recomeça o futuro sem esquecer o passado

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31 de dezembro de 2008

2008, Adão e Eva e 2007

Chega nesta altura do ano e é hora da revisão da matéria dada.
1956! Ano bom, muito bom mesmo!
2007! Ano ruim. Péssimo. Falhou tudo. Também não é tão assim. Dos conhecidos restaram os amigos. Aqui foi seleccionador e enriquecedor. De resto, nem vale a trabalheira olhar para trás. É mesmo para esquecer, excepto as lições que consegui lhe tirar.
É mais ou menos um ano de Adão e Eva. Uma estória real mas mal contada.
Vamos ver.
O Criador, dizem-me, inventa o Adão e lhe manda logo assim no Paraíso. É suspeito. Com tanta Terra para lhe mandar lhe manda logo para o Paraíso? E o Adão, sem protestar, ao que sabemos, foi. Mas desilusão das desilusões foi que ele encontrou um sítio despovoado. Como é que o Paraíso pode ser assim despovoado? Tá errado, claro que está. E aí o Adão acho começou a fazer manifestações e protestos e acho até fez uma petição. Acho, que não consegui descobrir na Internet a certeza, o Criador lhe enviou companhia. Uma cobra e ainda por cima falante. A dita, com a sua língua viperina atazanava o Adão a toda a hora. Que raio de sítio era aquele que não parecia na com o Paraíso que ele sonhava quando o Criador lhe criou. Pouco arborizado, sem nenhuma construção, sem povo e ainda por cima agora tinha que aturar a cobra. Nova manifestação, novos protestos e acho que nova petição. Aqui o Criador, que andava a estudar genética, células estaminais, manipulação genética e outras coisas assim, lhe retira uma costela ao Adão e faz a Eva. Há aqui um erro que eu não compreendo: se tira uma costela ao Adão como é que ele tem simetria bilateral? Pormenores, estou a ver a dizerem-me. Mas adiante. Agora ambos têm de usar parra? Quer dizer que ainda por cima têm de aprender como conservar as parras bem verdinhas para poderem durar o ano todo e não se esfarelarem ao mais pequeno movimento quando estiverem secas? E a cobra a envenenar os pensamentos do Adão. Mas que raio de Paraíso é este que o Criador criou para o Adão e depois para a sua costela Eva? Mas adiante que se faz tarde e ainda acaba o ano e eu não me completei. Com tanta fruta ruim porque é que o Criador logo havia de embirrar com a maçã, lhes proibindo a ingesta? E logo a cobra fica a saber disto e atazana mais o cérebro já estoirado do Adão com essa de comer a maçã da Eva que era costela de Adão. Há laranjas tão ácidas, há bananas que não sabem a nada, há mangas carregadas de fios que até enerva, há frutos secos mais duros que pedra, tinha de ser a maçã. E a cobra não se calava até que a paciência se foi e logo comeram as maçãs que até eram bem boas ao que me parece, pelo que não se contentaram com uma, mas deram cabo do pomar que até fez com que o Criador lhes expulsasse do Paraíso.
Verdade ou não é que ainda hoje se conta esta estória.
O mesmo com o meu 2007.
2008! Está a acabar. Foi como foi nos seus 365 dias. Acredito que foi um ano de transição.

NOTA: esta divagação estava para sair sem qualquer imagem, mas o facto de aparecer atrás do Adão um poste de electricidade fez com que se assemelhasse à estória, e o raio da parra ser tamanho XXL também.

Sanzalando

30 de dezembro de 2008

a minha mantilha, a impaciência, uns tantos palavrões


Tremo. Os olhos mal conseguem ver se é dia ou noite. Lacrimejo com qualquer réstia de luz. Maldito fruto deste tempo. Não me contam nas estatísticas porque não engrossei nenhuma fila ou call center.
Eu, a minha mantilha, a impaciência e uns tantos palavrões, vamo-nos aguentando. Leite com mel, mel com isto e com aquilo. Brrrr. Hei-de derrotar o vírus antes que ele me derrote a mim ou afogá-lo-ei um dia destes.
A lareira não se acende porque não tem autonomia para isso. A televisão só serve para fazer barulho.
Eu, a minha mantilha, a impaciência, uns tantos palavrões e uma encadear de pensamentos vamo-nos aguentando.
Afinal de contas a gente constrói o futuro dia a dia, com acções, pensamentos, palavras e sentimentos.
Este ano está a acabar e vamo-nos preparando para receber o próximo ano. Aproveitamos estes dias para reflectir, reunir forças e limpar a cabeça de sugeira abundante.
Eu queria, mas com a minha mantilha, a impaciência e uns tantos palavrões não tenho tempo para limpezas.

Sanzalando

29 de dezembro de 2008

é da febre

Quantas vezes eu te prometi a minha vida, quantas vezes eu te disse que não haveria Invernos, só primaveras? Quantas vezes eu te disse que as ondas são de magia e não do zulmarinho?
Eu só me recordo dos teus silêncios, jogos adiados e promessas nunca feitas.
Eu transporto o brilhozinho nos olhos em contraste com a tua apatia.
Já sei, deliro.
É da febre, me disseram.

Sanzalando

28 de dezembro de 2008

Frutos de inverno

Pinga-se-me o nariz. Arrepia-se-me o frio corpo mais frio que o tempo que está. Bebo um copo de vinho e mais outro. Tento falar com voz surda. Desisto. É Inverno e o melhor é estar debaixo da mantilha, ver filmes vividos misturados com ficções, desenhar construções no ar, construir caminhos de futuro. Pôr o meu universo numa rua, sentir o doce gosto de mar numa imaginada visão de ti.
Bebo mais um copo seguindo o dito popular do avinha-te.
Vejo-te nitidamente quando fecho os olhos, és a anatomia perfeita da minha paixão, os minutos de ódio da espera eterna, verbo conjugado de desejo.
Afinal de contas devo estar a delirar de febre.
Fruto do tempo, me dizem.



Sanzalando

27 de dezembro de 2008

sorriso de inverno


Transporto um sorriso em forma de vida. Às vezes inocente, outras maldoso. Mas a verdade é que é um sorriso e, como tal, ilumino-me de esperança, clareio a alma e sigo e, frente. Contrasto com o sol triste de Inverno, taciturno dia que se o tivesse que transportar às costas eu não aguentava o peso.
Me lembro agora que aprendi numa escola as estações do ano e lá estava o Inverno como mais triste de todos. Eu sei que tu não sabes disto porque só tens uma parte desta coisas, pelo que eu digo que tu tens apeadeiros do ano. Olha, o Inverno é assim mais ou menos as 5 da manhã de antes de tocar o despertador.

Não tás a ver?

Não faz mal, gosto mesmo é da rebeldia do meu pensamento que caminha para a loucura por causa da fraqueza desse sol fraquíssimo que passou sem distinção pelo solstício. Assim tenho mais tempo para estar sentado a pensar no que te gosto.


Sanzalando

26 de dezembro de 2008

imaginação

Um copo de vinho. Um silêncio provocado por ter desligado todos os aparelhos que pudessem emitir sons. Uma mantilha me cobre as pernas e mais de metade do tronco. Seguro um livro. Literalmente, pois há mais de muito tempo que eu não lhe encontro letras para ler. Seguro no livro e parti para uma viagem dentro da minha cabeça. Eu via numa claridade evidente que tu eras a luz que me iluminava o caminho que escolhi, eras o meu sol, um sol mais forte que aquele que lá fora parece se querer esconder por timidez de força. Eras quem me ensinou a viver, a amar e a ter um objectivo. Voltar a ter-te por inteiro.
Um trago no copo, um aconchegar da mantilha, guardar o livro à espera que um dia deste ele tenha letras onde eu possa ler a estória que devia estar a ler em vez de viver a que estou a imaginar.
Esperava encontrar ali as letras todas com que me dissessem que eras a minha estrela, meu sol, meu cometa, meu norte, minha madrugada de esperança, feliz por me teres ao lado e outras coisas assim, feliz por ter vivido as minhas aventuras, aguentado as desventuras. Mas como não as encontro ali, vivo-as na imaginação dum sonho de vontades.



Sanzalando

25 de dezembro de 2008

Sol adormecido


O sol se esqueceu de levantar. Se calhar ontem se deitou tarde à espera do PaiNatal que se deve ter atrasado a dar a sua volta ao mundo em RenaTurbo.

Seja lá porque é que é, ele hoje não tá aqui. Assim ele não me vai ver com as meias, cuecas e cachecol novo. Assim ele não vai ver o meu andar banga de procurar coisas novas na imaginação. Também quem lhe perde é mesmo ele, porque se continua assim, eu me sento no sofá, olho as labaredas da lareira, pego num livro que pode ser mesmo o Memórias dum Guerreiro que eu sei que não está do meu lado da razão mas mesmo assim dá para conhecer as razões que estavam do lado dele. Para uns ganhar teve que ter outros para perder e este teve a vontade de pôr isso no livro dele. Fico-lhe a ver o meu lado errado de Kifagondo, na berrida que levaram e outras coisas. Ou então fico mesmo só sentado à espera que o sol acorde enquanto saboreio as coisas novas que me deram.

Sanzalando

24 de dezembro de 2008

me disseram que era Natal

Me refastelo no sofá porque me disseram que era Inverno e que lá fora está um frio de gelar até a alma.
Olho a lareira cuspindo fogo quentinho. Fico só assim a olhar, tricotando os meus silêncios com fios de memória. Uns são encarnados cor de sangue, outros negros cor de terra, ainda outros azuis de mar e poucos brancos de nuvem.
Me disseram era Natal, não neva na marginal, não ouço o ruído rangido do trenó.
Me disseram só e eu lhe acreditei, por isso olho na lareira para ver se é tua hora de chegares para mim.

Sanzalando

23 de dezembro de 2008

definir-me inverno

Inverno é qualquer coisa igual a frio gélido, dia cinzento clareado por um sol desligado, de resistências fundidas, sorrisos apagados nos rostos que tilintam as recordações péssimas da vida, caminhos sinuosos de lágrimas e desilusões. O Inverno é a história de todas as estórias, a lenda equivocada dum papel perdido na peça da vida. O Inverno parece o fim da estrada, a pele se seca, franze-se o sobrolho, o sorriso encerrado numa expiração fumegante.
O Inverno trás-me à ideia que o amor romântico da verdade única, é pura ficção. Nessa certeza vou caminhando, deambulando em labirintos que se me escondem a saída como se fosse um carrossel da vida, subidas e descidas num desconto de tempo.
O Inverno é um encerrado provisório. Amanhã logo verei porque hoje estou preocupado em esconder-me do frio, do cinzento, da tristeza de acordar num dia triste.
Mas afinal de contas tu não sabes o que é o Inverno e mesmo que eu te explique, acabas por ficar só com a teoria e não sentes na pele todas estas verdades. Imaginar tudo isto saboreando o perfume da terra molhada, suar à sombra duma acácia, descansar sobre uma gasoarina.
Afinal de contas porque te falo eu de tanto Inverno?
O Inverno não é um labirinto eterno e logo mais encontrarei a saída!



Sanzalando

22 de dezembro de 2008

Light inverno


Que já não é Outono eu já vi. Me olho no espelho e reparei que a imagem que ali está na minha frente mais não é que eu a dobrar. Não na altura, mesmo só na largura que até parece é espelho de feira. Eu sei que a quantidade têxtil sobre os meus costados é maior que muito e só isso já dá uma largura de costas que eu vou dizer que até as tenho largas. Mas me vou aproveitar desse efeito têxtil e quando chegar a estação dos passarinhos a cantar, eu sei que tu não sabes que é que é isso de estações, mas também não te vou aqui explicar, eu vou estar assim que nem aço.
Vou começar por evitar o chuinga sem açúcar, sumos sem açúcar, café sem açúcar, gelados de todas as formas e feitos, com e sem açúcar. Vou fazer um esquecimento por uns dias no chocolate e, depois desse dia que chamam de reis, também vou evitar se tiver açúcar. Acho mesmo que também vou evitar o açúcar com açúcar e comer açúcar só sem açúcar. Não conheço mas deve estar à venda aí num canto qualquer.
Será que depois, quando eu estiver todo light acho vou sentir o amor menos doce?
Acho que o Inverno me está a arrefecer os parcos neurónios sobreviventes deste frio.


Sanzalando

21 de dezembro de 2008

Boneco de neve


Hoje me disseram já não é Outono. Portanto hoje neva. Como meu corpo está aqui mas a minha mente não, vou fazer um exercício de memória. Vou escutar a neve a cair. Não é na marginal. É mesmo neve de imaginação. Escuta. É um sussurro branco, brando e cristalino. Se eu tiver muita imaginação, vou fazer nevar muito e depois vou fazer um boneco de neve. Para nariz vou usar uma cenoura para parecer o nariz do Pinóquio, porque é um boneco de mentira. Vou usar um saco preto para lhe fazer de chapéu assim me vai parecer uma mago das estórias do antigamente.
Hoje neva, porque hoje começa o Inverno.
Bebo um café quente, ponho uma manta sobre as pernas, abro um livro que me leva aos tesouros escondidos da minha imaginação, na companhia do meu boneco de neve que não existe.

Sanzalando

20 de dezembro de 2008

Livros no Outono quase Inverno


Se acaba o Outono e vem aí o Inverno. Tem V, felizmente. Pois se tem f é que a gente ardia de frio. Mas lá tá sol e é quente, não é sol de Outono quase Inverno. É mesmo sol de aquecer que até ferve de calor. Mas eu não tou lá, por isso eu aguento o sol frio de Outono quase Inverno. Contrariado. Ambos.
Me preparo para aguentar as longas noites frias. Sim, o dia é tão cinzento que não lhe posso chamar de dia. É um dia quase noite por isso é noite sempre, mesmo quando o sol vem aqui dizer que ainda existe. Frio mas existe. Mas eu tava a te dizer que me preparo para lhes aguentar, com livros.
Há livros que prometem muito, tem título que até parece não vai dar para parar a meio para beber. Se abre e não tem mesmo nada porque é nada o que lá está. Tem outros que me fazem rir, outros que eu penso sou o artista principal, me tornando cúmplice do livro.
Mas é bom ter livros por perto. Merecem o tempo infinito do Inverno que chega.

Sanzalando

19 de dezembro de 2008

Um sol no Outono

É uma manhã de sol. Sol de Outono. Frio. Intensamente frio. Há gente na rua, nas praças e nas esquinas. Há gente que mexe, gente viva. Eu olho encoberto num manto de neblina. Imagino-me invisível, é claro. Como está sol, mesmo que seja de Outono, parece que renasci com o espírito de ver as crianças que olham felizes para as montras das lojas carregadas de cor e luzes. Vejo casais felizes de mão dada enamorando desejos eternos. Vejo idosos calcorreando ruas como se fizessem exercício que faz tempo tinham esquecido que era necessário.
Está sol de Outono e sinto um brilho nos meus próprios olhos.
Como é bonito ver gente que vai e vem como se o mundo não fosse acabar amanhã.
Mas continua a ser ainda Outono.

Sanzalando

18 de dezembro de 2008

As flores de Outono


Neste Outono que falsas me parecem as flores. Cores pobres num dourado artificial. Fico triste em vê-las neste tom pardacento. Olho-as e as vejo murchas, aparentemente mortas. Folhas soltas sujando o chão dum sujo que de sujo nada tem. Triste, apenas.
Já sei que o Outono é assim. Mas eu lá não tinha Outono… tinha frio mas não era um frio outonal.
Como me parecem falsas estas flores de Outono. Apetece-me arrancá-las pela raiz, mas assim não as poderia admirar numa futura primavera…É Outono mesmo que lá Outono não seja, mesmo que lá as flores floresçam nas suas garridas cores. Eu sinto o Outono.
Mas às vezes, no meio do nada me aparece uma flor que é uma flor de Outono.

Sanzalando

17 de dezembro de 2008

Outono e a Grécia


O Outono está assim a dar uma de finados. Comecei aqui a pensar no que é que eu iria divagar. Vou falar-te da Grécia, a Grécia clássica, mostrar-te a sua História, falar-te dos filósofos. Mas ao olhar umas imagens na televisão mudei de ideias. Repentinamente vieram-me à memória uns templos, monumentos e estátuas gregas e vi que estavam todas partidas, tal como estavam partidas as ruas da Grécia actual nas imagens que eu vi numa televisão. Portanto aquilo na Grécia parece que é habitual e por isso não te vou falar disso. Cansada de estar partida estás tu, eu sei. Ou de partida.
Mas afinal que é que o Outono me fez que não me deixa ter uma ideia. Esvaziou-me o jarro da imaginação ou meteu-me dentro dalgum cavalo de Tróia?
Acho que o Outono este ano está azedo, o que vale é que está mesmo a acabar. Mais dia menos dia e se fina.
Mas tanto tenho divagado em Outono e me esqueci que não sabes o que é o Outono.
Que grande Outono que eu sou.
Eu queria falar-te da Grécia. Talvez com algumas estátuas romanas à mistura, umas imagens do Egipto intercaladas. Eu que estou entre os deuses e os homens, principalmente quando me apetece dormir a sesta e tu não me deixas porque me ocupas a mente e eu para me distrair palestro sobre as velhas civilizações, que eram tão, mas tão grandes que acabaram em pedaços incompletos de pedra, areia e alguma cor.
Talvez por ainda ser Outono eu vou dormir mas é a sesta e esperar que este Outono acabe.



Sanzalando

16 de dezembro de 2008

Talvez porque ainda é Outono


Talvez porque é Outono eu estou assim perdido numa teia de pensamentos e ideias que se baralharam num baraço sem ponta por onde se pegar, ficando apenas os nós do remorso e arrependimento. Desconsigo perceber o que se passa no meu coração. Te disse bué vezes que te queria, mais isto e aquilo, assim num monte palavras pensadas com sentimento e quando tu me te deste, eu fui-me embora.
Tu me és especial, fonte da minha felicidade, luz, perfume, calor. Noutras palavras, tu és a minha vida, se é que a minha vida não é mais que um sonho em que eu sou apenas um espectador sentado como que a ver um filme.
Talvez porque ainda é Outono tu poderás estar a pensar que eu me pus a correr numa fuga premeditada. Mas numa primavera eu te mostrarei que não.
Simplesmente eu não sabia que a vida de quem ama é assim tão dura e difícil.




Sanzalando

15 de dezembro de 2008

Divago


Outono. Quase que até me apetecia dizer-te que me dói a alma. Mas vou ficar só no quase e ficar com o teu nome a sair, numa constância repetitiva, dos meus lábios em forma de sorriso.
Outono… e fico também com o teu olhar como forma de não esquecer as palavras que me apetece dizer-te no silêncio da solidão.
Olha, desculpa só mais uma coisa, é que eu vou ficar-te com os sonhos, desejos e em troca guardo as lágrimas que me esqueci de chorar por vergonha.


Sanzalando

14 de dezembro de 2008

Sol de Outono

Outono, ideias pouco iluminadas, condizentes com a luz que está lá fora. Abro a janela e parece estou no meio da estrada. Me entra um ar gelado que vem da montanha que eu sei deve estar ali para os lados do norte. Não a vejo mas lhe sinto pelo frio que me chega aqui. O sol está ali brilhante,encarnado, mas pelo que sei acho se afastou muito de mim desde o verão até agora. Vais ver ele se zangou comigo porque eu não lhe disse que ele não era o culpado do aquecimento global e coisas e tais. Quer dizer que no Outono o sol também amua. Pensei isto e sorri. Me lembrei de muitos sois que conheço, daqueles que são o centro do mundo e assim num estalar de dedos estão amuados, escondem o sorriso, bassam o brilho dos olhos, lábios em riste. Um dia, assim num inesperadamente voltam como se nada tivesse passado.

Vais ver o meu sol é assim e mais mês menos mês ele está aqui mais próximo de mim outra vez.


Sanzalando

13 de dezembro de 2008

Zulmarinho

É Outono quase Inverno e o que me apetece mesmo, porque é o que me relaxa, dá descanso e tranquilidade, é ficar rodeado por ele. É ele o meu fiel amigo que está sempre pronto para me ouvir. Pelo menos parece.

Me introduzo nele, passo a passo se o passo não tiver mais que um centímetro e a altura da água não subir mais que um milímetro. E ele, imenso, pronto o submergir-me. Depois, brincamos ao ritmo dele numa bailar que se não me ponho a pau ele me enrola na areia. Enfim, parece que nos entendemos na perfeição, nos compreendemos e nos reconhecemos. Foi nele que um dia lhe chamei zulmarinho e zulmarinho ele ficou.

Afinal de contas é o único lugar onde posso chorar sem que alguém note porque as minhas lágrimas se misturam num misturar de desaparecerem dissolvidas.

Outono e ele está quase gelado. Seco as lágrimas antes que saiam. 


Sanzalando

12 de dezembro de 2008

Prometerei num Outono


Se calhar no Outono eu devia mesmo era estar no meu silêncio, aceitar a nostalgia como passatempo, uma fuga à rotina, uma espera de melhores dias. Se calhar o Outono é altura melhor para não pensar. Ou se calhar não é, já que me angustia o silêncio, o espaço em branco da vida, o tentar não estar e não ser. É, aqui estou eu numa tarde de Outono tentando calar o meu silêncio com palavras soltas. Uma esquina, uma beira mar, um refúgio dum quarto isolado. Navego palavras por ondas de silêncio onde afogo as minhas raivas, medos, angustia e cobardias.

É Outono e quase me apetece prometer que num próximo Outono apresentarei uma livro de páginas choradas, a juntar a tantos que se vão empoeirando em muitas prateleiras de muitas bibliotecas, amontoados livros de lágrimas secas, bolorentas, amargas.

Afinal de contas mesmo no Outono é difícil contar em palavras o que não se consegue vomitar porque é inenarrável. O melhor mesmo é deixar as palavras deslizarem secas pela garganta, acidificarem-se no estômago, misturarem-se no fel no intestino delgado, perderem água no grosso e deixá-las seguir caminho até uma próxima ETAR.

Afinal de contas é Outono, uma etapa da vida. Como outras, passageira.


Sanzalando

11 de dezembro de 2008

SilÊncios de Outono


Aqui estou em mais um dia deste Outono. De tempo, de alma e se calhar de coração. Se tenho dúvidas fico com elas. Certezas são poucas e não as dou. Mas eu sou assim no Outono. Neste? E nos outros como foi? Desconsigo lembrar-me que a memória não me ultrapassa o dia de ontem. Não te falei? Então foi porque não tive tempo, mesmo sendo Outono. Se calhar há 20 kilos atrás eu tinha mais tempo, tinha mais coisas para falar no intervalo das inspirações ofegantes e fumegantes. Ou se calhar já te disse todas as coisas que eu tinha para te dizer. É lixada esta dúvida também. Vou tentar pensar e ver se vejo alguma luz no fundo de algum túnel.

Se calhar é mesmo só assim porque é Outono.


Sanzalando

8 de dezembro de 2008

Fico contigo


Chove frio. Eu sei que é Outono e que aí não é como aqui. Aí chove calor, misturando o suor com a água que cai. Mas a verdade é que eu estou aqui e tu estás aí e estamos juntos. E se alguém disser o contrário é que se enganou e a gente até que nem liga. Eu fico com o teu nome, o teu olhar e o teu sorriso na minha memória. Esqueci as palavras que me calaste, os silêncios que me ofereceste, os intervalos que nos inventamos. Eu fico com o sonho de te ver cada vez que fecho os olhos, do anel que te dei quando te reencontrei lá no sítio onde me disseram que ficou meu cordão umbilical.
Afinal de contas eu fico contigo sem mesmo saber onde te ver.





Sanzalando

7 de dezembro de 2008

(06) Texto Pedido - MORROS DE BENGUELA

MORROS DE BENGUELA

Vós que vos ergueis agrestes
Sob o azul do céu nevoado,
Vós que pareceis negros gigantes
Que a Terra (santa mãe)
Não sepultou no ventre ubérrimo,
Dizei-me: Quem sois?
Sim! Contai a glória, ou martírio
(Mistério transcendente)
Dessa vossa vida surpreendente.
Sois monumentos sagrados
De feros dramas e façanhas?
Quem pisou o vosso chão?
Tu, pedra escura,
Que linguagem estranha,
Que mistério escondes?
Dalgum santo missionário
Que pisou e sagrou a tua gleba?
Dum valente, indómito colono
Que com galhardia e amor pátrio
Fecundou Angola, que era Portugal?
Falai-me, por Deus,
Da vossa vida, da vossa lenda,
Penedos escuros de estranhas vidas.
No silêncio perpétuo e eterno
Oh morros de Benguela,
Concedei-me que eu, um dia,
Feita pó, feita lodo,
Durma prostrada, em paz.
Mas depois da minha morte
Feito pedra, pedra forte,
Meu pobre coração
Permaneça eternamente
Repousando a vosso lado.

Vera Lucia

Sanzalando

6 de dezembro de 2008

Sábado de Outono

É assim num sábado de Outono. Finge que chove uma chuva que parece não cai porque esvoaça, mas molha num molhar que arrefece a alma, que trás à superfície dos poros recordações, nostalgias e dilui as lágrimas que não são choradas na vergonha dum público.
Passamos a vida rodeados de gente que apenas nos vê mas não nos conhece. Sabe-nos o nome, a cor dos olhos e depois uma escuridão enorme de saber nos sentimentos. Alguns nos dizem conhecer, mas tão superficialmente que parecem estão a flutuar à nossa volta até parece um balão de criança. Mas no momento mais preciso, mais pontual dum relógio trágico da vida são até capazes de gritar e nos dizer que nem sabem quem somos, quando antes quase fizeram a nossa biografia que até parecia éramos nós os outros.
Eu sei, que nas leis da vida a gente às vezes faz coisas, consciente ou não, que não é o mais certo, que está até mesmo um pouco mais errado do que é aceitável. Eu sei que ninguém está livre mais disso porque é assim a natureza da gente, não ser máquina. Mas não é motivo suficiente para ter gente a pensar que tem total liberdade de falar da gente e do que nos é importante fingindo que nos conhece verdadeiramente, e nos empurram num julgamento injusto. Que lhes move?
Eu sei que um dia eu me esqueci de esquecer-me de ti.
Que mais posso eu fazer agora, num sábado de Outono?



Sanzalando

5 de dezembro de 2008

Cor de fogo

Quando é Outono as folhas das árvores caiem. Ou será que as folhas caiem por isso é que é Outono? Certo mais que certíssimo é que o ar fica mesmo frio. Tudo fica diferente. As minhas lágrimas que têm por hábito saber a mar, nesta altura sabem a melancolia nostálgica. Todas as cores tomam a tonalidade do fogo que acaba em cinza.

É assim o Outono, esse mesmo que me dá as ganas de arrumar a trouxa e zarpar. Mas em vez disso me sento no banco do jardim e releio as páginas da vida que deixei por viver.


Sanzalando
foto retirada duma apresentação sobre o Outono

4 de dezembro de 2008

Uma manhã linda de Outono


É uma manhã linda de Outono. Acordei com o barulho da chuva a me bater nos vidros e como a querer dizer que eram horas deu olhar o dia que acabada de acordar também. O horizonte tinha uma cor suave, melancólica, doce com sabor a desconhecido, frágil e molhado. Desenrosquei-me do meu casulo e esvoacei como uma borboleta com o olhar, leve, sereno e silenciosamente. O arco íris que não existia era azul, dizia-me o cantor no rádio, as árvores dançavam ao som da brisa que atirava a chuva contra a minha janela.

Era apenas uma manhã linda de Outono em que mais uma vez não fui para oo meu banco de jardim percorrer o mundo do faz de conta.



Sanzalando

foto duma apresentação sobre o Outono

3 de dezembro de 2008

Dias de Outono


Disseram-me estava cacimbo. Olhei e estava era mesmo chuva que caia, caté parecia queria acabar toda a água do céu num repentemente. Me resguardei atrás do vidro e mentalmente fui vendo as letras à espera que elas se ordenassem em palavras que eu iria pensar para ti. Esperei ouvindo o bruá da chuva e hipnotizado no acompanhamento do trajecto das gotas. Mas de palavras nem uma. Pensei que ia sair a primeira e que depois logo as outras vinham assim num repente. Parou o bruá e até o céu ficou assim num azul que não sei porquê me pareceu celestial. Deve de ser porque era azul celeste. O silêncio entrou em ambos ouvidos. Mas nenhuma palavra chegou ao meu pensamento. Este é o defeito dos dias de Outono!

foto de Oriza Martins
Sanzalando

2 de dezembro de 2008

Noite de Outono


Nestes dias de sombra te recordo no teu brilho, no teu calor e na tua força de ser. A minha fantasia me desperta na noite, me deixa vaguear por ti numa viagem de prazer e de dor. Entras na minha cabeça, vagueias num rodopio de intermináveis desejos. A noite, que foi feita para dormir, passo-a a navegar-te na imaginação das cores garridas. Jogo-te num jogo de lembranças, ganho-me nas imagens da distância focal.
Cerro os olhos e neste Outono viajo-me por ti, para ti e contigo.

Sanzalando

1 de dezembro de 2008

Um beijo no Outono


É uma tarde de Outono. Vejo fotos antigas. Minhas, tinha eu para aí uns 3 kilos, outras de paisagens a preto e branco não me deixando ver que estação do ano lhes foi captada. Se calhar era para aí um apeadeiro. Na verdade eu tilinto de frio. O frio de Outono.
Que linda roupinha aos folhos me vestiam. Também naquela altura ainda não tinha opinião.
Olha só esta com o meu avô a dar-me um beijo. Digo isto para mim como que a querer fugir da solidão do Outono. Deve ter sido o primeiro beijo fotografado que me deram. Neste álbum, pelo menos, não encontro mais nenhum.
Fico parado neste beijo. Olho os olhos do meu avô. Derrete o gelo que sinto neste momento. Uma gota de nostalgia me cai dos olhos. Os beijos afinal não significam um fim, um adeus. Jamais um beijo é um final.
Tentei saborear o sabor daquele beijo de mais de tantos anos. Nota-se que é um beijo sentido.
Os beijos nunca morrem!


Sanzalando

30 de novembro de 2008

Construo pontes de outono


Olhei para um ponto do infinito. Atravessei chuvas, ventos e cacimbos apenas com o olhar para ver as tuas palavras, sentir o teu perfume. Guardei os meus gestos para esconder tanto desejo de te abraçar. Gastei apenas o tempo dum olhar, mas ficou a sombra do pensamento petrificada na minha vontade, constantemente martelada como se construísse uma mental estátua da minha vontade.
Um dia, assim num depois dum Outono construo mil pontes simétricas e caminho, se necessário, interminavelmente, até sentir o teu desejo, até ver-te reflectidas nos meus olhos, até sentir-me leve pela pulverização da sombra petrificada.
E eu neste Outono desejo-te tanto!


Sanzalando

28 de novembro de 2008

Zulmarinho de Outono


Faz frio que me dizem que é de Outono. Não preciso vê-lo, mas que o sinto isso sinto. Mas o que eu preciso de ver é mesmo esse de zulmarinho. É impossível evitar, como é impossível evitar de lhe andar mesmo que não lhe toque porque ele parece tem raiva e quer destruir tudo neste Outono. Mas mesmo assim ele me dá calma, uma calma que eu preciso, que me tire desta letargia, introspecção vazia de mim. Fui vê-lo e pareceu-me que ele ainda se recordava de mim. Tentei falar-lhe. Acho que nem eu me conseguia ouvir. O gelo do tempo congelou-me as palavras. Atirei-lhe um beijo. Replicou-me com gotas dum onda mais feroz.
A vida do zulmarinho também tem Outono.


Sanzalando

27 de novembro de 2008

Outono é saudade


Silêncio que me dizem é de Outono. As sombras são pardas. Os olhos vêem azuis nos cinzentos dourados do frio vento que teima em despentear-me as ideias numa congelação de factos.
As árvores não nascem ao contrário mesmo que eu ao contrário as veja.
Faz tempo que não me ouves na troca de palavras e dizes-me o quanto eu cresci.
É Outono mesmo que as palavras que eu te diga não tenham sombra. O silêncio escuro como sombra não tem rasto. Vais ver que eu sou sombra enrugada no peso das minhas próprias palavras.
É Outono porque eu tenho saudade. Apenas!


Sanzalando

26 de novembro de 2008

Procurando no Outono


Olho. Por acaso olho para o horizonte. Poderia estar a olhar para o céu, para o chão, para um dos quaisquer lados que o que eu veria era o mesmo. Olho apenas por acaso sem ver nada ao acaso. Afinal de contas eu só estou a olhar com o coração para ver se consigo ver o final duma estória que comecei. Não me apetece reescrevê-la inteira, não me apetece revivê-la outra vez. Afinal de contas só me falta escrever a parte final. E já me disseram que as coisas costumam estar mesmo à nossa frente e por isso eu olho. E olho para o horizonte que é o lugar mais longe que consigo ver. Já vi as luzes da memória, vasculhei curvas de tempo, pintei tracejados de presente e continuo a não ver o final da minha estória.
Deve ser do cacimbo mesmo estando um dia lindo de céu azul deste incerto Outono.


Sanzalando

25 de novembro de 2008

Outono em ponte

Caminho por este Outono incerto como quem procura a saída, uma porta para poder falar-te, um holograma onde me apareças sem nuvens, ventos ou rachando-me de frio. Deambulo neste labirinto de cores cinzas e dourados, fugindo das sombras falsas, das recordações que se tornaram pesadelos, das feridas cicatrizadas no vazio da alma. Caminho procurando não me perder num vagar, não me dobrar numa dor nem lacrimejar por fraqueza.
Caminho pelos caminhos do Outono como quem procura um raio de sol onde se possa aquecer.



Sanzalando

24 de novembro de 2008

Quem sou neste Outono


Só porque é um Outono carregado de melancolia eu me pergunto quem sou.
Às vezes me parece que sou a sombra parda que me acompanha pensativamente, aquela que escuta os meus silêncios e desnuda as minhas tristezas. Outras vezes penso que sou quem te acaricia quando te me apresentas irada, magoada ou triste. Eu sou quem te beija no silencio da solidão, quem quer entrar nos teus sonhos.
Tu não me podes perguntar quem sou porque apenas sempre me perguntas porque te quero!


Sanzalando

23 de novembro de 2008

Azul de Outono

É Outono mas o céu está azul que até me faz pensar está o teu calor. Eu sei que os olhos me estão a enganar. Sinto-o no corpo, misturado com o desejo que me aceites sem ser apenas como mais um meu abrigo para este e outros Outonos. Eu sei que as minhas palavras te possam parecer um pedido de urgência, mas sabes que o não são, como também não são palavras vãs, porque o são palavras claras que te soletro em voz alta despindo-me em liberdade.
É Outono e eu não quero que as coisas continuem tal e qual estão. Ajuda-me a dar mais um passo. Tantos os que eu tenha que dar.



Sanzalando

22 de novembro de 2008

Outono de outono


Sigo a linha do Outono, debruada em tons de ouro sob seu fundo cinzento. Com voz firme, umas vezes, gaguejando outras, vou manipulando palavras, circunscrevendo ideias, abrilhantando conceitos, opulentando frases, engrandecendo conceitos, suposições, entendimentos, silêncios. Tanto as vou esticando que muitas vezes já não sei assimilar o que resta do meu corpo e sobra da minha alma.

Além de ser Outono é também o meu Outono, parte do meu Outono. Sei lá o que sei para além do que sou.


Sanzalando

21 de novembro de 2008

Regressado ao Outono

Abri a janela e desconsegui de ver mais alguma coisa para além da ponta do meu nariz. Eu sei eram os primeiros raios de sol que chegavam aqui, naquela madrugada fresca. Mas os raios vinham tão foscos que eu até disse num assim para mim:
- Não se vê nada! esquecendo que além do nevoeiro, era ainda madrugada.
Na verdade eu é que não consegui ver. Estava assim como que cego de ideias, desmemorizado de imagem. Optei então por ir para férias, pensar como era há uns anos, ir atrás da memória, procurar a nitidez das coisas na certeza da vida. Afinal só consegui recordar recordações sem ter a certeza se era eu. As recordações deformaram-me, deram-me um tom imaginativo sem ter certezas absolutas. As recordações se deformam cada vez que são chamadas à memória e já descompreendi de saber quem sou, donde vim e para onde vou.
Já só sei que sou.
Mas ainda não foi desta que me atirei na dúvida da desistência.
Afinal é Outono.





Sanzalando

11 de novembro de 2008

11- NOV.-2008



Sanzalando

Muitos «Obrigados»

Interrompendo as férias para dar uma ar da minha graçaRogério Freitas Sousa: Obrigado pelo convite mas dia 13 é-me totalmente impossível estar na FNAC de Alfragide

Salucombu: Obrigado por teres feito chegar-me as fotografias tão saborosas e as palavras da 'Sebenta'... Um grande de enorme abraço

São Branca: como vou ter mais palavras para responder à carta? Faz tempo não recebia uma carta assim via CTT e com palavras que deixaram um tremer à volta da alma. Vou ler o livro e mal possa vou ver 'Navalha na Carne'

Muito Obrigado a todos os que se lembraram de me 'e-mailar'. Vai ser duro rever os 231 que aqui estão. Mas com tempo eu vou conseguir.

Um dia destes eu volto.
Sanzalando

3 de novembro de 2008

43 - Estórias no Sofá – ao telefone

Pouco me importam as mentiras que eu já te contei. Usei-as como desculpa de alguma culpa que eu tinha. Sabes que desconsigo viver sem ti. Mas também sabes que não consigo viver só contigo. É mais forte que eu. Vou fazer mais como? Machismo? Chama lá o que quizeres, mas foi assim que eu sempre fui e não é agora que vou ficar diferente. Homem que é homem é assim. Olha bem à tua volta.
É Outono aqui, quase verão aí.
Tentei mudar de assunto e quando assim é, o melhor mesmo, é falar do tempo. A cara ensopada dele não mudava.
Vou telefonar para o México, para um (inventado) parente que por lá tenho. (Enquanto estiver ao telefone não me incomodarão). Penso eu, que às vezes também penso mal.
Não funcionou. Toca o telefone que eu fingia estar a usar. Olho para o visor e fico com uma chamada em espera que eu atenda. Desconheço o número que aparece.
Será alguém do governo? disse eu como que a fazer-me de importante e ela continuava ali sem me dar imprtância nenhuma.
Atendo? Não atendo! Ele insiste. Por esta insistência deve ser mesmo do governo. Vou atender com uma máscara na voz.
- Alô, disse eu com voz grave carregado de agudos. Digo eu, que não percebo nada de música e não me dá para investigar a esta hora da quase madrugada, pouco falta para o almoço.
- Fala o sr…. ? omito o nome porque não quero desvendar a fonte, ao mesmo tempo que saboreio a doce voz feminina que me chega do outro lado do telefone. Como pode aquele aparelhinho minúsculo ter capacidade de reproduzir tão doce voz?
- Sim, sim, o próprio! Sem mais delongas respondi na voz mascarada de locutor de rádio, doce, quase de açúcar derretido.
- Estamos a fazer uma promoção…
- Quê?!!!! Já num outro tom que mais parecia ter saído dum ataque de mil mosquitos.
- Sim, somos da Empresa … (não digo porque não me apetece fazer-lhes publicidade) e na assinatura de uma… tentou ela continuar
- Espere lá. Quanto é que pagam?
- Desculpe?
- Claro que sempre ouvi que tempo é dinheiro…
e foi aqui que fiquei com um piiiiiiiiiiiiiii colado à orelha.

Sanzalando

1 de novembro de 2008

para o meu dia de finados

Todo o mundo acaba por morrer. Tu vais morrer. Eu vou morrer. Ele já morreu. Ah, e ele que nunca fumou, nunca bebeu outra coisa que não água, que sempre olhou para os dois lados ao atravessar uma rua, mesmo que a rua fosse de sentido unico tambéma acabou morto.
Por causa disso eu já escrevi o meu epitáfio, é só escolherem, quem estiver mais próximo, um. É que eu não sei data, não sei a hora e nem sei o local. É mesmo uma surpresa estas coisas assim. Mas para não ser apanhado de surpresa aqui estão:

1 - Eu nunca gostei da minha vida e acho que a vida também não foi muito à bola comigo. Assim separados estamos bem.

2 - Aqui jaz o que a terra há-de comer. Espero ser indigesto.

3 - Se eu pudesse começar tudo de novo eu desistia já.

4 - A julgar pelo que não dormi agora terei muito tempo.

Sanzalando

31 de outubro de 2008

meu semba



Afinal de contas porque ando a divagar se posso simplesmente estar calado?
Dentro de cada um de nós existe um mundo interior, de pensamentos e sentimentos. Sei que é invisível porém tem uma força enorme esse interior mundo.
O meio ambiente que nos rodeia, com todas as suas alterações momentâneas, permanentes ou ocasionais, é o resultado da nossa atitude mental que predomina. O mundo externo é o reflexo do interno.
Exemplifico, se conseguir encontrar as palavras certas. Há dias que um dia de chuva tem algo de maravilhosamente belo e outros em que é uma grande chatice. Portanto, podemos mudar o mundo exterior mudando o mundo interior.
Bem, vistas as coisas, medindo os prós e os contras, é melhor não divagar por hoje.

Sanzalando

30 de outubro de 2008

eu queria tanto

Eu queria tanto ir. Sabes, não sabes? Se eu pudesse eu ia. Mesmo sabendo que o meu ir se calhar ia contra a tua vontade.
Se eu fosse se calhar eu ia ouvir dizer que não devia ter ido, que não ia comer o teu pão, beber a tua água e tocar a tua alma.
Mas eu queria tanto ir. Queria brincar na areia, pés descalsos como fazia quando era kandengue, jogar ao garrafão, trouxa-lavada, picles e outras coisas como o prego.
Mas eu queria tanto ir e voltar a ter a gargalhada facil, olhar inocente.
Eu queria tanto ir, esvazear as tantas garrafas de vinho barato, desenvelhecer antes de ser atirado num buraco.
Eu queria tanto ir e continuar a ser banal.

Sanzalando

29 de outubro de 2008

esperança

Observo o teclado do computador com o olhar fixo na esperança que as letras se ordenem em palavras para que eu as utilize. Encontro uma palavra e, palavra puxa palavra, ela parece que me pede que eu fale dela.
- Traços negros em fundo branco, neste meu caso concreto, as letras se conjugam num som cujo o significado procuro.
Cliques e claques da força de martelar as teclas se fundem no ambiente proporcional do meu êxtase. Estas palavras são minhas filhas. Eu sempre as sonhei. Ou não. Legítimas, ou não. Enfim, rezo a uma virgem inspiração na esperança de encontrar as ditas palavras que procuro.
Afinal de contas eu o que tenho é esperança de vir a ter esperança de ter futuro um dia.

Sanzalando

28 de outubro de 2008

PARABÉNS

(clique sobre a imagem para ampliar)

Sanzalando

um dia especial


Vou olhar-me ao espelho? Tentar recordar todas as caras que tive? Poucas ficaram na memória, umas esqueléticas a contrastar com outras a dar para a bolinha, todas sem qualquer significado marcante. Um cabelo negro farto, rebelde na risca ao lado, deu lugar a um grisalho reles de meio centímetro, vulgaridade. Umas orelhas que imitavam um aeroplano deram lugar a uns lindos pavilhões auriculares que cada vez mais se escusam a ser meros suportes de próteses oculares que escondam o olhar pagado do tempo feito.
Bah!
Olhar o espelho e pensar o que eu podia ter feito e que ficou por fazer numa qualquer estante da minha imaginação, já coberta de teias de aranha, pó fino de muitas cores em que mais tarde os arqueólogos se iram debruçar na tentativa de desvendar a minha existência, não me leva a remédios mentais.
Olho ao espelho apenas para me ver quando me tenho saudades.
Hoje vou é olhar para a janela.
Já sei que não vou ver nada. A neblina espessa continua a pairar no meu coração e as sombras escurecem-me a alma. Ponho as mãos magoadas sobre o frio vidro das janelas. Sinto alívio mas não o descanso de ter andado a escavar os alicerces da minha existência. Vejo a impaciência do vento como que se estivesse à espera que eu abrisse a janela. Ouço o silêncio do nada a toldar-me o corpo.
Toca o telefone. Eras tu. E tu. Tu. Tantos tus.
Sorri e passei a ter um dia feliz.


Sanzalando

27 de outubro de 2008

42 - Estórias no Sofá – Estevanov e o doido

Encontrei Estevanov sentado no sítio do costume à hora habitual.
O sitio mais não é que o que agora resta da traseira do que era o Kinaxixe. A hora era qualquer uma pois é coisa que ele não faz é sair dali.
Tantas vezes lhe perguntei o nome. Outras tantas me respondeu Estevanov. E para mim ficou a ser mesmo o Estevanov sem mais dúvidas ou pés na retaguarda.
Já lhe conheci louco. Ele me disse que não. Não era e nunca tinha sido louco.
Foi desde que se lembra motorista de General Soviético. Um Conselheiro, repetia ele, como que a querer dar importância. Não sei de quem porque ele me respondia só que era Conselheiro. Okey, pensava eu em ter que aguentar mais uma desinformação.
- Estevanov, tu com tanta bebida e tanta ganza em cima não podes ser normal. Lhe dizia eu todas as vezes para iniciar a conversa, lhe despertar ideais.
- Me disseram que beber bebidas com álcool mata as células da cabeça. Né?
- Sim, portanto com essa bebedeira que tens faz para ai uns quinze anos…
- Te enganas, pula. As células que se morrem são as mais fracas, as que não aguentam a pedalada, que já não fazem falta e nem atrapalham mais os circuitos.
- E…
- Portanto, me ficam as células fortes, logo te digo que não sou louco, apenas mais inteligente, porque só tenho as células fortes.
Era hora de mudar de assunto e caminhar para outras estórias.
Conta-me então uma tua estória.
- Era chófer de general soviético, esse Conselheiro que já te falai muitas vezes.
- Sim, eu sei. Não precisas repetir.
- Um dia, ele saiu numa depressa mais rápida que o vento e esqueceu voltar. Me deixaram aqui de viatura distribuída e desconseguia de saber onde eu trabalhava mais, Uns diziam era ali, outros acolá. Para não perder o meu tempo aproveitei o consumista automóvel e virei chófer de táxi. Ia fazendo uns esquemas, tas a ver. De vez enquando ia numa repartição e perguntava de serviço. Me diziam silêncio e lá ia eu fazer mais uns fretes.
- … abanando a cabeça de sim lhe respondi com silêncio também.
- Um dia, desqueci mais porquê, me levaram o carro e ainda me engaiolaram lá no São Paulo.
Me soltaram uns meses depois que eu perdi a conta. A única coisa que sei é que eles disseram que eu sabia demais e por isso era melhor para mim eu ficar ali. Me esqueceram, eu acho.
- Não fazias mais nada na vida antes? Não te meteste com garinas que nem devias?
- Me ensinaram só de ser motorista. Era só mesmo chófer, de farda e tudo.
- hum…
- Me soltaram e eu nem lhe fui procurar. Ela me encontrou. Eu vivia do esquema, no esquema. Ela me foi fazendo ficar assim luado, já nem tinha dores na alma. Lhe possuía assim umas tantas vezes no dia. Era até não conseguir mais. O esquema acabou. Me fui virando no álcool. Todos os álcois. Hoje me vez aqui a pedir, mas eu já fui pessoa de farda limpa. Eu já tive paixões que até me faziam sentir borboletas a voar à minha volta. Eu já tive assim de mulher à minha volta, a me pedir um esquena.
- Tens filhos?
- Não. Me apaixonei sem dar conta. Ela me dizia que como eu não havia outro. Os outros só queriam cama e eu queria diálogo, lhe queria ouvir. Mas o esquema nos foi tirando tempo que o tempo dela acabou bem cedo. Acho também me tirou paciência que agora tenho é demais.
- Já conseguiste fugir do esquema?
- Falta combu… quando lhe arranjo ainda esquemo uma de matar saudade.
- És doido, Estevanov.
- Te digo, pula, doido mesmo és tu que não és coxo, não és gago, não és cego e te perdes aqui a falar comigo. Quem é que é o doido afinal?


Sanzalando

25 de outubro de 2008

dor de cabeça

Vá lá. Dói-me a cabeça. Mas o que é isto de reflectir? O que é isso de pararmos para pensar? Mas se é assim é porque é assim e não vale a pena perdermos tempo matutar. Chamaste-te Maria e tu Manuel, ele Joaquim. Porquê? Mas o porquê aqui tem algum significado? Foi um acaso. Mas porque é que eu vivo onde vivo. Porque sim. Mas porque é que sou como sou? Porque sim. Se eu soubesse a resposta dalguma destas perguntar alguma coisa ia mudar? Já me basta ter de pôr gravata para parecer alguma coisa. Insignificante, por exemplo. Não higiénico, também. Mas para quê perguntar-me isto tudo.
Mas porque é que eu só vejo os meus defeitos se eu sei que também tenho virtudes?
EH. Tudo porque me dói a cabeça.

Sanzalando

24 de outubro de 2008

o que é real

Me vejo aqui sentado de corpo a voar pelas esferas do vento. Ver, sentir e acreditar nesta realidade como se fosse uma borboleta no seu voo entrecruzado a caminhar no ar.
Duas linhas irreais. Falo irrealmente. Descubro que ainda sou capaz de caminhar no ar. Basta-me querer!
Já me transpiram as mãos, a realidade não é como nós cremos que seja, é simplesmente como ela é.
Saltam-me os olhos da cara porque os sonhos podem ser pesadelos.
Afinal de contas o que é real?
A esperança sei que é.

Sanzalando

23 de outubro de 2008

espaço em branco

Me acabo de descobrir que existe em mim um bocado que ainda não foi descoberto. Além do lado escuro da minha vida ainda tenho o lado não descoberto. Isto é que estou a ficar que nem um baralho de cartas depois de bem misturadas.

Isto tudo foi mesmo mais porquê? Porque me perguntei em voz alta o que é que eu quero mesmo da vida. E a resposta foi um longo silêncio que ainda não terminou.

Será que não há um bocado de mim que conheça essa parte e diga a resposta assim num bem alto para eu não ficar com dúvidas?


Sanzalando

22 de outubro de 2008

Outono em mim


TSSSSS que já está a ficar é de manhã. Abro só um olho de cada vez para ver se ainda não são horas de acordar, mas me desengano porque o dia está a romper, o vento sopra porque é tempo dele soprar com força que até arranca as folhas das árvores e as palmeiras até que parece dançam um semba que não lhe ouço.

Chiça que ainda por cima está de chuva e o barulho do vento mais a da chuva me fazem apetecer ficar aqui com os dois olhos fechados a escutar a música deles.

Tsssss, tem mesmo de fazer força para combater essa coisa da inércia, que devia estar de férias e me deixar ficar aqui deitado que nem um sorna.

Mas afinal de contas quem é que vai notar se eu apareci ou não?


imagem: Museu da Escravatura - Luanda
Sanzalando

21 de outubro de 2008

marinheiro de água doce

Deixo percorrer na minha cabeça as mais que muitas ideias que lhes apetecem aparecer. Hoje mesmo estou aqui a olhar assim como que para muito longe que eu nem consigo ver de verdade mas só mesmo num ver de pensar.
Vou num barco que visto de desde lá do céu parece assim uma casaca de noz, o cordame range parece está a cantar uma canção de dor e o vento não pára de assoprar como que a me mostrar que tem força para me levar.
Parece vou na aventura do caos, à procura de tempestades que me rasguem as frágeis velas da minha casaca de noz.
Contra a canção de dor eu me canto canções de embalar. Me deixo adormecer em mar alto como se eu fosse um marinheiro.
Ai uê, mamãe, acho de me ter lembrado agora que eu não sei nem nadar por isso é melhor eu ir assim numa de ir a pé, devagar, olhar as estrelas e sonhar.

Sanzalando

19 de outubro de 2008

o mar de mim


Às vezes consigo ouvir o mar e lhe vejo milhares de gaivotas na areia da praia como se fosse um dia de verão.

Meus olhos se enchem de mar quando lhe vejo a espraiar ao ritmo do bater do coração.

Mas têm sido poucas vezes as que ouvindo o mar eu lhe consigo escutar.

Mas têm sido raras as vezes que lhe vejo parece me está a chamar.
Às vezes me apetecia estar fundido num abraço de água, seguir no meu bote de imaginação e como uma carícia lhe navegar numa melodia de serenidade. Às vezes me apetece ver os segredos nas mensagens das ondas como se um código fosse.
Às vezes o mar me entra e me afogo de nostalgia.



Sanzalando

18 de outubro de 2008

duvidosamente duvido



Eu sei que devia estar ali mas não estou. É um devia de dever moral. Umas vezes sinto que seria uma obrigação. Engano-me. Posso, não?


Mas a verdade é que eu devia estar ali. Devia, o que não sei é mesmo se devo.
Um dia me disseram que os sentimentos morrem. Duvidei. Duvido. Modificam-se. Ou não. Mas se morrem, estão mortos e portanto não voltam. Pelo menos para mim que não acredito em fantasmas.
Enganei-me outra vez? É claro que posso, ou não?
Mas afinal de contas porque é que eu te sinto perto de mim, por vezes reles, outras pressionante, outras intensa e não estás onde devias? Lá, sossegadamente lá.

Não entendo como posso perder este tempo a pensar-te.
Já sei. Estas poucas linhas, tal como tu, não deviam estar aqui.


Sanzalando

17 de outubro de 2008

já sei que sou um Outubro

Correm-me pela cara lágrimas caté me parecem é de sangue. Já sei que ninguém as vê. Lágrimas de impotência, de tristeza e de vazio. Já sei que ninguém as vê.

Só eu que as vejo, que as sinto. Só eu que as choro.

Afinal de contas não sou mais do que sou e tenho que convencer-me que nada sou, nem frio nem calor, nem noite nem dia, mero espectador duma vida.

Mais nada sou que as minhas pegadas e as minhas recordações.

Sou um Outubro cinzento a ver se me encontro.




Sanzalando

16 de outubro de 2008

viajarei ao deus dará


Acho vou mesmo entrar no mundo, lhe viajar e lhe conhecer todos os cantos mesmo os que sejam redondos que nem rotundas. Me apetece viajar para lá das estrelas, desviar-me de asteróides. Motor para isso. O que é que é mais rápido que o pensamento? Me diz só se para viajar é preciso tocar com as mãos.

Olha só essa paisagem linda que está que nem aí na mão que faz a sementeira. Agora põe o calor insuportável, lhe bota o cheiro nauseabundo que vem da lixeira que fica quase que nem a cem metros, lhe coloca os mosquitos e outros insectos visíveis mais os invisíveis. Deu mesmo o quê?

Nas estrelas não podemos nem tocar. Olhar apenas e deixar o sonho nos levar para lá da realidade.

Galáxias que me tornam insignificante.

Vou viajar num mágico pincel de pensamentos.

imagem da internet
Sanzalando

15 de outubro de 2008

introspecção ao vazio

Dia cheio depois duma noite agitada. Imagina só assim uma orgia mental que até parece te estão a arrebentar com a cabeça, saiu um almoço com amigos daqueles que bebem mais que a própria pipa e comem mais que um supermercado acabado de abrir.
Chego a casa e directo no duche. Aqui, quando a água me empapava todo é que eu me assustei num assustar que acho até me gritei para dentro. A minha alma se tinha ausentado. Foi dar uma volta. Eu não conseguia pensar em nada, assim como nada parecia estar a acontecer à minha volta. Fiquei estático enquanto a água me cobria. Pensei eu estava cego pois o vazio da minha cabeça apanhava os olhos também. Paralisei-me por instantes. Desalmei-me de todo. Olhava-me para dentro e via o nada. Me derreteu o corpo através do medo de poder ficar assim para sempre. Eu sem alma. Eu a circular desalmado, carregado de vazio numa dor poética. Afinal de contas já alguém me tinha dito que quem não sabe povoar a sua solidão nunca saberá ficar sozinho na multidão. Mas também não era preciso eu ficar assim num repente sem ser avisado, preparado, treinado.
Saí do banho. Deitei-me e logo desatei a sonhar que estava a sonhar. Lutei materialmente com a minha alma e foi esta que venceu.
Hoje, quando reflicto neste episódio sinto que perdi umas horas desfeitas em vazios.
Afinal de contas todas as dores e felicidades têm os seus tempos.

Sanzalando

14 de outubro de 2008

solteira culpa

Nestes caminhos perdidos em que o norte se mistura num sueste a dar para o poente dum qualquer põe-te a andar daqui, eu gostava de culpar alguém da minha má sorte e desafortunada fortuna de pós de muitas eras. É verdade que já ouvi alguém dizer que a culpa era dos genes, destino marcado nas células, outros que era por causa da infância fracassada, dos pais e das mães. Já ouvi tanta coisa que acho tudo ficou assim num sumário imaturo de desculpas para esconder os erros próprios.
Hoje eu gostava de dizer que a culpa era da infância, da mãe, do vizinho, de sei lá de quem, que eu me queimava nuns cigarros que faziam fila indiana para serem consumidos na quase centena diária. Gostava de dizer que a culpa era do pai, da vizinha, da filha, de sei lá de quem que eu fiquei agarrado nesta coisa de dizer o que penso.
Gostava de dizer que a culpa é dos meus avós por eu ser assim esbelto, rápido a pensar e lento a decidir.
Eu gostava era mesmo de culpar alguém.
Não havendo, a culpa fica solteira.

Sanzalando

13 de outubro de 2008

presentemente instante

Acho tenho de deixar de me levar pela intuição e fazer mesmo o que é que me está a apetecer.
No futuro nem lhe vou pensar, porque o agora está a passar e o depois a gente mais logo vai ver como foi.
Por isso agora mesmo, neste presentemente instante, vou deixar a voz de lado e vou ver só com os olhos, mesmo com eles fechados a olhar-me para dentro. Vais ver ainda vou ver um brilho qualquer num céu cinzento.

Sanzalando

12 de outubro de 2008

num domingo qualquer eu te conto

Me vesti com roupa lavada que até parece é nova. Me atirei de casa para a rua movimentada dos passeios de domingo. Escolhi o restaurante que fica mais perto da praia com a mesa mais indiscreta de modo que eu lhe consiga ver toda. Ou quase.
Bebi a cerveja e atirei o meu olhar em todas as direcções. É hora de escolher a virtualidade que me acompanhará na refeição. É, depende de onde meus olhos vão parar assim eu escolho o que vou comer.
É domingo e não é dia de se comer assim numa de solidão solitária. E há que escolher a companhia, boa companhia.
O garçon já me perguntou umas tantas vezes se já escolhi. Não sei se ele se refere na companhia ou na ementa. Mas uma depende da outra e vice sem verso.
Meus olhos parece estão a ficar cada vez mais exigentes, ou cegos. Desconseguem fixar um objectivo definido.
Peço nova cerveja. Já comi um pouco de pão com manteiga. Continuo a fazer navegar os meus olhos na areia dourada da praia.
Acho hoje é mais um dia de comer na solidão.
Não, hoje não é dia de comer, pelo que paguei as duas cervejas, o pão e a manteiga e com os bolsos vazios regresso a casa.

Sanzalando

11 de outubro de 2008

41 - Estórias no Sofá – Carta de Arnaldo

Ali está Arnaldo sentado no seu canto. Ele sempre se senta nesse canto quando a saudade lhe aperta. Me apetece dizer que Arnaldo sufoca de saudade, assim num cada vez mais frequentemente, e quando isso lhe acontece ele escreve cartas. Acho ele tem uma colecção tão grande que faz inveja nos coleccionadores de verdade.
Lhe falo coisas à toa para ver ele se acorda dessa saudade que lhe afoga. Me responde com palavras mais pequenas de duas letras. Os olhos não se mexem nem para ver donde lhe falo.
Lhe olho de lado para um papel que descansa no seu ladoe consigo ler a sua redonda letra:

Querida amiga, espero que estejas bem de saúde. Melhor ainda, espero que estejas mesmo feliz. Te estou a escrever não é para pedir desculpas porque eu penso que não tenho motivo para tas pedir. Te escrevo mesmo só porque faz tempo que estas palavras me rebolam na cabeça com vontade de sair. Não sei se são os meus sentimentos que vão escritos nestas palavras ou se é apenas um relato das coisas feito pela minha cabeça. Acho vai sair assim tudo junto parece é uma misturada muito grande que nem eu vou depois descobrir, mas que eu tenho que te dizer isso é mais que certo. Talvez assim tu e eu nos possamos entender no meu interior.
Eu sei que, por muito tempo, controlei as minhas emoções. Pelo menos assim me pereceu. Podia eu até calhado dizer-te que te queria que eu sabia que nunca me ia enamorar assim numa de pés para a cova, pois estava certo que nunca me ia enamorar com coração e tudo. Mas depois que te repensei foi um secretamente crescente de amor nascido. Fui atrás dos teus passos, segui as tuas palavras, saboreei os teus perfumes. De verdade que nem sei bem que é que aconteceu.


Parei aqui de ler porque tinha de virar a folha e eu não ia fazer isso assim sem pedir com licença e disse mais umas outras palavras ao Arnaldo para lhe acordar desse afogamento. Me desligou como se eu não estava nem ali. Continuei a falar, acho lhe falei do tempo, da luz do céu até parecia fotografia. Lhe recebi o silêncio. Foi assim num repente que lhe perguntei se podia ler o que é que ele estava a escrever. Me respondeu com encolher de ombros que eu interpretei é um sim e logo virei a folha e continuei a ler me esquecendo de lhe dizer um obrigado pá.



Acho brinquei com o fogo e me queimei. Eu não queria viver isto que vivo agora. Eu queria continuar a ser livre e não um manso cabrito que sofre de amor. Mas eu acho enlouqueci quando me deste esperanças, ou fui eu que fiquei cego de amor e me confundi. É verdade que passei uns belos momentos até sentir as verdades futuras, até começar a sentir o medo do amor e recomecei a desprender-me e desconsegui. Antes pelo contrário. Me desliguei do medo e recomecei a viver esse momento como o momento mágico da vida. Enlouqueci. As tuas carícias, os teus beijos. Tudo o que sonhei estava a sentir através dos teus sussurros e dos teus acenar de sinais que eu percebia.
Fui feliz. Esqueci os meus medos. Empolguei.
Mas afinal sucedeu o que o meu coração sempre me dizia. A felicidade diminui com o passar dos dias. Me aconteceu isso num progressivamente sentir vindo de ti. Vi que o brilho do teu olhar já não me olhava com o mesmo brilho. Senti num sentir que até parece cobra que escapavas furtivamente da minha vida dedicada a ti. E eu ali sentado à espera das tuas carícias, dos teus sinais, dos teus beijos. Fugias assim por entre os meus dedos mais rapidamente tinhas entrado.
O tempo me foi abrindo os olhos enquanto o coração chorava as lágrimas da dor sentida. Eu estava à espera que tu te entregasses assim que nem eu. Mas foi-te um amor volátil. Mas é assim a realidade. Chorarei em silêncio até à última vez, até ao meu destino mais próximo. Não te negarei os meus sentimentos de antes, não te nego os de agora e os do futuro logo a gente os vai ver. Sei que te escrevo palavras se calhar sem sentido, se calhar para libertar os meus fantasmas, se calhar para te esquecer.
Não, esta carta não é uma forma de fazer queixas, lastimar ou chorar-me porque não te sentes igual que nem eu.
Se calhar esta carta é apenas mais um equívoco. Quem sabe?


Arnaldo olhava em frente com olhos de quem não está a ver nada. Tinha uma folha em branco à sua frente. Lhe voltei a falar e lhe perguntei se ainda ia escrever mais. Me olhou num olhar triste e me respondeu:
- Quem é que sabe o que é o futuro?

Sanzalando

10 de outubro de 2008

me escondo

Cada vez mais perdido que nunca, não me encontro. Bem, de verdade nem encontro as minhas escapatórias, as minhas portas SOS. Tento, insisto e nem sei onde procurar-me. Acho que já nem sei quem sou nem quem eu podia ser. Já não sei o caminho que me leva a mim mesmo.
Procuro-o com a esperança dum regresso de mim, dum reencontro com a ilusão. Encontro labirintos, caminhos sem saída, escadas sem degraus e imagens sem som.
Mas onde é que eu me escondi?

Sanzalando

9 de outubro de 2008

viagem no tempo

Faço mais uma das muitas viagens dentro de mim e presto atenção à paisagem e vejo um céu cinzento prometendo uma chuva de palavras ou quem sabe uma tempestade de ideias. Deixo o tempo passar e me vou ficando nesta contemplação enquanto ouço na memária umas canções de saudade, song song blue, let it be, outras mais que às vezes já nem sei de que ano e neste exercício mais o tempo vai passeando por algum desencanto ou outro mal entendido.
Hoje a viagem torna-se mais longa porque me perco em labirintos de sonhos, porque vagabundo-me por rostos que fantasio num queimar de tempo fazendo esquecer que foi um dia duro de mais um dia aqui sem poder ouvir os sons dela.
Me entro pelo duche num correr de água sem confirmar qual a temperatura. Me arrepio. Acho até gritei da dor do gelo escorrendo-me nas costas ao mesmo tempo que me ouço por dentro o cair da coluna do disco ao vivo dos Creedence Clearwater Revival em Tóquio. Retemperado nas forças e nas emoções salto para Because I Love do MajoratY One. Me aqueço na saudade de poder viver amanhã sem calafrios e como os seus olhos me olhando com a ternura de quem ama.
Saio do meu carro do tempo, entro na viagem real e tento não perder o controlo.

Sanzalando

8 de outubro de 2008

espaço em branco

Acabo de descobrir um espaço em branco dentro de mim. Bem, na verdade nem eu sei se ela já estava aqui antes, mas ao sentir a tua falta senti um vazio que até me doeu. Vasculhei à volta desse espaço em branco e encontrei um vazio de tempo, um silêncio de vida, um gesto seco de interrogações infinitas.
Abracei-me na ternura dos meus dedos e vaguei por pensamentos e recordações.
Amor, chamei eu ao espaço em branco dentro de mim.

Sanzalando