Me sentei na falésia, faz de conta é teatro e tenho a Igreja nas minhas costas, faz conta me protege de pecados e outros pensamentos que possam me levar para outros lugares que não a adolescência.
Porque é que me sentei aqui?
Porque para além de ser aqui que me habituei a assistir ao santo sacrifício da saída da missa de domingo de manhã, é aqui, mais ou menos no meio da baía, que eu vejo todo o planeta zulmarinado que os meus olhos conseguem alcançar e que me embalo em sonhos que nem sei se mais algum dia eu lhes vou recordar com tanta nitidez.
É aqui, neste lugar mágico que eu descubro quem sou, o que eu adoraria ser, o que eu fosse se não puder ser o sonho que eu tenho e me revejo no que realmente sou. Neste anfiteatro eu sou capaz de me sentir o que serei.
Aqui, sentado na falésia, sem tempo nem modo, sem contas, rectas ou direitos, o meu passado se entrecruza desfuturado num agora ou nunca momentâneo, porque aqui eu sou futuro de mim, dono das invenções que inventei, das páginas que nunca escreverei e do desejo que nunca desvendarei. Aqui eu sou eu e mais ninguém, diria o poeta.
Aqui descubro tudo sobre ti, folheando as minhas memórias, revendo as minhas imaginações e, desenhando rabiscos de vento, te desenho para mim. Não me interessa a tua voz, teu sotaque, timbre ou qualquer som. Leio-te no meu silêncio e imagino-me no teu futuro com a certeza absoluta que nunca me arrependerei de ter sonhado contigo tantas horas do meu dia a dia.
Aqui, olhando o mar lá em baixo, poderia dizer que te amaria aquele eternamente que durasse o tempo que tivesse que ser. Aqui faço-te os meus pedidos desde que esses pedidos, todos juntos, sejam suficientes para me deixar estar perto de ti nos sonhos que sonhei para o meu futuro, mesmo que ele seja um distante espaço entre nós.
Aqui sentado vi que o meu futuro não é o que eu imaginei ele fosse embora tenha a certeza que ambos perdemos e ganhamos, que ambos fizemos da vida uma vida.
Sanzalando
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