
Trás aí uma birra estupidamente gelada e me acompanha, na bebida, no passo e no pensamento. Isto é, se eu não te estou a pedir muito. Consegues acompanhar-me?
Então me acompanha e vamos ver se são as coisas que não se despedem de mim, ou se sou eu que as impeço de irem embora.
Se as coisas se vão, é porque fogem mansas e silenciosas, sem que eu as perceba. Gastam-se, arruínam-se, desaparecem, escapam-se por entre os dos dedos e viram essa estranha poeira que vagueia pela vida, mudando as cores, misturando-se no ar dando um toque de neblina aos dias, transfigurando as margens deste zulmarinho, que termina aqui mas tem o início lá no começo de tudo.
Tas a ver que é quando o que existe dentro de mim vira mundo novamente, existe sem ser num pensamento palavreado em voz quase rouca de contador de estórias à beira-mar, carcomido pelo sal e torrado pelo sol?
De tantas metas que já escolhi qual terá sido a mais interessante?
Há tantos caminhos que se vão abrindo na minha frente, tantos sonhos sonhados. Todos com um toque especial, mas nenhum permanece imóvel no seu sítio, todos são flutuantes e não rectos divididos ao meio por um equador, todos prometem-me a felicidade a seu modo de ser sonhado.
A minha vida é assim mais com menos como o amor.
O amor é uma grande incógnita. Todos esperamos a ser a pessoa perfeita, cheios de confiança e capazes de resolver todas as exigências e requerimentos em papel timbrado e selado. Queremos ser mundos e pessoas perfeitas e afinal de contas andamos a borrar face da terra com todos os nossos erros. Queremos ser felizes neste mundo tão depressivo, ser sinceros num mundo de mentiras e hipocrisias, ser livres num mundo de tantas prisões e escravaturas, viver em paz num mundo de guerra e violência.
Tas mesmo a acompanhar-me ou estás a deixar-me ir na tua frente que quando te olhar já só te vejo como um ponto lá atrás?
Onde está a ilusão da ideia que me mantém neste mundo, a razão que me dê um pouco de ânimo para levantar-me de manhã e não pensar que a vida é uma acumulação de sucessos supérfluos? Onde está esse sonho que me mantém a salvo deste inferno e me acende a luz da sombra da minha existência?
Como me vês eu sou um realizador real de sonhos sonhados acordado. E tu?

Ao crepúsculo fechava-se, como uma anémona, quando se lhe toca e punha-se a sonhar. Fantasiava com a outra margem sem-fim, onde molhava os pés à beira-mar. Brincava ao mata com o pica-pica e todas as noites acrescentava mais uma concha ao seu antigo colar, afeiçoava aquele sonho. Partia resplandecente numa canoa de espumas, a todo o vento, para o longe sem fim, de além da distância. E todas as noites adormecia, antes de chegar à outra margem.
ResponderEliminarLonge no tempo e no fundo mar.
Beijo grande
Bom, respondendo à pergunta da crônica eu diria que se eu tivesse essa capacidade ímpar de escrever já teria escrito um livro. Você é muito bom nas letras, amigo!
ResponderEliminarGostei muito, profundo!
abraços,
Kafé.
MC
ResponderEliminarsempre replandescente numa canoa de emoções
Kafé
você me deixa assim sem palavras para te dizer mais o quê e como
Obrigado