópsia dizia ter morrido de paragem cardíaca, deixa duas viúvas e três filhos.
Isto seria uma notícia banal, não fosse o caso da sua bigamia, nunca ter sido ocultada a nenhuma das suas esposas
.

Ao que o Jornal soube, Justino desde os tempos de namoro, mantinha a situação dupla, não enganando nunca a namorada presente. Eu explico com as letras do jornal:
- se estava com Armandina, ele lhe dizia que às 7 horas ia à Espanhola, depois iria para a casa dos seus pais;
- se estava com Rossio, lhe dizia que só podia estar com ela das 19 às 22, pois tinha estava na Armandina até às 19 e os pais não admitiam que ele chegasse tarde a casa.
- os fins de semana eram repartidos entre Armandina e Rossio, sempre com as desculpas a caírem no trabalho.
Casou, de papel passado com Armandina, num fim de semana de folga da tropa. Manteve casa com Rossio sem nunca ter casado de papel assinado, porque os papeis dela nunca chegaram de Espanha. Ou terá alguém sorrateiramente os desviado? Uma incógnita que assim perpetuar-se-á dentro do caixão que foi a enterrar.
Os anos se passaram e lá ia ele ter com a Espanhola todas as tardes entre as 9 e as 22.
No dia do funeral ambas se conheceram. E se olharam olhos nos olhos num ar de espanto como que a perceber onde se tinham perdido durante tanto tempo na mesma estória. Ao que o Jornal conseguiu saber, não houve zangas, culpas ou desculpas, tendo o funeral decorrido na normalidade da existência de duas viúvas que até à data não se conheciam nem sabiam a existência uma da outra.
A repórter do Jornal ainda testemunhou um breve diálogo.
- Quando ele me dizia que ia à Espanhola eu pensava que era um bar. disse Armandina a Rossio.
- Quando me dizia que estava na Armandina, pensava eu que era o nome da Empresa onde trabalhava. falou Rossio a Armandina, na sua voz de cantar o português aprendido faz mais de meio século.
Sanzalando

N'golart XVII

26 de outubro de 2006

13 - Estórias no Sofá - Descoberto depois de morto - 3 de 4

Tirando os bons dias nada me foi dito. Empunhei o Jornal e reparei que havia vários por sobre as secretárias. Eles já sabiam. Tudo bem, está confirmada a minha estória. Exijo desculpas, disse-lhes. Sorrisos foi o que recebi em troca. Mas chegou para eu saber que lhes tinha ganho confiança.
Durante uns dias a viagem foi feita como se o autocarro carregasse ainda um falecido ali.
Este silêncio foi quebrado somente uns dias mais tarde quando, na minha paragem entro e ouço uma algarviada medonha. A confusão das vozes deixou-me perplexo na ignorância do que estava a acontecer. O vizinho da cadeira ao lado da minha me recomenda comprar o jornal, pois assim eu compreenderia tudo. A cadeira de Justino já estava ocupada. Era um jovem que andaria aqui há cerca de uns dois meses.
Tentei, durante a viagem saber mais alguma coisa que justificasse aquele comportamento, depois de uns dias de silêncio sepulcral. Nada, cada vez percebia menos. Só ouvia palavras soltas que não me faziam sentido.
Acabada a viagem fiz logo um desvio para comprar o referido jornal. Para não chegar atrasado não o abri e segui para o escritório. Abro-o lá pensei. Lá chegado todos me olham e perguntam se eu já sabia.
- Mas sei o que? Houve alguma revolução? Falimos? Que é que se passa? indaguei farto de ser o único que não sabia nada.
- Abre a página 3. A morte que tu viveste no autocarro, foi de um gajo que afinal é famoso.
- Como assim? Famoso e andou 40 anos num dia a dia naquele autocarro que quase tinha a idade dele? Não brinquemos com a morte alheia. retorqui no sentido de me dar tempo a perceber o que se passava. Sentei-me à secretária e abri a famosa página 3

Sanzalando

N'golart XVI


Sanzalando

25 de outubro de 2006

13 - Estórias no Sofá - Descoberto depois de morto - 2 de 4

Sai daquela barafunda, eu que andava fazia pouco mais de meio ano, naquela carreira, e apanhei um táxi que me levou ao meu trabalho, no centro do meio da cidade. Atrasado tive que dar as explicações e com não havia comprovativos dos acontecimentos, alguns se riram, outros fizeram só mesmo aquela cara que a gente sabe estão a nos chamar de mentirosos.
Amanhã de certeza vem no Jornal e eu quero ver quem é que me vai pedir desculpa, disse eu já contrariado e exaltado.
Passei o dia a matutar no assunto. Como pode andar alguém 40 anos assim num diariamente e ninguém conhecer mais que um bom dia? Afinal de contas ele já fazia parte do autocarro, ele já era parte da carreira.
Ao fim do dia, o mesmo autocarro, as mesmas pessoas com a falta de Justino. O silêncio era fúnebre e ninguém se sentou na cadeira em que ele se sentava nas todas as viagens de uma vida. Respeito ou medo de algum contágio? Não sei, não perguntei, mas na verdade também ali não me sentei. Nunca ouvi tão bem o barulho do motor a gasóleo daquele autocarro. O sofrimento dele nas subidas, o alívio nas descidas, o chiar dos travões. Aquele autocarro afinal tinha vida própria e só hoje, no silêncio fúnebre duma viagem, lhe tomo conhecimento. Nenhum comentário, nenhuma palavra sobra a viagem da manhã.
Na manhã seguinte, antes de apanhar o habitual autocarro, comprei o jornal. Não fora o único. Todos dentro do autocarro ou o tinham aberto ou o tinham debaixo do braço. Logo que me sentei o abri nas últimas páginas, nas folhas de necrologia à procura dalguma notícia referente ao passado dia de ontem. Aqui nada.
Alguém me sussurra ao ouvido, aparentado medo de quebrar o voto de silêncio que ninguém fez mas todos cumprem:
- Na página 3!
Lá estava.
Título bem grande a dizer Passageiro Morre a Caminho do Trabalho. Olho de soslaio para a cadeira de Justino e não estava nem Justino e ninguém lhe ficara com a cadeira.
Quero ver a cara deles no trabalho quando eu lhes mostrar isto.
Sanzalando

Ao som do RAP


Divirtam-se vendo zonas de Luanda e ouvindo um RAP

Sanzalando

N'golart XV

24 de outubro de 2006

13 - Estórias no Sofá - Descoberto depois de morto - 1 de 4

Justino, homem sério e trabalhador, carregado nos seus 65 anos resolvera falecer porque o coração parou assim de um momento para o outro, no autocarro que lhe trazia para o emprego todas as manhãs e que ao fim do dia lhe retornava a casa. Não foi solavanco a mais, não foi discussão. Olhava na janela para ver a rua de todos os dias e assim parou de lhe correr sangue no corpo. 40 anos a fazer a viagem todos os dias, sem uma reclamação, sem ninguém lhe ouvir a voz senão quando dava os bons dias aos que entravam ou saiam daquele autocarro que ele conhecia como o seu autocarro. E agora ele estava a dar um trabalho danado na companhia, porque o seu corpo jazia sentado na sua cadeira no meio da sua viagem que terminou ali, mais cedo que habitualmente. Autocarro esvaziado assim no meio da viagem à espera das autoridades. Na verdade ninguém protestava. Afinal todos conheciam, pelo menos de vista Justino, e sabiam que não era homem de fazer aquela confusão de propósito só para contrariar alguém. Se lhes ouviam só elogios, pois ali era da família dos que faziam a viagem diária.
- Já alguém avisou a família? perguntou um mais habituado nestas coisas de mortes e falecimentos.
Mas quem conhecia ali Justino senão de o ver todos os dias dentro daquele seu autocarro, àquela hora?
As autoridades ficam de tratar disso depois de fazerem o levantamento do corpo e o levarem lá para onde ele tem de ir, disse um outro alguém.
Assim, 40 anos depois, Justino vai faltar ao trabalho porque não acabou a viagem no seu autocarro, eles vão notar alguma coisa de estranho e vão entrar em contacto com a família e logo se vai descobrir que ele morreu, disse logo o motorista que tinha tantos anos daquela viagem como tinha Justino, não conseguindo disfarçar uma lágrima a lhe escorrer na cara enrugada.

Sanzalando

Aproveitando a música


Sanzalando

23 de outubro de 2006

a7 - Estórias no Sofá - A Esperteza do macaco

Me contam e eu vos conto. Desnecessito lhe acrescentar pitada.



Esses olhos negros como a noite onde o luar passeia, contam fábulas quando os animais falavam, poemas que falam dos segredos das noites misteriosas, de luas lindas e de céu estrelado, praias de areia fina, de perfumes embriagadores das flores, do perpassar do vento que faz baloiçar os bambús e as copas dos densos palmeirais...era uma vez lá no reino do Obô, numa dia de festa:
O rei Leão mandou avisar todos os animais que a partir daquele dia ninguém poderia mais comer as mangas do seu quintal, a não ser ele.
O macaco não gostou nada da ordem e resolveu pregar-lhe uma partida.
Fingindo-se muito aflito, aproximou-se do muro do quintal e começou a berrar:
Acudam, acudam, acudammmmmmm...
Vieram os guardas e perguntaram:
O que tu queres macaco? Não sabe que o Rei está a dormir?
O macaco respondeu:
Tenho uma coisa muito importante a dizer ao Rei se ele me quizer ouvir.
Um dos guardas muito zangado respondeu-lhe:
Claro que o Rei não há-de querer ouvir-te, pisga-te e não voltes a incomodar-nos.
O macaco insistiu:
Nesse caso, peço-vos que me amarrem com todas as vossas forças contra uma árvore, porque vem aí garroa, que não vai deixar nada no lugar.
Os guardas impressionados foram contar ao Rei e este prontificou-se logo a falar com o macaco.
É verdade o que dizes?
O macaco respondeu:
Se não for verdade, manda-me arrancar os olhos e cortar a língua.
O leão convencido, mandou que o amarrassem, a ele primeiro, à mais robusta árvore. Os guardas por sua vez pediram uns aos outros para se amarrarem mutuamente.
O macaco fingia estar aflito e perguntava:
E a mim quem me amarra?
Cala-te bicho insignificante  respondiam
O macaco logo que apanhou todos bem amarrados, trepou para a mangueira e encheu-se de mangas até não poder mais. Só então o rei percebeu a esperteza do macaco e jurou vingar-se.
Um dia, o leão fez uma grande festa e convidou todos os animais, na esperança de apanhar o macaco.
Este, foi ter com a galinha de angola e pediu-lhe as penas, foi ter com o faisão e pediu-lhe o carapuço, que enfiou na cabeça.
Quando chegou à festa, o rei muito intrigado perguntou:
E tu quem és?
Sou o filho do Obô,
O rei sentiu-se muito honrado com tal presença que o tratou com todas as atenções.
No fim da festa deram-lhe uma bela cama para descansar. O macaco tirou o carapuço e adormeceu profundamente de tão estafado que estava. A leoa preocupada com o ilustre convidado foi verificar se estava tudo ao seu gosto e qual não foi o seu espanto quando reconheceu o sr. macaco.
Foi logo avisar os guardas, cercaram a casa, o macaco acordou com tanto barulho e pensou:
Que hipóteses tenho de escapar? Tenho que pensar numa saída e bem rápido.
Ouvia os cães a labrar e lembrou-se que na sua fuga iria ser perseguido por eles.
Encheu um saco com ossos, saltou a janela e à medida que corria que nem louco ia atirando os ossos aos cães.
Mas infelizmente havia um que não desitiu e continuou a correr atrás do macaco. Cansado e sem forças, tropeçou numas raízes que escondiam uma toca e meteu-se lá dentro.
O cão, raivoso, começou a cavar e apanhou o rabo do macaco, mas o sabichão logo se pôs a berrar:
Olha o grande parvalhão, agarra uma raiz e pensa que me apanhou.
O cão larga o rabo do macaco e vai-se embora.
Sanzalando com MC

N'golart XIV

22 de outubro de 2006

a6 - Estórias no Sofá - ...casou com o macaco

Tla qual me contaram eu te reconto:

Um dia, quando todos menos esperavam Lô casou-se. As moças do Luchan ficaram admiradas:
- Até que enfim!!!!
O marido de Lô nunca parava em casa. Ia à caça todos os dias.
- Simão, tu nunca pára em casa!...
Ia à caça todos os dias. A roupa da caça vinha sempre rasgada mas… Nem lagaia, nem morcego, nem rola, o Simão trazia.
Apenas roupa rasgada.
Um dia, os empregados resolveram ir espreitar o patrão. O que viram, nesse dia, deixou-os espantados.
Na larga varanda da casa, Lô deu um almoço para mostrar às amigas que afinal, não morreria solteira.
Os empregados arranjaram uma corda comprida, prenderam-na numa ponta da varanda e colocaram em fila muita banana madura, em grandes e apetitosos cachos.
Em cima da mesa havia calúlú, lôçô dóchi, izaquente, enfim muita coisa boa. Toda a gente comia satisfeita e ria.
Só Simão estava mal disposto nesse dia. Andava dum lado para o ouro, com as mãos atrás das costas, coçando a cabeça…
Os empregados escondidos atrás da varanda riam e aguardavam.
De repente, de um salto, rugindo, Simão pendurou-se no corrimão da varanda e começou a engolir sofregamente as bananas, e um comprido rabo de macaco saiu pelo fundilho das calças.
Toda a gente, pasmada, começar a cantar:
"Tanto escolheu que casou com um macaco…"


Sanzalando com MC

era uma vez...

20 de outubro de 2006

Contemplação

Hoje fico por aqui. Vá lá, estou cansado. De vez enquando apetece-me olhar para o belo. Releio-me e dou uma volta pelos link's que estão aí do lado direito. Há tanta coisa bonta para ver. Se eu tivesse tempo... Posted by Picasa

N' golart XII

19 de outubro de 2006

12 - Estórias no Sofá - O Tédio - 2 de 2

Quando era jovem tinha medo de morrer. Na verdade tinha medo de não ter nada para fazer depois de morto. Todos acreditam em céu, inferno, ou qualquer coisa que haja depois da morte. Ele tinha medo de não ter nada. De morrer e não ter o que fazer. Ter de ficar a olhar a terra de cima dos seus olhos para sempre, ou nem isso, só dormir. Daí que não morria.
Queria viver para sempre, achava que tinha muita coisa para fazer na Terra, aventuras, descobertas, quotidianos, amigos, História, aprender tudo até o fim dos tempos. Queria participar de tudo.Agora cansou-se. A História, de um jeito ou de outro, era a mesma. As mulheres, mais baixas ou não, eram as mesmas. Os amigos, mais calmos ou não, eram do mesmo jeito. O futebol também era o mesmo. As aventuras, as descobertas eram quotidianas. Morou em todos os países do mundo, nuns mais pobres que outros, eram todos do mesmo jeito. Queria morrer.
Queria morrer, mesmo que fosse para não fazer nada. Aliás, queria morrer para não ter que fazer nada. Nesta altura já não pensava em céu, deus, diabo ou quaisquer coisa que valha. Queria era dormir para sempre e nem precisar ver as estrelas, já sabia reconhecê-las, com as constelações e todas as mitologias.
Um dia, assim num repentinamente, morreu de tédio.

Sanzalando

N'golart XI


Sanzalando

18 de outubro de 2006

12 - Estórias no Sofá - O Tédio - 1 de 2

Horácio tinha que a morte era um passado carregado de incertezas dolorosas. Tinha a certeza que não morreria mais. Se tal ainda não lhe tinha acontecido até aquele instante, não mais lhe iria acontecer.
Estava cansado da vida, das coisas quotidianas, de conhecer cada canto do mundo, de aprender todas as línguas do mundo, de ter mulheres diferentes em todos os cantos do mundo. Estava cansado de olhar para a sua cara ao espelho há mais de duzentos anos, refez seu rosto muitas vezes em plásticas, mas se enjoava assim mesmo porque qualquer que fosse a forma era ele por trás daquela máscara. Estava farto de se ver, estava farto de si. Acabara-se a paciência para se aturar.
Tentava morrer e não morria. Saltou de prédios sem pára-quedas, deu-se-lhe tiros em todos os pontos mortais, bateu com vários carros contra vários muros, saltou falésias, apanhou na rua tanta sova porque se meteu com todos os bandidos que encontrou. Mas não conseguia morrer.
Foi para guerras, para o espaço, andou de avião atrás de um desastre. Ficou amigo de vários videntes para tentar saber sobre os atentados terroristas e ia acompanhá-los. Era sempre o único sobrevivente. Pegou doenças incuráveis, mas não morria.
As pessoas que com ele cresceram já estavam todas mortas, ninguém acreditava que ele já passava dos duzentos anos. Mas com todas as desventuras, ainda tinha muitos amigos. Não podia queixar-se de nada. Buscava motivos para morrer, brigava com os amigos, com as mulheres, mas todos sempre o perdoavam e juravam que era ele que estava certo.
Único motivo que encontrou para morrer era a sua própria vontade de o fazer.

Sanzalando

N'golart X

17 de outubro de 2006

11 - Estórias no Sofá - O rubor da mentira - 2 de 2

Respondi-lhe que descansava de um dia de trabalho demasiado cansativo e que me sentia angustiado e nostálgico, enquanto o fazia com a voz carregada de emoção, da mentira e do prazer, manobrava os dedos de forma a desenvencilhar-me da aliança que teimava em não me sair do anelar. Atabalhoadamente tricotava os dedos de forma nervosa e complicada, gestos vãos.
Num gesto rápido e inesperado, pela primeira vez, virou a cabeça na minha direcção, mostrando uns lindos olhos de azul inocente, para dizer que ia ali todos os dias àquela hora, num ritual que se habituara a cumprir fazia anos.
Eu sabia que ela me tinha visto na tentativa velhaca e infrutífera de tirar a aliança, e ao ser apanhado, tinha ficado envergonhado enrubescendo desmesuradamente, como sempre me acontecia quando era apanhado em falta. Ela não desviava a cara, e eu não era capaz de a encarar, refugiando o olhar na linha agora negra do horizonte, esperando que o ar de fim-de-tarde num sopro arrefecido me devolvesse a cor original e entregando-me à simples matemática da contagem das ondas, tentando não me culpar em demasia. Eu era homem e ela uma mulher belíssima, a tentação tinha prevalecido, objectiva e subjectiva como todas as máscaras da alma humana.
O silêncio pesado durava há muito quando ela me perguntou.
- É casado?
O rubor voltou ainda mais desconfortável, punindo-me de forma drástica, enrubescendo-me até a voz que já não era melodiosa nem limpida.
- Sou e tenho dois filhos, acrescentei eu numa rapidez como que a penitenciar-me, já que o propósito que me havia passado pela cabeça estava frustrado.
- Ama a sua mulher? voltou a perguntar-me na sua cândida voz.
Após um instante respondi-lhe que sim, não valia a pena mentir-lhe, só faria papel de estúpido se negligenciasse a sua inteligência.Estendeu a mão para me cumprimentar disse:- Chamo-me Eduarda, e sou cega de nascença.

Sanzalando

N'golart IX


Sanzalando

16 de outubro de 2006

11 - Estórias no Sofá - O rubor da Mentira - 1 de 2

Descalcei-me, tirei as meias, dobrei as calças até meio da perna e enterrei os pés na areia ainda húmida da maré-cheia da hora do almoço.Senti os grãos de areia abraçarem-me os pés. A sensação entre os dedos era relaxante enquanto olhava o mar azul cinzento e chão de um dia de Outono, momento de praia-mar e pequeníssimas ondas num bailado repetitivo lambiam a areia, onde bandos de gaivotas esperavam pela noite. É ainda muito cedo, pensei. Faltava uma boa hora para se ouvir o cair do crepúsculo para as abraçar e as levar numa migração para outro porto de abrigo.
O céu carregado de nuvens denunciava que a noite não seria serena nem ia havia lugar para luar.
Indolentemente embriagado pelo cheiro a maresia e com o som cadenciado das pequenas ondas, via-a ao longe e fixei-a enquanto caminhava à beira da praia. Não mais a perdi de vista. O mar, a brisa, o refugio da solidão passaram para um plano inclinado de importância.
À medida que se aproximava admirei-lhe a forma esguia, o cabelo negro solto à brisa e o vestido, na minha opinião, leve de mais para esta época. Vinha descalça, num ritmo de ninfa, com uma toalha azul pendendo da mão, num ar de desleixo ou de descontracção absoluta.Virou-se repentinamente e caminhou na minha direcção.
Num choque de prazer, olhei-a com inconsciente e estéril pensamento. Que quereria aquela insólita e linda sereia de mim. Parou quando chegou perto de mim e depois de uns instantes cumprimentou.
- Olá, boa tarde.Respondi-lhe, dizendo que a tarde não esteve grande coisa até este momento, mas que tudo me indicava que ia melhorar.
Ela sorriu, com inteligência nada disse, estendeu simplesmente a toalha uns três passos à minha frente e sentou-se, admirando o mar. Bebia todo o mar naquela pose.Aproximei-me e sentei-me a seu lado, guardando uma distância educada, mas não conservadora, já que, tinha sido ela que convidativamente se aproximara.
Puxei de um cigarro, com a secreta esperança de que um novelo de fumo suavizasse ou amenizasse uma conversa pacífica que eu adivinhava ia haver.
Acendi-o. O clic-clac clássico do zippo de estimação, pareceu interessá-la.
Perguntei-lhe se queria um cigarro.
Estendeu-me a mão. Passei-lhe o maço donde tirou um voltando a estendê-la pelo zippo, que me apressei a colocar na frágil mão que senti quente e macia. Acariciou-o como uma apreciadora, enquanto lhe admirava a finura de dedos. Acendeu-o, protegendo a chama do pouco vento com uma delicada mão em concha e após uma forte puxada, perguntou-me o que fazia ali.


Sanzalando

quem fungou

15 de outubro de 2006

10 - Estórias no Sofá - A carta - 3 de 3

Um amigo que se cruza comigo pergunta-me onde vou. Não lhe sei responder porque nem eu sabia para onde ia.
Andei num andar desnorteado, desarrumado. Círculos, quadrados. Tudo fiz nesse caminhar. Perimetrei quarteirões, contornei rotundas.
Caminhei por sentidos sem sentido, caminhos contrários para perceber as divergências.
Entrei num supermercado e dirigi-me às bebidas. Escolhi um vinho sem qualquer critério consciente. Simplesmente era tinto. Paguei-o e saí.
No passeio verifiquei que não tinha saca-rolhas. Para que me serve uma garrafa de tinto se não a consigo abrir. Mas será que a quero beber?
A carta ainda estava ali comigo, dentro da cabeça. O que será que ela contém? Caligrafou-a ou dactilografou-a?
Passei num cinema no momento em que saíam todos de lá de dentro. Assisti à saída do cinema. Todos se faziam acompanhar. As últimas vezes que fui ao cinema fui sozinho. Assistindo à saída do cinema eu e a minha garrafa de tinto fechada porque seria estúpido empurrar a rolha para dentro.
Me pus a caminho de casa desta vez seguindo um caminho mais recto, decidido a dar algum destino à carta. Ainda estava em dúvida se devia lê-la ou não.
Precisava confirmar se os meus pensamentos estavam correctos. Uma desculpa, alegando qualquer coisa. Um pedido que voltássemos a conversar, por sentir a minha falta. Talvez tivesse percebido ter feito algo errado, mas que não era essa a sua intenção. Se explicaria com palavras amáveis?
Neste caminhar alguém me olha de forma estranha. Queres ver que estava a falar alto comigo?
Impossível abrir a carta. Frouxo dir-me-á mais tarde se souber que eu li a carta. Ela tem de passar sem ser lida.
Desgraçada.
Desfaço-me da garrafa. Abro a porta de casa e vou directo à caixa. Agarro na carta. Olho-a sem a abrir. Deve dizer-me que eu sou isto ou aquilo, que deixei de conversar, que deixei de ser o simpático de outros tempos. Injustiças.
Pego no isqueiro. Queimo-a.
Olho espantado para o fogo das minhas dúvidas.
Olho-me queimando a minha dúvida.
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N'golart VIII

14 de outubro de 2006

10 - Estórias no Sofá - A carta - 2 de 3

Fiquei alterado com a súbita curiosidade de saber o que tinha lá dentro desta vez. Estaria a reafirmar-me um pedido de desculpas? Estaria a querer insistir na reaproximação? Deve ser uma carta depressiva, chorosa. Ela quer levar-me às lágrimas. Resisto!
Tentei inventar coisas para fazer, para tirar toda esta curiosidade de dentro de mim.
Tentei tocar piano e apercebi-me que nem duas notas saiam num compasso aproximado da pauta. Estava incapaz de tocar piano porque nem as partituras eu conseguia ler. Improvisei com notas agressivas e repetitivas, fortes e rápidas. Desconsegui descontrair-me. A carta ali estava a preencher-me ainda. Os meus olhos só viam a carta depositada dentro da caixa. Para sempre, acho eu. Mas mesmo assim eu vejo-a. Reflexo dela ficou encaixilhado dentro da minha massa cinzenta, branca e outra que eu possa ter.
Não posso continuar assim.
Sai. Passei pela casa dela sem me ter dado pelo caminho que escolhi. Toquei a campainha, bati directamente na porta. Quase calejei o nó dos dedos. Nenhuma resposta. Ao menos se podia instalar em nós uma amizade, mesmo que fosse falsa, não tão profunda como o amor. Quer-me parecer que estou a fraquejar. Mas ela não me atende à porta. Se calhar se escreve torto por linhas direitas. E a carta lá em casa encaixada na caixa dos papéis arquivados em montes. Uma caixa que não devia ter visto a luz hoje.
Voltei ao piano. Olhei-o. Escolhi teclas que iriam ser tocadas pelos medos. Toquei de olhar, por assim se dizer.
Voltei a sair sem ter conseguido soltar uma nota.

Sanzalando

N'golart VII

13 de outubro de 2006

10 - Estórias no Sofá - A carta - 1 de 3

Faz sol. É o começo do tempo quente. Também chove a chuva que lhe chamam de tropical. Porque molha e aquece, só pode ser. Não, é mesmo porque estamos nos trópicos. Eu me mantenho nos tópicos, mesmo que esteja num Polo. Outros nos utópicos. Mas o que conta é a tropicalidade.
Hoje resolvi fazer arrumações. Casa arrumada tem outro aspecto. Aproveito para encher o meu tempo. Porque se encontra sempre o que não se procura quando se fazem arrumações. Encontrei uma caixa que fora outrora de sapatos, tendo agora uma função diferente. Segredos e contas pagas e outros papeis que podem ser precisos. Alguns há anos que ali estão pacientemente esperando serem úteis em vão.
Abri a caixa donde entre muitos papéis encontrei uma carta. Esperadamente uma carta por abrir.
Que diabo faz aqui esta carta, pensei dentro de mim. Porque é que eu não rasguei esta carta?
Quem é que se dá ao trabalho de escrever uma carta, ir ao correio, colar um selo e depois ir metê-la no marco, se sabe bem que o outro não a vai ler?
Mas será possível que ela não tinha compreendido o que se estava a passar? Eu decidi nunca mais ouvi-la. Eu disse-lhe e acho que de forma bem clara.
Ela também não teve um período que nem me queria ver, desviando-se e cortando qualquer conversa? É evidente que eu nesses dias me degradei. Foi-se o apetite, foi-se a vontade de existir. Ultrapassei e não quero voltar a acorrentar-me e um dia voltar ao mesmo. Acabou é porque está acabado.
Disse-lhe tudo, num texto semi-decorado, com improviso disfarçado, por vezes com palavras a se enrolarem na boca, parecia tinha eu vertido uma tantas garrafas de qualquer coisa.
Parece ela não entendeu. Talvez a entoação não tenha sido a mais correcta. Talvez o conteúdo tenha sido adulterado nalgum embargo linguístico.
Li as primeiras cartas que recebi. Li e rasguei-as. Esta foi atirada para dentro da caixa que só se abre para guardar para a eternidade algum papel, algum recado, contas pagas e coisas que não vão ser precisas mais mas que a gente guarda por hábito ou porque é conveniente.
Porque abri eu agora esta maldita caixa se não tenho nada para lá dentro colocar. Re-caixei a carta e ganhei tempo para pensar o que fazer com ela.

Sanzalando

Prémio Nobel

12 de outubro de 2006

a5 - Estórias no Sofá - A lagoa Amélia

Talqualmente me contam eu assim te conto, nem virgula nem tom eu acrescentei.

Lá para os lados da montanha, conta-se que onde se vê a água da lagoa existia em tempos um grande luchan.
Certo dia, aconteceu passar pelo luchan uma avó de aspecto desagradável ou talvez doente, de nome San'ana, que oferecia uns peixes de mau estado a troco de farinha de mandioca ou milho. Tinha sede, segundo outros, e pedia água, comida e lenha para se aquecer.
Não lhe aceitaram o negócio, não lhe deram água, não a atenderam, trataram-na com desdém, até a xingaram, pelo que a avó se retirou resmungando ameaças e deixando o luchan entregue à euforia duma grande festa em que a encontrara.
À saída da povoação, deparou-se-lhe uma piquena por quem foi bem acolhida, a qual chamou a mãe que trouxe farinha e água trocando pelos peixes.
Diz-se ainda que tendo San'ana o braço cheio de feridas foi a seu pedido tratado pela piquena. Logo a avó lhe disse:
- Visto que és simples e me trataste bem, escuta: esta noite, quando cantar o primeiro galo, hás-de ouvir três vezes um grito.
Então, chama teu pai e tua mãe e fujam, porque aqui tudo se arrasará com água.
A avó seguiu, apoiada ao seu bordão, embrenhando-se no mato.
A piquena, inquieta, aguardou sem dormir; até que, após o canto do primeiro galo, ouviu o anunciado grito, provindo, forte e rouco, do lado onde o sol nasce. Então, correu, chamou o pai e a mãe e embrenharam-se no mato, ao mesmo tempo que uma enormíssima vaga de água assaltava o luchan submergindo-o, com todos os seus habitantes, tomados dum misterioso sono, enquanto se ouviam rufos subterrâneos de tambores antecedendo o desabar da vaga.
O soba do luchan estava ausente. Fora caçar para os lados de Bombain. Quando regressou, deparou-se-lhe o lago no terreno em que deixara o luchan. Meditou por momentos naquela infelicidade. Depois, resoluto, resolveu entrar nas águas, até desaparecer. Ao mesmo tempo, ressoou um estrepitoso rufo de tambores, eram os submersos que saudavam o seu soba fiel, que marchava a juntar-se-lhes, nos fundões do grande lago.
Dizem que o soba do luchan, enquanto andava no mato a caçar, havia encontrado a avó, dando-lhe água da sua cabaça; e que teria sido ela que o avisou, depois de contar o sucedido, que ao cair da noite o luchan daquela gente má teria tanta água que a todos fartaria. É vulgar dizer aos naturais que "a lagoa está boa". Porém, em outros tempos, ninguém podia aproximar-se, principalmente se vestisse panos de cores vistosas ou berrantes.
Dizem que, quando as águas baixam, se podem ver katanas e peças diversas como panelas e que por vezes se vêem flutuar tectos das casas submergidas.
Dizem que, em tempos, se ouviam rufos de tambor, nos compassos do batuque, vindos lá do fundo e que era perigoso tocar tambores junto ao lago, pelo risco de sobressaltar os que dormem no fundo do lago.
Dizem que, em tempos passados, também se ouviam cantos de galos ao nascer das alvoradas, no meio do lago, no ponto onde existiu o grande luchan, e que no mesmo local gira um forte redemoinho, que engolirá a canoa que dali se aproximar.
Disse um pescador da lagoa Amélia, "não entro na lagoa quando San'ana está zangada" e realmente nesses dias havia um forte vento até parece que a lagoa está embravecida, agitada por vagas, uma verdadeira calema onde as canoas dificilmente se aguentariam.
Sanzalando com MC

N'golart VI

11 de outubro de 2006

09 - Estórias no Sofá - Uma estória de Miserela - 3 de 3

A minha família se fechava cada vez mais no seu silêncio e as suas aparições iam rareando. Sem mulher, sem projecto de filho e agora sem família. A dela, bem, eu nunca a havia conhecido porque ela também não. Era, segundo se dizia órfã desde nascida.
Em casa, no serviço, no carro, eu matava as minhas saudades nos espelhos. A minha persistente dúvida nunca me era respondida. Eu só a via até às mamas.
Neste tempo todo passaram-se cinco dias que me valeram anos. Pelos que me foram roubados à vida.
A barba era desfeita de dois em dois dias. Os espelhos já não serviam para fazer a barba. Eram o meu mata saudades.
Gervásio vivia em dois mundos, no que me levava ao trabalho e o que eu vivia em frente aos espelhos.
Um dia, assim sem mais nem menos, chego do trabalho e encontro na sala, numa penumbra de janelas cerradas, a minha família. Põem o dedo na boca em sinal de silêncio. Toda a minha cara virou sinal de espanto. Ia desatar num pranto. Eu pensei que para estarem ali assim a tinham encontrado jazida num sítio qualquer. Mas eles não tinham cara fúnebre. Olhei-os com tal intensidade que lhes vi os interiores. Mais desarrumados que o meu. Não encontrei visível uma resposta. Estático ali estava eu despercebidamente fora do mundo real.
Minha mãe se levantou, D. Senhorinha, dona de porte atlético para os seus cinquenta, caminhou para mim e me levou arrastando pelo braço para o passeio da minha rua, como querendo desvendar-me um grande segredo que nem as paredes podessem ouvir. Fim de tarde outonal que estava a me ferver o sangue e a alma.
Sabes, meu filho, começou ela a querer segredar-me um segredo. Lhe olhava estupefacto porque ela nunca agira assim comigo. Era sempre pão pão queijo queijo. Aqui há coisa, soletrava eu interrompendo a fala dela.
Aqui na nossa terra, tentava ele continuar o diálogo comigo, há um costume ancestral. Para que uma grávida tenha uma boa hora, para que o seu rebento seja forte e saudável, assim como tu, a futura mãe tem de passar uma noite sobre a ponte de Miserela. De manhã, a primeira pessoa a passar e a encontrar será o padrinho ou a madrinha. Se a criança for rapaz chamar-se-á Gervásio, se for rapariga chamar-se-à Senhorinha. Nós somos assim ligados a estas tradições. Tu, estudaste fora, viveste muitos anos fora daqui estás muito mudado. Modernizaste-te.
Mas que treta é essa agora aqui? perguntei eu do alto da minha ira. Para quê esta lenga lenga toda a esta hora.
Sabes, continuou ela no seu ritmo de fala, com as novas vias já ninguém passa em Miserela como antigamente. A tua mulher sempre esteve em nossa casa estes dias tendo só regressado hoje porque só hoje, dia de caça, passou gente por lá.
Mas isto deve ser uma brincadeira. Só pode. Gritava eu cada vez mais alto. Meu pai apareceu, deu-me um abraço como que a querer abafar-me a raiva. Enraivecido afastei-o.
Sabíamos que és contra estas coisas por isso agimos assim. Com a tua mãe, felizmente foi só uma noite. Eram outros tempos.
Severina, a minha mulher apareceu-me no passeio. Envelhecida, cansada, inquestionavelmente grávida ainda. Se agarra-me ao pescoço num abraço e nesse instante desata a chover camuflando as lágrimas que brotávamos.
Mundo louco este, babuciei.
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N'golart V

10 de outubro de 2006

09 - Estórias no Sofá - Uma estória de Miserela - 2 de 3

O gelado esparramou-se no chão quando tomei conta que não estava ninguém dentro do carro. Nem mãe nem projecto de filho. Bem, este também não podia estar pois ainda estava dentro da barriga dela, mas naquele instante não consegui ver claro o que me corria dentro da cabeça.
Naquele instante tive a plena certeza que não tenho o sexto sentido. Não seria preciso procurar à volta para confirmar que tinham dado sumisso. Tinham sumido mesmo.
Foram dias de perguntas, de voltas. Colei cartazes em tudo o que era loja, poste ou árvore. Tudo dolorosamente inútil. Falei com conhecidos e desconhecidos. A minha família me olhava e emudecera porque nem uma palavra me era dita, nem um olhar me era dirigido. Parecia tinham desaparecido, tal como todas as folhas A4 que eu tinha colado com o rosto lindo dela.
Tudo parecia perdido. Eu, Gervásio estava velho. Acabado assim num tempo de comprar um gelado. Acabado e sem descendência.
O germe da resignação germinava no meu interior, bolorando a desarrumação, saturando o amontoado de ideias vagueantes e tudo já perecia perdido.
Cheguei do trabalho cansado, deixei água a correr na banheira e me preparei, rodeado do silencioso apartamento, para tirar a minha angustiada barba de três dias.
Esguichei uma boa dose de espuma para a cara, raspei a gillette sobre os pelos esbranquiçados da cara, mirando-me ao espelho a ver-me velho e acabado num envelhecimento precoce.
No fundo do reflexo percebi a figura da minha mulher. A gillette caiu-me da mão e congelei-me por instantes. Pateticamente tentei alcançar o reflexo dela. Claro que só tive como resposta o toque frio do espelho gelado.
Foram apenas alguns segundos, logo o espelho reflectia apenas a porta da casa de banho, mas foi o suficiente para me perturbar para um quase sempre.
Daquele dia em diante, ela passou a visitar-me através dos espelhos cuidadosamente espalhados por mim ao longo da casa. Na mesa, em cima da televisão, na cabeceira da cama, jaziam pequenos postais de vidro, trazendo de volta o que eu tinha perdido. Refém daquele pequeno universo, minha mulher surgia sempre com um olhar resignado e doce, cheio de saudade. Era este o reflexo que eu via. Saudade doce.
Já me andava a acostumar com a situação. Eu e os meus espelhos. Os meus espelhos e eu.

Sanzalando
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N'golart IV

9 de outubro de 2006

09 - Estórias no Sofá - Uma estória de Miserela - 1 de 3

Era tarde de uma noite lá muito para trás.
Só agora te conto porque só agora me apeteceu abrir o meu livro de interiores. Está desarrumado, é verdade, mas como abro poucas vezes para visitas guiadas, quem se vai importar com isso? Eu pelo menos não, Não fosse o meu nome Gervásio, não fosse eu um cidadão de todos os costados e mais alguns que nem são quantos são, que nem ligo para dentro de mim.
Mas te contava eu que uma noite já bem tarde. Se podia dizer que madrugada já era, embora ainda não se visse um rasgo de sol.
Vínhamos de uma festa, como íamos a tantas festas já nem me lembro direito qual era a festa donde a gente voltava. Ela, carregada na sua gravidez pediu um gelado. Mulher grávida também arranja apetites a qualquer hora.
Me lembrei dos meus tempos de boémia nocturna, de uma roulotte que fica toda a santa ou pecadora noite aberta.
Dirigi-me para lá. Podia tentar dizer-lhe para aguardar por amanhã. Mas como a conhecia e mais os seus desejos gravídicos, pensei que o gelado não podia esperar. Tem de ser e tem muita força. Carregado no meu silêncio lá fui guiando contrariado na esperança que os tempos não tivessem mudado assim tanto e a roulotte ainda subsistia no mesmo canto de sempre, com a mesma freguesia de sempre.
Estava no mesmo sítio, tinha o mesmo aspecto e fundamental era que estava aberta.
Lhe disse para irmos.
Eu vou ficar no carro, disse-me ela com a sua voz carregada de sono misturado com mais qualquer coisa que desentendi.
Foi a última coisa que me disse antes de desaparecer.
Lá fui eu para o balcão alto e aguardei pacientemente a minha vez. Fui pensando que gelado lhe ia apetecer. Levasse eu qual que fosse ela ia dizer que não era aquele. Sempre assim foi e sempre assim será, só para me contrariar ou para se contrariar a ela mesma. Vai ser um de chocolate. Ou será um crocante de qualquer coisa?
Gostaria de dizer que tive assim uma espécie de premonição que ela poderia estar a correr perigo. Mas a verdade é que não. Demorei-me pacientemente na escolha. Foi uma escolha sem pressas. Chocolate ou crocante? Maldita dúvida. Se eu levasse um ela ia dizer que queria o outro. Mas só levo um. Jogo na sorte.
Escolhi o chocolate. Assobiando uma canção mais antiga que eu, lá fui ter ao carro, certo que a minha mulher e meu projecto de filho estariam em segurança. Vais ver ela deve ter adormecido. Anda tão cansada que qualquer sítio é bom para passar pelas brasas e, a esta hora tarde da noite, mais convidativo será.

Sanzalando

Dia santo

6 de outubro de 2006

a4 - Estórias no Sofá - A Grande escolha

Me contram tal e qual vos conto. Não acrescento conto nem ponto

Lô crescia. Crescia e lavava roupa no rio. Dançava socopé no Fundão, lançava sonoras gargalhadas para toda a gente.
A mãe, a avó e o pai entristeciam-se. Lô já fez 18 anos, mas não aceitava ninguém. Fazia troça de todos os rapazes da vizinhança.
- Lô! Lô! Mé Nóvu trouxe peixe p'ra gente. É bom pescador.
- Pescador morre no mar. Não quero criar filho sem pai.
- Lô, olha que morres sem filho para te enterrar.
- Solteira é que eu não morro. Mamã não te preocupe por minha causa…
"Lô está a brincar
Lô está a folgar
O tempo vai passando…
Lô acorda
Que a gravana está chegando."
As moças de casa cantavam à porta de Lô, mas rindo agarrava no cesto e ia à feira vender limões.
"Compra freguesa
Lô quer dinheiro
Para fazer enxoval"
- Lô, nô te mace. Eu ajudo-te, dizia um rapaz da cidade, atirando um piropo.
Lô ria, arrumava o cesto e ia à venda mais próxima comprar o último lenço da moda.
Um dia, quando todos menos esperavam Lô casou-se. As moças do Luchan ficaram admiradas:
- Até que enfim!!!!
O marido de Lô nunca parava em casa. Ia à caça todos os dias.
- Simão, tu nunca pára em casa!...
Ia à caça todos os dias. A roupa da caça vinha sempre rasgada mas… Nem lagaia, nem morcego, nem rola, o Simão trazia.
Apenas roupa rasgada.
Um dia, os empregados resolveram ir espreitar o patrão. O que viram, nesse dia, deixou-os espantados.
Na larga varanda da casa, Lô deu um almoço para mostrar às amigas que afinal, não morreria solteira.
Os empregados arranjaram uma corda comprida, prenderam-na numa ponta da varanda e colocaram em fila muita banana madura, em grandes e apetitosos cachos.
Em cima da mesa havia calúlú, lôçô dóchi, izaquente, enfim muita coisa boa. Toda a gente comia satisfeita e ria.
Só Simão estava mal disposto nesse dia. Andava dum lado para o ouro, com as mãos atrás das costas, coçando a cabeça…
Os empregados escondidos atrás da varanda riam e aguardavam.
De repente, de um salto, rugindo, Simão pendurou-se no corrimão da varanda e começou a engolir sofregamente as bananas, e um comprido rabo de macaco saiu pelo fundilho das calças.
Toda a gente, pasmada, começar a cantar:
"Tanto escolheu que casou com um macaco…"

Sanzalando com MC

N'golart II

5 de outubro de 2006

08 -Estórias no Sofá - Eu, o farnel e o comboio - 3 de 3

A angustia é tão grande dentro de mim, cruzam-se imagens dos momentos familiares na minha cabeça que parecem filmes a preto e branco a lhe serem projectados e que se destroem em cada segundo que passa.
Dentro desta tanta confusão na qual divaga a minha cabeça que parece sair em altavoz o grito do Chefe da Estação:
- Partidaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaa.
Lentamente ele se punha em marcha, fumegando branco por todos os lados num ruído monstro de força e tremor.
Hoje fecham-se as portas, um solavanco ligeiro e lá está ele silenciosamente em marcha.
Sinto que a carga não é tanta como era antes, mas é a do meu coração que voa carregado na saudade dos tempos de criança.
A paisagem mudou. Vou gradeado por bairros periféricos, vou cercado por fios de arame, já não tenho a planície que eu não via na minha janela que só me reflectia. Já não consigo viajar fora do comboio a ver-me viajar.
Viajo sozinho no meio de tanta gente. Viajo triste no meio de tanta tristeza, porque já não vou conseguir viajar com destino para, viajo só com destino a.
- Não te ponhas tão triste, não olhes para o caminho que deixaste, olha para o verde da vida. Dá-me um sorriso – me diz uma senhora que me olha fixamente e que eu nunca lhe tinha visto. Lhe respondo com um sorriso, não só sem sentido como triste.
- É que…
- Não há é que. Nada é para sempre. Não o é o bem ou o mal. Só há que pôr um sorriso e desfrutar as coisas boas que se podem.
Ainda sinto falta da trouxa do farnel.
A senhora tem razão, penso eu. Nada é para sempre, nem o farnel o era. Sempre o posso recordar, a forma e o sabor. Por mais problemas que tenha o seu filme não se apaga da minha memória e sempre que viajar de comboio o poderei recordar. Basta-me viajar afinal.

Sanzalando

Hay hombres


Sanzalando

4 de outubro de 2006

08 -Estórias no Sofá - Eu, o farnel e o comboio - 2 de 3

Hoje viajo sem destino, sem ponto planificado anteriormente. Já não viajo para, viajo a.
- Mãe, quero ir para a casa do avô! Era o tempo do cacimbo, era o tempo de ir ao planalto viver a vida do cieiro e outras coisas mais.
- Como é que queres ir? Pergunta sacramental. Sabes que estou a trabalhar e não posso ir assim.
- Vou de comboio, mãe. Tem tanta gente que vai que eu não vou sozinho. Dizia logo eu como que a ensinar o abc de mãe.
Lá conseguia levar a minha avante e um dia às tantas da noite me metiam no comboio, mala castanha de imitar cabedal, trouxa de pano com farnel, algum conhecido, mesmo que só de vista na carruagem, e era a aventura no seu início.
Como se fosse dia escolho lugar ao pé da janela. Mais não via que o meu reflexo. Imaginava a vista, a longa planície a ser desventrada pelo monstro negro fumegante e mais as suas tantas carruagens de primeira, segunda e terceira classes e mais uns tantos vagões de carga. Eu estou do lado de fora a ver-me a fazer a viagem. Uma ponte que se passa. O barulho dos rodados é diferente, a velocidade é diferente. Se ele não cruza nenhuma estrada porque apita ele. Vais ver é só para marcar o seu território, é o seu egoísmo a dizer que ele vai ali.
Na primeira hora já mais de metade do farnel tinha ido.
Eu continuo de fora a ver-me viajar no velho comboio a vapor. Sulca a planície. Pára quando tem de parar. Pára para deixar passar outro que vem em sentido contrário, pára para deixar ou receber alguém, ou carga. Pára porque tem de parar. É noite e eu não consigo ver porque é que ele tem de parar.
Sentado na janela, vendo o meu reflexo sigo viagem até ao meu destino.
Agora, no presente, me vejo subindo num vagão novo, logo à entrada me pedem o bilhete, picam-no e com um sorriso de plástico me devolvem, sento-me no lugar marcado, pode ser perto da janela, pode se no meio do corredor, já não vejo as cabines de 2ª classe para seis pessoas, sou um número da companhia dos caminhos de ferro
Como eu gostaria que viajar de comboio agora fosse uma alegria como nos tempos de criança. Como são tão contraditórios os sentimentos que levo dentro de mim e os que a memória me transmite.
Sanzalando

Dia Mundial do Animal

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3 de outubro de 2006

08 -Estórias no Sofá - Eu, o farnel e o comboio - 1 de 3

Posted by Picasa Está uma tarde assim transferida de calma e transbordante de sol. Felizmente corre uma vento suave que parece vem do mar e amacia a alta temperatura que eu acho deve estar. A Estação dos caminhos ferro está cheia, como está sempre que vai partir um comboio. Pessoas passam ao meu lado, alguns lentamente conversando coisas triviais com os companheiros, outros correm desenfreados como que desesperados por um comboio que se foi. Nesta mistura encontro trabalhadores da Estação, todos com relativa calma demonstrando que sabem o passo a passo da sua rotina, inspeccionam cada roda, cada ligação de carruagem, etc, como se fosse possível numa rápida vista de olhos ver se estava tudo conforme os regulamentos. Era assim, é assim.
Ouço o barulho e vejo ao fundo a velha máquina a vapor, enormemente gigante e negra, a caminhar por entre os seus fumos a vir-se ligar às carruagens que vai ter que puxar serra acima, ganhando balanço nos muitos quilómetros de plano. É aquela besta enormemente fumegante que me vai levar ao destino. A mim e todos estes outros que estão aqui numa azáfama indescritível pelos contrastes. Para uns a viagem é enervante, para outros é só mais uma entre as muitas que já fizeram.
Olho para este comboio e afinal o que estou a ver são as recordações do meu tempo de criança, quando viajava nos velhos comboios a vapor.

N'golart I

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2 de outubro de 2006

Dia Mundial do Coração

Afinal todos os dias deviam ser


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a3 - Estórias no Sofá - Sereia

Outra estória que me contaram e que eu não deixo de partilhar

Conta San'Ana que sua mãe Sana Lozita era parteira jurada de Sereias!
Foi chamada muitas vezes, a prestar os seus serviços, por uma pessoa que vinha do mar com aspecto de homem. Acompanhou-o sempre de boa vontade e sempre que chegavam à beira da água o homem tirava uma cana da sua capa e com ela batia nas ondas e o mar abria-se mostrando uma bela estrada seca e segura! Então o homem desaparecia e só uma voz se ouvia guiando os passos dela, até ao palácio onde se encontrava a futura mamã Sereia.
Tudo era maravilhoso, jardins com corais e plantas desconhecidas bordavam a estrada e rodeavam o palácio!
No quarto da Sereia, ouviam-se vozes mas não se via ninguém.
Depois do bebé sereia ter nascido, ofereciam a Sana um banquete, tudo isso acompanhado de risos e cantos, mas sem ela conseguir ver alguém! De novo na presença da Sereia e do seu bebé, aquela oferecia-lhe algumas pedrinhas do mar como recompensa, com a recomendação de, assim que chegasse a casa, as guardar no canto do baú.
Vinham então trazê-la até à praia, pela mesma estrada, no meio do mar, e o homem aparecia só para se despedir, agradecer-lhe a boa vontade e dar-lhe as ditas pedras.
Logo depois desaparecia e o mar fechava-se!
Sana, assim que chegou a casa, fez aquilo que sempre fazia, deitou fora as pedrinhas para o quintal, nunca respeitando as recomendações da Sereia e ficando assim pobre mas de coração contente por ter cumprido o seu dever humanitário.
Aqui termina a história de San'Ana.
Mas ouvindo atentamente o desfecho, o pequeno Henda com os olhos bem abertos disse que sabia outra estória , que um dia a parteira de Sereias, por desenfadamento, trouxe duas das tais pedrinhas do mar, que a Sereia lhe ofereceu, para casa e deitou-as no canto do velho baú.
No dia seguinte, as pedras tinham-se transformado em duas lindas pérolas negras! A reacção de Sana Lozita foi de alegria mas também de arrependimento por ter desperdiçado todas as ofertas e não ter acreditado na palavra da amiga Sereia. Ainda correu à beira-mar gritando pelos "encantos" para pedir perdão e também algumas das pedrinhas do mar. Mas ninguém lhe respondeu e, pior ainda, nunca mais a chamaram para ir ao fundo do mar ajudar bebés sereia a nascer!

Sanzalando com Mc